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Coordenação da UE na ONU e reforma das Nações Unidas

Luís Tomé *

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O estabelecimento da PESC acentuou a necessidade de os Estados-membros, o Conselho e a Comissão coordenarem as suas acções nas relações externas e, em particular, no seio da ONU, a fim de que o seu peso colectivo possa ter mais impacto no mundo. Por outro lado, manifestando-se apoiantes de “uma ordem internacional baseada num efectivo multilateralismo”, a UE e seus Estados-membros têm constantemente reafirmado o empenho em fortalecer as Nações Unidas, procurando dotar esta organização da autoridade e dos meios necessários ao cumprimento das suas responsabilidades e à prossecução dos seus objectivos. De facto, o contributo europeu para o sistema das Nações Unidas é significativo. Além disso, a cooperação e a complementaridade UE-ONU têm-se alicerçado nos vários domínios. Pelo que é estranho e, até certo ponto, surpreendente que o empenho, o papel e, sobretudo, o impacto da UE na reforma das Nações Unidas estejam aquém do que se poderia esperar.

 

Como é que a UE coordena o seu trabalho na ONU

Sendo todos os Estados-membros da União Europeia de per si membros da Organização das Nações Unidas (ver caixa com datas de acesso), o desenvolvimento da PESC tem-nos levado a uma maior coordenação de actividades, no que são assistidos pela Comissão Europeia (CE) e pelo Serviço de Ligação do Secretariado do Conselho. Uma vez que a CE tem estatuto de observador, não pode votar, com excepção da FAO, onde vota em nome dos Estados-membros, nomeadamente nas matérias de comércio, agricultura e pescas. Esta coordenação cobre agora todos os seis comités da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) e seus organismos subordinados. Ocorrem em cada ano mais de mil reuniões de coordenação UE nas NU. O país que assume a presidência da UE tem um papel central na medida em que, além de coordenar os trabalhos, representa a União na maioria das áreas da actividade da ONU e é o principal interlocutor nas discussões com outros países membros das Nações Unidas, grupos regionais e organizações. É igualmente o país da presidência que apresenta a posição da UE (que depende de prévio consenso) à Assembleia Geral – excepto nos assuntos relativos ao comércio, agricultura ou pescas, em que tal cabe à Comissão – e as declarações da UE no Conselho de Segurança.

Os resultados desta coordenação são óbvios: entre 1992 e 2003, foi conseguido o consenso europeu numa média de 95% de todas as resoluções aprovadas na AGNU (ver gráfico). Neste aspecto, a 58ª sessão da AGNU (pelo menos, até Julho de 2004) terá sido a menos conseguida: em 322 resoluções, os Estados-membros estiveram coesos em 289 (89,75%). Das 33 em que não foi conseguido o consenso, 12 eram relativas a questões de armamento nuclear e desarmamento e 16 sobre descolonização e direitos humanos. Durante esta sessão, a UE falhou o consenso em 3 resoluções relativas ao Médio Oriente, por exemplo.

A maior dificuldade existe, porém, ao nível do Conselho de Segurança (CSNU),

em virtude de haver estatutos distintos entre os Estados-membros da UE: 2 membros permanentes (França e Reino Unido), alguns rodando entre os 10 não permanentes, e a maioria ausente. Embora o artigo 19 do Tratado da União Europeia afirme que “os Estados-membros que são também membros do Conselho de Segurança da ONU deverão concertar e manter os outros Estados-membros plenamente informados. Os Estados-membros que são membros permanentes do Conselho de Segurança deverão, no desempenho das suas funções, assegurar a defesa das posições e interesses da União, sem prejudicar as suas responsabilidades mediante os compromissos da Carta das Nações Unidas”, a verdade é que esta é uma questão que mexe com as sensibilidades europeias e que, em certa medida, boicota a própria PESC e a coesão da União na ONU.

 

Cooperação UE-ONU

A cooperação UE-ONU não tem, verdadeiramente, dois sentidos, na medida em que assenta essencialmente sobre o que a União quer oferecer a uma organização sempre carenciada e disposta a receber. A União Europeia é a organização regional que mais intensamente tem promovido o relacionamento com as Nações Unidas e é também a que oferece melhores perspectivas de cooperação. Tem procurado reforçar o papel e a autoridade da ONU, dotando-a das capacidades necessárias ao desempenho da sua missão, através de contribuições financeiras significativas para o orçamento geral, agências, programas, fundos e missões da ONU – a UE paga, colectivamente, cerca de 40% do orçamento das Nações Unidas; disponibilizando recursos civis e militares apreciáveis para as mais variadas tarefas e missões da organização; promovendo a assinatura, ratificação e respeito das suas convenções e resoluções por todo o globo; e apoiando as “causas comuns” da ONU ou complementando a sua acção através de iniciativas autónomas europeias. A cooperação UE-ONU abrange um leque muito variado de matérias, da luta contra o terrorismo às questões ambientais, com destaque para a ajuda humanitária, a assistência ao desenvolvimento, a promoção/ manutenção da paz e a defesa-implementação dos direitos humanos. Em particular, a União tem manifestado grande empenho na prossecução dos “Objectivos do Milénio” para o Desenvolvimento sob a égide das Nações Unidas (Setembro 2000), a implementar até 2015, como demonstra nos “Compromissos de Barcelona”. Por exemplo, colectivamente, a UE contribui com mais de 50% da Ajuda Pública ao Desenvolvimento mundial (ver texto “UE, Desenvolvimento e Ajuda Humanitária”) e é, de longe, o maior contribuinte do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR). Entre os principais parceiros do EuropeAid e do ECHO (Serviço Humanitário da Comunidade Europeia) encontram-se várias agências das Nações Unidas.

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A UE e a reforma das Nações Unidas

Em Dezembro de 2003, o Conselho Europeu aprovou a Estratégia de Segurança Europeia onde se declara que “o quadro fundamental para as relações internacionais é a Carta das Nações Unidas... Fortalecer as Nações Unidas, equipando-as para cumprir as suas responsabilidades e actuar efectivamente é uma prioridade europeia”. Em Maio de 2004, a UE – já com 25 membros – submeteu uma contribuição ao Painel de Alto Nível das Nações Unidas sobre Ameaças, Desafios e Mudança. Finalmente, o Tratado Constitucional (aprovado em Junho e assinado em 29 de Outubro de 2004) afirma explicitamente no seu art. III-292 que a União “...promoverá soluções multilaterais para os problemas comuns, em particular no quadro das Nações Unidas”.

 

Como explicar, então, o pouco empenho da UE na preparação da reforma da ONU?

A primeira justificação assenta nas divergências intra-europeias em torno das propostas de reforma. Durante a preparação da 60ª Assembleia Geral das Nações Unidas, os 25 chegaram a acordo numa série de questões, mas continuam a divergir em outras fundamentais. No que respeita a convergências, os Estados-membros acordaram no objectivo de reservar 0,5% do PIB, até 2009, e 0,7%, até 2015, à Ajuda Pública ao Desenvolvimento. Também apoiam as iniciativas destinadas a aliviar a dívida dos países mais pobres, com prioridade para África, lutar contra a sida e outras doenças infecciosas, repensar o papel da mulher no desenvolvimento e estabelecer uma agência das Nações Unidas para o Ambiente.

Noutra área, os Estados-membros UE apoiam o estabelecimento de uma Comissão de Peace Building nas NU, de maneira a assegurar os esforços de reconstrução pós-
-conflito de forma duradoura e coordenada. Outras propostas são também do agrado dos europeus: reforçar a cooperação na luta contra o terrorismo e proliferação de ADM e sobre desarmamento; refinar a aplicação das sanções; dar mais recursos para o Secretário-Geral das Nações Unidas utilizar os seus bons ofícios nas disputas internacionais; e, reconhecendo a “responsabilidade de proteger” em função dos genocídios e violações massivas dos direitos humanos, definir critérios de intervenção humanitária – embora, neste ponto, haja algumas divergências entre os europeus.

Em relação às propostas sobre direitos humanos, os países UE apoiam a criação de um Conselho de Direitos Humanos – porém, estão divididos sobre se este novo órgão deve estar ligado à Assembleia Geral ou ao Conselho de Segurança, e ainda sobre o papel que nele terão as ONG.

Finalmente, no domínio da reforma institucional, os europeus estão genericamente de acordo com o reforço do Secretariado das NU. No entanto, as divergências na UE são muito acentuadas em torno da reforma do Conselho de Segurança. Existem, pelo menos, quatro perspectivas (1):

1) a Alemanha pretende tornar-se membro permanente do CSNU – ficando de fora, certamente que os alemães vão pressionar no sentido de um lugar da UE como membro permanente em substituição da França e do Reino Unido, enquanto que, entrando, os seus lugares serão perpetuados;

2) por isso, a França e o Reino Unido apoiam a opção novos membros permanentes 4+1, i. e, Brasil, Alemanha, Índia, Japão mais um país africano;

3) a Itália e a Espanha – tal como outros Estados não UE, entre eles a Argentina, o Paquistão e a República da Coreia – opõem--se à entrada de novos membros permanentes; e

4) outros Estados-membros, bem como o Parlamento Europeu, prefeririam que os esforços no domínio da PESC se consolidassem num único assento da UE como membro permanente do Conselho de Segurança, pois temem uma espécie de “G-3” na direcção da política externa da União.

Por outro lado, além destas divergências, há um outro elemento que ajuda a explicar o relativo pouco empenho europeu na reforma das Nações Unidas: é que também a União se encontra num profundo processo de reforma, o que a tem levado a concentrar-se no seu umbigo, procurando prioritariamente sair da sua “crise” económica, política e institucional.

Tendo em conta o seu significativo contributo para o sistema das Nações Unidas e o peso e prestígio colectivo provenientes do seu soft power , acrescido da ausência de interesse norte-americano, a UE teria uma grande oportunidade de exercer uma influência positiva: poderia actuar como um honest broker entre grandes potências ou grupos regionais, poderia colocar a democracia e os direitos humanos no centro da acção das Nações Unidas, poderia colocar a protecção ambiental como um dos objectivos-chave da ordem internacional, poderia insistir no reconhecimento do papel das organizações regionais, enfim, poderia levar os Estados-membros da ONU a recriarem a organização com os necessários recursos ao cumprimento das suas missões vitais. Infelizmente, a UE e os seus Estados-membros não estão em posição de ter um impacto decisivo na reforma da ONU. A verdade é que a crescente coordenação europeia no seio da ONU não é suficiente para ultrapassar certos dilemas, e os progressos PESC não escamoteiam persistentes interesses divergentes entre Estados-membros. O que significa que a UE partiu para as negociações sobre a reforma da ONU com um habitual “mínimo denominador comum” – pouco, para quem tanto contribui e tão veementemente reclama um “efectivo multilateralismo”.

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Informação Complementar

DATAS DE ACESSO DOS ESTADOS-MEMBROS DA UE ÀS NAÇÕES UNIDAS

Bélgica, Dinamarca, França, Grécia, Luxemburgo, Holanda e Reino Unido: 1945; Suécia: 1946; Áustria, Finlândia, Irlanda, Itália, Portugal, Espanha: 1955; e Alemanha: 1973. A Comunidade Europeia tem o estatuto de observador permanente nas Nações Unidas desde 1974. Novos membros: Polónia: 1945; Hungria:1955; Chipre: 1960; Estónia, Letónia e Lituânia: 1991; Eslovénia: 1992; e República Checa e Eslováquia: 1993.

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1 Ortega, Martin;, “Conclusion. UN Reform: as necessary as it is difficult”, in Chaillot Paper nº 78, «The European Union and the United Nations. Partners in effective multilateralism», ISS-EU, Junho 2005, p. 100.

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* Luís Tomé

Licenciado em Relações Internacionais pela UAL. Mestre em Estratégia pelo ISCSP. Doutorando em Relações Internacionais na Universidade de Coimbra. Professor na UAL. Investigador e Membro do Conselho Directivo do Observatório de Relações Exteriores.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Consensos UE na Assembleia Geral das Nações Unidas, 1991-2003

Link em nova janela Votações UE nas resoluções da AGNU sobre Médio Oriente, 1993-2002

Link em nova janela Principais contribuintes para o orçamento regular da ONU

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