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Onde estou: | Janus 2001 > Índice de artigos > Portugal e o mundo > Tópicos comparativos da sociadade portuguesa > [O medicamento: contributo para a saúde pública e impacte social] | |||
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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! Ao longo das últimas décadas os medicamentos têm contribuído decisivamente para o tratamento das doenças e o seu impacte tem sido muito significativo na melhoria da saúde das populações, nomeadamente pela redução da mortalidade e da morbilidade e pelo aumento da esperança e da qualidade de vida, sendo de referir os antibióticos e os medicamentos utilizados no tratamento do cancro como dois grupos terapêuticos de grande impacte sanitário e social. Dados publicados pela Associação da Indústria Farmacêutica Americana (PhRMA) em 1998, indicam a percentagem de redução das taxas de morte em várias doenças tratadas com medicamentos no período entre 1965 e 1996. Destes dados referem-se, como exemplos, a taxa de 83% para os antibióticos em doenças como a febre reumática, 74% para os medicamentos indicados na aterosclerose e doenças cardíacas, e 72% para os medicamentos destinados ao tratamento das úlceras gástricas e duodenais. Também dados publicados pelo Departamento de Saúde dos Estados Unidos, em 1992, indicam que, entre 1980 e 1990, os medicamentos contribuíram para a redução do número de anos produtivos perdidos devido às doenças cardiovasculares em cerca de 1/3. Deste modo, o interesse e impacte social do medicamento é enorme, tornando-se fundamental promover o seu desenvolvimento e investigação, para se obterem medicamentos cada vez mais eficazes e com poucos efeitos secundários, assim como a sua utilização racional, como forma de proteger o interesse público. Neste sentido as políticas do medicamento são complexas, variando de país para país. Actualmente, na União Europeia o medicamento está sujeito a um conjunto de regras comuns que abrangem a sua investigação e desenvolvimento, autorização, fabrico, distribuição, prescrição, dispensa e vigilância pós autorização, através de inúmeras disposições de carácter legal, e ainda de normas várias, de carácter regulamentar ou técnico-científico. Esta preocupação, nascida no passado, em consequência de acidentes toxicológicos surgidos com produtos vendidos como "medicamentos", que livremente circulavam no mercado, reclamando efeitos por vezes não comprovados, constitui uma preocupação de todos os países e foi alvo de uma evolução internacional, que hoje aponta para sistemas que tendem para uma harmonização mundial cada vez mais abrangente.
Evolução histórica Na sua função reguladora e responsável por assegurar o interesse público, o Estado tem dedicado atenção crescente à regulamentação do medicamento. O objectivo primeiro e essencial é a protecção da Saúde Pública, através da garantia da qualidade, segurança e eficácia dos medicamentos. Progressivamente, o Estado tem alargado a sua atenção para áreas mais relacionadas com as implicações sócio-económicas do medicamento, nomeadamente os regimes de preços e de comparticipação pêlos sistemas de saúde e de segurança social, aspectos que, em especial nesta última década, foram objecto de atenção marcada da maioria dos países desenvolvidos. Pode, assim, dizer-se que o desenvolvimento da regulamentação do medicamento tem sido notável, sobretudo nos últimos 40 anos do século XX. No início do século que agora termina, a regulamentação do medicamento — ou dos produtos hoje assim classificados — era praticamente inexistente e diversos factores contribuíram para o seu desenvolvimento, nomeadamente os acidentes ocorridos com substâncias medicamentosas, bem como o desenvolvimento científico, as preocupações do público, o comportamento da indústria, e os custos com a saúde. No entanto, o maior catalisador desta regulamentação, foram, sem dúvida, os acidentes toxicológicos ocorridos com os medicamentos e o seu impacte em termos de Saúde Pública. A título de exemplo, citaremos as mortes provocadas pelo excipiente de um xarope de sulfamidas que levou à criação da estrutura que antecedeu a Food and Drug Administration dos Estados Unidos da América, em 1906, e, no início da década de 60, o chamado desastre da talidomida, com o aparecimento de um grande número de casos de focomélia, um síndroma raro até esse momento, efeito de origem teratogénica, cuja identificação levara quatro anos, desde 1957 a 1961. As malformações congénitas assim originadas estiveram na origem da elaboração ou reformulação da legislação do medicamento na maioria dos países que actualmente constituem a União Europeia, e da criação de estruturas reguladoras para o efeito. É em 1965 que a então Comunidade Económica Europeia aprova a Directiva 65/65/CEE, a qual estabelece as regras a que deve obedecer a autorização de introdução no mercado de medicamentos.
O consumo de medicamentos No que se refere aos gastos e aos custos com os medicamentos, a sua importância é cada vez maior. O quadro mostra-nos a despesa total com medicamentos em percentagem do produto interno bruto (PIB). Apesar de se tratar de um valor baixo, variando entre 0,7 e 2,2.%, com um valor médio situado em 1,2%, é um valor significativo, nomeadamente para os países em que mais de metade da despesa com medicamentos é suportada pelo Estado, através dos impostos. Os países do Norte da Europa surgem com valores mais baixos, sendo estes níveis mais elevados em países como a França, a Bélgica, a Alemanha e os Estados Unidos. Portugal, apesar de ser um país cujo PIB se situa a meio da tabela, surge como um caso onde esta despesa é de grande significado, nomeadamente devido ao seu crescimento nos últimos anos. Procurando reduzir os custos com os medicamentos, tem-se verificado um crescente desenvolvimento dos medicamentos genéricos, conforme se verifica pela análise do quadro. Este desenvolvimento decorre de várias medidas tomadas pêlos países, nomeadamente a criação de estímulos à prescrição e utilização de genéricos. Apesar de os dados relativos aos medicamentos genéricos deverem ser analisados com cuidado, devido à falta de harmonização na definição do conceito de genérico, observam-se, por exemplo na União Europeia, realidades bastante distintas no Norte e no Sul, verificando-se uma expressão muito reduzida em países como a França, Espanha, Portugal, Itália, apesar da crescente tomada de medidas ao seu desenvolvimento.
A investigação do medicamento A nível da União Europeia foram introduzidos em 1995 novos procedimentos de autorização de introdução no mercado de medicamentos, instituindo-se assim um quadro novo. Nesse âmbito foi criado o procedimento centralizado vocacionado para os medicamentos de biotecnologia e inovadores, cuja avaliação é efectuada através dos comités científicos da Agência Europeia de Avaliação de Medicamentos, sendo posteriormente objecto de uma autorização única pela Comissão Europeia, válida directamente em todos os Estados-membros da União Europeia, aos quais caberá assegurar a forma de acesso pêlos Sistemas Nacionais de Saúde. Através deste procedimento foram avaliados — desde 1995 — 155 medicamentos, correspondentes a 120 novas substâncias activas. Apesar dos sistemas reguladores terem procurado e conseguido reduzir os tempos necessários à aprovação de um medicamento — actualmente inferior aos 210 dias previstos na legislação comunitária — o período requerido para o seu desenvolvimento e os respectivos custos têm aumentado. O tempo que um medicamento leva a chegar ao mercado passou de 6,7 anos em 1970 para 9,1 anos em meados da década de 1990. Os custos reais triplicaram entre 1962 e 1969 e duplicaram nos anos 70. O custo de desenvolvimento de uma única entidade terapêutica ultrapassa os 140 milhões de dólares. Em termos de países, o contributo para a inovação provém em 50% dos Estados Unidos e em 25% do conjunto da Alemanha, França e Reino Unido. Prestes a iniciar-se um novo século, também na área do medicamento se inicia um novo ciclo, centrado em dois tipos de questões principais: os critérios de avaliação técnico-científicos dos medicamentos, onde se identificam matérias como a introdução das novas terapêuticas génicas, a avaliação de eficácia comparativa, a avaliação do risco e a avaliação económica, e o papel e as funções das estruturas supranacionais e nacionais, isto é, o papel das instituições comunitárias e o papel dos Estados-membros. Estas questões, entre outras, foram recentemente objecto de discussão numa Conferência Europeia sobre "Medicamentos e Saúde Pública" promovida pelo Ministério da Saúde e o INFARMED no âmbito da Presidência Portuguesa da União Europeia.* Rui Santos Ivo Licenciado em Ciências Farmacêuticas pela Universidade de Lisboa. Pós-Graduado em Medicina Farmacêutica pela Universidade de Basileia e em Gestão de Unidades de Saúde pela Universidade Católica Portuguesa. Quadro do Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (INFARMED), Vogal do Conselho de Administração entre 1994 e 2000. Administrador Cientifico na Direcção da Agência Europeia de Avaliação de Medicamentos (EMEA) Londres. Bibliografia Jacobzone, Hyperlinkj, S., Pharmaceutical Policies in OECD Countries: Reconciling Social and Industrial Goals, Labour Market and Social Policy-Occasional Paper n° 40, OECD/OCDE, Paris, 2000 Policy Relating to Generic Medicines in the OECD, Report prepared by NERA, S J Berwin & CO and YRCR Ltd to the European Commission, NERA (National Economic Research Associates), London,1998 Dossier "O Estado da Saúde" in Economia Pura -Tendências e Mercados, nº 25, ano III, Junho 2000 Roses, A. D., "Pharmacogenetics and future drug development and delivery", in The Lancet, vol. 3555, 15/4/2000 Aranda da Silva, J. A., "Europa dos Medicamentos: Objectivos Sociais e Interesses Industriais", in Le Monde Diplomatique (ed. Portuguesa), ano l, n" 12, Março 2000 Brunet, P., Dictionary of the Main Reference Terms - Pharmaceutical Law in the European Union, Medicinal Products for Human Use, Éditions de Santé, Paris, 1999 International Pharma News, Droit &Pharmacie, Paris, 2000 ; 5° Relatório Anual da Agência Europeia de Avaliação de Medicamentos, 1999, http://www.eudra.org/; Relatório Anual do INFARMED, Lisboa, 1998 (http://www.infarmed.pt) Informação Estatística, INFARMED, Lisboa, 1998 (http://www.infarmed.pt) Resumo e Conclusões da Conferência "Medicamentos e Saúde Pública – o Tratado de Amesterdão e o Futuro do Sistema Europeu de Autorização e Supervisão de Medicamentos", Lisboa, 11-12 de Abril, 2000, Edição INFARMED, Lisboa, 2000. Despesa total com medicamentos, em percentagem do PIB Medicamentos genéricos no total de medicamentos prescritos, nos países da OCDE (em 1996 ou 1997) Evolução do consumo de medicamentos por categoria terapêutica
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