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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! A China e a Índia, grandes actores da cena petrolífera As causas para esta situação compreendem múltiplas razões que vão desde a oferta condicionada pela concentração das reservas e da produção nalguns países do Médio Oriente, à lógica dos novos investimentos na prospecção e a uma procura em aceleração, alimentada “artificialmente” por uma componente especulativa. Entre as razões que contribuíram para estimular a procura de crude figura a dinâmica que os dois colossos asiáticos vêm impondo, já que a RPC foi responsável por um terço do aumento da procura global registada em 2003 (1,7 milhões e barris/dia).
O crescimento económico-social e a procura de energia Por detrás desta pressão encontra-se o surto de crescimento que a RPC regista que, desde inícios da década de 80, se traduziu em ganhos anuais reais do PIB da ordem dos 9,5%, tendo, em 2003, este país ascendido ao segundo lugar à escala planetária em termos de paridades de poder de compra. Tomando a decomposição sectorial da produção, constata-se a prevalência da indústria transformadora que, em 2002, gerou 42,2% da riqueza criada, destacando-se os ramos pesados a par de actividades mais orientadas para a exportação, características que redundaram, no facto de, naquele ano, o sector ter sido responsável por 68% da energia total consumida. O fenómeno da industrialização acelerada da sociedade chinesa teve contraponto na imersão dum país com 1.300 milhões de habitantes e reduzido crescimento demográfico num processo de urbanização sem paralelo, originando 44 cidades com mais de 1 milhão de habitantes, tendência que se deverá agudizar, estimando as autoridades que, até 2020, as migrações venham a envolver 300 milhões de pessoas. Ora, as necessidades em energia das populações urbanas são bem superiores às das rurais, recorrendo as primeiras ao consumo de combustíveis fósseis, em detrimento das soluções ancestrais centradas na “biomassa e desperdícios” dada, p.e., a emergência do parque automóvel, quase integralmente dependente do petróleo. Assim, na China entre 1999 e 2003, os incrementos anuais no número de veículos foram de 75%, tendo neste último ano, as vendas e os stocks superado respectivamente, os 2 e os 24 milhões de unidades, o que se traduziu no reforço do peso dos transportes no consumo final de energia que duplicou no septénio terminado em 2002, ano em que alcançou 10% daquele total. Por sua vez, a Índia teve uma evolução algo similar ainda que específica, onde avultam um ritmo de crescimento demográfico muito mais vivo que, entre 1973 e 2001, ascendeu a 2,1% ao ano, e uma expansão económica mais moderada e irregular, tendo nas duas últimas décadas o PIB obtido ganhos anuais médios de 5,8%. Tais dinâmicas redundaram numa população de 1.035 milhões (2001), e em níveis médios de desenvolvimento socioeconómico mais modestos, já que os actuais níveis de capitação do PIB são pouco superiores a metade dos alcançados pela RPC. Quanto à decomposição sectorial da produção constata-se elevado peso dos sectores primário (22%) e terciário (50,8%), com subalternização da indústria (27,2%), com aposta nos serviços com conteúdo tecnológico ( software ), e em nichos de indústrias especializadas, como a química e a farmácia. Por outro lado, no início do presente século, a taxa de urbanização tinha alcançado 27,8%, assistindo-se, a partir da década de 90, à redução do seu ritmo de crescimento, o que denota uma dinâmica mais amortecida, que terá sido ditada, no quadro duma democracia parlamentar, pela prevenção dos extensos conflitos sociais que vêm grassando no país vizinho. Em função dos elementos atrás expostos não admira que também o grau de desenvolvimento do parque automóvel indiano seja bem mais modesto, já que no último quinquénio o respectivo crescimento anual ascendeu a 5,3% enquanto, em 2004, as vendas de veículos atingiram 755 mil unidades. No intuito de focalizar a evolução do panorama da procura de energia nestes dois países apresenta-se um quadro em que se assume uma óptica retrospectiva de longo prazo tendo como anos extremos 1971 e 2002. Assim, a procura de energia nos dois países asiáticos registou ritmos de expansão muito vivos e algo semelhantes, de que resultou o claro reforço destes no panorama global em análise, com a RPC a ocupar uma situação muito mais proeminente, já que em 2002 representou 12,0% do total mundial, enquanto a Índia se ficou pelos 5,2%. Numa breve análise do quadro é de salientar a subalternização a que, no caso chinês, foi remetido o item “Biomassa e Desperdícios”, a aferir a mais rápida generalização das fontes de energia “comerciais”, o que se traduziu em perdas estruturais consideráveis, tendência que também se fez sentir na Índia, ainda que assente numa base mais “arcaica” e mediante um ritmo de “substituição” bem mais modesto. No que respeita às restantes fontes, é de assinalar, no caso da RPC, a predominância do carvão, sobretudo, no domínio industrial e na geração de electricidade, a enorme e crescente pressão das necessidades em hidrocarbonetos, especialmente petróleo, dada a reduzida expressão da difusão do gás natural, a que será de acrescentar os esforços desenvolvidos relativamente a outras origens (nuclear e hídrica). Quanto ao petróleo, são de assinalar ritmos crescentes na sua utilização, revelando as ópticas do longo, de médio e de curto prazos, crescimentos anuais que, pela mesma ordem, ascenderam a 5,8, a 6,8 e a 16%, resultando que, em 2002, esta fonte representava 20% da oferta de energia primária. No caso da RPC esta situação traduz-se no aparecimento e no reforço da dependência externa, com início em 1993 que, em 2002, redundaria no facto de o país se tornar o segundo importador de crude , com um grau de auto-aprovisionamento de 65,7%, enquanto no caso da Índia a crescente procura de petróleo se saldou por uma dependência bem mais acentuada, de 70% em 2002, isto, não obstante o consumo deste país representar apenas 42,3% do país vizinho. Deste modo, ambos os países defrontam o problema do abastecimento em petróleo, sendo que na Índia as reservas ascendem a 4,7 mil milhões de barris, ou menos de 6 anos do nível do consumo de 2002, enquanto na China o nível estimado para este indicador era de 12,7 anos, ou 24 mil milhões de barris. O reforço do aprovisionamento externo Para responder a estas fragilidades, ambos os governos têm reforçado a pesquisa e exploração internas de novos recursos em crude e gás natural. É assim que a RPC tem avançado nas zonas com maior potencial, localizadas quer nos mares do Sul da China, marcadas por conflitualidades regionais por vezes exacerbadas, quer em áreas remotas, localizadas, sobretudo, a oeste do país. De salientar que a China National Offshore Oil Corporation Limited (CNOOC Ltd.), empresa focalizada na exploração de hidrocarbonetos no offshore , recorre aos “contratos partilhados de produção”, admitindo a presença de estrangeiros. Quanto à Índia, onde a prospecção se encontra mais atrasada, regista-se, desde 1997, o recurso à NELP ( New Exploration Licencing Policy ), cujas cinco fases de leilões competitivos atraíram capitais externos, ainda que a principal beneficiada seja a ONGC ( Oil and Natural Gas Corporation Ltd ), empresa controlada pelo Estado, cujos maiores sucessos foram a descoberta de petróleo no Rajasthan, pela britânica Cairn Energy (2004), e de gás natural, no “ offshore ” ao largo da Baía de Bengala (2002), pela Reliance Energy , o maior operador privado autóctone do sector energético. As crescentes necessidades e a manifesta incapacidade de lhes dar resposta, como comprova o crescente esgotamento das grandes jazidas de Daqing (RPC) e Bombay High Field (Índia), conduziram à procura de novas soluções que passaram, para além dos esforços de modernização e afirmação competitiva das respectivas esferas empresariais, pelo recurso acrescido ao exterior. Esta última política tem tido como vectores principais o investimento na aquisição de interesses de produção, a dinamização da contratualização de fornecimentos de longo prazo e a celebração de acordos internacionais para a implementação de pipelines . Assim, o investimento na aquisição de interesses de produção corresponde a um vector altamente privilegiado que, para além da segurança de abastecimento, permitirá embaratecer a factura energética, importando reconhecer, em especial no caso da China, a ênfase, quer no reconhecimento da relevância do Médio Oriente, quer na procura de fornecedores alternativos. É que os países englobados no primeiro grupo facultam um acesso mais imediato e detêm o essencial das reservas conhecidas; por sua vez o segundo corresponde à entrada ou à afirmação de novos produtores, i. é., países africanos (Argélia, Sudão, Níger, Gabão e Angola), e sul-americanos (Venezuela, Peru, Brasil), isto sem esquecer os esforços de aproximação face às areias betuminosas do Canadá. Aliás, os chineses têm sido muito mais consistentes do que os indianos na prossecução destas orientações, já que, até finais de 2004, as transacções efectuadas pela CNPC, empresa que tem centralizado estes interesses, representaram 11,5 vezes o valor das efectuadas, no mesmo período, pela homóloga indiana ONGC/OVL, ou seja, em termos de stock , respectivamente, 40 e 3,5 mil milhões de dólares. É que o acesso dos indianos a este instrumento tem passado pela aquisição de posições minoritárias num âmbito geográfico mais limitado, ainda que, e à semelhança dos chineses, se tenham associado a projectos situados nos países “párias” (Irão, Sudão e Myanmar), de que o Greater Nile Project é o exemplo mais emblemático. O claro atraso da Índia neste domínio parece, entretanto, estar em fase de correcção, sendo perceptível tanto no plano das preocupações dos seus dirigentes quanto na perspectiva do desenvolvimento dos negócios; em especial, no que respeita à “frente” russa, a ONGC pretende investir, no médio prazo, cerca de 20 mil milhões de dólares. Outra solução que contribuirá para reforçar a segurança dos abastecimentos é a dinamização da contratualização destes últimos numa óptica de longo prazo, importando, sobretudo, referir a recente celebração de dois meganegócios no domínio do gás, ambos envolvendo a China e tendo como parceiros o Irão e a Arábia Saudita. Assim, o negócio com os iranianos envolve 100 mil milhões de dólares, enquanto o celebrado com os sauditas tem especial significado pelo facto de estes terem subalternizado os EUA no contexto de várias adjudicações de grande dimensão. Quanto à construção de pipelines está em causa o acesso ao abastecimento externo por via terrestre, abrindo a possibilidade de estabelecer ou melhorar a inserção das redes nacionais destas infra-estruturas no seu contexto regional, opção importante dados os custos e a insegurança crescentes associados ao transporte marítimo, em particular, no estreito de Malaca. Assim, a RPC, país que vem empreendendo enormes esforços neste âmbito, deverá concluir, em 2005, a construção de 12.000 km de novos oleodutos e gasodutos a que se deverão adicionar, no período de execução dos dois próximos planos quinquenais a iniciar em 2006, um total de 20.000 km destas infra-estruturas. A componente internacional destes esforços passa pela execução do “siberiano”, cujo términos fez ressaltar os antagonismos regionais envolvendo russos face a japoneses e chineses, acabando por vingar a solução que penaliza estes (Nakhodha); outro projecto também emblemático das contradições do relacionamento sino-russo, é a ligação ao Cazaquistão, com cerca de 1.000 km e orçando 3,5 mil milhões de dólares. Quanto à Índia, defronta um panorama bem mais complexo, resultante, sobretudo, do quadro regional muito conflituoso em que o país vive, colocando-se como soluções, o pipeline da Paz, a articulação a Myanmar e o fornecimento a partir de repúblicas da Ásia Central, antes integradas na ex-URSS. Relativamente à primeira daquelas hipóteses, que facultaria os fornecimentos do Irão, prevê-se a construção de infra-estruturas com uma extensão de 1.700 km e um custo orçado em 4 mil milhões de dólares, colocando-se dois grandes obstáculos, um decorrente das opções regionais dos EUA, que pretendem impor a criação de um corredor leste-oeste seguindo a “rota da seda”, derivando o outro dos históricos antagonismos indo-paquistaneses, no presente algo amortecidos. Por sua vez os fornecimentos a partir de Myanmar implicam a construção de um gasoduto numa extensão de 900 km, ligando o offshore de Shwe field ao terminal indiano de Kolkata, o que implica atravessar o Bangladesh, outro inimigo dos indianos, e a aceitação da RPC, um aliado tutelar dos birmaneses, que impuseram contrapartidas de idêntica natureza. Por fim, no que respeita ao recurso às Repúblicas da ex-União Soviética (Cazaquistão, Quirguistão e Tajiquistão), existem dificuldades ditadas, quer pelo relacionamento preferencial com a aliada Rússia, quer pela necessidade de atravessamento de territórios pertencentes ou à China ou ao Paquistão, ambos inimigos figadais da Índia.
Informação Complementar AS PERSPECTIVAS DE LONGO PRAZO A análise precedente assumiu, essencialmente, cariz retrospectivo, pelo que passaremos a considerar as evoluções prospectivas de longo prazo, admitindo-se, para isso, o cenário de referência apresentado pelo WEO 2004, mediante o qual, no futuro, não só os dois gigantes asiáticos reforçarão o seu peso na procura de energia primária, como dependerão mais fortemente do exterior para se abastecerem em petróleo. Com efeito, de acordo com aquela fonte, até 2030, a China e a Índia registarão incrementos médios anuais na procura de energia primária de, respectivamente, 2,6, e 1,7% tendo, pela mesma ordem, que importar 75, e 90% das suas necessidades em crude . O “motor” de tais incrementos deverá corresponder ao factor mobilidade. Em particular, e no que respeita à China, W. Jiang estima um acentuado crescimento do parque automóvel, por forma a atingir os 130 milhões de viaturas em 2020, ano em que, segundo o mesmo autor, esta vertente seria responsável por cerca de 50% do consumo de petróleo no país. Mesmo tratando-se de meros cenários, a verdade é que as evoluções previstas são preocupantes tanto em termos ambientais como no domínio da crescente punção de recursos particularmente escassos, tendo este último aspecto como consequência uma acrescida conflitualidade internacional pelo controle das fontes energéticas em causa (cf. o episódio recente da procura de controle da Unocal). Atendendo à escala de consumos envolvidos, o mero reforço nos níveis da eficiência energética será insuficiente, pelo que se torna necessária a ruptura do actual paradigma centrado no petróleo, parecendo emergir, por mais promissores, a gaseificação do carvão (RPC), bem como um hidrocarboneto não convencional abundante na Índia, o coal bed methane .* Carlos Costa Nunes Licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Economia (ISE) e pós-graduado em Gestão de Projectos pela Universidade Aberta de Lisboa. Assessor Principal do Departamento de Prospectiva e Planeamento (DPP). Desempenhou funções técnicas e de chefia nos SPECE (Macau) e no DPP (DSISPA). Colaborou em projectos de coordenação técnica em Angola e na Guiné-Bissau. China e Índia: procura de energia primária
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