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A política de cooperação da União Europeia

Maria Manuela Afonso *

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A política de cooperação para o desenvolvimento é actualmente, a par da política externa de segurança comum (PESC) e da política comercial comum, um dos pilares essenciais da actuação externa da União Europeia (UE).

Nas últimas quatro décadas a cooperação para o desenvolvimento da Comunidade evoluiu de uma atenção fragmentada a países com os quais os Estados-membros (EM) tinham fortes laços coloniais, ou outros, para o estabelecimento de quadros de cooperação e parceria regional com uma cobertura quase global. À medida que a UE se foi aprofundando e alargando a novos membros, os laços e relações especiais com países terceiros, sejam eles vizinhos geográficos ou ex-colónias, levaram ao estabelecimento e aprofundamento das relações de cooperação e de ajuda ao desenvolvimento. Por outro lado, o contexto histórico e as mudanças internacionais foram influenciando a política de Ajuda, visível na variação da sua composição regional, por razões políticas e contextuais, como adiante se verá.

 

Até aos anos 80

Embora sem existência legal nos primeiros Tratados, pode afirmar-se que a cooperação para o desenvolvimento começou em 1957 com o estabelecimento do primeiro Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED) para as ex-colónias e territórios ultramarinos.

A “Convenção de Associação” entrou em vigor em Janeiro de 1958 e foi precursora das Convenções de Yaundé I e II e depois das de Lomé (I a IV e IV bis) e, mais recentemente, do Acordo de Cotonou.

Até aos anos 70, o Tratado de Roma e algumas obrigações internacionais posteriores (por exemplo, a Convenção sobre a ajuda alimentar) explicam o predomínio do FED e dos acordos com os países de África, Caraíbas e Pacífico (ACP), bem como a importância da ajuda alimentar, no contexto dos excedentes resultantes da política agrícola comum (PAC). Os principais receptores eram, à data, africanos e francófonos.

Começa, contudo, a assistir-se ao estabelecimento de outros programas regionais: em 1976, por iniciativa do Parlamento, surge o Programa ALA de ajuda e cooperação com a América Latina e a Ásia e são assinados os primeiros protocolos com o Mediterrâneo, denotando uma globalização incipiente do alcance da política de cooperação, ainda que o FED absorvesse a maior parte dos fundos (60%).

Durante os anos 80, e em particular no contexto da crise da dívida, antes da adesão de Portugal e Espanha, o espírito Lomé foi aprofundado e alargado a 46 ACP, agora já com forte presença anglófona. Assistiu-se também a um aprofundamento (p. ex., de cooperação financeira e técnica para infra-estruturas e desenvolvimento rural) e diversificação dos instrumentos e mecanismos de cooperação: aos instrumentos mais tradicionais associaram-se novos instrumentos (Stabex e Sysmin).  

 

Os anos 90 e a criação da base legal

Durante os anos 90 as políticas e práticas da cooperação para o desenvolvimento integraram-se gradualmente no novo quadro de desenvolvimento global que tem como objectivo central a redução, e, se possível, a erradicação da pobreza.

A base legal, os objectivos e princípios para a cooperação para o desenvolvimento da UE são estabelecidos, pela primeira vez, em 1992, no Tratado de Maastricht (os quais se manterão, em linhas gerais, nos Tratados de Amsterdão e Nice). Nele se estabelece (Título XVIII, Art. 139U a 130Y) que a política da Comunidade na esfera da cooperação para o desenvolvimento deve: “i) apoiar o desenvolvimento económico e social dos países em desenvolvimento (PED), em particular os mais desfavorecidos; ii) promover a integração harmoniosa dos PED na economia mundial; e iii) lutar contra a pobreza”.

O Tratado refere que a política da Comissão Europeia (CE) deve contribuir para o objectivo geral de desenvolver e consolidar o primado da lei e o respeito pelos Direitos Humanos e liberdades fundamentais nos países terceiros, deve ser complementar da dos EM e promover a coordenação e a coerência (os designados 3C).

Na prática, assiste-se a mudanças, não só em termos de maior volume da Ajuda (crescimento) como em termos de distribuição geográfica. Entra-se numa fase caracterizada pela crescente importância dos países do ex-bloco de Leste, reflexo do fim da Guerra Fria e da realização das conferências intergovernamentais sobre a União Política e Económica. O ano de 1990, com o Programa PHARE, para os países da Europa Central e Oriental, marca o início de importantes fluxos de Ajuda para esta região, ao qual se segue, em 1991, a criação do Programa Tacis, para os Novos Estados Independentes da ex-URSS.

Outra mudança registou-se ao nível dos instrumentos de cooperação. Para além dos programas tradicionais (geográficos e temáticos), a UE passa a dispor de três instrumentos para atingir os seus objectivos: o diálogo político, o comércio e a cooperação para o desenvolvimento em sentido estrito.

A partir de agora, a racionalidade da Ajuda assenta em três tipos de motivações que determinam a intensidade e natureza dos diferentes programas regionais: preocupações políticas e de segurança; considerações económicas e estratégicas; motivações humanitárias e de solidariedade.

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O novo século

A partir de 2000 dá-se um novo impulso à cooperação para o desenvolvimento. Com a aprovação da Declaração do Conselho e da Comissão sobre a Política de Cooperação para o Desenvolvimento da Comunidade Europeia (10 Novembro), clarificam-se os seus objectivos ao reconhecer que o objectivo último da política de desenvolvimento da UE deve ser a luta contra a pobreza, com vista à sua erradicação. A atenção política nos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio e na redução da pobreza vai sendo progressivamente fortalecida por várias regulamentações e comunicações temáticas, aprovadas por resoluções e conclusões do Conselho. A integração do comércio nas estratégias de desenvolvimento é também, cada vez mais, reconhecida como um contributo para a redução da pobreza e as sinergias entre a política de desenvolvimento e a política de migração vão sendo aprofundadas.

Em termos de características da Ajuda, reforça-se a tendência manifestada desde 1991: i) o crescimento do número de países receptores, tanto no quadro de Lomé IV como fora dele; ii) o aumento espectacular da ajuda humanitária, de emergência e de reabilitação pós-conflito (em 1992 tinha sido criado um gabinete específico, o ECHO); bem como iii) uma crescente perda de peso dos países mais pobres como receptores privilegiados da política de cooperação para o desenvolvimento.

Esta é uma fase caracterizada pela ênfase posta na nova relação com os ACP, pela reforma da gestão da Ajuda e pelo alargamento da UE. No quadro das relações com os ACP é assinado o Acordo de Parceria de Cotonou, o qual representa uma reforma radical das relações com os países ACP, assentando agora em cinco pilares interdependentes: uma abordagem estratégica da cooperação, centrada na redução da pobreza; uma dimensão política aprofundada, incluindo os princípios dos Direitos Humanos, democracia, primado da lei e boa governação; uma participação acrescida, dando ênfase ao papel dos actores não estatais; um novo quadro de comércio, para facilitar a gradual integração dos ACP na economia mundial; e a melhoria da cooperação financeira através da reforma da programação (deslizante) e dos instrumentos (apenas dois: o envelope financeiro de longo prazo e o envelope não programável, para emergências).

Quanto à reforma da gestão da Ajuda externa, ela tem como objectivo aumentar a sua qualidade, eficiência e eficácia. Iniciada em 2000, teve como elemento chave a criação da EuropeAid, sob tutela do Comissário das Relações Externas, que passou a ser responsável por quase todos os projectos de desenvolvimento da CE. Têm sido feitos esforços de harmonização da programação, bem como de simplificação de procedimentos e alinhamento com os sistemas e procedimentos dos parceiros. Novos instrumentos de Ajuda têm sido introduzidos, como o apoio ao Orçamento e a abordagem sectorial integrada (SWAP) e quer a CE, quer os EM, têm colocado na agenda os 3C. Um bom exemplo de como se pode fortalecer a coerência entre políticas comerciais e de desenvolvimento é a iniciativa Everything but Arms, ainda que, no domínio das políticas internas, se mantenham vários desafios, especialmente com a PAC e a Política Comum de Pescas. Outro importante aspecto da reforma é o processo de transferência de competências para as Delegações promovendo a apropriação dos programas e assegurando maior coordenação com os parceiros de desenvolvimento. Embora ainda seja cedo para fazer um balanço sobre o sucesso da reforma, são reconhecidas algumas melhorias na gestão da Ajuda.

Alguns acontecimentos mais recentes, em particular desde 2004, poderão produzir inflexões na política de cooperação:

• Alargamento da UE: Com o alargamento, o peso político da UE na esfera internacional foi reforçado, mas surgem as preocupações com os novos vizinhos, tendo já sido criada a Política Europeia de Vizinhança (aprovada pelo Conselho em Maio de 2004) e proposto um Instrumento de Parceria e Vizinhança Europeia. Na próxima década um dos aspectos-chave da acção externa será o apoio ao desenvolvimento económico, estabilidade, democracia e segurança destes países vizinhos, o que poderá condicionar a política de cooperação para o desenvolvimento.

• Nova Constituição Europeia: A nova Constituição, formalmente assinada em 29 de Outubro em Roma, poderá ter uma influência decisiva nas relações externas, incluindo nas que se referem aos PED.
A versão que está a ser referendada reconhece a política de desenvolvimento da UE como uma política de direito próprio, cujo objectivo central é a erradicação da pobreza em todas as regiões, e cria um novo quadro legal para essa actuação, com a instituição de um Ministério dos Negócios Estrangeiros que supervisionará toda a política externa. Em princípio esta mudança institucional contribuirá para reforçar a coerência das políticas externas da UE mas é preciso saber se os objectivos de desenvolvimento serão tidos em conta na redefinição do quadro legal das relações externas da UE e qual será a sua hierarquia na política externa europeia.

• Uma nova Comissão e um novo Parlamento: Com os novos comissários e deputados, e atendendo aos documentos recentemente aprovados e às posições manifestadas, as preocupações com África continuam no topo da agenda.

• O debate sobre as perspectivas financeiras: O debate sobre as perspectivas financeiras para o período 2007-13 foi iniciado em 2004. Dele sairão indicações claras sobre os objectivos políticos globais a médio prazo da política comunitária, nomeadamente em três domínios: desenvolvimento sustentável da Europa; reforço do significado de cidadania europeia; e Europa como parceiro global (toda a sua intervenção na área externa). A proposta mais recente, no que diz respeito às relações externas, apresenta seis áreas temáticas (instrumentos de ajuda humanitária, apoio macrofinanceiro, pré-adesão, vizinhança europeia e parceria, desenvolvimento e cooperação económica e estabilidade) para simplificar a actual panóplia de instrumentos regionais e temáticos de acção externa. Os regulamentos que irão sustentar os novos instrumentos estão em fase de discussão e há aspectos fundamentais para os quais ainda não há consenso. Subsistem dúvidas quanto à amplitude do instrumento desenvolvimento e cooperação económica: receio de marginalização da Ajuda face às intervenções na área da cooperação económica e eventual descaracterização e mesmo marginalização, a prazo, da política de cooperação da UE. A proposta de regulamento apresentada pela CE para este instrumento aponta no sentido da orçamentação do FED, posição partilhada pelo Parlamento. Contudo, os EM estão divididos quanto a esta decisão. Portugal faz parte do grupo que está contra. Se a orçamentação do FED poderá assegurar que as despesas sejam feitas tendo em atenção o objectivo de redução da pobreza ela poderá também significar menos protecção para os países ACP e, por outro lado, uma vez inscritos no Orçamento, os recursos do FED poderão mais facilmente ser desviados para outras prioridades, nomeadamente as relacionadas com a segurança, ou para países com rendimentos superiores aos dos ACP, especialmente no Mediterrâneo, América Latina e Leste Europeu.

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* Maria Manuela Afonso

Geógrafa pela Universidade de Coimbra. Mestre em Estudos Africanos pelo ISCTE. Professora do Ensino Secundário a exercer funções no IPAD como Chefe de Divisão de Avaliação. Autora de 4 livros e vários artigos sobre a problemática da cooperação e do desenvolvimento.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

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Link em nova janela Pricipais receptores da APD/AP da CE

Link em nova janela Estrutura dos desembolsos da ajuda da CE por grupos de rendimentos 1990

Link em nova janela Estrutura dos desembolsos da ajuda da CE por grupos de rendimentos 1999

Link em nova janela Estrutura dos desembolsos da ajuda da CE por grupos de rendimentos 2003

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