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Onde estou: | Janus 1998 Supl. F.A. > Índice de artigos > Conflitos e paz nos nossos tempos > [Segurança ambiental: o ambiente como factor de segurança] | |||
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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! Em 1985 a expressão do Novo Pensamento Político de Gorbachov lança a noção de "segurança ampla" (comprehensive security) cujo objectivo foi definido como sendo a sobrevivência da humanidade. As ameaças à segurança ampla incluíam não apenas as ameaças militares, mas também as ameaças económicas e as ameaças ambientais, especialmente as relacionadas com as questões ambientais globais. O relatório Brundtland, publicado em 1987 pela Comissão Mundial sobre Ambiente e Desenvolvimento, faz referência às tensões ambientais como fontes de tensões políticas e de conflitos militares, ou seja como uma questão de segurança. Devido à crescente escassez de recursos ambientais e à progressiva degradação da sua qualidade, a relação entre a gestão dos problemas ambientais e a segurança nacional e internacional passa a ser aceite e o ambiente a ser considerado como uma preocupação de segurança. O relatório Brundtland defende uma completa integração das perspectivas ambientais num novo entendimento dos factores económicos, sociais e políticos e argumenta que a noção de segurança no sentido tradicional, isto é em termos de ameaças políticas e militares à soberania nacional, deve ser alargada por forma a incluir os impactes das tensões ambientais aos níveis local, nacional, regional e global. O conceito de segurança ambiental está relacionado com o conceito de sustentabilidade ambiental. A falta de sustentabilidade, se não for contrariada de forma apropriada por aqueles que são afectados ou pelas instituições que os defendem, é susceptível de provocar insegurança. A circunstância de o processo de insegurança ambiental ser alimentado pela falta de sustentabilidade e de a falta de sustentabilidade ser provavelmente alimentada pela insegurança é particularmente preocupante, porque as várias ameaças à segurança podem ser cumulativas e produzir efeitos susceptíveis de desencadear novos mecanismos e novas dinâmicas. A segurança ambiental está também directamente relacionada com os conflitos ambientais que podem ou não assumir carácter violento. Estes conflitos, actualmente difusos, poderão vir a aumentar rapidamente nas próximas décadas, por as situações de escassez de recursos ambientais tenderem a agravar-se rapidamente em muitas regiões do mundo. Alguns autores consideram que a degradação ambiental, embora não seja, em si mesma, uma causa de conflitos violentos, pode ter o efeito de exacerbar ou acrescentar novas dimensões aos conflitos violentos. Na realidade tem sido identificado um efeito de feedback positivo: a degradação ambiental e a escassez de recursos podem ser geradoras de conflitos, e até de guerras, que ao eclodirem vêm agravar a delapidação ambiental e a destruição dos recursos. O termo "conflitos ambientais" não pretende sugerir a existência de um tipo especial de conflitos atribuíveis exclusivamente, ou sequer principalmente, à degradação ambiental. Existe, na realidade, um razoável consenso entre os diversos autores, no que toca a considerar que a escassez ambiental não é, normalmente, a única causa de conflito nem sequer a mais importante causa de conflito. Alguns autores consideram que um conflito ambiental é aquele em que a degradação ambiental pode ser considerada como tendo, pelo menos, um papel importante. Estes conflitos podem ser nacionais ou internacionais, assumindo, na sua forma violenta, o carácter de guerra civil ou de guerra entre Estados. Actualmente parecem afastadas as ameaças das guerras nucleares e das suas consequências ambientais. Mas as ameaças ambientais relacionadas com as armas convencionais continuam presentes, tanto em tempo de guerra como de paz. Para além disso é possível falar também de "armas ambientais", como é o caso, por exemplo, da destruição de barragens como um acto de guerra, ou do incêndio de campos de petróleo como aconteceu na Guerra do Golfo em 1991. Analogamente os conceitos de "crimes ambientais", "terrorismo ambiental" e "refugiados ambientais" começaram, recentemente, a entrar no vocabulário corrente. Entre os exemplos de situações de insegurança ambiental mais frequentemente referidos destacam-se os ligados aos recursos hídricos, nomeadamente em certas regiões particularmente afectadas pela escassez de água, tendo as referências às "guerras da água", como as guerras de um futuro próximo, surgido com crescente frequência nos últimos anos. Como exemplos de regiões afectadas pelos problemas de insegurança hídrica referem-se, o Médio Oriente (por exemplo, as bacias hidrográficas do Jordão, do Nilo, do Tigre e do Eufrates), o Sueste Asiático (Mekong), ou a Ásia Central (Mar de Arai e Mar Cáspio). Em 1990 cerca de 300 milhões de pessoas viviam em regiões com escassez de água. Prevê-se, porém, que no final do primeiro quartel do próximo século as situações crónicas de escassez de água possam vir a afectar mais de cinquenta países e cerca de três mil milhões de pessoas, ou seja um terço da população mundial. As regiões de insegurança ambiental de origem hídrica virão no futuro a corresponder, sobretudo, a países em desenvolvimento sujeitos a forte crescimento demográfico, mas poderão também corresponder a países desenvolvidos. Assim, por exemplo, na Europa poderão agravar-se os problemas hídricos em certas bacias internacionais, entre as quais se incluem as bacias luso-espanholas. Para caracterizar as relações entre as situações de escassez de água e de insegurança ambiental é necessário começar por procurar esclarecer o que se entende por escassez de água. O Banco Mundial propôs um critério simples, mas também algo simplista por não tomar em conta as especificidades de cada caso, que considera que a situação é de stress hídrico numa determinada região se o escoamento per capita for inferior a 1700 m3/ano e é de escassez hídrica se for inferior a 1000 m3/ano. De acordo com este critério certos países do mundo já se encontrariam actualmente numa clara situação de escassez, como é o caso de diversos países do Médio Oriente. Noutras regiões, como por exemplo na maior parte da Europa, a situação actual é muito mais favorável. No caso, que nos interessa particularmente, dos recursos hídricos luso-espanhóis, as disponibilidades de água dos dois países ibéricos correspondem a cerca de 6700 m3/hab./ano em Portugal e 2900 m3/hab./ano em Espanha, valores estes que estão claramente acima dos valores antes indicados correspondentes às situações de stress hídrico e de escassez hídrica. Se se considerarem apenas os escoamentos gerados em cada um dos dois países, o valor correspondente às disponibilidades em Espanha permanece praticamente inalterado, mas o valor correspondente a Portugal reduz-se substancialmente, para cerca de 3400 m3/hab./ano ou seja um valor que tende a aproximar-se do correspondente à Espanha. Mesmo assim este valor é ainda cerca de duas vezes superior às condições de stress hídrico e três vezes e meia superior às condições de escassez hídrica, estabelecidos pelo critério do Banco Mundial. Os valores luso-espanhóis estão pois, em qualquer caso, longe de corresponder a situações graves de insegurança ambiental, sendo, por exemplo, cerca de dez vezes superiores aos dos países do Médio Oriente. Mesmo assim, face à evolução recente e prevista da situação, no que toca à quantidade e qualidade dos recursos hídricos que afluem a Portugal provindo de Espanha, torna-se cada vez mais claro que é urgente para Portugal concretizar a negociação com a Espanha de um novo convénio sobre os recursos hídricos luso-espanhóis. Para que o novo convénio possa corresponder a um progresso significativo na gestão dos recursos hídricos luso-espanhóis seria desejável que ele não fosse um mero acordo de partilha como o foram os convénios anteriores. Na realidade, é importante que se tenha presente que só será possível encontrar uma solução válida para os problemas dos recursos hídricos luso-espanhóis se ela passar por um relacionamento com a Espanha que não se assuma como antagónico, mas, pelo contrário, seja cooperativo. Considera-se indispensável que seja posta em prática, em cooperação com Espanha, uma estratégia regional para a gestão da água nas bacias hidrográficas dos rios luso-espanhóis. A estratégia da gestão regional dos recursos hídricos luso-espanhóis deve reconhecer plenamente a realidade essencial de que uma parte importante do território de cada um dos dois Estados corresponde a um mesmo conjunto de sistemas hídricos, constituídos pelas bacias dos rios transfronteiriços. Porém, tal não deve implicar que a estratégia regional não reconheça também que cada um dos Estados é soberano e que, como tal, deva avaliar a estratégia de gestão da água à luz dos seus próprios interesses e prioridades. Por um lado, a estratégia regional só terá significado se reflectir os interesses de cada um dos Estados e, por outro lado, as estratégias nacionais de recursos hídricos só terão sentido se forem consistentes com os objectivos e as medidas regionais. A gestão do ambiente e, em particular, a dos recursos hídricos, é um excelente campo para avaliar do bom funcionamento da democracia e para testar a autenticidade democrática. Seria, certamente, desejável que Portugal e Espanha se envolvessem plenamente no exercício democrático que a aplicação das políticas ambientais possibilita, assegurando assim a consolidação de uma situação de segurança ambiental na Península Ibérica.
Informação Complementar Evolução da Vulnerabilidade dos Recursos Hídricos entre 1990 e 2030 As estimativas relativas a 3030 correspondem a dois cenários diferentes. O cenário baixo baseia-se na previsão pessimista do PIB do Departamento Central de Planeamento da Holanda e na projecção baixa do crescimento da população do Instituto Internacional para a Análise de Sistema Aplicada (IIASA). O cenário alto corresponde à previsão optimista do PIB e à projecção alta da evolução da população.
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