Pesquisa Avançada | Regras de Pesquisa | ||||
Onde estou: | Janus 2004 > Índice de artigos > O direito e a justiça em acção > O poder judicial e o exercício da justiça > [Criminalidade de estrangeiros julgada em Portugal] | |||
|
ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE
AQUI! Fruto da ausência de dados estatísticos relativos aos dois primeiros níveis desta pirâmide, o estudo que seguidamente se apresenta centra-se na intervenção judicial. Assim sendo, a análise assenta sobre o topo da pirâmide. Pretende-se identificar quais os actos ilícitos mais usualmente julgados em tribunal penal praticados, quer por estrangeiros, quer por portugueses. No que se refere aos dados dos tribunais, limitações na fonte de informação(1) inviabilizam uma desagregação por nacionalidade do autor, baseando-se a análise na dicotomia português/estrangeiro. Relativamente aos dados do sistema prisional, a Direcção Geral dos Serviços Prisionais produz relatórios estatísticos onde apenas alguns indicadores vão além dessa dicotomia, apresentando a nacionalidade do recluso. A análise incidirá sobre o ano de 2001 para os tribunais (2).
Arguidos estrangeiros em processos penais Em 2001 os arguidos estrangeiros em processo penal (3.548, equivalendo a 3,4% do total) eram, na sua esmagadora maioria, homens (89,5%) com idades compreendidas entre os 30 e os 39 anos (33,2%) e entre os 21 e os 24 anos (22,3%). Por sua vez, os arguidos portugueses detinham um peso de mulheres ligeiramente superior (11,3% contra 10,5% de estrangeiras), sendo mais usuais as idades entre os 30 e os 39 (27,2%) e entre os 40 e os 49 anos (25,3%). Por grandes categorias de crimes, em 2001, 27,8% dos arguidos estrangeiros foram presentes a tribunal na sequência de crimes contra a vida em sociedade. Os crimes contra o património (15,8%) e os crimes contra as pessoas (14,3%) são igualmente merecedores de destaque. Estes últimos são, em 2001, os mais frequentes junto dos arguidos portugueses (24,8%). Com pesos percentuais praticamente idênticos, seguem--se os crimes contra o património (18%) e os crimes contra a vida em sociedade (17,8%). Em 2001, o crime mais frequente dos arguidos estrangeiros em processo penal foi a condução de veículo em estado de embriaguez (21%). Associado a este, encontra-se o segundo delito mais usual na fase pré-julgamento, ou seja, a condução sem habilitação legal (16,7%). Posteriormente, surgem os crimes de emissão de cheques sem provisão e a ofensa à integridade física simples e privilegiada (ambos com 8,7%). O quinto crime mais comum dos arguidos estrangeiros foi o tráfico e actividades ilícitas, simples ou agravado (5,3%). Comparando com os crimes dos arguidos de nacionalidade portuguesa, detecta-se uma supremacia dos estrangeiros na condução de veículo em estado de embriaguez (21% contra 13,6%) e, principalmente, no tráfico e actividades ilícitas, simples ou agravado (5,3% contra 1,9%). Em sentido oposto encontra-se a ofensa à integridade física simples e privilegiada (8,7% contra 14,8%).
Condenados estrangeiros em processos penais A condenação em processo penal (3) implica necessariamente a prova do cometimento do acto ilícito pelo arguido. Desta forma, sobe-se mais um degrau em direcção ao topo da pirâmide. À semelhança do observado junto dos arguidos, também os condenados de nacionalidade estrangeira (2.500, equivalendo a 4,1% do total) são, na sua larga maioria, homens (92,1%) com idades compreendidas entre os 30 e os 39 anos (33,8%) e os 20 e os 24 (23%). Com o mesmo peso percentual de homens, os condenados de nacionalidade portuguesa são um pouco mais envelhecidos (48,3% detinham entre 30 e 49 anos). Por grandes categorias de crimes, destacam--se, relativamente aos condenados de nacionalidade estrangeira, os crimes contra a vida em sociedade (36,1%), com um peso relativo consideravelmente superior ao observado junto dos reclusos de nacionalidade portuguesa (27,8%). No ano de 2001, os crimes em consequência dos quais se verificou maior número de condenações de estrangeiros em Portugal foram a condução de veículo em estado de embriaguez (29%) e a condução sem habilitação legal (21,8%). Seguidamente, e a alguma distância, surge aquele que era o quinto crime nos arguidos, isto é, o tráfico e actividades ilícitas, simples ou agravado (6,4%). O furto qualificado (sexto dos arguidos) e as ofensas à integridade física simples e privilegiada (terceiro dos arguidos) representam 4,7% e 4,6%, respectivamente. Comparativamente com os crimes cometidos pelos condenados de nacionalidade portuguesa, observa-se junto dos estrangeiros um maior peso da condução de veículo em estado de embriaguez (29% contra 23%) e, novamente de forma acentuada, do tráfico e actividades ilícitas, simples ou agravado (6,4% contra 2,5%). Por tipo de penas ou medidas atribuídas, embora predomine a multa tanto junto dos estrangeiros (65,2%) como dos portugueses (69,8%), é na prisão não substituída e não suspensa (vulgarmente denominada prisão efectiva) que se detectam as maiores discrepâncias de valores, tendo os estrangeiros praticamente o dobro das condenações a pena de prisão efectiva (15,9% contra 8,1% dos portugueses). Supõe-se que esta última situação poderá advir da conjugação do facto de os estrangeiros terem um elevado peso relativo de condenados por crimes com uma moldura sancionatória mais “pesada”, como é o caso do tráfico de droga, com uma eventual atitude mais atenta, talvez mesmo persecutória, das instâncias formais de controlo social (polícias e tribunais).
Condenados estrangeiros a pena de "prisão efectiva" A condenação a pena de prisão efectiva pressupõe a prática de um crime grave ou a prática continuada, ou reincidente, de crimes “menores”. Os condenados a pena de prisão efectiva de nacionalidade estrangeira (397, representando 7,8% do total) são, na sua maioria, homens (89,9%), tomando agora primazia as idades compreendidas entre os 20 e os 24 anos (29,6%). Realce-se que, comparativamente com semelhante realidade junto dos portugueses, o peso relativo das mulheres estrangeiras (10,1%) é praticamente o dobro do das portuguesas (5,7%). Esta situação prende-se com o facto de o principal delito pelo qual as estrangeiras foram condenadas a prisão efectiva ter sido o tráfico de droga (65%). Contrariamente ao observado nos arguidos e nos condenados, igualmente nas condenações de portugueses a prisão efectiva as idades entre os 20 e os 24 anos se tornam mais significativas (27,2%). Por grandes categorias de crimes, realce--se o facto de os crimes contra a vida em sociedade passarem a representar apenas 4,8% dos crimes cometidos por estrangeiros condenados a pena de prisão efectiva. Por sua vez, os crimes previstos em outros diplomas (4) (44,6%) e os crimes contra o património (38,8%) são agora dominantes. Os condenados a pena de prisão efectiva de nacionalidade portuguesa afastam-se deste cenário, registando 29,1% e 51,6%, respectivamente. O tráfico e actividades ilícitas, simples ou agravado (vulgo tráfico de droga), quinto crime mais frequente dos arguidos estrangeiros e terceiro nas condenações, é agora o crime mais frequente, com 36% do total de condenações a pena de prisão efectiva. Seguidamente surge o roubo ou violência depois da subtracção (15,9%), nono crime mais frequente dos arguidos e sexto dos condenados. O furto qualificado (13,6%), sexto e quarto, o tráfico de quantidades diminutas, de menor gravidade ou tráfico-consumo (5,3%), décimo segundo e décimo primeiro, e o furto (3,5%), sétimo e nono, são outros crimes na origem de uma condenação de estrangeiros a pena de prisão efectiva. Destaque-se ainda o facto de o crime de homicídio simples e qualificado (3,5%), detendo um peso irrelevante tanto nos arguidos como nos condenados, surgir aqui como o quinto crime mais usual. Os portugueses condenados a pena de prisão em consequência do tráfico de droga são consideravelmente menos que os estrangeiros (36% contra 20,6%). Já relativamente ao furto qualificado, a situação inverte-se (13,6% contra 27,3%). Conclui-se, assim, que dos dois crimes que, em sede de início do processo penal, eram mais comuns aos arguidos estrangeiros, não resultam necessariamente condenações a prisão efectiva. Estas surgem maioritariamente na sequência de crimes menos relevantes na fase inicial do processo penal, como o tráfico de droga ou roubos e furtos.
Informação Complementar Estrangeiros reclusos na UE No contexto europeu, Portugal apresenta uma das diferenças menos pronunciadas entre a proporção de estrangeiros na população nacional e a proporção de estrangeiros na população prisional. O peso relativo de estrangeiros no universo de reclusos em Portugal, longe de ser alarmante, é o quarto mais baixo de toda a União Europeia.
Estrangeiros residentes versus estrangeiros reclusos A associação entre os termos estrangeiros e imigrantes tende a favorecer ilações fáceis que são apostas como estigma. Na verdade, um imigrante é um estrangeiro. Mas um estrangeiro num determinado país pode não ser um imigrante. Pode ser um turista, um homem de negócios, um viajante, etc. O mesmo se passa no universo dos reclusos estrangeiros em Portugal. Ao comparar o peso percentual e a evolução dos estrangeiros nas prisões portuguesas com o peso percentual e evolução dos estrangeiros a residir legalmente em território nacional, é necessário ter em conta que, embora todos eles sejam estrangeiros em Portugal, nem todos aí serão imigrantes. Durante a década de 90 e anos mais recentes, o peso relativo dos estrangeiros no universo total de reclusos tem sido sempre significativamente superior ao dos estrangeiros no total da população nacional. Em finais de 2002 os reclusos estrangeiros representavam 15,2% do total da população prisional, contra aproximadamente 4% de estrangeiros legais em Portugal. A existência de uma percentagem de estrangeiros em reclusão superior à percentagem de estrangeiros legalmente registados no país é consequência de vários factores conjunturais. Entre estes assoma o facto de muitos destes serem pobres. Os estrangeiros que encontramos como reclusos nas prisões integram-se, na sua maioria, nos estratos mais baixos da sociedade portuguesa. Vieram preencher o nicho económico deixado vago pelo desaparecimento do operariado não especializado nacional que, por sua vez, se foi extinguindo, quer por mobilidade intergeracional ascendente, quer por emigração. Portanto, não é de surpreender que sejam os pobres os mais “apanhados” a infringir a lei (não necessariamente por racismo mas certamente por “classismo”); que tendo sido “apanhados”, sejam condenados numa maior proporção (defesas oficiosas menos eficientes, dificuldades linguísticas, etc.); e que entre os crimes que praticam se destaquem os crimes mais graves, escolhidos por serem aqueles que possibilitam maiores proveitos. Arguidos 2001 - 5 principais crimes cometidos (em %) Condenados 2001 - 5 principais crimes cometidos (em%) Condenados a "Prisão efectiva" 2001- 6 principais crimes cometidos (em%) Reclusos estrangeiros no contexto europeu Estrangeiros na população nacional e no sistema prisional
|
|
|||||||