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As recentes negociações no quadro da OMC

Pedro Pinto *

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Do fracasso da Ronda do Milénio em Seattle ficaram duas certezas para o evoluir do comércio mundial: as divergências são enormes entre os diversos intervenientes e a OMC ganhou uma mediatização inaudita.

Entre apelos ao fair trade em vez de free trade, por entre prisões e manifestações de rua — um misto de Woodstock e Maio de 68 como referiram alguns — as negociações para o livre comércio despertaram a opinião pública para um tipo de discussões tradicionalmente confinadas às salas de negociação. Em causa está a concretização de regras mais transparentes no comércio entre os países, uma maior eficácia nos sistemas de resolução de diferendos, a abrangência da OMC a novos domínios por forma a regular uma globalização crescentemente anárquica e, sobretudo, o acesso a novos mercados para exportações, verdadeiro motor do crescimento económico mundial das últimas décadas.

Em meio século de existência, desde o Acordo do GATT — General Agreement on Tariffs and Trade, o antecessor da OMC —, a liberalização multilateral tem tido um impacte dramático. O desmantelamento das barreiras às importações proporcionou uma crescente integração das economias. Desde a Segunda Guerra Mundial, as exportações aumentaram vinte vezes e passaram a representar quase 27% do PNB mundial em 1998, contra 8% em 1950. Dados que não evitaram, no entanto, um rotundo fracasso em Seattle. Sem declaração final nem consenso entre os países presentes, as negociações foram depois retomadas em Genebra a um nível oficial inferior, sem que tenham sido atenuadas, ainda assim, as divergências inicialmente encontradas. Para já, não existe qualquer data para a concretização de uma nova cimeira ministerial, embora o primeiro trimestre de 2001 surja como hipótese.

 

Divergências insanáveis?

A nova ronda negocial da OMC encontra-se por agora submersa em contradições num triângulo de interesses díspares que tem na União Europeia, nos EUA e nos Países em vias de Desenvolvimento (PVD) os seus principais vértices.

Do lado europeu subsiste a visão de uma agenda ampla e global, capaz de abranger os chamados novos temas do comércio internacional e destinada a regular e controlar o processo de globalização. A saber: comércio e investimentos, comércio e concorrência, comércio e meio ambiente.

Uma estratégia que desagrada aos EUA e aos PVD, que apostam numa via negocial significativamente mais estreita, onde cabem apenas as questões ligadas à liberalização agrícola, aos serviços e à redução das tarifas industriais, temas susceptíveis de garantirem benefícios visíveis no curto prazo. E se o capítulo agrícola paralisou o Uruguai Round, ameaça voltar a ser decisivo neste novo ciclo de negociações. Os Estados Unidos e o Grupo de Cairns, que engloba os maiores exportadores mundiais do sector, pretendem uma rápida liberalização da agricultura. Querem ver consagrada uma descida das tarifas, cortes nos apoios estatais à produção e, sobretudo, o fim dos subsídios à exportação.

A reclamação é extensível à maioria dos PVD, mas conta com firme oposição da União Europeia, Japão, Coreia do Sul, Suíça e Noruega, cujas tradicionais políticas agrícolas os tornam avessos a grandes mudanças.

Uma clivagem que ameaça perdurar, até porque a União Europeia não tem qualquer possibilidade de fazer concessões aos seus parceiros comerciais enquanto o alargamento e o concomitante processo de revisão da Política Agrícola Comum não estiverem concluídos. Para já, Bruxelas defende-se com o conceito da Multifuncionalidade da agricultura, isto é, com a necessidade de se levar em conta nas negociações aspectos não comerciais como o meio ambiente e o papel vital dos agricultores no combate à desertificação, êxodo rural e segurança alimentar. Um argumento proteccionista, garantem os restantes países da OMC, que olham para a questão como um pretexto europeu para limitar o acesso aos mercados e que impossibilita, por agora, a concretização de avanços. A batalha agrícola esconde ainda uma outra frente: os alimentos geneticamente manipulados. A União Europeia reivindica a inclusão na OMC de regras que permitam restringir as importações desses produtos até que não subsistam dúvidas de absoluta segurança para a saúde dos consumidores.

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Ao invés, os EUA pretendem que o ónus da prova seja feito por quem se prepara para impedir tais exportações. A divergência atlântica promete agudizar-se, temperada pêlos recentes episódios da "guerra das bananas" e da carne com hormonas. Outro dos obstáculos ao sucesso de uma nova ronda para a liberalização do comércio mundial jaz na pouca disponibilidade dos PVD para avanços significativos na matéria, pelo menos sem sérias contrapartidas. Desiludidos com os efeitos do Uruguai Round no sector têxtil e agrícola, encontram-se determinados em rever as suas obrigações em matéria de propriedade intelectual, protecção de investimentos, subsídios e regras anti-dumping.

Um impasse agravado pela vontade dos EUA e da União Europeia em fixarem padrões laborais mínimos entre os países membros — um dos raros pontos que coloca os dois gigantes de acordo — por forma a assegurar que um incremento das trocas comerciais não seja sinónimo de desemprego e redução de salários entre os países mais ricos.

A tentativa de introdução em Seattle de regras para a exclusão do trabalho infantil e a hipótese de um padrão máximo de horas de trabalho enfureceu os representantes dos países menos desenvolvidos, dispostos a bloquear as negociações se a ideia persistir. O raciocínio é simples: a OMC existe apenas para desmantelar barreiras e não para impor objectivos sociais ou ambientais. O sector dos serviços é outro dos pontos incontornáveis da agenda em curso e dos poucos em que todos os países poderão ficar a ganhar. O objectivo consiste em conferir dimensão e massa crítica ao que ficou acordado em Marraquexe no que diz respeito à liberalização das telecomunicações, dos transportes e dos serviços financeiros. Contudo, o "princípio do paralelismo" — só se avança se avançar a agricultura — poderá deitar tudo a perder. De Seattle saiu igualmente a noção de uma certa ingovernabilidade da OMC e a urgência de profundas reformas susceptíveis de melhorar a eficiência, transparência e até democraticidade da organização. Uma preocupação reforçada pela certeza de que um novo fracasso nas negociações multilaterais irá incentivar os países membros para um renovado interesse na concretização de acordos regionais ou bilaterais.

Certo é que o equilíbrio interno da OMC passará sempre por dois factores estruturantes: um acordo transatlântico entre EUA e UE, que juntos respondem por 2/5 do comércio mundial, e um entendimento Norte-Sul entre ricos e pobres. As divergências são muitas e poucos acreditam que o novo ciclo termine em menos de três anos, não espantando a hipótese de que possa demorar mais do dobro, rivalizando com a maratona negociai do Uruguai Round.

 

Informação complementar

China: um gigante na OMC

Com entrada prevista para Janeiro de 2001, isto se até lá não surgirem novos entraves em matéria de multilateralização uma vez já ultrapassadas as negociações bilaterais com os EUA e a União Europeia, a inclusão da China na OMC — um objectivo perseguido desde há 14 anos e agora concretizado para regozijo das multinacionais — emerge como o principal marco positivo dos últimos anos, depois de falhada em Seattle a possibilidade de significativos avanços no campo da redução de tarifas. A partir de agora, a China passará a respeitar um conjunto de regras e terá de obedecer a uma disciplina que a impedem de concorrer em condições desleais no mercado mundial, quer em matéria de investimentos, quer nas trocas de mercadorias, enveredando por uma liberalização comercial com regras bem definidas.

Mais importante ainda, a adesão à OMC vincula a China de forma inexorável à necessidade de profundas reformas internas no seu sector económico, que podem até passar por novos ventos de democratização do seu sistema político. O calendário para o desmantelamento das múltiplas protecções ao comércio é brutalmente apertado, uma "dor de cabeça" para a pesada economia estatal chinesa, apenas minorada pêlos esperados efeitos em matéria de novos postos de trabalho, decorrentes de uma economia revigorada e de novos fluxos de capital estrangeiro. Do sector bancário à agricultura, passando pelas telecomunicações e pela indústria automóvel — dentro da OMC as tarifas às importações de veículos vão reduzir-se para 25% quando agora variam entre 80 e 100% — poucos vão ser os sectores que resistirão a profundas transformações, acelerando a necessidade de radicais transformações no seu tecido empresarial.

Os efeitos previstos não serão, contudo, diminutos: uma duplicação de exportações em 2005 — e isto numa economia que ao longo das últimas duas décadas tem aumentado as suas exportações a uma média de 20% ao ano, com as importações a crescerem 13% — um ponto percentual extra no crescimento económico ao longo da próxima década, a duplicação do investimento estrangeiro nos próximos cinco anos e a consequente descida da taxa de desemprego.

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* Pedro Pinto

Mestre em Desenvolvimento e Cooperação Internacional pelo ISEG. Docente na UAL.Jornalista na TVI.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Crescimento do comércio mundial de mercadorias por região, 1990-98

Link em nova janela Crescimento das exportações mundiais e da produção

Link em nova janela Crescimento das exportacões mundiais de mercadorias e produção por principais grupos de productos, 1990-98

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