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- JANUS 2004 -

Janus 2004



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Lusofonia, anglofonia, francofonia

João Domingues *

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Ao estudarmos a integração de Portugal em espaços políticos alargados, haverá interesse em analisar essa inserção comparativamente com os espaços de influência inglesa e francesa. A Commonwealth, a Comunidade Francófona e a Comunidade de Países de Língua Portuguesa têm em comum o serem, de algum modo, o prolongamento de antigos impérios coloniais. Mas ao contrário das outras, na CPLP a potência mais forte não é antiga metrópole: a importância do Brasil e a dimensão de alguns dos países africanos de língua portuguesa bastam para redimensionar o papel de Portugal e para dar uma natureza própria a essa Comunidade.

 

A Commonwealth

A Commonwealth é uma associação de 53 países independentes que funciona através de uma rede informal de ligações governamentais e não-governamentais. Os Estados-membros beneficiam do suporte de uma larga rede de organizações privadas, voluntárias e profissionais no domínio universitário, parlamentar, legal, da saúde, dos media e desportivo.

A Commonwealth não tem uma estrutura constitutiva formal. Baseia-se em procedimentos comummente aceites, convenções e declarações de vontade ocasionais ou compromissos de acção. A consulta intergovernamental é a principal fonte de orientação, permitindo aos Estados-membros exercerem conjuntamente influência sobre os acontecimentos mundiais e organizarem programas levados a cabo bilateralmente ou pelo "Commonwealth Secretarial", a agência executiva principal desta comunidade, sediado em Londres e cujo Secretário-Geral é actualmente o nigeriano Emeka Anyaoku.

O culminar das actividades da associação é a Conferência bienal dos Chefes de Governo da Commonwealth onde se discute a política mundial, os assuntos económicos e sociais e o modo como estes interagem sobre os respectivos membros. Daqui são lançadas as políticas orientadoras a serem cumpridas nos dois anos que se seguem. A maior parte das actividades é executada pelo "Commonwealth Secretariat". Depois de se tornar independente, a índia escolheu em 1949 a forma republicana de governo, pretendendo, no entanto, manter a ligação com a Commonwealth. Isto marcou o início da moderna Commonwealth. A partir daí, o número de Estados-membros cresceu rapidamente, proporcionalmente às independências conquistadas por vários países africanos e asiáticos.

A rainha Isabel II é monarca de 16 Estados entre os 53 membros e Chefe da Commonwealth para a generalidade dos países. O apego a este papel simbólico do monarca tem sido essencial para sublinhar o sentido de uma "família de Nações", outrora ligadas pelo império britânico e que se baseia actualmente na herança comum da língua, cultura, justiça e educação. Após a aceitação no seio da comunidade, pela primeira vez, de um país que nunca estivera sob domínio da Grã-Bretanha — Moçambique —, a Commonwealth tem sido pressionada para que as regras de admissão de novos membros sejam mais restritivas, lendo como particular relevância o aspecto selectivo da língua que teria de ser obrigatoriamente a inglesa, e a obrigatoriedade de um passado de ligação constitucional com um dos Estados-membros da Commonwealth.

 

A Comunidade francófona

Na senda de Léopold Sedar Senghor, os presidentes Habib Bourguiba da Tunísia e Ould Daddah da Mauritânia foram os idealizadores de uma comunidade onde se reuniriam povos que utilizassem o francês como língua e que beneficiassem de uma herança cultural comum. O mundo associativo francófono surge placidamente sob a forma de organizações associativas tais como a CONFEMEN que nasce em 1960 e junta ministros da Educação de vários países francófonos, a AUPELF constituída em Montreal um ano depois com vista a agrupar as universidades parcial ou inteiramente francófonas, assim como a Assembleia Internacional dos Parlamentares de Língua Francesa (AIPLF) criada em 1967 com o intuito de reunir os parlamentares utilizadores da língua francesa.

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Estes diversos agrupamentos favoreceram o aparecimento de uma consciência colectiva dos falantes da língua de Molière em todo o mundo. No turbilhão de sentimentos comuns surge em Niamey em 1970 a ACCT (Agência de Cooperação Cultural e Técnica), que é aos nossos dias a única organização intergovernamental da francofonia. A ACCT tem como vocação, entre outras, explorar e pôr à luz do dia as vias de complementaridade e sinergia, de modo a "fazer cooperar as cooperações". Esta agência tem sede em Paris, delegações regionais em Lomé, Libreville e Hanoi, delegações intermediárias junto das instituições da ONU em Nova Iorque e Genève e está representada junto das instituições europeias e do secretariado do grupo ACP (África, Caraíbas e Pacífico) em Bruxelas.

Em 1986, fruto de uma longa maturação, a comunidade francófona alarga as suas estruturas institucionais, realizando em Paris a 1ª Conferência de Chefes de Estado e de Governo dos países que têm em comum o uso do francês. Esta conferência engloba hoje em dia 49 países entre os quais alguns Estados onde o francês é apenas a principal língua estrangeira, como a Bulgária, o Myanmar e a Roménia.

A mais recente Conferência em Hanoi designou o primeiro Secretário-Geral da francofonia. Este herdará as atribuições dos actuais Presidente do Conselho Permanente da francofonia e Secretário-Geral da ACCT. Terá como funções ser a "cara e voz" da francofonia e representá-la na cena internacional.

 

A CPLP e o contexto global

Não cabe aqui a descrição da CPLP, pois está devidamente feita na edição de JANUS 97.

É notório o aparecimento tendencial de grandes blocos com interesses mútuos partilhados. Este surgimento foi incentivado pela queda do mundo bipolar simbolizada no Muro de Berlim. É certo que muito antes de tal acontecimento histórico já existiam alguns desses blocos. Exemplos claros são a Commonwealth e a Comunidade francófona, que sendo de cariz eminentemente cultural ficaram adormecidos pela força estrutural que lhes foi imposta. Observemos a "quase" coincidência entre o desanuviamento da glasnost e a primeira cimeira da francofonia. Observe-se ainda que só muito recentemente a Comissão dos assuntos externos da Câmara dos Comuns no Reino Unido acordou para o facto de a Grã-Bretanha não estar a aproveitar devidamente o potencial económico da Commonwealth.

É neste contexto, em que a formação de blocos culturais e económicos é a última forte tendência geopolítica do pós-guerra fria, que surge a CPLP. Terceiro bloco do género, cronológica e demograficamente, a CPLP foi a primeira comunidade nascida do pós-1989 com toda a responsabilidade e expectativa que tal acarreta.

O número de Estados-membros da CPLP está confinado à obrigatoriedade da língua portuguesa e de serem Estados independentes. Para os casos da Galiza e da Guiné Equatorial, que já manifestaram o seu interesse, resta-lhes esperar que, à semelhança do que acontece com o Vale d'Aosta (Itália) e a Louisiana (EUA) no seio da Comunidade francófona, se possa vir a criar o estatuto de convidado especial ou mesmo de observador na CPLP. Quanto a Timor Leste, viu consagrado o seu estatuto especial de "observador participante" na Conferência de Ministros dos Estrangeiros da CPLP, em São Salvador da Baía, em 18 de Julho de 1997, decisão a confirmar na Conferência dos Chefes de Estado marcada para Cabo Verde em 1998.

 

Informação Complementar

Bilhete de Identidade das três comunidades

Nome/Designação: Commonwealth
Língua utilizada: Inglês
Data de nascimento: (da moderna Commonwealth) 1949
N.º de Membros: 53
N.º de Habitantes: 1.320 Milhões de Habitantes

Nome/Designação: Communauté Francophone
Língua utilizada: Francês
Data de nascimento: (como comunidade organizada -ACCT-) 20 de Marco de 1970
N.º de Membros: 49
N.º de Habitantes: 473 Milhões de Habitantes

Nome/Designação: Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)
Língua utilizada: Português
Data de nascimento: 17 de Julho de 1996
N.º de Membros: 7
N.º de Habitantes: 198 Milhões de Habitantes

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* João Domingues

Licenciado em Relações Internacionais pela UAL. Pós-graduado em Estudos Europeus pelo ISEG.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela As três comunidades

Link em nova janela Distribuição da população pelas três comunidades

Link em nova janela Milhões de habitantes por comunidade

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