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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! China: impressões e surpresas Situada no Leste da Ásia, a China é o terceiro maior país do mundo em dimensão. Os seus 9,6 milhões de km2 de superfície total colocam-na apenas atrás do Canadá e da Rússia e próximo do território continental dos Estados Unidos. As fronteiras terrestres chinesas prolongam-se por 22 mil km, cruzando-se com a Rússia, Índia, Coreia do Norte, Mongólia, Kasaquistão, Vietname e Myanmar (ex-Birmânia), entre outros. A costa marítima estende-se por mais de 18 mil km. Em termos populacionais é a maior nação do mundo, com uma população estimada, em meados de 2004, de 1.298 milhões de pessoas (2), o que representa um quinto da população mundial. A densidade populacional é de 135 pessoas por km2 , ou seja, quatro vezes mais do que os EUA, mas relativamente próxima da densidade populacional de Portugal (114 pessoas por km2 ) (3). A média de idades dos chineses é actualmente de 31,8 anos, com cerca de 70% da população concentrada na faixa etária dos 15-64 anos (22% entre 0 e 14 anos e 8% de idosos). Apesar das severas políticas governamentais de controlo da natalidade, a respectiva taxa é claramente superior à taxa de mortalidade (por cada mil habitantes nascem 13 crianças e morrem cerca de 7 cidadãos), o que assegura a continuação do elevado ritmo de crescimento populacional do país. É de referir que em 1949 (data da fundação da República) a população chinesa não ultrapassava os 542 milhões de habitantes, o que significa que, desde então, a taxa média de crescimento anual da população chinesa foi de 1,6%. Por outro lado, nos últimos 10 anos, a população chinesa aumentou a um ritmo de 0,8% ao ano, pelo que, a manter-se este ritmo, serão necessários pouco mais de 50 anos para que se atinja a impressionante cifra de 2 mil milhões de pessoas. Em termos étnicos, a população é maioritariamente han (91,6%), repartindo-se os restantes por cerca de 55 minorias étnicas pouco representativas. Deste modo, com excepção dos casos específicos do Tibete, anexado pela China em 1950, após 38 anos de independência do domínio chinês, e de Taiwan, que a China continua a reclamar como província sua, não parecem existir focos de conflito étnico ou político significativos. A China está dividida em 23 províncias administrativas (sendo a 23 a , do ponto de vista das autoridades chinesas, Taiwan), 5 regiões autónomas (nomeadamente o Tibete), 4 municípios (correspondentes às maiores cidades, i.e., Pequim, Xangai, Chongqing e Tianjin) e duas regiões administrativas especiais (Hong Kong e Macau). O poder legislativo pertence ao Congresso Nacional do Povo (e respectivos comités), o qual é representativo dos diversos congressos do povo (municipais, regionais e provinciais), sendo eleito por cinco anos. Nos seus poderes incluem-se a eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República, bem como do Conselho de Estado, o órgão mais alto do poder executivo do Estado. O Presidente da República, por sua vez, tem a incumbência de nomear o Primeiro-Ministro, numa decisão que terá posteriormente de ser ratificada pelo Congresso Nacional do Povo. O poder político e administrativo está, na prática, controlado pelo Partido Comunista Chinês, que se confunde com o próprio Estado, de que é exemplo sintomático o facto de o Presidente da República ser simultaneamente Secretário-Geral do Partido (esse sim, o cargo mais importante no país). Esta identificação do Partido Comunista com o Estado é também visível a nível dos restantes órgãos de soberania, designadamente a chefia do Governo e do Congresso do Povo. A este propósito, a última alteração constitucional (em 2004) é ilustrativa da forma como se encontra organizado o poder político na China. O notável progresso que representou a inclusão na Constituição da tese dos Três Representantes (de Jiang Zemin), ou seja, a ideia de que o Partido Comunista não é apenas o representante da classe operária, mas sim das forças produtivas, das forças culturais e dos interesses fundamentais da maioria da população (o que naturalmente inclui as empresas) corresponde, simultaneamente, à reafirmação da identidade Estado/Partido (4). O sistema legal é particularmente complexo, baseando-se numa amálgama de tradição e sistema instituído, sobretudo no que diz respeito ao regime criminal. Desde 1987 está em vigor um código civil muito rudimentar, estando a ser desenvolvidos internamente esforços para melhorar, não só esta área, como também os códigos administrativo, criminal e comercial. O poder judicial está dividido em 3 níveis: Supremo Tribunal do Povo, cujos juízes são eleitos pelo Congresso Nacional do Povo, Tribunais Locais do Povo, que compreendem as diversas instâncias, e Tribunais do Povo, centrados sobretudo a nível militar, marítimo e dos caminhos-de-ferro. A religião está pouco enraizada no país, estimando-se que o número de crentes se situe em torno dos 100 milhões, dos quais a maioria é budista (os cristãos deverão corresponder aproximadamente a 3% da população chinesa). Algumas contradições Durante décadas, a economia chinesa seguiu um modelo rígido de economia planificada, sem abertura à iniciativa privada ou ao capital estrangeiro. Os primeiros sinais de abertura (ainda tímida) apenas foram visíveis em 1978, com o aumento da influência das organizações não estatais a diluir parcialmente o controlo do partido no poder, a colectivização das terras a dar lugar a alguma responsabilização por parte das famílias e de organizações de âmbito local (vilas e aldeias) e o aparecimento de pequenas empresas nos serviços e nalguns sectores da indústria. Desde então, a China deu passos expressivos no que diz respeito à abertura da economia ao investimento estrangeiro e, embora em muito menor escala, ao comércio externo. Assim se entende o aumento expressivo, nos últimos anos, do investimento directo estrangeiro no país e também das importações. Foi, aliás, notável o sucesso das negociações tendentes à adesão do país à Organização Mundial do Comércio, onde a China poderá vir a assumir um papel preponderante. Essa abertura ao exterior tem sido igualmente observada a nível do sector financeiro, com a participação crescente de instituições estrangeiras no sistema financeiro, embora a níveis ainda muito incipientes (os bancos estrangeiros a operar na China, sobretudo através de sucursais ou escritórios de representação, detêm cerca de 1,5% do total dos activos do sistema financeiro). Apesar de todos estes desenvolvimentos positivos, em bom rigor não se deveria falar na economia chinesa, mas sim nas várias economias que coexistem na República Popular da China. Na verdade, por detrás de uma economia próspera na Costa Sul (5), muito aberta ao sistema capitalista e que produz os bens que vão depois afluir em massa aos mercados europeus e norte-americanos, a preços inigualáveis, esconde-se uma realidade bastante complexa, com 800 milhões de pessoas a viver em condições precárias. As contradições latentes na República Popular da China podem ser ilustradas por alguns exemplos: • O Estado controla ferreamente a economia e os seus cidadãos e, no entanto, os índices de corrupção, designadamente a nível do próprio Estado e do poder político, são muito elevados. Segundo os dados da Transparency International (uma importante Organização Não Governamental), a China estava colocada, em 2004, na 71 a posição do Corruption Perception Index (6). • Também não é completamente exacta a imagem que se deixa passar para o exterior de uma sociedade bem organizada e disciplinada: por detrás de toda esta aparente tranquilidade, esconde-se uma realidade por vezes divergente, em que o mal-estar social é traduzido em greves nas zonas rurais e nas cidades industriais. Segundo um estudo recente (7), terão ocorrido em 2001 cerca de 10 mil acções de protesto na indústria, a maioria das quais relacionadas com questões salariais e de pensões. • A população chinesa é maioritariamente rural (62%) e dedica-se à agricultura (cerca de 44%), embora o produto gerado por este sector se quede pelos 14,3% (a indústria corresponde a 53,3% e o sector terciário a 32,4%); Para além disso, o modelo de crescimento seguido tem gerado desequilíbrios a nível regional e sectorial, com repercussões directas numa desigualdade flagrante na distribuição do rendimento. A nível regional , uma vez que o modelo de crescimento se baseia no incentivo do investimento externo que se dedica à produção de mercadorias para exportação. Ora, este tipo de investimento concentra-se naturalmente junto às zonas costeiras, e urbanas, aumentando assim as disparidades entre o mundo urbano e o mundo rural. É de notar que o rendimento per capita nas cidades chega a ser mais do dobro do que no campo, o que revela uma distorção absoluta do modelo de crescimento, dado que cerca de 60% do mercado potencial se situa no mundo rural. Este desequilíbrio gera uma situação social potencialmente explosiva, num contexto em que é permanente a disputa entre Pequim e as autoridades locais em matéria de competências sobre a posse da propriedade e a recolha dos respectivos rendimentos (designadamente a nível fiscal). A nível sectorial , é patente o desequilíbrio entre o sector exportador (e o da construção/habitação) e outros sectores importantes da economia, designadamente o dos serviços. Por tudo isto, não será de surpreender se, de um momento para o outro, ocorrerem alterações de cariz económico, ou mesmo social, absolutamente inesperadas e que alterem todo o aparente curso da história recente (nomeadamente em termos da maior abertura da economia ao exterior) da República Popular da China. Em qualquer dos casos, independentemente da justeza dos argumentos extremos sobre a China, com alguns a defenderem que esta será a maior economia mundial no final da primeira década deste século (devendo brevemente estar em condições de disputar a liderança económica do mundo com os Estados Unidos da América), enquanto outros prognosticam a impulsão do gigante chinês (talvez destruído pela corrupção que a abertura recente ao capitalismo deixou bem visível), a verdade é que estamos perante uma economia progressivamente mais preponderante em termos mundiais.
Informação Complementar A CHINA E PORTUGAL Ao nível estritamente político são conhecidas as boas relações existentes entre Portugal e a República Popular da China, a que não foi alheia a forma exemplar como decorreu a transição da soberania em Macau. No entanto, as boas relações existentes entre os dois países, e o facto de Portugal estar representado em Pequim aos mais variados níveis (tanto a nível diplomático como no quadro das organizações de apoio de âmbito económico) não parecem encontrar correspondência nas relações comerciais. Deste modo, verifica-se que as exportações portuguesas para a China atingiram, em 2004, 101 milhões de euros, o que representa apenas 0,4% do total das nossas exportações. Os dados das importações são igualmente esclarecedores: 459 milhões de euros, ou seja, 1% do total.1 A Constituição inicial data de 1954, mas a actual remonta a 1982, tendo sofrido alterações por 4 vezes, a última das quais em Março de 2004. 2 Dados que não incluem a população chinesa que vive em Hong Kong e Macau nem, naturalmente, a província (ainda) chinesa de Taiwan. 3 Ainda assim, a densidade populacional na China é relativamente baixa para os padrões asiáticos: no Japão é de 337 pessoas por km2 e, na Índia, atinge 324 pessoas por km2... 4 É todavia de assinalar a importância dos passos dados em 2004 em matéria constitucional, nomeadamente no que diz respeito à consagração do critério de inviolabilidade da propriedade privada, o que ocorre pela primeira vez na história da República Popular da China. 5 É de assinalar, apesar das disparidades regionais ainda existentes, o esforço das autoridades em desenvolver outras áreas do país, nomeadamente a zona mais ocidental (o Noroeste), bem como as remotas regiões do Nordeste, nomeadamente as três províncias da Manchúria (Liaoning, Jilin e Heilongjiang). 6 O índice mede a corrupção a nível do Estado, numa escala de 0 (altamente corrupto) a 10 (ausência de corrupção). A China registou, em 2004, o valor de 3,4, abaixo de parte significativa de países da região (Singapura: 9,3; Hong Kong: 8,0; Japão: 6,9; Taiwan: 5,6; Malásia: 5,0; Coreia do Sul: 4,5; Tailândia: 3,6). 7 O estudo intitula-se “ China: a Five Year Outlook ”, da Oxford Analytica, em associação com a Oxford Economic Forecasting. * Henrique Morais Licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). Mestre em Economia Internacional pelo ISEG. Docente na UAL e na Universidade do Algarve. Assessor do Banco de Portugal. Membro do Conselho Directivo do Observatório das Relações Exteriores da UAL. Estrutura do comércio externo português (2003-2004)
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