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As exportações portuguesas: a dimensão tecnológica

João Dias *

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A integração de Portugal na UE abriu novas possibilidades de expansão para as exportações tradicionais do país. Mas ofereceu também (e oferece ainda) uma excelente oportunidade para a renovação dessas mesmas exportações. Para isso, teria sido importante a generalização de uma crescente preocupação com a qualidade dos produtos e a exploração de novas gamas, em particular aquelas que incorporam elevado conteúdo tecnológico, em geral sinónimo de elevado valor acrescentado. Em suma, seria essencial um rápido crescimento das exportações de produtos de alta tecnologia, condição importante para um forte crescimento e desenvolvimento económico do país. De qualquer forma, uma rápida convergência real da economia portuguesa para o padrão comunitário dificilmente será possível sem esta aposta na qualidade e na tecnologia.

Passada mais de uma década de integração, o comportamento das exportações portuguesas parece ter descurado, em muitos casos, esta necessidade de upgrade, tendo apostado quase em exclusivo numa linha de continuidade das exportações mais tradicionais. Neste texto apresentam-se alguns elementos de caracterização das exportações em termos da sua intensidade tecnológica e compara-se a evolução registada em Portugal com a observada noutros países de rápido crescimento económico recente.

Naturalmente que não fará qualquer sentido a defesa do interesse exclusivo de exportações de alta tecnologia. A própria definição de “alta tecnologia” pode envolver alguma controvérsia, embora seja fácil indicar alguns produtos em que a sua catalogação nesta rubrica seja mais ou menos pacífica. De qualquer forma, as várias propostas de definição convergem na constatação da importância crescente, a nível mundial, deste tipo de produtos. Seguindo a classificação da OCDE, a última tabela da página seguinte mostra isso mesmo: o peso destes produtos nas exportações mundiais de produtos manufacturados para a OCDE passou de 17 para 21 por cento, entre 1989 e 1997. O quadro mostra ainda o enorme peso deste tipo de produtos nas exportações dos países de fortíssimo crescimento económico na Ásia. Em todos os casos apresentados, trata-se de países com notáveis taxas de crescimento real do produto per capita de cerca de seis por cento ao ano (apesar de 1997 ser ano de forte crise na Ásia). Em todos os casos apresentados, o peso dos produtos de alta tecnologia é muito elevado, atingindo mais de metade do total das exportações nalguns países. Em todos os casos ainda, registou-se um reforço do peso destes produtos ao longo do período.

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Na vertente tecnológica, o contraste das exportações portuguesas é enorme. Em 1989 apenas quatro por cento das exportações nacionais de produtos manufacturados e três por cento das exportações totais para a OCDE (que absorve 90% das exportações nacionais) se enquadravam na definição da OCDE de produtos de alta tecnologia. No final do período considerado estes valores tinham baixado um ponto percentual. Para comparação, o PIB real per capita de Portugal cresceu 2,4% no mesmo período.

O exemplo da Irlanda é também importante neste aspecto. As fortíssimas taxas de crescimento registadas pela economia irlandesa nos últimos anos afastaram rapidamente este país do grupo dos menos desenvolvidos da Europa comunitária. A taxa média de crescimento do PIB real per capita (6,9%) neste período foi, na Irlanda, cerca de três vezes superior à registada em Portugal. O conteúdo tecnológico das exportações irlandesas é também incomparavelmente mais elevado.

No quadro que se segue classificam-se as exportações nacionais por tipo de tecnologia, utilizando uma definição um pouco diferente. Nesta última década, de acordo com esta definição, registou-se alguma redução do peso dos produtos de tecnologia mais banalizada (standard). Mas esta continua a enformar metade das exportações de produtos manufacturados do país. A principal alteração registou-se no escalão da tecnologia intermédia (peso do automóvel, com o projecto Ford-Volkswagen). Os produtos de alta tecnologia detêm um peso ainda reduzido e as alterações observadas ao longo da década foram pouco substanciais.

Nos gráficos apresentados compara-se de novo a experiência portuguesa com a irlandesa e a dos quatro “dragões” asiáticos (NPI), nas últimas duas décadas. Esta comparação envolve a evolução registada pelas exportações de maior intensidade tecnológica (hi-tec) e a dos grupos têxteis, vestuário e calçado (tvc), em geral (embora com importantes excepções) caracterizados pela utilização de tecnologia mais rudimentar e vulgarizada.

No caso português constata-se que, após uma década de integração europeia, reforçou-se o peso do grupo tvc e reduziu-se o do grupo hi-tec. Assim, parte muito importante das exportações portuguesas de produtos manufacturados continua a basear-se em indústrias intensivas em trabalho não qualificado, baixos salários, reduzido valor acrescentado e forte concorrência dos países em vias de desenvolvimento. Apesar de importantes excepções e de algumas alterações recentes, tende a persistir a subcontratação, a incapacidade de criação e imposição de marcas e de exploração do design, entre outras limitações da oferta nacional.

Já no caso dos NPI asiáticos observa-se um comportamento diametralmente oposto. Embora tenham tido uma importância muito grande no passado, as exportações de têxteis-vestuário-calçado registam um declínio acentuado nos últimos anos. Ao contrário, observa-se uma fortíssima expansão dos produtos de alta tecnologia, num curioso “efeito-tesoura” que poderia, em certa medida, caracterizar a passagem de um país em vias de desenvolvimento para um país desenvolvido.

O exemplo irlandês é também paradigmático e radicalmente oposto ao português. O “corte” ou “efeito-tesoura” irlandês ocorre já um pouco antes de 1980 mas acentua-se consideravelmente nos últimos quinze anos. Desta forma, em constante declínio, o grupo tvc tem hoje um peso insignificante nas exportações irlandesas. Ao contrário e em permanente progressão, as exportações de produtos de alta tecnologia representam agora cerca de metade das exportações da Irlanda.

Em conclusão: sendo, embora, compreensível e desejável o aproveitamento das oportunidades oferecidas pela integração europeia por parte de algumas exportações tradicionais, começa a ser preocupante a persistência, quase exclusiva, dos sectores baseados em baixa tecnologia, numa altura em que se antevêem dificuldades adicionais para a oferta portuguesa. De facto, a liberalização crescente dos mercados mundiais traduz-se, na UE, por uma acentuada quebra do proteccionismo face ao exterior da Comunidade. Ou seja, a inevitável e progressiva erosão da “preferência comunitária” implicará uma concorrência acrescida de grande parte das exportações portuguesas por parte de muitos países onde os baixos salários e o não cumprimento de normas ambientais ou de carácter social lhes garantem, nesta gama de produtos, uma posição competitiva indiscutível.

Além disso, o iminente alargamento a Leste reduz este espaço de manobra das exportações portuguesas. Quer na gama de produtos de baixa tecnologia, quer em relação às dificuldades agora acrescidas para a transição para a necessária modernização da oferta nacional.

A tabela adjacente mostra também o exemplo da Hungria, onde a mudança da composição das exportações foi substancial. Assim sendo, se em quase duas décadas de integração e de posição confortável na UE não se aproveitou a oportunidade para introduzir de forma significativa novas gamas de produtos, baseados numa matriz tecnológica mais avançada, de qualidade superior, de maior valor acrescentado e baseados em trabalho significativamente mais qualificado, esta transição afigura-se, no futuro, algo mais problemática. Mas necessária, já que só ela será compatível com uma rápida convergência para os países mais avançados da União.

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* João Dias

Doutorado em Economia pelo ISEG. Docente no ISEG.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Peso dos produtos Hi-tec e têxteis, vestuário e calçado nas exportações portuguesas de manufacturas - Portugal

Link em nova janela Peso dos produtos Hi-tec e têxteis, vestuário e calçado nas exportações portuguesas de manufacturas - Irlanda

Link em nova janela Peso dos produtos Hi-tec e têxteis, vestuário e calçado nas exportações portuguesas de manufacturas - NPI

Link em nova janela Exportações portuguesas de manufacturas por tipo de tecnologia

Link em nova janela Peso dos produtos de alta tecnologia nas exportações totais e de manufacturas para a OCDE

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