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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! O mundo acordou para a importância desta fonte estratégica alternativa na década de 60, despertado pelos alertas de risco de rápido esgotamento das existências terrestres destes minerais. Algumas projecções então avançadas apontavam, em compensação, para uma capacidade de aprovisionamento praticamente ilimitada assente na exploração dos nódulos polimetálicos dos fundos oceânicos: manganésio para 400.000 anos, níquel e cobalto para 200.000, cobre para 6.000 e ferro para 2.000. Este cenário, indiscutivelmente fantasista, fez desencadear uma corrida à extracção e exploração desses recursos e abriu aquela que tem sido uma das disputas políticas e jurídicas mais acesas no domínio oceânico. É uma disputa entre duas lógicas de regulação antagónicas, patrocinadas por dois grupos bem identificados de países: de um lado, a lógica apropriacionista, sustentada pelos países industrializados; do outro, a lógica comunitarista, defendida pelo Terceiro Mundo. A primeira encontrou tradução jurídica na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982. A sua Parte XI, reguladora das actividades na Área (isto é, os fundos marinhos e seu subsolo situados para lá da jurisdição dos Estados), articula-se em torno do conceito de património comum da humanidade. Dele decorrem os imperativos da não apropriação, da reserva para fins pacíficos e da exploração em benefício de toda a humanidade, especialmente dos países pobres. Para garantir a concretização destes princípios, a Convenção cria uma organização internacional, a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos, investida em funções seja de exploração directa dos recursos dos fundos oceânicos (através da Empresa), seja de regulamentação e controlo das iniciativas dos operadores nacionais públicos e privados. A Convenção teve sempre a oposição dos países desenvolvidos. A prová-lo está o facto de todas as 60 ratificações que permitiram a sua entrada em vigor em Novembro de 1994 pertencerem a países em desenvolvimento. O mundo industrializado sempre defendeu a tese da sujeição dos fundos marinhos à mesma regulação do alto mar: livre utilização do tipo "first come, first served". Quer dizer, não apropriação do espaço mas ocupação exclusiva de facto e aproveitamento exclusivo dos recursos extraídos. Subjacente a estas posições está a defesa, por esses países, dos investimentos de centenas de milhões de dólares feitos por consórcios multinacionais desde os anos 70 (cfr. tabela Principais Consórcios de Exploração Mineira dos Fundos Marinhos e gráfico Repartição dos Títulos Atribuídos no Pacífico Norte). De modo a enquadrar a actividade destes grupos, os principais países desenvolvidos muniram-se de legislações nacionais legitimadoras das actividades das empresas em causa e contrárias aos alegados riscos de apropriação colectiva mundial dos nódulos. Iniciou-se assim a formação de um verdadeiro regime paralelo ao da Convenção. A celebração de diversos acordos entre os consórcios (e posteriormente entre os seus países de sede) para delimitação dos sectores a explorar foi um passo mais no esvaziamento da Parte XI da Convenção, que superou inclusivamente a tentativa de compromisso que foi a concessão de um estatuto de privilégio aos investidores pioneiros no quadro da própria Convenção, através de uma Resolução anexa. O triunfo das posições liberais e apropriacionistas, favoráveis às multinacionais, consumou-se no "Acordo relativo à aplicação da Parte XI da Convenção", contido na Resolução 48/263 aprovada na Assembleia Geral das Nações Unidas em 28/7/94 com 121 votos a favor, 0 contra e 7 abstenções, e que passa a constituir parte integrante da mesma Convenção. O Acordo desmantela, ponto por ponto, a construção normativa do património comum da humanidade: anula as obrigações de transferência de tecnologia a favor da Autoridade e dos países em desenvolvimento, afasta o monopólio tendencial da Autoridade, dando preferência ao modelo de joint ventures, reduz a política de produção com base nos nódulos à disciplina comum do GATT/OMC e, acima de tudo, prevê o reconhecimento dos direitos dos investidores pioneiros, quer dos registados pela Comissão Preparatória da Autoridade ao abrigo da referida Resolução II, quer dos consórcios com investimentos na Área fora do regime da Convenção. Definitivamente, o património comum da humanidade é substituído pela multinacionalização dos fundos marinhos. Neste contexto, encontram-se actualmente reservados mais de 2,5 milhões de km2. Pouco mais de metade beneficia operadores abrangidos pelo regime da Convenção: a Autoridade (756.000 km2), a Índia (120.000 km2), a Coreia (75.000 km2) e as empresas francesa, japonesa, russa, chinesa e polaca (todas com 75.000 km2). Cerca de um milhão de km2 está reservado para consórcios maioritariamente ligados a não signatários da Convenção: Ocean Mining Associates (150.310 km2), Kennecott Consortium (116.340 km2), Ocean Mining Inc. (291.660 km2), Ocean Minerals Co. (173.380 km2 a que se adiciona um sítio de 66.100 km2 abandonado pela Kennecott em 1994) e AMR (138300 km2) (Fonte: Lenoble, 1996). Os montantes de investimento para rentabilizar a exploração efectiva de um sítio na Área são gigantescos. Estudos datados de 1988 relativos à exploração anual de 1,5 milhões de toneladas secas de nódulos apontam para cerca de 7.000 milhões de francos para estudos de viabilidade, prospecção e custos de arranque de actividade, a que se juntariam 1.700 milhões de francos de custos de funcionamento anual. A estagnação em baixa do preço das matérias-primas e a descoberta de novas jazidas terrestres têm protelado a exploração efectiva dos nódulos. Mas a intensificação da procura em virtude da globalização dos mercados faz adivinhar um novo surto de apetite pelos fundos marinhos. Desta feita, num cenário de multinacionalização e não de partilha mundial.
Informação Complementar E Portugal? Falar da posição portuguesa em matéria de exploração dos fundos oceânicos longínquos é acima de tudo fazer referência à evolução da posição diplomática portuguesa relativamente à Parte XI da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982. Ao longo do processo negocial que conduziu à celebração da Convenção (1973 - 1982), a posição portuguesa evoluiu de um apoio às teses pró-património comum da humanidade e pró-Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos tal como desenhados nas teses terceiro-mundistas para um alinhamento progressivo pelas posições reticentes ou até mesmo contrárias dos países da Europa Comunitária. Este alinhamento, construído em sucessivas reuniões de peritos e representantes governamentais, prolongou-se durante as conversações promovidas pelo secretário-geral das Nações Unidas que levaram ao Acordo relativo à aplicação da Parte XI. À semelhança dos países membros da União Europeia, Portugal esperou a aprovação desse Acordo para desencadear o processo de ratificação, o qual, uma vez concluído, integrará também o conteúdo do Acordo (Ver 6.2.). Localização dos sectores atribuídos para exploração mineira dos fundos marinhos longínquos Principais consórcios de exploração mineira dos fundos marinhos longínquos Repartição dos títulos atribuídos no Pacífico Norte Distribuição do espaço reservado para a exploração de módulos polimetálicos
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