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AQUI! Teve também efeitos de contágio no Uruguai e no Paraguai. O México,
os países da América Central e Chile, mais ligados à economia norte-americana,
apresentam melhores perspectivas de recuperação. Sobre a América Latina pairou então a sombra do desastre económico, as palavras contágio e colapso entraram rapidamente no léxico da região e as perspectivas de crescimento foram revistas em baixa.
O “efeito dominó” e a “carta” Brasil Os sinais da crise chegaram primeiro ao Brasil, onde o real, pressionado pela turbulência política das eleições que se aproximavam e as expectativas de vitória de um candidato de esquerda, conduziram a uma lenta, mas firme, desvalorização da moeda. Embora as diferenças entre os dois países sejam muitas – dívida externa no caso de Buenos Aires, sobretudo interna no Brasil, câmbio fixo de um lado e variação do real no outro, economia dependente e pequena no caso argentino, diversificada e maior no Brasil, com outra disciplina orçamental, tornando uma crise na balança de pagamentos menos provável – o nervosismo tomou conta dos mercados. Até porque as perspectivas não são muito animadoras: a economia brasileira enfrenta uma inflação superior ao esperado, as taxas de juro dispararam para mais de 20%, o superavite comercial é baixo, o sistema de pensões carece de uma profunda reforma e os riscos não param de aumentar com a dívida pública – 55% do PIB – a sublinhar a hipótese de um “default” no curto prazo. Ainda assim, ninguém tem dúvidas que a economia está bem mais forte agora que há três anos, quando se verificou uma massiva desvalorização do real. Incertezas de futuro não escondem uma séria evidência: o Brasil, pela sua dimensão na região, é uma peça-chave para o amainar da crise ou para a sua metamorfose num furacão imparável. Por agora, os piores ventos parecem ter passado. Quem não conseguiu escapar ao violento efeito “dominó” foi o Uruguai, onde se repetiram as cenas de pilhagem, pobreza e revolta social. Enquanto a Argentina ia lutando para resgatar os cacos da sua economia e respectivo furacão político, o Uruguai foi obrigado a abandonar o seu sistema de “currency-band” – um sistema fixado na lei que determina um nível da sua moeda doméstica face ao dólar – e deixou flutuar o peso. A moeda uruguaia afundou de imediato, agravando quatro longos anos de recessão económica. As reservas monetárias do Banco Central caíram 75% e desde o início do ano o peso já perdeu mais de quarenta por cento face ao dólar. O medo de que os particulares corressem para os bancos para levantar os depósitos em dólares – a maioria do legado bancário, tal como aconteceu na vizinha Argentina – obrigou ao encerramento do sistema bancário durante alguns dias, enquanto não foi assegurada uma injecção de capital, via FMI. Uma rápida ajuda que permitiu ao governo defender o seu sistema bancário e acomodar as reservas. A adopção de medidas de austeridade, a par de um inevitável plano de privatizações e emagrecimento do Estado, geraram o protesto nas ruas. Para agravar a situação, já de si débil no Mercosul, a crise estendeu-se também ao Paraguai. A economia enfrenta uma profunda recessão económica – crise bancária, moeda em queda – acelerada pela crescente instabilidade provocada por fortes rumores de um golpe de estado contra o presidente Luiz Gonzalez Macchi.
Crise em alta, expectativas em baixa As previsões apontam para uma recuperação da economia mundial a partir do segundo semestre de 2002 – uma retoma liderada pelos Estados Unidos – mas a diferentes velocidades, com valores menos ambiciosos para os mercados emergentes, com particular incidência na América Latina. A recuperação alcançada em 2000 e as esperanças de um novo ciclo de crescimento na região desapareceram depois da forte desaceleração da economia mundial no pós-11 de Setembro. A quebra na procura de produtos por parte dos Estados Unidos, a par da redução dos preços das matérias-primas e da crise financeira na Argentina, deixou marcas na América Latina. O México, os países da América Central e parte da zona andina – com uma ligação mais directa à economia norte-americana e respectiva influência comercial – vão ser os primeiros a recuperar. Um cenário diferente daquele que se irá viver na Argentina e restantes parceiros de integração, onde os sinais de retoma não só não são claros como podem ser arrebatados por novas crises. Não espanta, portanto, que seja o cone sul da América Latina o mais fustigado com a queda do PIB, ostentando em 2002, a par do Japão, o mais fraco índice de crescimento. As previsões melhoram, contudo, em 2003. O Mercosul deverá crescer cerca de 3 %, um valor superior ao da União Europeia e ligeiramente inferior ao dos Estados Unidos. Ainda assim, uma performance longe das perspectivas para os mercados emergentes, abaixo da economia mundial e atrás de todos os restantes agrupamentos regionais, incluindo os espaços vizinhos, cujos ventos da crise sararam de forma mais rápida, até porque se fizeram sentir, no caso andino e da América Central e Caribe, de forma menos tumultuosa. Num plano individual, a Argentina é, como se esperava, o país mais abalado pela derrocada. O seu PIB poderá vir a cair 15% em 2002, continuando com crescimento negativo no ano seguinte, abalado por uma inflação sem rival na América Latina. Se o contágio ficar por aqui, o Uruguai escapa da crise já em 2003 e o Brasil recupera, igualmente, para níveis similares a 2000. Chile e Equador vão liderar a retoma, com o registo mais negativo a pertencer à Venezuela, excluindo, claro está, o caso da Argentina.
Tempo de crise, tempos de mudança Se o futuro é ainda incerto quanto à dimensão do contágio, sobretudo se o poderoso Brasil entrar em “default”, já não restam dúvidas de ser esta a altura ideal para uma profunda mudança nas economias da América Latina, capaz de restabelecer a credibilidade das instituições e acalmar os investidores. Em todos os países do Mercosul, a recente crise voltou a tornar clara a tremenda falta de confiança dos mercados, minados pela ausência de duras reformas estruturais, um atraso que vai muito para além da recente irresponsabilidade demonstrada pela classe política argentina. Assim, a presente situação afigura-se como um novo ponto de partida que se torna imperioso não desperdiçar, à imagem do aconteceu em 1999 com a crise do real. O problema é que a introdução de programas de austeridade, destinados a estabilizar as finanças e a persuadir as agências internacionais a minorarem a crise financeira – injectando mais capital – caminhará de mãos dadas com os sinais de impaciência e revolta perante a crescente e justificada aversão das populações a maiores sacrifícios. A verdade é que depois da Argentina, violentos protestos obrigaram os governos do Peru e do Paraguai a adiarem os seus planos de reforma e privatização, e um pouco por toda a América Latina as oposições contestam a chegada, em tom apressado, do modelo “neoliberal”. Uma crescente instabilidade que constitui mais um factor de risco para a região, mas que parece incontornável, até porque os Estados Unidos já fizeram saber que toda a ajuda financeira aos países da América Latina depende de substanciais reformas económicas, como já explicou detalhadamente o secretário de estado do Tesouro, Paul O´Neill, para quem a crise é muito mais dos políticos e das suas más decisões do que das economias, ou pelo menos dos seus fundamentos.
Informação complementar América Latina: Três Crises em Dez anos Em apenas uma década, esta é já a terceira crise que devasta a América Latina, colocando em causa, uma vez mais, o ciclo de progresso e desenvolvimento económico na região. Embora, curiosamente, apresentando sintomas e causas diferentes, todas elas acabaram por gerar efeitos similares, traduzidos numa brusca redução do crescimento do PIB e dos volumes comerciais até então alcançados. México – A primeira crise eclodiu em 1995, no México, e apresentou um carácter localizado espraiando-se, depois, por via financeira. A desvalorização do peso mexicano, em Dezembro de 1994, originou uma fuga de capitais de vários países latino-americanos e obrigou à suspensão do financiamento externo. Para além do México, a Argentina foi o país mais afectado, acabando por arrastar depois o Uruguai, dentro do contexto do Mercosul. Uma derrocada ultrapassada em apenas três trimestres, fruto de uma retoma comercial, um forte crescimento mundial e uma massiva ajuda financeira aos países em causa. Ásia e “efeito caipirinha” – Diferente conjuntura teve a crise seguinte, com origem na Ásia, na segunda metade de 1997. Os efeitos para a região latino-ame-ricana foram comerciais e financeiros, visíveis numa drástica redução do preço das matérias-primas, agravada por uma precipitada fuga de capitais, cuja histeria se tinha feito sentir primeiro na Rússia, tombando depois na América Latina, através do Brasil. O fim da indexação ao dólar, a pesada desvalorização do real e a consequente desarticulação nas trocas do Mercosul prejudicou, sobretudo, a Argentina, firme na ligação à moeda americana, com todos os efeitos negativos para as suas exportações e mercado interno. O rápido crescimento da economia americana acabou por amortecer as consequências no espaço latino-americano, principalmente no México e na América Central. O “último tango” –
Ao contrário das anteriores, a crise actual apresenta maiores contornos
globais, porque, ainda que localizada na Argentina, é desencadeada por
uma profunda desaceleração da economia mundial. A sua projecção reflecte
sinais comerciais, com uma forte contracção dos volumes exportados, assim
como uma queda no preço das matérias-primas, influenciando todos os países.
A partir daqui, estavam lançadas as bases para o agravar de uma situação
precária na Argentina – há mais de quarenta meses em recessão – e o explodir
do caos financeiro e respectivos sinais de contágio na região. Projecções para a economia mundial
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