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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! Um dispositivo pode ser sustentável numa pequena escala ou para um grupo social específico e, no entanto, esse mesmo dispositivo pode revelar-se insustentável quando muda a sua escala. Uma companhia de seguros pode vender seguros para terramotos mesmo numa zona sísmica — o prémio que o segurado terá de pagar será mais alto do que numa região não sísmica, mas ainda poderá comprar esse seguro, existe esse produto no mercado. Porém, se o número de segurados aumentar muito, esse produto tem de ser retirado do mercado. A companhia de seguros não retira esse produto porque recebeu informação privilegiada quanto à ocorrência de um sismo, mas o aumento do número de segurados provocou o aumento do risco para além do que as reservas financeiras da companhia podem garantir na eventualidade do sismo ocorrer. Continua a não se saber se vai ou não haver terramoto, mas o que era possível para um número pequeno de clientes (mesmo que houvesse sismo, a companhia podia pagar) deixa de o ser para um grande número (se houver sismo, a companhia não poderá pagar, o que é o mesmo que não haver seguro). Este exemplo simples mostra em que medida a escala é relevante para a determinação das condições de sustentabilidade de dispositivos de seguro ou de protecção. É conhecida a história de Bismarck quando, durante o primeiro processo de unificação da Alemanha nos anos 70 do século XIX, decidiu beneficiar os funcionários públicos centralizados (que perdiam os privilégios que tinham nos Estados regionais) com o primeiro sistema de reformas que existiu na Europa, como direito generalizado a um grupo profissional e já não como atributo arbitrário concedido pelo rei ou pelo imperador. A sua pergunta foi: em que idade deve ser concedida a reforma de modo a que o Orçamento do Estado não tenha de pagar nada? A resposta a que se chegou foi 65 anos, porque a esperança de vida à nascença na Alemanha, nessa época, era de 48 anos. Isto é, se todos os funcionários contribuíssem para um fundo de reformas, os que morriam antes dos 65 anos perdiam o direito a qualquer reforma, enquanto os que vivessem para além dos 65 anos seriam sempre num número tão pequeno que as suas despesas não iriam ultrapassar as receitas totais. Nestas condições, o dispositivo é sustentável e obedece à regra geral dos seguros de acidentes: os que não têm sinistros financiam as despesas dos acidentados (e as despesas de administração do sistema). Nas realidades sociais, porém, nem as condições de partida permanecem eternamente idênticas nem o que parece ser um dispositivo útil deixará de ser desejado por todos. Isto é, vão mudar as condições de sustentabilidade, tanto no que respeita às condições de viabilidade, como no que respeita à escala do dispositivo. Como todos desejam ter o seu direito à reforma (e ao subsídio de desemprego, à protecção na doença, ao apoio na educação, ao subsídio de natalidade, às férias pagas, etc.), é inevitável que a escala aumente até cobrir toda a população (universalidade). Mas como a ideia de que, finalmente, as sociedades encontraram um dispositivo de segurança contra o risco se difunde rapidamente, o desejo a uma protecção vai confundir-se com um direito — e, então, perde-se a noção social da sustentabilidade e entra-se no campo das ilusões. Neste caso, o que se julga ser um direito à segurança e à protecção social (nos vários domínios em que seja preciso suportar uma despesa individual que não corresponda a uma receita própria) fica assente num vazio de financiamento que um dia se tornará evidente — após o que todos terão de reconhecer que, afinal, o risco não foi anulado e que a ideia de segurança não é sustentável a não ser em períodos curtos ou para pequenos grupos sociais. As fontes de financiamento deste dispositivo são o trabalho e as empresas ou serviços administrativos, isto é, as contribuições dos trabalhadores e das entidades patronais, e o valor dessas contribuições depende do que for o crescimento económico, a produtividade e o número de elementos que contribuem para o sistema. Tudo irá bem enquanto houver crescimento continuado, aumento de produtividade e, sobretudo, aumento da população activa, pois tudo isto significa aumento de receitas das contribuições dos trabalhadores e das empresas. Tudo irá mal se não houver crescimento, se a competitividade obrigar a baixar os custos (e as contribuições são custos do ponto de vista da actividade produtiva), se aumentar a esperança de vida à nascença (o que significa que o reformado vai estar mais tempo a receber a sua reforma) e se a idade de reforma diminuir, se o volume de emprego diminuir e se os salários baixarem ou se a economia clandestina se generalizar. A questão decisiva, porém, estará na evolução demográfica que, no caso europeu, também está relacionada com o nível de desenvolvimento: se as gerações futuras são mais pequenas do que as gerações anteriores, grupos mais pequenos da população activa terão de financiar a segurança de grupos crescentes de reformados. As sociedades europeias já não reproduzem a sua população, pelo que cada geração seguinte já é, e continuará a ser, com este quadro de dispositivo de segurança, menor do que a anterior. Este dispositivo foi uma boa ideia, mas só enquanto as suas condições de viabilidade estavam satisfeitas; violadas estas condições, o dispositivo transforma-se numa armadilha perigosa. Dentro de cada sistema contributivo, para esse grupo profissional restrito, é possível encontrar um equilíbrio entre receitas e despesas, elevando o nível das contribuições ou diminuindo a taxa de substituição (o que o reformado recebe em relação à sua remuneração enquanto activo), mas sempre tendo em conta as condições de custos nos mercados mundiais competitivos. Mas quando o dispositivo se generaliza a toda a sociedade, através de sistemas de solidariedade, o financiamento (como para as restantes despesas sociais) tem de vir do sistema tributário — o que tem limites quando a carga tributária se aproxima dos 50% do rendimento. O universalismo e o garantismo do dispositivo de segurança social prometeram o que não é natural, prometeram que era possível anular o risco nas sociedades modernas, recriando o Paraíso. A natureza — isto é, as dinâmicas sociais e, em primeira linha, na Europa — encarregou-se de nos devolver ao campo da realidade, onde o risco é parte integrante da natureza humana. Como sempre, a solução está na realidade e não na ilusão: compreendido o funcionamento do dispositivo, será elementar concluir que ele é factor de uma inaceitável injustiça entre gerações, onde a protecção dos direitos dos idosos impõe o sacrifício dos jovens.
Informação complementar Três dispositivos diferentes Há três dispositivos de segurança social muito diferentes — o da Europa continental (mas que também se encontrava na área sob influência da União Soviética), o japonês e o americano (que também se encontra no Reino Unido e na Irlanda) — no que se refere ao seu modo de financiamento e ao tipo de garantias que oferecem, ainda que todos tenham em comum esquemas de solidariedade para os rendimentos mais baixos e que são financiados por via orçamental. O modelo da Europa continental é financiado por um dispositivo de transferências entre gerações, embora tivesse começado por ser concebido como um sistema de seguro normal, por capitalização dos saldos (diferença entre contribuições e pensões) acumulados. A universalização do sistema implicou a transformação do dispositivo para o sistema que se designa por pay-as-you-go, onde cada geração activa financia os reformados — o que torna o sistema vulnerável a alterações demográficas. O modelo japonês está baseado em pensões de reforma de cada empresa, o que significa que o valor da reforma a receber depende do sucesso dessas empresas e do valor que tiverem as suas acções ou os seus fundos acumulados, com diferenciações pronunciadas entre valores das pensões. O sistema americano está baseado em fundos de pensões (compostos por títulos de diversas empresas) cotados na Bolsa, o que torna o valor efectivo das pensões variável em função do risco do mercado, do crescimento continuado da economia e da valorização dessas aplicações.* Joaquim Aguiar Licenciado em Economia pelo ISEG. Investigador Associado do Instituto de CiênciasSociais. Dados adicionais Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas (clique nos links disponíveis) Evolução das gerações na Europa Taxa de dependência (15-64)/(65 e mais) nas sociadades desenvolvidas Idade de reforma equivalente aos 65 anos em 1935
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