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As comunidades portuguesas no mundo

Jorge Carvalho Arroteia *

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A saída de portugueses do "reino" com destino às terras descobertas pêlos nossos navegantes, registada desde a época dos Descobrimentos, comprova a antiguidade e a longa evolução deste fenómeno iniciado no começo do século XV quando o senhor Infante, desejando "haver de tudo manifesta certidão, movendo-se a isso por serviço de Deus e del-rei" (Serrão; 1976), decidiu mandar explorar as terras da Guiné. A continuação desta empresa na costa de África e índias, Orientais e Ocidentais, levou à intensificação dessas saídas sobretudo para o Brasil, após a descoberta do ouro e a exploração mineira do século XVII, em algumas partes daquele território.

Embora dominadas durante séculos pela forte emigração para o Brasil, as saídas de portugueses para a Europa são conhecidas desde longa data. Em Espanha, essa presença é assinalada desde o domínio filipino e em França este movimento parece remontar aos finais do século passado, tendo-se incrementado depois da participação das nossas tropas nas campanhas da Flandres, durante o primeiro conflito armado.

Uma estimativa das saídas durante os séculos passados aponta para um acréscimo significativo deste movimento, perdurando até ao início da segunda década do século XX, época em que a emigração portuguesa, quase exclusivamente transoceânica, escolhia o Brasil como principal destino. As quebras registadas quer durante o primeiro conflito armado, quer no decurso da crise económica que antecedeu a segunda guerra mundial, levaram a uma redução drástica desse movimento, fenómeno que só se reconstituiu a partir da segunda metade do século XX com o incremento da emigração europeia.

Sendo, portanto, a corrente mais antiga da emigração transoceânica, a emigração para o Brasil foi substituída durante os anos sessenta pela emigração para a Europa, dando assim origem a um novo ciclo, o ciclo migratório europeu que até ao início dos anos setenta se desenrolou com grande intensidade de saídas legais e, sobretudo, de saídas clandestinas. Comprovam-no os mais de 1,4 milhões de saídas legais com destino aos diversos países industrializados da Europa, registados durante o terceiro quartel do século XX, montante que, adicionado às saídas clandestinas, ultrapassa os 2 milhões de emigrantes. Este movimento reduziu-se drasticamente durante as três últimas décadas não ultrapassando, em média, as duas dezenas de milhares de saídas/ano.

Importa realçar que, como principal responsável do fenómeno emigratório português, o movimento clandestino foi igualmente registado para outros destinos do continente sul-americano, em especial para o Brasil. Este país acolheu um número considerável de emigrantes portugueses (muitos dos quais se dirigiram a partir daqui para os E.U.A. e o Canadá), embarcados clandestinamente em Portugal e, sobretudo, nos portos da vizinha Espanha, particularmente em Vigo.

 

Significado actual

O incremento das migrações na Europa, sobretudo no período posterior à segunda   guerra mundial, foi uma das consequências do processo de desenvolvimento, de reconstrução e de mudança social registado no velho continente. E, no seu conjunto, realça os contrastes "norte-sul" e a dependência dos países da periferia, em particular dos países mediterrânicos, face ao poder económico dos países mais industrializados do ocidente europeu.

Relativamente à situação portuguesa, Serrão (1972) considera a emigração como "uma espécie de válvula de segurança da estrutura mais ou menos tradicional" da nossa sociedade, pelo que as causas directas destes movimentos se devem encontrar na situação económica do país e no estado de desenvolvimento das suas regiões. Também Oliveira Martins, referindo-se às causas deste movimento durante o século passado, justifica-o como resultado da "desordem sempre crescente da economia social portuguesa".

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Mais recentemente, Rocha-Trindade (1973) afirma serem as "motivações de natureza económica: impossibilidade de sobreviver; impossibilidade de realizar investimentos permitindo melhorar as condições de vida própria e da sua família" as causas principais deste movimento. Da nossa parte encaramos este fenómeno (Arroteia; 1983) como expressão dos contrastes geográficos existentes no nosso território, da forma de aproveitamento dos nossos recursos e dos "modelos de desenvolvimento postos em prática que não têm permitido atenuar os desequilíbrios existentes no território português". E a sua evolução tem dependido não só das condições locais — pull factors, mas igualmente das condições de atracção —push factors — exercidas pelos países de imigração, decorrentes das melhores oportunidades de emprego e remunerações aí praticadas. Esta a razão da extensão e volume deste fenómeno que persiste nos nossos dias.

Encarado como um "fenómeno histórico estrutural" da nossa sociedade (Serrão; 1972) a emigração fez-se sentir, ainda que com algumas especificidades e preferências em todas as regiões do território, em especial nas regiões do norte e do centro do país, bem como nos Açores e na Madeira. Originária principalmente do Minho mas igualmente relevante noutras áreas do território, a emigração brasileira foi substituída, a partir dos anos sessenta, pela emigração para a França e para a Alemanha em todos os distritos mais industrializados e densamente povoados do litoral português.

No que concerne às Regiões Autónomas, é de realçar as preferências emigratórias para a Venezuela e para a África do Sul registadas na Madeira e o "êxodo" açoriano em direcção aos E.U.A. e ao Canadá. Para além de realçarem a sua extensão no território (cf: Arroteia; 1984), estas preferências levaram à consolidação de importantes comunidades emigrantes constituídas, muitas delas, por indivíduos oriundos da mesma região.

Independentemente destas características importa realçar como muitas dessas antigas comunidades foram fortalecidas, durante a segunda metade do século XX, por contingentes de novos emigrantes, essencialmente adultos e do sexo masculino, pouco letrados e especializados. Outras comunidades constituíram-se desde então, devido à chegada dos novos emigrantes. Tal aconteceu quer na Europa quer em países da Ásia e do Médio Oriente, pouco conhecidos da emigração portuguesa. Mesmo assim, estima-se que mais de um quarto destes últimos emigrantes tinham idade inferior a 14 anos, facto que vem comprovar a importância da emigração jovem e jovem-adulta (em idade de procriação) e o significado da emigração familiar.

 

Extensão da "diáspora" portuguesa

Devida, essencialmente, à "míngua dos meios de subsistência", esta situação parece justificar a dimensão do "êxodo português" e a constituição de importantes núcleos de comunidades portuguesas em diversos continentes e países estrangeiros, muitos deles outrora dependentes da nossa administração colonial. Note-se que, de tradicional país de emigração, Portugal tem vindo a tornar-se "porto de abrigo" para um número considerável de cidadãos oriundos das mais diversas paragens que tencionam por esta via, atingir o velho continente.

Reconhecer a participação e o contributo desta população no desenvolvimento das sociedades de acolhimento, bem como realçar a importância dos "portugueses da diáspora" na construção de sociedades multiculturais e no estreitamento dos laços de amizade e de cooperação internacional é uma tarefa que nos cabe aprofundar tendo em conta as raízes históricas, a evolução passada e recente, a dispersão e a dimensão geográfica das comunidades portuguesas nos cinco continentes.

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* Jorge Carvalho Arroteia

Doutorado em Ciências Sociais. Professor Catedrático da Universidade de Aveiro.

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Bibliografia

Arroteia, Jorge Carvalho (1983) – A emigração portuguesa, suas origens e distribuição. Lisboa; I.C.L.P. (Biblioteca Breve, n° 79)

Arroteia, Jorge Carvalho (1984) – Atlas da emigração portuguesa. Porto; Secretaria de Estado da Emigração – Centro de Estudos

Rocha-Trindade, Maria Beatriz (1973) – Immigrés portugais. Lisboa; Instituto de Ciências Sociais e Política Ultramarina.

Serrão, Joel (1972) – Emigração portuguesa. Lisboa; Livros Horizonte.

Serrão, Joel (1976) – Testemunhos sobre a emigração portuguesa. Lisboa; Livros Horizonte.

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Dados adicionais
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