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Sistema de transportes e acessibilidades ibéricas no contexto europeu

Helena Marques, Rita Lages e Sérgio Nunes *

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Os países da Península Ibérica têm desenvolvido esforços no sentido de aumentar a quantidade e a qualidade dos respectivos sistemas de transportes, tendo em conta o sistema socioeconómico e físico envolvente. Pede-se a cada um dos países que encontre objectivos comuns capazes de dar resposta à estratégia anunciada pela Comissão Europeia de conjugação da procura crescente neste sector com a minimização do impacte ambiental decorrente, sendo indispensável o desenvolvimento de uma abordagem integrada e sistematizada de toda a problemática subjacente aos transportes e acessibilidades.

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Pensar em transportes e acessibilidades é pensar na capacidade de criar mobilidades e forças de sustentabilidade entre espaços físicos e sistemas socioeconómicos, conferindo-lhes crescentes potencialidades de, com base nessa integração, desenvolver níveis elevados de eficiência produtiva e consequente redistribuição de bem-estar económico e social.

No caso ibérico, ambos os países têm desenvolvido esforços conducentes a aumentar quantitativa e qualitativamente as possibilidades de transportes para quem neles habita ou por eles pretende fazer circular bens materiais ou imateriais.

Neste quadro, o sistema ibérico de transportes emergirá como um potencial instrumento de competitividade na medida em que demonstre capacidade de conferir a esse espaço geográfico funcionalidades convertidas, ou passíveis de por esse modo se virem a converter em desempenhos económicos, designadamente visíveis ao nível da qualidade de circulação de bens, serviços e pessoas.

Pede-se, pois, a cada um dos países que encontre objectivos comuns (ou pelo menos de homogeneidade de intenções) para as estratégias capazes de ajudarem a dar resposta ao desafio europeu que tem vindo a ser anunciado pela Comissão Europeia nos últimos anos. Por um lado, procura-se conciliar a cada vez maior procura de transportes com a necessidade de reduzir os seus impactes no ambiente físico, social e humano. Por outro lado, torna-se imperioso desenvolver uma abordagem sistémica e integrada no âmbito da problemática subjacente aos transportes e acessibilidades.

Uma vez que os diversos meios de transporte (ferroviário, marítimo, rodoviário, fluvial e aéreo) se encontram em diferentes fases de desenvolvimento e implementação, i. e., cada um deles, de per se, não tem capacidade de responder com eficácia às solicitações que lhes são feitas em termos de eficiência de transporte (cargas, itinerários, binómio espaço-tempo), torna-se necessário proceder à sua optimização numa perspectiva modal.

No entanto, esta perspectiva não se deve desligar de uma outra que tenha como estratégia a integração entre os diferentes modos de transporte aos níveis das infra-estruturas, exploração, procedimentos e regulamentação.

As opções dos dois governos nesta matéria bem como a sua coerência/articulação com as linhas de acção preconizadas pela Comissão Europeia consubstanciam-se em 3 documentos de referência: Programa Europeu de Acessibilidades e Transportes, Plano Operacional de Acessibilidades e Transportes (POAT – português) e Plan de Infraestructuras de Transporte 2000-2007 (PIT – espanhol).

A coerência dos objectivos e instrumentos, quer interna quer face às orientações supranacionais, parece estar relativamente assegurada, facto que se comprova, indirectamente, pelos montantes aprovados de financiamento comunitário de ambos os países e pelas pressões também comunitárias no sentido de conferir maior celeridade às acções preconizadas.

Infelizmente, o grau de coerência formal da estratégia preconizada no documento português, nomeadamente de criação de uma nova centralidade – consubstanciada na “Plataforma Atlântica da Europa” – não tem equivalência no grau de exequibilidade dos pressupostos que a permitiram enunciar.

Esta é uma posição que Espanha, realisticamente e de forma firme, evitou ao explicitar claramente o seu posicionamento periférico face aos centros de decisão e de produção europeus. Desta forma, a sua estratégia nesta área demonstra maiores possibilidade de êxito, já que assenta em pressupostos com maior aderência à realidade, aumentando, assim, a capacidade de ganhos de eficiência na utilização de recursos financeiros, físicos e humanos. A sua atitude mais realista reflecte-se, por exemplo, na defesa do sector rodoviário, justificada não só pela configuração do seu território, como também pela existência de zonas de enclave de extensão considerável, onde não existe massa crítica que torne viável uma aposta definitiva nos caminhos de ferro em detrimento da estrada. Estranha-se que o governo português não tenha adoptado uma posição similar à espanhola nesta matéria, promovendo ao invés corredores em que coexistem paralelamente estrada e caminho-de-ferro.

Quanto ao citado objectivo de transformar o espaço português numa “Plataforma Atlântica da Europa”, inserido no “Novo Modelo de Crescimento”, tem como instrumentos de actuação as seguintes orientações estratégicas: a internacionalização dos portos portugueses, procurando-se, deste modo, atrair novas escalas de navios, a construção do Novo Aeroporto Internacional de Lisboa na Ota, a Rede de Alta Velocidade, o Sistema Logístico Nacional, a modernização de algumas linhas ferroviárias e a conclusão do Plano Rodoviário Nacional.

 

O transporte marítimo

Na análise da problemática relativa à internacionalização dos portos portugueses, deve levar-se em linha de conta que, por um lado, cada vez mais as grandes empresas transportadoras procuram explorar de uma forma integrada e articulada os diversos modos de transporte e, por outro lado, os tráfegos marítimos estão cada vez mais concentrados em alguns grandes portos mundiais (1) (Hong Kong, Singapura, Roterdão, Antuérpia, Hamburgo, Felixtowe, Algeciras, Barcelona, Valência, Gioia Tauro) hierarquizados em termos de importância no que concerne ao respectivo tráfego.

No caso de Portugal, as vantagens/potencialidades que permitam sustentar a ideia da “Plataforma Atlântica da Europa”, são essencialmente:

• posição geográfica de Portugal face às Américas e à África;

• os portos portugueses são suficientemente “profundos” para a utilização de navios de grande porte, proporcionando benefícios que resultam do aumento da dimensão dos navios;

• Roterdão e Antuérpia (dois dos maiores portos europeus), devido ao intenso tráfego rodoviário e ferroviário nos respectivos hinterlands, vão perdendo eficiência, abrindo novos espaços à emergência de outros portos, desde que possuam boas ligações às Redes Europeias.

• aumento previsível do comércio internacional, resultante da entrada da China na Organização Mundial do Comércio, com possíveis reajustamentos de tráfegos transoceânicos.

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Por outro lado, podem ainda apontar-se algumas desvantagens/constrangimentos importantes que fragilizam essa ideia:

• posição geográfica descentrada de Portugal face ao centro da Europa;

• concorrência dos portos do Norte de África.

• as deficientes conexões com as Redes Terrestres e a inexistência de Corredores Axiais na direcção Este-Oeste;

• só uma quota muito fraca (em termos relativos) dos tráfegos marítimos é emitida ou recebida pelos portos atlânticos. Isto mostra a pequena dimensão dos seus hinterlands, que não ultrapassam as duas centenas de quilómetros para o interior, i. e., limites claramente regionais;

• Portugal, face ao atraso que demonstra face a Espanha (quantidade e qualidade dos portos, estrutura logística, modos de transporte) não tem outra alternativa senão procurar integrar-se e ter como referência a matriz espanhola já existente.

Deste ponto de vista, novas possibilidades de crescimento vão-se perfilando para portos e espaços que demonstrem possuir boas relações rodo e ferroviárias conectadas às Redes Europeias ainda não saturadas. Contudo, em termos de tráfego marítimo, dificilmente no quadro dos 50 portos mundiais poderão surgir “entradas” ou “saídas” de portos hoje considerados de menor importância, como é o caso dos portos nacionais.

Por outro lado, os portos portugueses encontrarão muitas dificuldades em assumir posições de relevo no âmbito da Fachada Atlântica. Bilbau e Bordéus procuram denodadamente assumir os lugares cimeiros como portos de escala para porta-contentores, embora Sines tenha, vindo a desenvolver esforços, através de uma parceria com o porto de Singapura, de modo a candidatar-se ao 1.º lugar desses portos.

No entanto, os portos portugueses não deixarão, a curto e médio-prazo de competir por um tráfego de menor dimensão, onde se incluem o tráfego de tramping e de feedering, devendo as acções entretanto desenvolvidas criar funcionalidades para a consolidação destes mercados.

 

Do aeroporto da Ota à modernização da rede ferroviária

A construção do aeroporto da Ota (2) e da Rede de Alta Velocidade, continuam envoltas em mistério e indecisões e não parece vislumbrar-se qualquer “luz ao fundo do túnel”. Isto apesar de existirem compromissos assumidos, quer em termos nacionais quer comunitários. Enquanto por parte das autoridades portuguesas, não parece existir grande clareza de opções (3), no que concerne à rede de alta velocidade, Espanha não tem dúvidas muito profundas e está a levá-la a todas as capitais provinciais.

Relativamente à modernização de linhas ferroviárias e apesar de se terem vido a realizar pesados investimentos em algumas linhas portuguesas (Norte, Beira Alta, Beira Baixa, Linha do Algarve, área metropolitana do Porto), as orientações estratégicas tomadas não parecem ter sido as melhores. Um exemplo elucidativo refere-se à continuada utilização da bitola ibérica (em novas construções e modernização de estruturas já existentes) em vez da introdução progressiva da denominada bibitola (bitola polivalente), por parte das autoridades nacionais.

A excepção relaciona-se com o futuro troço Sines/Badajoz, ligado apenas às redes transeuropeias.

No que concerne à linha do Norte, a modernização prossegue a um ritmo lento, mantendo-se algumas indecisões quanto ao grau de intervenção a efectuar em alguns dos seus troços. Em 2003, passará a haver comboios directos de Lisboa para o Algarve e em 2004, o comboio eléctrico chegará ao Algarve, altura em que toda a linha do Sul estará electrificada entre Lisboa e Faro. Há, contudo, um conjunto de casos que continuam com características obsoletas, como sejam a linha do Oeste, do Minho, do Leste, do Alentejo e do Algarve, bem como a generalidade da rede ferroviária de características regionais.

 

Aspectos conclusivos

Em síntese: face a todas as dificuldades de coordenação, articulação interna e integração modal; insuficiência de modos de transporte; falta de qualidade técnica e organizacional dos meio existentes (massa crítica), muitos deles obsoletos; indecisões das autoridades portuguesas nestas matérias, funcionando como entraves internos; e factores externos bloqueadores (Espanha enquanto líder ibérico; contexto europeu que confere à Península Ibérica uma posição de perifericidade, independentemente da perspectiva tomada) não parecem estar ainda reunidas condições objectivas para que Portugal se possa preocupar, no curto e médio prazo, com questões que não passem pela resolução de um conjunto de constrangimentos internos que coarctam qualquer possibilidade de ganhos de funcionalidades internas e articulações externas e de, por essa via, poder vir a desempenhar um papel de relevo no contexto do desenvolvimento de uma “Plataforma Atlântica da Europa”, estratégia que já de si enferma de sérias dificuldades de prossecução, quer face ao contexto da Península, quer ao processo histórico que caracteriza a criação de acréscimos de centralidade nesta matéria.

Isto não significa, obviamente, que não existam desde já oportunidades e condições para que sejam dados passos importantes e empreendidas acções que possam fortalecer o sistema nacional de transportes e as posições de Portugal em futuras negociações com parceiros externos. Importa, no entanto, realçar que muitos dos passos importantes a desenvolver são de natureza política e carecem de acordos mútuos e posições (ibéricas) concertadas.

 

Informação complementar

Sistema de transportes e a questão da logística

Outro aspecto fundamental no processo de criação de valor acrescentado a bens e serviços é a questão da logística. Esta é uma componente estratégica na actividade económica, factor de diferenciação dos sistemas produtivos, conferindo-lhes uma vantagem competitiva e de liderança. Cada vez mais, é importante eliminar sucessivos pontos de paragem e de retenção de stocks, fazendo das variáveis “tempo” e “contacto com o consumidor final” os dois elementos fundamentais da criação de riqueza.

O processo da consolidação do sector da logística iniciou-se com o PNDES, onde se refere que um dos desafios prioritários é precisamente a logística. Posteriormente, no POAT, foi atribuída ao sector a verba de 250 milhões de euros destinada a iniciativas e projectos na referida área. Como consequência, desenvolveu-se o Programa para o Sistema de Logística Nacional.

Este é um sector onde foram levadas a cabo um conjunto de iniciativas formais mas onde as transformações estruturais ainda estão por fazer. Importa discutir, de forma aprofundada, quais as finalidades e o grau de utilização garantida para as novas infra-estruturas bem como a sua articulação com as já existentes.

Por outro lado, o documento (POAT) preocupa-se mais com o aspecto das acessibilidades e com a questão do transporte em si, do que com a componente que hoje é considerada mais relevante, a gestão da cadeia de abastecimento. É necessário fazer a articulação entre a macrologística (componente de infra-estruturação e sua relação com os diversos meios de transporte, armazenagem e serviços especializados) e a micrologística (o sucesso de qualquer organização assenta num modelo operacional apropriado à actividade que se pretende gerir).

Pelo contrário, a Espanha põe em pleno funcionamento uma rede de plataformas logísticas em todas as regiões, interligadas e geridas numa perspectiva empresarial. A oferta espanhola é a todos os níveis mais apetecível, com custos mais baixos e com as suas plataformas pensadas de raiz e em associação com o potencial marítimo. Saliente-se a fortíssima intervenção das entidades públicas, sobretudo ao nível das Comunidades Autónomas, para a concretização deste tipo de infra-estruturas.

__________
1 O porto português melhor classificado é o de Lisboa na 94.º posição (1998). A área de influência de um porto e suas funcionalidades pode ser aferida pelas “linhas” que o escalam, pelos serviços que oferece e pelos tráfegos que serve.
2 As informações mais recentes apontavam para o adiamento da construção da nova aerogare para 2010.
3 A primeira proposta contemplava um “T deitado”, ligando parte do litoral português e com uma ligação a Madrid. Seguiu-se a versão do “deitado”, com duas saídas para Espanha (Lisboa-Badajoz e Aveiro-Salamanca). Actualmente, encontram-se em estudo várias propostas de trajecto no âmbito do Agrupamento Europeu de Interesse Económico, entre elas a ligação Porto-Vigo e Lisboa/Porto-Madrid.


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* Helena Marques

Licenciada em Economia pelo ISEG.

* Rita Lages

Licenciada em Economia pelo ISEG. Investigadora do CIRIUS

* Sérgio Nunes

Licenciado em Economia pelo ISEG. Mestre em Economia e Gestão do Território pelo ISEG. Docente no Instituto Politécnico de Tomar.

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Link em nova janela A posição do Porto de Sines nas rotas mundiais de transporte marítimo de contentores

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