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Janus 2006



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Regime "autonómico" e ensino superior espanhol

Fernando Amorim *

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O ensino universitário de Espanha busca as sua origens na criação da Universidade de Salamanca no ano de 1218, a segunda universidade mais antiga do mundo depois da de Bolonha, o que explica a relativa imutabilidade do sistema até ao século XIX. Se a Idade Média configurara as características essenciais da instituição, como a dupla protecção pontifícia e régia e a autonomia económica, administrativa e jurídica em torno da imagem de uma Cristandade de cultura superior unificada, a Idade Moderna e a monarquia dos Reis Católicos expandiu as universidades como bastiões de um catolicismo militante e instrumento de formação de um funcionalismo eclesiástico e de uma burocracia estatal de serviço ao império. O reformismo do século XIX seria marcado por um centralismo liberal que pretendeu aplicar um modelo uniforme a todas a universidades da monarquia, desde o plano Caballero (1807) ou o plano Pidal (1845), até às leis de Claudio Moyano (1857) que implantou, também, o modelo de universidades de distrito (segundo dez distritos e âmbitos territoriais próprios). A criação de novas universidades que este modelo traduzia não alteraria a matriz essencial de uma universidade elitista que persistiria até 1959. A uma universidade de elites e sujeita a um controlo político rigoroso, sustentada na Ley de Ordenación Universitária (Julho de 1943) e vinculada às ideologias dominantes da Falange e do catolicismo tradicionalista sucederiam as aceleradas transformações sociais dos anos 60 que cristalizam no novo marco jurídico constituído pela Ley Villar Palasí de 1970 (LGE) e que concede alguma autonomia às universidades em matéria de docência e investigação, abrindo-se a uma massificação nas décadas de 1960 a 2000. Esta lei tem um importante significado, já que abriu as portas a um modelo de universidade um pouco mais livre e democrático, que será claramente definido, após a transição política, na Ley de Reforma Universitária (LRU) aprovada em 1983, e que marca o início de vertiginosas transformações a caminho de uma ampla autonomia universitária.

 

Regime autonómico e diversidade de organização

O processo de descentralização estatal iniciado com a promulgação da Constituição de 1978 repercutiu-se na instituição universitária, no sentido em que o referencial educativo passou a ser constituído pelo marco geográfico correspondente à Comunidade Autónoma, transferindo-se a gestão universitária, do Estado central para as autonomias regionais, ao mesmo tempo que se produziu em toda a Espanha uma proliferação universitária sem precedentes e que anuncia uma nova época, a da Universidade universal, à qual acedem massivamente mais de três quartos da juventude espanhola, de ambos os sexos e de origem social diversa. De 76.000 estudantes em 1960, a população universitária disparou para quase 1,6 milhões em 2002. Por outro lado, a transferência completa de competências sobre as universidades para as Comunidades Autónomas (1996) consolidou as características de descentralização territorial de um sistema universitário espanhol de modelo diversificado, porquanto assenta em cinco tipologias diferentes: universidades uniprovinciais que albergam 24% dos estudantes; universidades exclusivas de uma Comunidade Autónoma (com 11% dos estudantes); Universidades gémeas (i.e., duas universidades por província) que concentram 29% dos estudantes do sistema; universidades metropolitanas – públicas e privadas – com 26% dos estudantes universitários; e universidades de ensino à distância, que possuem 9% dos estudantes espanhóis.

Universidades uniprovinciais e de comunidades autónomas

O sistema reflecte o monopólio das universidades públicas (uniprovinciais) sobre a sua província ou região, reforçado pelo facto de mais de metade das províncias espanholas possuírem um sistema exclusivamente público de ensino universitário e, também, pela circunstância de haver universidades que não apenas possuem o monopólio sobre uma província como sobre a região ou Comunidade Autónoma (casos de Saragoça, Oviedo, Castilla-La Mancha, Extremadura, Cantábria, Ilhas Baleares e La Rioja).

Universidades gémeas

O modelo de universidades gémeas – duas universidades em uma mesma província – existe em oito províncias espanholas, geralmente reflectindo o desdobramento entre ensino universitário e universitário politécnico.

Universidades metropolitanas

A estrutura típica é de um conjunto básico de quatro universidades públicas: uma universidade clássica, outra politécnica, uma autónoma e outra “de qualidade”, leia-se de elite (caso das universidades Carlos III em Madrid, criada em 1989 e Pompeu Fabra em Barcelona, 1990). Às universidades públicas juntam-se (no caso de Madrid) universidades privadas mas de menor dimensão. Este modelo abarca mais de três quartos da totalidade dos estudantes universitários.

Universidades de ensino à distância

Este é o modelo de maior dimensão do sistema de ensino superior espanhol, constituído pela pública UNED – Universidad Nacional de Educacíon a Distancia, em Madrid, e pela privada UOC – Universitat Oberta de Catalunya, em Barcelona. A primeira é a maior universidade espanhola e estende-se a todo o território espanhol, com 133.000 estudantes. A UOC abarca, sobretudo, os estudantes catalães, alguns valencianos e outros das Ilhas Baleares, possuindo cerca de 9.000 alunos matriculados. O modelo de “ensino à distância” tem vindo a crescer exponencialmente nos últimos anos.

Actualmente, o número total de universidades espanholas ascende a 70 (2005), das quais 48 são públicas e 22 privadas. O número de estudantes reduziu ligeiramente face a 2002, sendo de 1.551.000 (Janeiro de 2005). Destes, mais de 90% encontram-se matriculados em universidades públicas que se regem por normas comuns ditadas pelo Estado ou pelas Comunidades Autónomas. Contudo, as privadas necessitam do reconhecimento legal pela Asamblea Legislativa de la Comunidad Autónoma correspondente, ou por lei, das Cortes Generales . A Ley Orgânica de Universidades , de Dezembro de 2001 (LOU) consagrou algumas diferenças entre os dois tipos (público e privado) de universidades, mormente no que respeita à sua estrutura, normas de organização, funcionamento e professorado.

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O sistema educativo e o acesso à universidade

Até 1970 ( Ley General de Educación ) o acesso à universidade fazia-se após a frequência da Educación General Básica , (que consistia em oito anos de escolaridade obrigatória divididos em três ciclos, compreendendo o primeiro ciclo o 1.º e 2.º anos de EGB; o segundo ciclo, os 3.º, 4.º e 5.º anos de EGB; e o terceiro ciclo os 6.º, 7.º e 8.º anos de EGB) e a conclusão do Bachillerato Unificado Polivalente (BUP), de três anos de duração. Em 1990 esta organização do sistema educativo foi objecto de alteração com a Ley de Ordenación General del Sistema Educativo (LOGSE – Ley Orgánica 1/1990 , de 3 de Outubro).

A educação infantil, até aos seis anos de idade ficou organizada em dois ciclos de três anos cada. Os anteriores seis primeiros cursos de EGB passaram a corresponder à Educación Primaria Obligatoria (EPO) e os dois últimos, em conjunto com os dois primeiros do BUP, à Educación Secundaria Obligatoria (ESO) que constitui uma etapa educativa obrigatória e gratuita para todos os cidadãos em idade escolar. O Bachillerato , embora de carácter voluntário, constitui a última etapa da educação secundária e é organizado em modalidades distintas que visam uma preparação especializada dos alunos (em função dos diversos itinerários formativos de cada modalidade) para o seu ingresso no ensino superior ou na vida activa.

 

Os ciclos universitários até Bolonha

A aprovação da nova Lei Orgânica da Educação (LOE) em Julho de 2005 destina-se a promover profundas alterações no sistema, no que respeita ao financiamento, com uma previsão de investimento de cerca de seis milhões de euros para os próximos cinco anos e alterações na educação básica, ensino médio e universitário de Espanha, neste caso, preparando a reforma das titulações universitárias, tendo em vista a integração do sistema universitário espanhol no espaço europeu de ensino superior. Até então, o modelo típico universitário espanhol assentava em três ciclos:

• O primeiro ciclo consistia num programa de estudos com uma duração de três anos e conferia os títulos académicos de Diplomatura, Ingeniería Técnica , Arquitectura Técnica ou Maestro ;

• O segundo ciclo ou ciclo largo consistia num programa de curso com uma duração de quatro ou cinco anos (ou mesmo seis anos para o caso da Medicina) e que conferia os títulos académicos de Licenciatura , Ingeniería ou Arquitectura . Existiam ainda titulações designadas de “ solo segundo ciclo ” a que se acedia obtendo o título de primeiro ciclo ( Diplomatura ), sendo graus conferidos após dois anos curriculares. Contudo, um pouco mais de metade dos cursos universitários espanhóis até ao “processo de Bolonha” eram programas de ciclo largo , isto é, licenciaturas ou engenharias, exclusivamente de quatro a seis anos de duração.

• O terceiro ciclo tinha como destinatários os que tivessem obtido um título de segundo ciclo ( licenciatura , ingeniería ou arquitectura ). Este 3.º ciclo finalizava com a obtenção do grau de Doctor , após cursar um programa de doctorado e redigir e defender publicamente uma tese doutoral, constituindo o grau académico máximo do sistema universitário espanhol.

Além destes títulos ou estudos oficiais, as universidades podiam conferir os chamados “ títulos próprios ”, que podem ser de grau ou de pós-graduação ( masters , especialistas e expertos ). Este modelo é produto de um sistema eminentemente público, em que 84% das universidades públicas albergavam 92% de estudantes (2001), sendo as universidades privadas de pequena dimensão, albergando em média 7.000 alunos contra 23.000 nas públicas. Outro fenómeno geral de realce na universidade espanhola consiste no processo de feminização, com 53% dos estudantes do sexo feminino, embora esta taxa elevada não seja acompanhada pelo correspondente processo de feminização do professorado, em que apenas 32% é constituído por mulheres. A taxa de êxito das mulheres no ensino superior é uma das mais altas da Europa, em conjunto com a Grécia, Portugal e Finlândia, embora num contexto em que a Espanha, em conjunto com a Itália e Portugal, apresenta os menores gastos da Europa em educação superior (47% da média dos países da OCDE).

 

Internacionalização e espaço europeu de ensino superior

O sistema espanhol caracteriza-se por albergar relativamente poucos estudantes estrangeiros; apenas 0,7% na área da graduação e 11% no doutoramento. Contudo, se na área da graduação são maioritariamente cidadãos europeus, na segunda são de origem latino-americana, facto que não é despiciendo considerar no contexto da sobrevivência e reconfiguração das antigas áreas imperiais de influência cultural. Entre os universitários que obtêm o grau de doutor, a proporção de estrangeiros multiplicou-se 3,5 vezes no espaço de um lustro: de 2,8% em 1994 para 7,6% em 1998. O início do debate, em 2003, em torno da integração do sistema universitário espanhol no espaço europeu de ensino superior traduziu-se na adopção dos critérios de Bolonha, com a implantação do sistema de créditos europeus e a adaptação do ensino superior ao sistema de dois níveis, graduado e pós--graduado, sendo o segundo estruturado em dois ciclos, o master e o doctorado . Presentemente (2005) está já completo o processo legislativo para a implementação das principais ferramentas consagradas nas declarações e comunicados dos ministros da Educação em Bolonha (1999), Praga (2001) e Berlim (2003), bem como estão já em vigor as normas correspondentes à utilização do sistema de créditos (Set. 2003), à emissão pelas universidades do Suplemento de Diploma (Set. 2003) e à homologação e acreditação de programas de estudo e títulos académicos oficiais (Jan. 2005), maximizando o potencial de expansão universitária e cultural da Espanha, num contexto de competitividade e globalização em que a universidade não apenas cumpre o papel de formar as elites profissionais de cada país numa identidade-raíz mas também de educar uma estrutura social europeia nos valores de uma identidade-projecto.

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* Fernando Amorim

Mestre em História Moderna pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Docente e Investigador do Observatório de Relações Exteriores da UAL. Editor do Janus.

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Bibliografia

RUIZ-RIVAS, Carmen et al. – «National Reports 2004-2005: Spain». In BOLOGNA-BERGEN Summit 2005 - Towards the European higher education area: Bologna process national reports 2004-2005 . http://www.bologna-bergen2005.no/Docs/Spain/National_Reports-Spain_050114-Sp.pdf

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
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Link em nova janela Os ciclos universitários antes do "Processo de Bolonha"

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