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- JANUS 2004 -

Janus 2004



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Relações sócio-culturais com a África Subsariana

Alfredo Margarido*

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A África subsariana tem sido abalada pelo debate em torno dos problemas da democracia, dos direitos do homem e da erradicação da corrupção. Uma parte substancial dos homens políticos e até dos politólogos pretende reduzir o alcance efectivo da democracia, propondo a criação de formas reduzidas de "democracia africana". Não falta de resto quem, no calor do debate, denuncie tais direitos, considerados — sobretudo nos países de orientação islâmica — como sendo uma mera herança do colonialismo. Regista-se também uma evidente impaciência por parte de muitos Estados ocidentais, que põem, enfim, em causa os apoios concedidos a dirigentes políticos corruptos e brutais. Estas operações são não apenas caras, mas incapazes de definir as vias do futuro africanas. Verifica-se que a democracia é mais barata do que as formas ditatoriais e mais capaz de garantir a eficácia da sociedade civil.

Esta situação tem sido também perturbada pelo lento mas contínuo empobrecimento desta ampla fracção do continente, devendo ainda registar-se a impotência dos governos e das organizações políticas, africanas e mundiais — da Organização de Unidade Africana às Nações Unidas — para pôr termo às situações de guerra civil, como acontece no Sudão ou nas regiões dos Grandes Lagos, sem esquecer o caso dramático de Angola. Alguns velhos apetites neocoloniais continuam activos, como se verifica no caso do Estado francês que procura integrar no espaço da francofonia países como a Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe, Cabo Verde e até Angola. Por sua vez, Moçambique decidiu aderir à Commonwealth, decisão na qual muitos quiseram ver o sinal da liquidação da língua portuguesa em Moçambique, o que provocou uma emoção certamente legítima, mas evidentemente excessiva: nem o governo de Moçambique previu qualquer medida tendente a restringir a utilização da língua, como o seu destino depende da vontade dos locutores moçambicanos.

Todavia, as modificações mais importantes registaram-se sobretudo na África Austral, em consequência da liquidação do regime do apartheid e da eleição de um dirigente tão carismático como o Presidente Nelson Mandela. A revisão das escolhas políticas do país, a ainda lenta mas já visível modificação do funcionamento das instâncias políticas e das estruturas económicas, obriga à recomposição das forças políticas em toda a África Austral. O aparelho político e militar da África do Sul, apoiado pela eficácia tão conhecida dos serviços secretos, deixou de suscitar e de alimentar forças (os falsos "movimentos") destinados a impedir a organização normal das sociedades civis dos países vizinhos.

No caso de Moçambique verificam-se já os excelentes resultados da transição para uma situação de paz, que permite o funcionamento cada vez mais normal da sociedade civil, objectivo que não foi ainda, infelizmente, alcançado em Angola, apesar de a África do Sul ter deixado de apoiar abertamente as forças da UNITA. Esta operação está destinada a alcançar uma dimensão cada vez mais ampla, pois ela condiciona a revisão das relações envolvendo não só o Atlântico Sul, mas as relações entre esta zona e o Índico, o que abrange necessariamente os países africanos de língua oficial portuguesa, assim como o Brasil. Tais modificações devem ser geridas pelas práticas da "lusofonia", da qual se espera a criação de um "espaço lusófono", capaz de integrar todos os países que utilizam a língua portuguesa como meio preferencial de conhecimento e comunicação. O primeiro passo desta política fora já dado em 1953 – com a criação da Comunidade Luso-Brasileira – tendo sido reforçada graças à criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), em 17 de Julho de 1996. Não se procura apenas renovar os laços do passado, mas construir a relação forte do futuro.

Deve, contudo, contar-se com dois obstáculos consideráveis, sendo o primeiro decorrente da adesão do Estado português ao Tratado de Schengen, pensado essencialmente como uma barreira destinada a defender os "países do Norte" do afluxo negativo — quando não até diabólico — dos "países do Sul". Os efeitos negativos desta opção já se fizeram sentir entre nós, como parece comprovar o reduzido número de emigrantes africanos em Portugal. Se bem que não disponhamos de valores estatísticos suficientes, podemos verificar, recorrendo ao caso francês, que esta política provocou já uma descida sensível do número de estudantes africanos matriculados nas Universidades francesas. A rigidez da política dos vistos, imposta pelas regras do Tratado, empurra estes estudantes para regiões políticas e culturais mais flexíveis, menos repressivas.

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O segundo obstáculo está patente no quadro Comunidades Portuguesas na Africa Subsariana, que mostra a distribuição dos emigrantes portugueses nesta imensa fracção da África. O reduzido número de portugueses instalados nesta vastíssima região não pode deixar de ser preocupante, na medida em que a colonização portuguesa assentou preferencialmente nas opções dos colonos, que não hesitavam em se instalar junto das populações autóctones, vivendo com elas e com elas partilhando valores e costumes. A existência de portugueses "cafrealizados", como se dizia pejorativamente, salienta a importância destes laços.

A única maneira de compensar esta queda brutal da presença física dos portugueses, reside no reforço das relações culturais, capazes de assegurar a expansão e a banalização da língua portuguesa, e na multiplicação dos instrumentos de cultura e das relações culturais, graças aos media, assim como a muitas outras formas de intercâmbio cultural e técnico, que incluem a alimentação (bacalhauzada e vinho português) e o desporto (futebol). Esta orientação política é reforçada pela concessão de bolsas de estudo por parte do governo português: conta-se hoje cerca de um milhar de bolseiros, distribuídos pelos cinco países africanos de língua oficial portuguesa, como se pode ver no quadro Estudantes Africanos Lusófonos com Bolsas de Estudo Atribuídas pelo Governo Português. Este número aumenta de maneira significativa quando lhe acrescentamos os 124 bolseiros da Fundação Calouste Gulbenkian, a qual, através do Serviço para a Cooperação com os Novos Estados Africanos, organizou as actividades de apoio a estes países nos domínios da Educação/Formação e da Saúde. A Universidade Católica concede 5 bolsas anuais, mas regista-se a emergência de esforços tendentes a aumentar de maneira significativa o número de bolsas a conceder aos estudantes africanos.

Deve ser assinalada, no plano da colaboração técnica associada à edição, a criação de um Fundo Bibliográfico, com sede em Maputo, com fundos provindos da Comunidade Europeia, cujo objectivo é a formação de editores, livreiros, jornalistas culturais e outros especialistas da edição, abrangendo todos os países de língua oficial portuguesa. Na esteira desta operação, registe-se a criação de uma editora, à qual está associada a Texto Editora, que também participa na formação dos técnicos previstos pelo projecto do Fundo Bibliográfico.

Verifica-se que os projectos universitários moçambicanos se tornaram possíveis com o fim da guerra civil, e duas universidades privadas — a Católica e a Lusófona — participaram, através dos seus responsáveis, na criação de instituições de ensino médio e superior. A Universidade Católica está neste momento empenhada em levar a cabo a mesma operação em Angola, onde as condições sócio-militares não o permitiram ainda. Está também em via de ser reforçada a actividade registada no plano dos media, como acontece na rádio: a RDP emite desde as 6 da manhã até à 1 da manhã do dia seguinte, para todos os países africanos, com excepção de Angola, devido às regras políticas que impedem que as rádios estrangeiras recorram à FM. Espera-se que este obstáculo seja enfim removido pela paz indispensável.

Por sua vez, a RTP Internacional emite para as Repúblicas africanas de língua oficial portuguesa durante uma hora por dia, pretendendo contudo alargar este período para quatro horas, o que seria certamente mais consentâneo com as necessidades de todos os países envolvidos. Falta, é cada vez mais evidente, um amplo projecto que assegure a presença destas instituições de língua portuguesa na Internet, mas trata-se certamente de uma presença que já poderemos analisar no JANUS do próximo ano.

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* Alfredo Margarido

Escritor. Docente na UAL.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

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Link em nova janela Estudantes africanos lusófonos com bolsas de estudo atribuídas pelo governo português

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