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Onde estou: | Janus 2001 > Índice de artigos > Actualidade das migrações > A imigração em Portugal > [Imigração ilegal em Portugal: padrões emergentes em inícios do séc. XXI] | |||
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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! O conceito de imigrante ilegal depende, pois, da forma como em cada momento histórico uma nação-Estado regula os quatro aspectos supracitados. De acordo com a legislação em vigor em Portugal é imigrante ilegal todo o cidadão estrangeiro que: tenha entrado indocumentado ou com documentos falsos e assim permaneça em território nacional; tenha permanecido no país após o termo de validade do respectivo visto de entrada ou título de residência ou após ter sido expulso do território nacional por autoridade competente. Na primeira metade dos anos 90, os Relatórios de Segurança Interna (R.S.I.) tipificaram sistematicamente os imigrantes ilegais como sendo cidadãos estrangeiros que entraram legalmente em território nacional, oriundos de um país africano de língua oficial portuguesa (PALOP), "munidos com vistos de turismo, negócios ou trânsito, não abandonando o país no termo de validade daqueles vistos" (R.S.I. de 1993) (1). O número de imigrantes em situação ilegal em Portugal é obviamente desconhecido, mas pensamos poder avaliá-lo na ordem dos 25 a 40 mil imigrantes na primeira metade dos anos 90, estimativa baseada nos seguintes dados: a) durante a Regularização Extraordinária de 1992, dos 39 mil processos entrados apenas 16 mil deram lugar à emissão de títulos de residência (R.S.I. de 1994); b) a Regularização Extraordinária de 1996 foi legitimada politicamente pela necessidade de legalizar os imigrantes que não tinham sido abrangidos pela anterior Regularização de 1992 ou que se tinham novamente tornado ilegais; c) durante a Regularização de 1996, foram recebidos 35 mil processos dos quais mais de 95% deram lugar à emissão de um título de residência. Atendendo a que nenhuma regularização abrange a totalidade da população estrangeira em situação ilegal, a nossa estimativa parece-nos razoável, número deverá ter decrescido drasticamente, pelo menos imediatamente após a Regularização Extraordinária de 1996. Convém notar, contudo, que, desde Março de 1995, a entrada em vigor da Convenção de Aplicação de Schengen fez cessar a exigência de consulta prévia obrigatória para a concessão de visto aos nacionais da Rússia, Ucrânia, Roménia e outros países do Leste Europeu, o que, conjugado com a liberdade de circulação no Espaço Schengen, potenciou a vinda para o nosso país de migrantes provenientes desta região. A revisão, em 1998, da Lei de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de Estrangeiros do Território Nacional (Decreto-Lei 244/98 de 8 de Agosto), ao alargar o âmbito dos mecanismos de regularização de imigrantes ilegais — referimo-nos muito especialmente ao Artigo 88 que estabelece "Em casos excepcionais de reconhecido interesse nacional ou por razões humanitárias, o Ministro da Administração Interna pode conceder a autorização de residência a cidadãos estrangeiros que não preencham os requisitos exigidos no presente diploma" — tornou Portugal um país mais atractivo para as redes de tráfico de mão-de-obra. É interessante notar que sob o impacte conjugado da adesão de Portugal à Convenção de Schengen e da entrada em vigor do Decreto-Lei 244/98, entre outros factores, a imigração ilegal em Portugal parece estar a sofrer algumas mudanças estruturais particularmente interessantes. Esta parece estar a passar de um fluxo maioritariamente constituído por movimentos voluntários e individuais, baseados em redes migratórias activas em ambos os extremos da trajectória migratória, a um outro significativamente composto por imigrantes cuja entrada e permanência se deve a redes de tráfico de mão-de-obra estruturadas a partir das zonas emissoras (ou distribuidoras). Esta mudança está associada, quer à deslocação das principais zonas emissoras ou distribuidoras dos países de língua oficial portuguesa para os países do Leste europeu, região a partir da qual se estruturam as principais redes de tráfico de mão-de-obra activas na UE, quer à ineficácia dos instrumentos de controlo do mercado de trabalho nacional e da actuação das autoridades encarregadas dessa função. Sintoma desta mudança é o crescente número de notícias que têm vindo a público, desde o ano passado, sobre a presença de imigrantes ilegais em território nacional, oriundos de países como a Moldávia, a Roménia, a Ucrânia e outros países do Leste Europeu, bem como alguns artigos sobre as redes de tráfico associadas a estes movimentos (2). Adicionalmente, o número de expulsões de cidadãos do Leste Europeu tem vindo a aumentar, registando-se mesmo um salto brusco entre 1997 e 1998, o que confirma o reforço deste tipo de imigração ilegal.
Imigração ilegal e trabalho informal A Organização Internacional do Trabalho (OIT) definiu, em meados dos anos 70, migrações ilegais ou clandestinas como o acto de migrar em que os migrantes "no decurso da sua viagem, no momento da sua entrada, durante a sua permanência ou no exercício da sua actividade económica contravenham as instruções ou acordos internacionais, multinacionais ou bilaterais pertinentes ou a legislação nacional" (3) O conteúdo desta definição parece demasiado abrangente para ser operacional, uma vez que engloba tanto imigrantes em situação de residência ilegal como os que, apesar de residirem legalmente em Portugal, estão inseridos no mercado de trabalho informal. Acresce, que enquanto a permanência ilegal em território nacional é, dentro do ordenamento jurídico nacional, uma infracção cuja sanção prevista é a expulsão do território nacional, a inserção na economia informal não acarreta qualquer sanção deste tipo. Estamos assim perante duas situações jurídicas de consequências bem diversas e que por isso mesmo devem ser tratadas diferenciadamente. Para que o termo imigrante ilegal tenha valor heurístico pensamos que deve ser reservado para os imigrantes que residam ilegalmente em território nacional, usando para os restantes casos outros termos, como imigrante activo inserido na economia informal. Dada a legislação em vigor, nenhum estrangeiro em situação de residência ilegal pode ser economicamente activo no mercado de trabalho formal, ou seja, a situação de residência ilegal implica necessariamente, se activo, informalidade económica. De acordo com diversas fontes, o imigrante ilegal, tenderá, se activo e do sexo masculino, a ser maioritariamente incorporado no sector da construção civil e obras públicas; se activo e mulher, estará predominantemente ligada ao sector terciário, nomeadamente às limpezas industriais e domésticas. Esta descrição tem pouco de surpreendente dado que a esmagadora maioria dos imigrantes ilegais em Portugal é oriunda dos PALOP, entra em Portugal de modo legal, inserido numa rede migratória informal de base familiar ou de vizinhança, num processo migratório que tecnicamente designaríamos por migrações em cadeia, sendo, por isso, encaminhado para actividades económicas em que o grupo imigrante a que pertence está firmemente inserido. Contudo, se este é o perfil económico 'típico' do imigrante ilegal, convém não esquecer que outros tipos foram detectados em trabalhos recentes que apontam para uma crescente complexificação da tipologia dos imigrantes ilegais em Portugal e sobretudo para o impacte crescente de redes de tráfico internacional de mão-de-obra tentacularmente estruturadas dentro e fora da UE. Portugal definiu uma política de imigração, aparentemente no pressuposto de que apenas atrairia fluxos significativos de imigrantes provenientes de países de língua oficial portuguesa. Este pressuposto é ainda, tanto quanto sabemos verdadeiro, mas os sintomas de mudança são claros pelo que conviria atempadamente rever a política de imigração para que a mesma corresponda às reais necessidades da economia portuguesa e regulamentar eficazmente o mercado de trabalho, para que quem trabalha o possa fazer sem atentados à sua dignidade humana e sem atropelos aos seus direitos e deveres de trabalhador estrangeiro.
Informação complementar Imigração ilegal: até quando um fenómeno da Região de Lisboa? Ao contrário da situação verificada nos outros três países do Sul da U.E., os imigrantes que têm como destino Portugal têm-se fixado, quase exclusivamente, nas áreas urbanas. Efectivamente, a Região de Lisboa concentra quase dois terços dos estrangeiros em situação legal, tendo recebido cerca de 60% das solicitações para obtenção de visto de residência apresentadas em 1996. No caso da imigração ilegal, esta tendência para a aglomeração na Região de Lisboa reforça-se ainda mais. Mesmo que algumas pessoas possam solicitar a regularização em Lisboa embora não residam na região, este dado é revelador da importância da oferta de trabalho informal e das redes de solidariedade social endógenas das comunidades imigradas mais consolidadas em Portugal — as oriundas dos PALOP — na indução da imigração ilegal de tipo tradicional. Se considerarmos o processo de transição para um novo modelo de imigração ilegal, com raízes no Leste Europeu e suportado por redes estruturadas de tráfico de mão-de-obra, é de admitir uma evolução no sentido de uma maior dispersão geográfica do fenómeno. Por um lado, os novos grupos de imigrantes não estão dependentes de redes de solidariedade social fortemente ancoradas em Lisboa e, por outro, o seu encaminhamento far-se-á em direcção a regiões, como o Centro e o Norte Litoral— particularmente a Área Metropolitana do Porto — onde a dinâmica dos sectores económicos tradicionalmente mais informalizados (e.g. construção civil e obras públicas) se tem fortalecido. * Maria loannis Baganha Expulsões executadas pelas autoridades portuguesas
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