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O associativismo dos imigrantes em Portugal

Rosana Albuquerque, Lígia Ferreira e Telma Viegas *

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O carácter recente da imigração explica que apenas em 1999 tenha sido aprovado em Portugal, pela Assembleia da República, o Regime Jurídico das Associações de Imigrantes (Decreto-Lei n.° 115/99), existentes desde a década de 70. De facto, podemos distinguir três grandes fases no movimento associativo de origem imigrante em Portugal:

• uma primeira fase de intervenção de emergência, que marcou toda a década de 80, mas que se inicia em meados dos anos 70 com a vinda de um grande contingente de cidadãos africanos das antigas colónias portuguesas. É uma fase caracterizada pela criação de associações informais nos locais da Área Metropolitana de Lisboa que foram acolhendo os recém-chegados e onde a população imigrante se foi concentrando. O objectivo subjacente a estas primeiras associações era facilitar a instalação dos conterrâneos, num quadro de ausência de medidas de integração oficiais;

• uma fase de impulso da intervenção das associações como agentes da integração sócio-económica dos imigrantes, que marcou a primeira metade da década de 90, assistindo-se a um rápido aumento do número de associações. De uma associação entre 1970 e 1980 (Casa de Cabo Verde), passou-se para 10 em 1990 e para 78 associações em 1996 (apenas uma não africana, a Casa do Brasil) a que se juntam 10 associações de estudantes africanos. É o período em que as associações dão os primeiros passos na intervenção política em torno da reivindicação de direitos de cidadania dos imigrantes e seus descendentes e investem no desenvolvimento de projectos mais integrados e de longo prazo;

• uma fase de maturação do movimento associativo, a partir de meados da década de 90, onde as associações alcançam o reconhecimento formal, pelas instituições políticas, nacionais e locais, do seu papel enquanto agentes de desenvolvimento das comunidades de origem imigrante, assistindo-se à consolidação daquelas que conseguiram entrar na etapa da profissionalização. As associações de origem imigrante em Portugal têm centrado a sua atenção em três grandes domínios de intervenção:

• domínio sócio-económico, que se desdobra na realização de acções de educação não formal (ateliers educativos para crianças; workshops de dança para jovens), formação profissional (concretizada numa grande diversidade de cursos, estando os mais frequentes integrados no âmbito da mediação cultural mas desenvolvendo-se também cursos de técnicas empresariais ou de amas), prestação de cuidados de saúde, melhoramento das condições dos bairros, promoção da prática desportiva, entre inúmeras outras actividades;

• domínio cultural, que se traduz na organização de actividades culturais como forma de conservar e transmitir a identidade cultural e que, frequentemente, estão articuladas com o domínio educativo (por exemplo, através da promoção de actividades para a conservação da língua materna);

• domínio político-legal, concretizado em acções para a comunidade, assentes na informação sobre os direitos e deveres dos imigrantes, e em acções para a sociedade em geral e o Estado em particular, ao defenderem e representarem os interesses das comunidades de origem imigrante (assumindo o papel de interlocutor do Estado).

Em Portugal, a questão da imigração e do associativismo imigrante ganhou visibilidade com o aumento dos fluxos de imigrantes africanos lusófonos e a adopção da política de imigração europeia no início dos anos 90 [Acordos de Schengen (1991) e Tratado de Maastricht (1992)], assente no controlo das fronteiras como forma de restringir os fluxos imigratórios e a imigração ilegal, segundo o princípio de que tal permitiria às comunidades já estabelecidas uma integração de maior qualidade.

Nessa óptica, é criado o Secretariado Coordenador dos Projectos de Educação Multicultural/Entreculturas (Despacho Normativo n.º 63/91), no seguimento do Despacho n.º 123/ME/89, relativo à escolarização dos filhos dos trabalhadores migrantes, mas que não tinha provocado efeitos práticos. Promulga-se legislação vária: a Resolução do Conselho de Ministros n.º 38/93 aprova medidas de apoio aos imigrantes e minorias étnicas; o Despacho conjunto MAI/ME/MOPTC/MS/MESS (1993), cria a Comissão Interdepartamental para a Integração dos Imigrantes e Minorias Étnicas. Mas, neste período, a principal exigência das associações é o direito à legalização. Em 1992 realiza-se a primeira legalização extraordinária de imigrantes (Decreto-Lei n.º 212/92) monitorizada pelas associações através do Secretariado Coordenador das Acções de Legalização (SCAL), tendo sido apoiadas financeiramente pelo Estado e desenvolvido parcerias com as centrais sindicais (CGTP/IN e UGT). Este processo marcou a viragem para uma intervenção mais política do movimento associativo, que será reforçada pela institucionalização do diálogo com os partidos políticos.

Daqui resulta a eleição para o Parlamento de um representante das comunidades imigrantes nas listas do Partido Socialista [Fernando Ká, presidente da Associação Guineense de Solidariedade Social, (legislativas de 1991) e Celeste Correia, antiga presidente da Associação Caboverdiana, (legislativas de 1995 e de 1999)].

A primeira metade da década de 90 é caracterizada pela crescente interpelação do movimento associativo ao Estado, reivindicando direitos de cidadania que só seriam atingidos com uma efectiva política de integração. O próprio Estado reconhece que existem lacunas nesse campo. Um relatório do Serviço de Informações de Segurança (SIS) do Ministério da Administração Interna sobre "Violência urbana protagonizada por minorias étnicas" (1993), alertava para a necessidade de desenvolver" (...) políticas sociais específicas, que permitam aumentar o potencial de integração dos imigrantes e seus descendentes directos, por parte da sociedade portuguesa".

Mas é necessário esperar pela segunda metade da década, onde se assistiu à eleição de um governo do Partido Socialista, para as vozes das associações serem ouvidas. Cria-se o cargo de Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas - ACIME (Decreto-Lei n.º 3-A/96) que fornece às associações, pela primeira vez, um intermediário no diálogo com o Governo. Realiza-se, em 1996, o segundo processo de legalização extraordinária de imigrantes (Lei n.º 17/96). A Lei nº 20/96, permite às associações de imigrantes e de defesa dos direitos humanos constituírem-se como assistentes em processo penal no caso de crimes de índole racista ou xenófoba. Reforçam-se os direitos de cidadania dos imigrantes (Lei n.º 50/96) que, alterando a lei eleitoral, permitiu o direito de voto e de elegibilidade para as autarquias locais, em condições de reciprocidade, aos cidadãos estrangeiros. Publica-se o Despacho conjunto n.º 304/98 do Ministério da Educação e Ministério do Trabalho e da Solidariedade, que reconhece legalmente a figura do mediador cultural para a educação. Cria-se um Conselho Consultivo para os Assuntos da Imigração (Decreto-Lei n.º 39/98), no âmbito das competências do ACIME, e uma Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial, no quadro da lei que proíbe a discriminação no exercício de direitos por motivos de "raça", cor, nacionalidade ou origem étnica (Lei n.º 134/99).

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A tendência vivida actualmente no movimento associativo de origem imigrante em Portugal é a profissionalização de as associações e a incidência na formação profissional. A entrada nesta etapa depende da capacidade das associações acederem aos subsídios estatais disponibilizados pelo Quadro Comunitário de Apoio I [1986-1993], Quadro Comunitário de Apoio II [1994-1999], e por programas europeus, como a Iniciativa Operacional INTEGRAR, (alargamento das perspectivas de emprego de excluídos ou ameaçados de exclusão laborai), o YOUTHSTART (integração de jovens sem qualificações de base no mercado de trabalho), o HORIZON (alargamento de emprego aos deficientes) e o NOW / New Opportunities for Women (promoção da igualdade de oportunidades para as mulheres no emprego).

A intervenção associativa vai concentrar-se na área da formação profissional, uma vez que estes programas dão maior prioridade ao financiamento de acções nessa área, sendo de destacar a emergência de uma nova geração de líderes associativos que nasce, sobretudo, da formação em animação ou mediação sociocultural, uma grande aposta das associações para a integração das comunidades de origem imigrante. Em 1999, as minorias étnicas (não só as de origem africana, como também os ciganos e os indianos) foram o segundo grupo-alvo dos cursos de formação (a seguir ao grupo dos jovens em risco), representando 24,66% do total dos formandos (em 1998 constituíram o primeiro grupo, com 31,1%). Também o Rendimento Mínimo Garantido (RMG) (Lei n.º 19-A/96), traduziu-se, em 1998, na concessão a 4126 beneficiários oriundos de países africanos lusófonos.

Hoje as associações de imigrantes integram já o cenário político e social, como parceiros do poder político, a nível nacional e local. A evolução futura do movimento associativo dependerá do diálogo entre os intervenientes no processo de integração social das populações imigrantes e da capacidade de as associações tecerem equilíbrios entre as expectativas das comunidades e as exigências dos seus interlocutores políticos.

 

Informação complementar

ASSOCIAÇÕES DE IMIGRANTES e/ou DESCENDENTES DE PAÍSES DA CPLP

Área Metropolitana de Lisboa

A. Africana do Barreiro
A. Africana de Moçambique em Portugal – AAMO
A. dos Angolanos Residentes em Portugal - NOVAGER
A. dos Amigos da Encosta Nascente
A. dos Amigos da Mulher Angolana - AAMA
A. CaboJovem
A. Caboverde Na Coraçón
A. Caboverdiana
A. Caboverdiana do Seixal
A. Caboverdiana de Setúbal
A. Caboverdiana de Solidariedade dos Amigos da Margem Sul do Tejo
A. de Coordenação e Integração dos Migrantes Angolanos - ACIMA
A. Cultural e Desportiva da Pedreira dos Húngaros
A. Cultural Luso-Africana MORNA
A. Cultural Moinho da Juventude
A. Cultural e Recreativa Angolana – ACRA
A. Cultural e Recreativa Sãotomense
A. Espaço da Comunidade Caboverdiana em Portugal – EC-CO
A. Estrela d'África
A. Guineense de Solidariedade Social – AGUINENSO
AGUIPA
A. de Jovens Promotores de uma Amadora Saudável
A. Juntar Mãos
A. Juvenil Luso-Africana
A. Luso-Africana de Solidariedade – ALAS
A. Mãos Unidas da Casa da Alegria
A. de Moçambicanos em Portugal - ASSOMO
A. de Moçambique
A. para a Promoção de Saúde dos Africanos - SANITAE
A. de Solidariedade de Angola - ASA
A. de Solidariedade Social, Recreativa, Cultural e Desportiva RECRIJOVEM
A. Unida e Cultural da Quinta do Mocho
A. Unidos de Cabo Verde
A. Unida dos Emigrantes da Guiné-Bissau em Portugal – AUEGBP
Casa do Brasil
Casa de Moçambique
Federação das Associações Caboverdianas em Portugal
Federação das Associações da Comunidade Lusófona
Liga de Angola – LIANGOLA
Liga dos Imigrantes de Países de Expressão Portuguesa – LIPAEP
SOS Defesa dos Angolanos
União dos Angolanos no Exterior – UNANGOLA
União da Juventude Angolana em Portugal – UJAP

 

Outras Regiões

A. Africana de Solidariedade Social – TABANCA
A. Caboverdiana do Algarve
A. Caboverdiana do Norte de Portugal – ACPN
A. da Comunidade de S. Tomé e Príncipe - ACOSPE
A. de Juventude Luso-Africana Pontos nos iis
Casa de Angola do Algarve

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* Rosana Albuquerque

Mestre em Relações Interculturais pela Universidade Aberta. Investigadora no Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais da mesma Universidade.

* Lígia Ferreira

Mestre em Psicologia Educacional pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada. Investigadora no Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais da Universidade Aberta.

* Telma Viegas

Mestre em Relações Interculturais pela Universidade Aberta e Investigadora no Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais da mesma Universidade.

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