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As coordenadas da política externa

Observatório de Relações Exteriores

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Através da documentação oficial — programas dos governos, declarações dos altosresponsáveis do Estado, discursos ministeriais — pode obter-se uma visão de conjuntodas coordenadas da política externa portuguesa.

Essas grandes orientações são relativamente estáveis nas últimas décadas e, se não alcançam a unanimidade, atingem pelo menos um alargado consenso entre as forças políticas e a opinião pública.

Apesar da vastidão do tema, é possível ensaiar uma síntese dessas coordenadas, articulando-as em torno de três eixos: os objectivos gerais, as plataformas multilaterais e as relações bilaterais.

 

Os objectivos gerais

Os documentos oficiais não utilizam certos termos que, num passado ainda recente, eram expressões obrigatórias da linguagem diplomática, como seriam “defesa da soberania”, “protecção do interesse nacional”, “expansão da influência”, “afirmação de potência”...

A terminologia hoje utilizada libertou-se destes conceitos “clássicos” e formula de modo novo os grandes objectivos da política externa.

A construção europeia é considerada um desígnio nacional de primeiro plano, empenhando-se Portugal na consolidação da Europa como espaço democrático de segurança e estabilidade e de integração política e económica. Defende-se a gradualidade do processo de edificação europeia, não sendo claro se a posição portuguesa se aproxima ou se afasta do modelo federal. A integração do país nas instituições europeias, pan-europeias e transatlânticas é entendida como forma de partilhar a soberania numa comunidade internacional aberta e multilateralizada.

Tal não significa a diluição dos interesses portugueses. Num texto especialmente autorizado, a prossecução desses interesses é formulada como “a valorização continuada das especificidades do papel de Portugal no mundo”. Entre essas especificidades destacam-se a projecção da língua portuguesa, o relacionamento fraterno com os demais membros da comunidade de Estados cumpridores das regras do direito internacional e a utilidade para outras regiões do mundo da recente experiência portuguesa nos domínios da democratização, descolonização e liberalização económica. Como era de prever, particular ênfase é atribuída à questão da língua portuguesa, falada por cerca de 200 milhões de pessoas e com uma comunidade portuguesa e lusodescendente espalhada pelo mundo.

Daí a importância do Instituto Camões, do Conselho das Comunidades Portuguesas e dos órgãos de comunicação que atingem esse vasto espaço da lusofonia: RTPI, RDPI, RTP África e RDP África.

Visando estes objectivos de carácter geral, a acção externa do Estado português desenvolve-se em duas vertentes complementares: a diplomacia multilateral e a diplomacia bilateral.

 

As plataformas multilaterais

A inserção portuguesa nas organizações intergovernamentais concretiza-se prioritariamente nas instituições de âmbito europeu, numa aliança transatlântica e numa organização de vocação mundial.

Quanto às primeiras, trata-se do Conselho da Europa (a que Portugal vai presidir em 2004), da União Europeia (e da UEO) e da OSCE – Organização de Segurança e Cooperação na Europa (a que Portugal preside em 2002). De entre os muitos tópicos da política portuguesa nestas instituições, alguns merecem destaque. Apesar da reticência expressa de modo informal por diversos observadores, a posição oficial portuguesa é absolutamente favorável ao alargamento da União Europeia nos termos do processo em curso. De igual modo, Portugal apoia a passagem da cooperação política europeia para a política externa e de segurança comum, defende as “cooperações reforçadas” e empenha-se na preparação da próxima Cimeira Intergovernamental (prevista para 2004) para aprofundamento das instituições comunitárias.

As questões de defesa e segurança são hoje matéria das políticas europeias, mas articulam-se de perto com a aliança transatlântica acima referida. Portugal tenta equilibrar o binómio UE / NATO, apoiando a iniciativa europeia de segurança e defesa e simultaneamente subscrevendo a existência de um pilar europeu da NATO. Deve aqui ressaltar-se a entrada em funcionamento na UE das estruturas políticas e militares, a criação do Comité de Gestão Civil de Crises e, sobretudo, a participação portuguesa na conferência de “geração de forças”, tendo disponibilizado 3.800 homens com meios aéreos e navais. No âmbito da NATO, Portugal aprovou o novo conceito estratégico da organização (adoptado em Washington em 1999), bem como o lançamento dos grupos de forças conjuntas e combinadas (CJTF), preconiza o alargamento da NATO aos novos candidatos (Eslovénia, Eslováquia, Bulgária e Roménia), o estreitamento de relações com o Atlântico Sul (por iniciativa portuguesa o Brasil participou num exercício naval da NATO) e defende para o Mediterrâneo um modelo inspirado na “Parceria para a Paz”. Quanto ao projecto “Missile Defense” da nova Administração americana, Portugal manifesta disponibilidade para “apreciar”, com os restantes aliados, essa iniciativa, de que os contornos técnicos continuam por esclarecer, embora os acontecimentos de 11 de Setembro de 2001 obriguem a repensar as coordenadas globais da questão.

Ainda no domínio da integração na NATO, a política portuguesa visa a valorização do Comando da NATO em Oeiras, agora com a designação de “Comando Regional” (CINCSOUTHLANT), habilitando-o a funcionar como Quartel-General ou módulo de apoio de CJTF com meios navais, aéreos e aerotransportados.

Por último, a organização de vocação mundial, ou seja, a ONU. O empenho português nessa plataforma tem sido evidente, manifestando-se na eleição para o Conselho de Segurança (biénio 1997-98 e candidatura já lançada para o biénio 2011-12) na eleição para a Comissão dos Direitos Humanos (2000-2002), a participação em acções de observação eleitoral (Namíbia, Moçambique, Angola, Guiné-Bissau, Bósnia, Kosovo, Saara Ocidental e Peru) e a participação em missões de paz (ex-Jugoslávia, Moçambique, Angola, Saara Ocidental, República Centro-Africana), sem contar com o envolvimento na IFOR e SFOR (Bósnia-Herzegovina), na KFOR (Kosovo), no acompanhamento da situação na Macedónia e, obviamente, na importante participação em Timor-Leste (no plano da segurança, Portugal participa com 1.100 homens, dos quais 930 militares e 170 das forças policiais — PSP e GNR).

 

As relações bilaterais

A diplomacia portuguesa privilegia, do ponto de vista bilateral, as relações com alguns países europeus (evidente relevo para Espanha, França, Reino Unido e Alemanha), com os Estados Unidos (com a entrada em vigor do Acordo de Cooperação e Defesa, considera-se que se atingiu uma fase de relações adultas, não dependentes do valor estratégico da Base das Lajes) e com os países de língua portuguesa.

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O caso do Brasil, porém, adquiriu notável particularidade: sobretudo desde 1995, o relacionamento com o Brasil foi uma das prioridades da política externa portuguesa, não só em nome da importância desse país em si mesmo, mas ainda pela sua integração no MERCOSUL, considerando-se que Portugal e o Brasil poderiam funcionar como as portas de contacto entre a UE e o MERCOSUL, o que constitui uma aposta estratégica na cooperação inter-regional, tema de reconhecida importância na presente agenda internacional. Desde o volume significativo dos investimentos portugueses no Brasil (Portugal subiu para terceiro investidor mundial no Brasil), até às trocas culturais e à reciprocidade de direitos para os cidadãos dos dois países, as relações bilaterais são hoje muito fortes.

A ligação brasileira insere-se, por sua vez, no âmbito da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), essa organização de carácter peculiar onde o bilateral se cruza com o multilateral, integrando sete países de três continentes, mais um observador — Timor-Leste — que será membro após a independência. Objecto de proclamações frequentes quanto à importância que lhe é atribuída, a verdade é que a CPLP ainda não demonstrou verdadeira consistência enquanto sistema de aliança e de cooperação.

A doutrina da política externa portuguesa salienta ainda alguns conjuntos regionais que são objecto de atenção particular: a área ibero-americana, o Mediterrâneo, a África Austral e a Ásia.

Portugal e Espanha estão solidários no reforço da ligação à América Latina e essa corresponde a um dos eixos mais fortes do seu relacionamento com o exterior, o que não é de estranhar dadas as reconhecidas potencialidades dessa vasta zona onde são substanciais os interesses comuns.

De igual modo o Mediterrâneo empenha os dois países ibéricos. Portugal tem reiterado a intenção de contribuir para uma bacia Sul do Mediterrâneo estável e próspera, o que se explica, entre outros factores, pela importância que tem a Argélia como fornecedor de gás natural e Marrocos como um dos países para onde mais se têm dirigido os investimentos e os interesses empresariais portugueses. Daí o envolvimento português no “Processo de Barcelona” e no Fórum Mediterrânico, além das já referidas iniciativas quanto a esta zona em matéria de segurança no âmbito da NATO.

A preocupação pela África Austral justifica-se pela presença dos dois maiores países africanos de língua portuguesa e pela dimensão da comunidade portuguesa na África do Sul. Só em Angola operam 200 empresas e vivem 30.000 cidadãos portugueses. A insegurança que actualmente impera sobre a imensa comunidade portuguesa na África do Sul (estimada em 500.000 pessoas) introduz um factor de extrema delicadeza para a política externa de Portugal nesta área.

Quanto à Ásia podem destacar-se os esforços de aproximação à Índia (foi de iniciativa portuguesa a primeira cimeira entre a UE e a Índia), as tentativas para manter as relações com a China em torno da Região Administrativa Especial de Macau e a normalização das relações com a Indonésia.

Por último, a diplomacia portuguesa tem em mãos o dossier da negociação com a Santa Sé da revisão da Concordata, questão de razoável delicadeza, já que se trata de optar entre a mera actualização de um documento claramente obsoleto ou de uma oportunidade para repensar as relações da Igreja e do Estado, após a adopção por Portugal da nova lei sobre liberdade religiosa.

 

Informação complementar

Novas missões diplomáticas

Um dos indicadores de orientações em política externa é seguramente o dos países onde existem representações diplomáticas e o das capitais onde novas missões são abertas.

Nos anos mais recentes, Portugal inaugurou diversas missões e esse movimento merece ser analisado. Se era previsível a abertura de missão diplomática em Zagreb, capital da Croácia, já é mais significativa a criação de outra em Ramallah, junto da Autoridade Palestiniana.

A principal transição, porém, verifica-se em relação à Ásia, em especial na região do sudeste asiático, onde foram abertas, naturalmente, a missão em Díli, capital de Timor-Leste, mas também as embaixadas em Manila, capital das Filipinas, e em Jacarta, capital da Indonésia. Aliás, durante a presidência portuguesa da União Europeia no primeiro semestre do ano 2000, foi aprovado um documento de estratégia para o relacionamento futuro entre a Indonésia e a UE. Ainda na Ásia, está prevista a abertura de embaixada em Kuala Lumpur, capital da Malásia.

Acrescente-se ainda a inauguração da embaixada portuguesa em Addis Abeba, com representação junto do governo etíope e da União Africana, o que parece confirmar a orientação de não limitar aos países lusófonos o relacionamento com o continente africano.

 

As traves mestras

Para além das orientações ora estruturantes ora circunstanciais, os responsáveis pela política externa portuguesa explicitam algumas traves mestras que constituem os próprios fundamentos da mesma: a identidade histórica, a adesão aos valores europeus e a vocação universalista.

A matriz mais profunda da política externa será porventura a própria identidade do povo português, nas suas raízes históricas e culturais, mas também nos seus projectos colectivos, nas suas grandes opções quanto à maneira de estar no mundo e na maneira como o seu Estado se relaciona com outros Estados no cenário da vida internacional.

Uma tal posição supõe um quadro de valores. Na doutrina actualmente adoptada, é dito que os princípios e os valores são os europeus, nos domínios humano, político, social e económico. Há um entendimento da pertença à Europa que inclui a adesão a um referencial que vai desde o respeito pelos direitos humanos, as liberdades públicas e o sistema democrático, até a um certo modelo social que a Europa tem cultivado.

Em terceiro lugar, o universalismo está presente na melhor tradição do modo como os portugueses se relacionam com os restantes povos. O país tem assim a possibilidade histórica de estabelecer pontes entre os vários continentes e de se aproximar do ideal da sociedade aberta, disponível para o multiculturalismo e para a convivência universal.

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