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Portugal e Inglaterra: de D. Fernando ao mapa cor-de-rosa (II)

José Calvet de Magalhães *

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O expansionismo britânico em África levou o governo de Londres a procurar apoderar-se de alguns territórios portugueses, como foi o caso da ilha de Bolama e territórios anexos no continente, e da parte sul da baía de Lourenço Marques. Em ambos os casos o governo português conseguiu persuadir o governo britânico a submeter a disputa a arbitragem internacional, tendo Portugal obtido ganho de causa pela sentença proferida pelo presidente dos Estados Unidos Ulysses S. Grant, em 21 de Abril de 1870, sobre o caso de Bolama, e pela sentença proferida pelo presidente da República Francesa marechal Mac Mahon, em 24 de Julho de 1875, sobre o caso da baía de Lourenço Marques.

Estas arbitragens resolveram alguns problemas importantes relativos à soberania portuguesa em África, mas a definição dos limites dos domínios portugueses nesse continente, na época em que as potências europeias mostravam um interesse particular pela sua expansão em África, era um problema de enorme magnitude que viria assumir excepcional gravidade para Portugal no último quartel do século XIX.

Para João de Andrade Corvo, um dos mais notáveis estadistas portugueses desse século, seria indispensável definir, de uma vez por todas, os limites dos domínios portugueses na Ásia e na África, e isso só poderia ser obtido através de negociações com a Grã-Bretanha. Ministro dos Negócios Estrangeiros de 1871 a 1879 (com curtas interrupções) e da Marinha e Ultramar de 1872 a 1877, procurou Andrade Corvo pôr em execução o seu plano político. Em 26 de Dezembro conseguiu fazer aprovar um tratado com a Grã-Bretanha sobre os limites dos domínios portugueses e britânicos na Índia. Iniciou em seguida negociações sobre os limites de Moçambique e da bacia do Zaire. O tratado sobre Moçambique, chamado "tratado de Lourenço Marques", foi assinado em 30 de Maio de 1878, mas não chegou a ser aprovado pelo Parlamento português em virtude de uma violenta campanha dirigida por alguns políticos e por importantes forças económicas que receavam a política liberal de Andrade Corvo que entendia abrir a África portuguesa ao investimento estrangeiro. A rejeição do "tratado de Lourenço Marques" pôs termo à brilhante carreira política de Andrade Corvo.

As negociações por ele iniciadas para um tratado sobre a bacia do Zaire foram retomadas em 1882 e levaram à assinatura do tratado luso-britânico de 26 de Fevereiro de 1884. Esta tardia assinatura permitiu que se formassem oposições internacionais contra a sua ratificação, sobretudo por parte da França e da Alemanha, levando, por fim, à realização da Conferência de Berlim, convocada em 12 de Outubro de 1884, sob a égide de Bismark que dominava então a cena política europeia. A Conferência, além de atribuir à administração da Associação Internacional do Congo, criada pelo rei Leopoldo II da Bélgica, uma vastíssima área na bacia do rio Zaire ou Congo, em parte à custa de territórios historicamente dependentes de Portugal, estabeleceu entre as suas disposições o princípio da "ocupação efectiva" nas costas do continente africano, ou seja, a necessidade de manter nos territórios reclamados autoridades suficientes para fazer respeitar os direitos adquiridos.

O abandono britânico do tratado do Zaire, o papel passivo da delegação britânica na Conferência de Berlim e a sua falta de apoio às posições portuguesas criaram considerável ressentimento contra a Inglaterra junto de muitos políticos portugueses que principiaram a nutrir a ideia de que Portugal deveria procurar apoio junto das outras potências, nomeadamente a França e especialmente a Alemanha. O ministro dos Negócios Estrangeiros Barbosa du Bocage, muito ligado à Sociedade de Geografia, pretendia efectivar o velho sonho de ligar Angola a Moçambique, tendo perfeita consciência de que esse plano interferia com os interesses britânicos na África central. Os projectos dos ingleses do Cabo, tendo à sua testa o poderoso magnate Cecil Rhodes, incluíam a extensão da influência britânica através da Bechuanalândia, os territórios dos Matabeles e dos Machonas, e do Barotze, até à região dos grandes lagos, o que permitiria dar continuidade às possessões britânicas do Cabo até ao Cairo.

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Na execução do seu plano, oposto ao plano realista de Andrade Corvo, Barbosa du Bocage iniciou negociações com a França e com a Alemanha, em 1886, que vieram a ser terminadas pelo seu sucessor Henrique de Barros Gomes. Contra o reconhecimento do domínio francês sobre a bacia do rio Casamansa, o acordo com a França, de 13 de Março de 1886, reconhecia a Portugal uma esfera de influência sobre uma longa faixa de território ligando Angola a Moçambique. Pela declaração assinada com a Alemanha em 30 de Dezembro desse ano fazia-se idêntico reconhecimento, anexando-se um mapa em que aquela faixa de território era colorida de cor-de-rosa: era o famoso mapa cor-de-rosa. Ignorando os protestos britânicos, e confiando sobretudo na protecção alemã, as autoridades portuguesas enviaram diversas expedições para aquela área. Quando em 8 de Novembro de 1889, a expedição comandada pelo major Serpa Pinto foi atacada pelos Macololos, sobre cuja tribo as autoridades britânicas haviam declarado exercer um protectorado, tendo sido rechaçados com importantes perdas, a imprensa britânica iniciou uma violenta campanha contra Portugal, que atingiu o seu auge quando se soube em Londres que a expedição de Serpa Pinto ocupara a região do Chire. A 11 de Janeiro de 1890 o ministro britânico em Lisboa transmitiu ao governo português um ultimato exigindo a retirada imediata das forças portuguesas da região do Chire e dos territórios dos Macololos e Machonas.

 

Informação Complementar

As arbitragens sobre as disputas territoriais luso-britânicas em África

Algumas disputas entre Portugal e a Grã-Bretanha acerca do domínio de certas regiões africanas foram submetidas à arbitragem internacional. Entre elas contam-se a questão da ilha de Bolama e a questão da baía de Lourenço Marques.

Durante longo tempo a Grã-Bretanha disputou a Portugal a soberania da ilha de Bolama e de certos territórios adjacentes no continente africano. Forças militares portugueses ocuparam a ilha em 1830, o que não impediu que o governo britânico ordenasse, em 1860, a incorporação da ilha na colónia britânica da Serra Leoa. Depois de prolongadas negociações, ambas as partes concordaram, em 1869, em submeter a questão a uma arbitragem internacional. O governo britânico propôs como árbitro o presidente dos Estados Unidos, o que foi aceite pela parte portuguesa. O presidente na altura era Andrew Jackson que foi, entretanto, sucedido por Ulysses S. Grant, o qual, em 21 de Abril de 1870, proferiu uma sentença a favor de Portugal.

A partir de 1832 a marinha britânica procurou estabelecer acordos com Os chefes indígenas das regiões de Temba e Maputo, na parte sul da baía de Lourenço Marques, chamada pelos ingleses Delagoa Bay. O governo português protestou diversas vezes em Londres contra as tentativas da marinha britânica que, aliás, nunca conseguiram conquistar a colaboração dos chefes indígenas da região. Em 1860 o vice-almirante britânico Keppel, a bordo da fragata Brisk, entrou na baía de Lourenço Marques e notificou as autoridades portuguesas que a Grã-Bretanha exercia a soberania ao sul da baía que tencionava ocupar (o que excluía a povoação de Lourenço Marques, cuja posse portuguesa nunca foi contestada). As autoridades portuguesas protestaram novamente em Londres contra as pretensões britânicas e num acordo assinado com a República do Transval em 1869, esta reconheceu a soberania portuguesa na região cobiçada pelos britânicos, o que originou, por seu turno, os protestos do governo de Londres. Após porfiadas negociações foi aceite por ambas as partes o recurso à arbitragem, tendo sido escolhido como árbitro o presidente da República Francesa, na altura Louis Adolphe Thiers. A sentença, foi, porém, pronunciada pelo seu sucessor, o marechal Mac Mahon, em 24 de Julho de 1875, a favor de Portugal.

 

O Ultimato britânico de 11 de Janeiro de 1890

O Ultimato foi comunicado oralmente pelo ministro britânico em Lisboa Georges Petre, ao Ministro dos Negócios Estrangeiros Henrique de Barros Gomes e ao Ministro da Marinha e do Ultramar Frederico Ressano Garcia. Barros Gomes pediu ao ministro britânico que redigisse a comunicação para a poder transmitir correctamente aos seus colegas de governo. Petre redigiu então o seguinte memorando: "O Governo de Sua Majestade não pode aceitar como satisfatórias ou suficientes as garantias dadas pelo governo português tais como ele as interpreta. O cônsul interino de Sua Majestade em Moçambique telegrafou, citando o próprio major Serpa Pinto, que a expedição ainda estava ocupando o Chire, e que Katunga e outros lugares mais no território dos Macololos iam ser fortificados e receberiam guarnições. O que o governo de Sua Majestade deseja e insiste é o seguinte:

Que se envie ao governador de Moçambique instruções telegráficas imediatas para que todas e quaisquer forças militares portuguesas actualmente no Chire e nos países de Macololos e Machonas se retirem. O governo de Sua Majestade entende que sem isto as garantias dadas pelo governo português são ilusórias. Mr. Petre ver-se-á obrigado, à vista das suas instruções, a deixar imediatamente Lisboa com todos os seus membros de legação, se uma resposta satisfatória à precedente intimação não for por ele recebida esta tarde; e o navio de Sua Majestade, Enchantress, está em Vigo esperando as suas ordens.

Legação Britânica, 11 de Janeiro de 1890”

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* José Calvet de Magalhães

Embaixador. Professor Associado na UAL. Membro da Academia Portuguesa de História.

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