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Esta evolução foi profundamente influenciada pelo papel central desempenhado pelas Forças Armadas no processo de transição de um regime autoritário para a democracia, que se projectou, no plano político e institucional, entre 1976 e 1982, além de outros aspectos, na existência do Conselho da Revolução, na consagração do princípio do autogoverno das Forças Armadas e no reconhecimento implícito do especial papel conferido ao Presidente da República enquanto emanação ou pelo menos protagonista de um especial vínculo de ligação à própria instituição militar. A revisão constitucional de 1982 foi dominada precisamente pela temática da extinção do Conselho da Revolução e pela definição do modelo de plena subordinação da instituição militar ao poder político democrático, pondo-se então termo ao sistema de autogoverno militar, o que abriu caminho para a aprovação do edifício normativo fundamental da Defesa Nacional e das Forças Armadas, assente sobretudo na Lei n° 29/82, de 11 de Dezembro (Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas, alterada pela Lei n° 41/83, de 21 de Dezembro e ainda pela Lei n° 18/95, de 13 de Julho). A temática da Defesa Nacional e das Forças Armadas constitui uma das áreas onde mais visivelmente se identificam aspectos institucionais que espelham a natureza semipresidencial do nosso sistema de governo, em que os órgãos do poder político (Presidente da República, Assembleia da República e Governo) partilham poderes, competências e responsabilidades num original modelo de equilíbrio que visa simultaneamente salvaguardar uma larga margem de corresponsabilização a par de uma relevante autonomia organizacional da própria instituição militar, (ver Informação Complementar). Neste contexto, o Presidente da República exerce, por inerência, o cargo de Comandante Supremo das Forças Armadas, competindo-lhe o poder de nomear e exonerar, sob proposta do Governo, os altos chefes militares. A opção do legislador constituinte recaiu, assim, num sistema de "dupla confiança", embora reconhecendo ao Governo um poder exclusivo de iniciativa, em conformidade com a afirmação do executivo como o órgão de direcção geral da política do país e órgão superior da Administração Pública do Estado (nesta se inserindo quer a administração civil quer a militar). Nos primeiros treze anos de vigência do sistema de designação das chefias militares a escolha do Governo estava significativamente condicionada pela prévia selecção de uma lista de três nomes emergentes da própria instituição militar para cada cargo mas, com a alteração introduzida em 1995, ampliou-se a margem de liberdade de escolha do Governo, eliminando-se o sistema de lista prévia, enquanto a participação das instâncias militares passou a revestir natureza meramente consultiva. A revisão constitucional de 1982 confiou ainda ao Presidente da República a presidência do Conselho Superior de Defesa Nacional que é essencialmente um órgão de consulta para os assuntos relativos à defesa nacional e à organização, funcionamento e disciplina das Forças Armadas. A Assembleia da República, por seu turno, desfruta de um amplo complexo de competências neste domínio de matérias (aprovar os tratados de paz, de defesa, de rectificação de fronteiras e os respeitantes a assuntos militares, bem como autorizar o Presidente da República a declarar a guerra e a fazer a paz e acompanhar, nos termos da lei e do Regimento, o envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro). No plano legislativo, compete à Assembleia da República, enquanto competência absolutamente reservada, legislar sobre organização da defesa nacional, definição dos deveres dela decorrentes e bases gerais da organização, do funcionamento, do reequipamento e da disciplina das Forças Armadas, bem como aprovar as denominadas "leis de programação militar" (leis de investimento específicas das Forças Armadas). Integra ainda a reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República a aprovação da legislação que restrinja o exercício de direitos por militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efectivo (restrições ao exercício dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva e à capacidade eleitoral passiva dos militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efectivo, na estrita medida das exigências das suas funções próprias), afloramento do princípio constitucional do rigoroso apartidarismo das Forças Armadas. Finalmente o Parlamento dispõe, também no que concerne aos domínios da Defesa Nacional e das Forças Armadas, dos amplíssimos poderes orçamentais que resultam do nosso sistema político. Na recente revisão constitucional (de 1997) procedeu-se ao aprofundamento deste modelo de evolução em torno de três vectores fundamentais. Por um lado, explicitou-se que "incumbe às Forças Armadas, nos termos da lei, satisfazer os compromissos internacionais do Estado português no âmbito militar e participar em missões humanitárias e de paz assumidas pelas organizações internacionais de que Portugal faça parte", o que vem pôr em realce não só a necessária redefinição das missões das Forças Armadas em função das mutações verificadas no cenário internacional e no específico protagonismo das organizações internacionais a que o nosso País pertence (designadamente a ONU, a NATO, a UE, a UEO e a OSCE), mas também vem sublinhar a cada vez mais íntima articulação do empenho de forças militares em missões de sustentação da política externa do Estado português (missões da ONU em Moçambique, em Angola e no Sara Ocidental e da NATO na Bósnia-Herzegovina). Este enquadramento conceptual corresponde ao entendimento perfilhado quanto ao baixo grau de ameaça convencional sobre o território nacional e à relevância central que desempenha, na definição da nossa própria defesa nacional, a partilha de responsabilidades no quadro das organizações internacionais, em especial daquelas que se ocupam da defesa colectiva (a NATO e a UEO). Neste contexto, a defesa e segurança colectiva exigem um conjunto de instrumentos de natureza preventiva que, para além da específica acção político-diplomática, passam pelo envolvimento das Forças Armadas em missões de gestão de crises que visam prevenir focos de eventuais conflitos ou restabelecer a paz nas melhores condições possíveis. No que se refere ao quadro de missões das Forças Armadas, a revisão veio acrescentar à previsão da participação das Forças Armadas em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações, designadamente no domínio ambiental, a colaboração em missões de protecção civil, bem como a participação em acções de cooperação técnico-militar no âmbito da política nacional de cooperação (em especial com os PALOPS). A revisão constitucional de 1997, mantendo a afirmação de que a defesa da Pátria é simultaneamente um direito e um dever dos cidadãos portugueses, veio, contudo, pôr termo à garantia constitucional do serviço militar obrigatório, o que significa que o legislador constitucional devolveu ao legislador ordinário a possibilidade de optar pela manutenção do sistema de serviço militar obrigatório (mais exactamente manutenção do sistema misto serviço efectivo normal e serviço voluntário ou em regime de contrato conforme se encontra em vigor entre nós desde 1993) ou pela consagração de um sistema exclusivamente de voluntariado para constituição do contingente geral. O dever de serviço militar, enquanto obrigação reservada aos cidadãos portugueses, impendia sobre os homens, uma vez que a prestação de serviço militar pelas mulheres apenas foi admitida após 1993 e exclusivamente em regime de voluntariado ou de contrato, não na modalidade de serviço efectivo normal. Sem embargo, a nossa Lei Fundamental consagra o direito à objecção de consciência ao serviço militar (nº 4) e regula as diversas condições em que pode ter lugar a prestação de um serviço cívico alternativo (nºs 3, 4 e 5). A revisão constitucional de 1997 consagrou ainda a extinção dos tribunais militares em tempo de paz.
Informação Complementar Integração no sistema político posterior a 1982 O modelo de plena integração das Forças Armadas no sistema político democrático posterior a 1982 evoluiu segundo três linhas fundamentais de consolidação: • Por um lado, "desdramatizou-se" o risco de instrumentalização partidária que algumas correntes de opinião identificavam em 1982 no denominado processo de "governamentalização" das Forças Armadas, afirmando-se uma prática política que, no essencial, correspondeu à efectiva salvaguarda da isenção e do apartidarismo da instituição militar; • Por outro lado, subsistindo uma esfera ainda relevante de autonomia organizacional das Forças Armadas no seu conjunto e dos três ramos que as integram, o peso específico da instituição militar foi diminuindo no conjunto das instituições do Estado, quer por força da alteração do cenário geoestratégico (e do quadro de ameaças e de riscos a ele ligado) quer em virtude do processo de reforma e de reestruturação adoptados tanto no ciclo pós-revolucionário (iniciado em 1982) como subsequentemente no contexto da reforma de redução e redimensionamento do dispositivo militar (iniciada em 1992/93 e que ainda prossegue); • Finalmente, a superação do debate entre uma concepção estrita de defesa nacional, exclusivamente centrada na componente militar da garantia da integridade do território e da independência nacional e concepções mais alargadas, que tendencialmente colhiam inspirações típicas das denominadas "teorias da segurança nacional", mais viradas para o empenho das Forças Armadas na própria garantia da ordem interna, acabou por abrir as portas a um consenso nacional alargado assente na autonomia específica da política de defesa nacional, de natureza permanente e carácter interministerial, cuja componente militar não se confunde com funções policiais e por isso não se destina à garantia da ordem interna (a não ser nas situações de excepção expressamente identificadas na nossa Lei Fundamental — estado de guerra e estados de sítio e de emergência) mas antes às missões de defesa autónoma e de participação em sistemas de alianças de defesa colectiva, valorizando-se paralelamente quer o seu emprego em missões de gestão de crises, missões de paz e missões humanitárias quer em outras missões de interesse público (designadamente as atinentes à fiscalização das pescas e da poluição ambiental, à busca e salvamento e evacuação médica e às referentes à promoção da melhoria do bem-estar e da qualidade de vida das populações).
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