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Portugal e a utilização de capital de risco

Sérgio Leal Nunes *

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A maioria das economias modernas encontra-se num processo de profunda transformação de organizações baseadas essencialmente em recursos físicos para estruturas baseadas no conhecimento, em que a inovação e a capacidade de inovar desempenham o principal papel de motor do crescimento económico, de fonte de competitividade nos mercados (inter)nacionais e, em alguns casos, de desenvolvimento da sociedade como um todo. Entenda-se aqui inovação como a capacidade de colocar a informação relevante em contacto com os recursos apropriados, introduzindo no circuito comercial novo conhecimento, novas competências e novos produtos adequados a uma procura real e potencial. É num ambiente de permanente selecção que, acossadas pela constante pressão competitiva, novas estruturas (organizacionais, comerciais, humanas) substituem antigas, onde novas ideias e organizações mais flexíveis (logo mais adaptáveis) são as que em melhores condições se encontram para impor a sua capacidade e competência.

A Comissão Europeia lança, em 1995, um profundo debate sobre o papel da inovação no desempenho das economias, donde emerge um plano de acção para a inovação na Europa —  Livro Verde sobre a Inovação —  assente em três grandes pilares: delimitação do paradigma da inovação, promoção de uma cultura de inovação e necessidade de entrelaçar a actividade de investigação com a inovação.

Em Portugal, 2001 foi o ano em que o governo português enunciou, formalmente e de forma explícita, o papel que a inovação poderá desempenhar no aumento de produtividade das empresas portuguesas e, por essa via, da competitividade de toda a economia nacional, procurando integrá-la, a diferentes níveis, através de um conjunto de iniciativas consubstanciadas no Plano Integrado de Apoio à Inovação.

Nestes termos, reconhecendo a inovação e a capacidade de intervir no seu domínio como elementos diferenciadores dos sistemas sócio-económicos, mobilizam-se, aos diversos níveis, acções e vontades que permitam criar condições favoráveis ao desenvolvimento dessa mais-valia.

 

A inovação e o capital de risco

As empresas são as organizações que, potencialmente, maior quantidade de riqueza criam, sendo por esta razão, as organizações que mais necessitam de desenvolver a sua capacidade de inovar, fazendo dela um instrumento que lhes permita criar cada vez mais e melhores produtos a colocar em tempo útil nas mãos de quem os procura.

Parte relevante da criação da riqueza mundial é feita por PMEs que, em função da sua natureza, se encontram, geralmente, em melhores condições para responder de forma rápida, flexível e eficaz às solicitações dos mercados. Por diversas razões, é particularmente difícil à maioria das grandes empresas correr os riscos e mobilizar os meios necessários à implementação, em tempo útil, de projectos inovadores e potencialmente diferenciadores nos mercados mundiais. No entanto, são também estas PMEs que maiores dificuldades encontram para reunir todos os elementos que lhes permitam construir essas competências e atitudes: meios humanos, físicos, financeiros, e organizacionais condicionam, inexoravelmente, os seus desempenhos neste domínio (I&D, produtividade e produção).

A viabilidade e correspondente rentabilidade dos projectos desenvolvidos por estas organizações dependem, essencialmente, da possibilidade de conseguir transportar com êxito os resultados da investigação e desenvolvimento para o circuito comercial. Este é, contudo, um processo arriscado e oneroso, em que as instituições bancárias tradicionais, rígidas e avessas ao risco, raramente se envolvem, dificultando assim o acesso de ideias potencialmente lucrativas a realizações económicas. É neste âmbito que, tomando o capital de risco como elemento que pode criar condições favoráveis à inovação, se pode compreender e estimular a articulação entre disponibilidade de capital de risco e a promoção da inovação.

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Embora a definição de capital de risco difira substancialmente de país para país, bem como a sua forma de disponibilização (pública e privada), quer se faça directamente, por investidores a título individual, os denominados business angels (projectos de seedcapital e start-ups), sociedades de capital de risco (empresas com estratégias de longo prazo em empresas não cotadas em bolsa), programas públicos ou, indirectamente, através de fundos de capitais especializados e medidas facilitadoras de actuação nos mercados, toma-se aqui a definição da OCDE (2000), que enuncia o capital de risco como um tipo específico de financiamento disponibilizado por diversas instituições (públicas e privadas) que efectuam investimentos em empresas de cariz tecnológico (geralmente em empresas de base tecnológica, nos sectores mais dinâmicos: telecomunicações, software, biotecnologia, Internet, etc.) com potenciais probabilidades de sucesso. As intervenções podem ter lugar a vários níveis: financeiro, organizacional, de acompanhamento, de perspectivas de I&D, de opções de compras ou de vendas futuras. Tornam-se, assim, verdadeiros parceiros comerciais, baseando a sua relação numa partilha de risco e num mútuo empenhamento de longo prazo, procurando assegurar a viabilidade do projecto (regra geral, o retorno faz-se ao nível de um voto de venda, admissão da cotação em bolsa ou venda a outros “capitalistas de risco”). Na procura desta simbiose estão subjacentes três ideias condicionadoras de todo o processo: investidores participativos, criação de valor e envolvimento a longo prazo (Banha, 2000).

Os resultados destas iniciativas podem confirmar-se pela existência de um conjunto de exemplos de empresas de sucesso, em termos mundiais, que foram alvo de ajudas desta natureza em várias fases do seu crescimento (Apple Computer, Cisco Systems, Microsoft, Intel, Compaq, Digital Equipment Corporation, etc.). 

 

O capital de risco no mundo e em Portugal

Embora a actividade do capital de risco seja relativamente pequena, quando comparada com os mercados financeiros como um todo, tem crescido significativamente nos países da OCDE durante a década de 90 (OCDE, 2000). Países como a Suécia, os EUA, o Reino Unido, a Holanda têm sectores de capital de risco bastante desenvolvidos oferecendo um conjunto de parcerias bastante diversificadas e criativas.

Já em Portugal o mercado de capital de risco apresenta características muito pouco animadoras. Senão veja-se: apesar de, num estudo recente, (1) se considerar que a segunda maior barreira à inovação na região de Lisboa e Vale do Tejo é precisamente a “disponibilidade de capital de risco”, logo depois da “qualidade dos serviços da administração pública”, esta uma barreira “natural”, um documento anexo ao supracitado Plano Integrado de Apoio à Inovação —  “Acompanhamento da estratégia de Lisboa: Chave de correspondência sobre as políticas europeias e nacionais e instrumentos do QCA III” – enuncia 12 medidas de política referindo-se uma delas, precisamente, ao “Capital de Risco”. Notável que, das 12 políticas apresentadas, apenas a referente ao capital de risco não tenha, a si associada, qualquer política nacional para o seu desenvolvimento.

Este é apenas um exemplo que pretende espelhar o deserto de ideias e de acções numa área há muito considerada relevante para a transformação de ideias em iniciativas empresariais com impactos multiplicadores (directos, indirectos, induzidos) ao nível de um importante conjunto de variáveis (criação de emprego, de iniciativa empresarial, de valor, etc.).

Fazendo uma pequena comparação em termos europeus, esta é uma ideia que encontra também alguma fundamentação quando se compara o capital de risco em percentagem do PIB. Como se pode observar, Portugal ocupa a última posição da tabela, lugar a que ultimamente temos sido relegados em numerosos indicadores, mas a que não nos devemos habituar.

Observa-se igualmente que a situação da inovação em Portugal pode ser caracterizada como sendo bastante débil e incipiente. Em 73% dos indicadores, Portugal ocupa a última ou a penúltima posição. No entanto, mais grave do que ocupar essas posições incómodas é o facto dos valores para alguns desses indicadores serem nulos ou próximos de zero. Um deles é, precisamente, o já referido capital de risco em percentagem do PIB. Nestes termos, a dialéctica Capital de Risco/Inovação parece estar bastante comprometida pois, por um lado, não parece existir ambiente suficientemente estimulante para se desenvolver a actividade de capital de risco e, por outro, muitas das iniciativas empresariais ainda embrionárias não despontaram por falta de sustentáculos financeiros e organizacionais. É necessário criar condições para que o capital e as oportunidades de o utilizar adequadamente se entrelacem amiudadamente o que, como vimos anteriormente, define a inovação.

No entanto, esta conclusão é apenas parte da verdade, uma vez que os “capitalistas de risco” não têm fronteiras e os territórios fervilhantes de actividades inovadoras serão sempre espaços potencialmente atractivos para a criação de riqueza. Este é um círculo vicioso que urge transformar em círculo virtuoso, através de diversas alterações, sendo a mais relevante ao nível de atitudes e mentalidades (confirmar com o raciocínio em caixa) que desde o século XVI parecem andar arredadas do quotidiano português. Foi nesse período que, esgotadas as possibilidades de guerrear Castela, por terra, Portugal decidiu arriscar fortemente no desconhecido, procurando arduamente o seu próprio destino.

 

Informação complementar

O conceito de risco e o desenvolvimento económico

O conceito de risco está associado à incerteza e ao cálculo de probabilidades. Só se enfrentam riscos quando os resultados das acções que se pretendem empreender não estão totalmente garantidos. Pode então dizer-se que o risco se pode resumir a um problema de minimização dos perigos calculados sujeitos à restrição das possibilidades futuras. Ora, daqui se retira que só as sociedades que se projectam no futuro, mesmo que imediato, estão disponíveis para correr riscos. Nestes termos, a aceitação positiva dos riscos funciona como génese da criação de riqueza numa economia moderna, como uma dinâmica potencialmente estimuladora de uma sociedade empenhada na mudança, apostada em determinar o seu próprio futuro.

Nas sociedades tradicionais, os acontecimentos tinham sempre uma explicação baseada em factos do passado. Todas as acções tinham explicações em rituais, tradições, bruxarias, na vontade dos deuses, etc. Giddens (2000) refere que a “atitude em relação ao futuro é o que distingue o capitalismo moderno de todas as anteriores formas de organização económica (...) a aceitação de riscos é um dos elementos fundamentais de uma economia dinâmica e de uma sociedade inovadora”.

A noção de risco pode, assim, ser vista como mais uma das consequências da passagem duma visão da ciência teológica, obscura, para uma visão baseada na razão e na experiência, i. e., o presente como ponto de partida e não como ponto de chegada, imóvel e determinado.

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1 Listart (2000) – Plano de Tecnologia, Inovação e Desenvolvimento Regional: Um novo desafio para Lisboa e Vale do Tejo

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* Sérgio Leal Nunes

Licenciado em Economia pelo ISEG. Mestre em Economia e Gestão do Território pelo ISEG. Docente na UAL.

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Bibliografia

Banha, F. M. (2000) – Capital de Risco – Os tempos estão a mudar. Lisboa: Bertrand Editora. ISBN: 972-25-1137-8.

Giddens, A. (2000) – O Mundo na Era da Globalização.

Listart (2000) – Plano de Tecnologia, Inovação e Desenvolvimento Regional: Um novo desafio para Lisboa Oeste e Vale do Tejo, Lisboa.

OCDE (2000) – “The Internationalisation of Venture Capital in OCDE Countries: Implications for Measurement and Policy”, document (OCDE DSTI/DOC (2000) 7).

PROINOV (2001) – Programa Integrado de Apoio à Inovação, Documentos vários, disponíveis em http://www.proinov.gov.pt.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Situação da inovação em Portugal face à União Europeia

Link em nova janela Capital de risco em percentagem do PIB

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