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Onde estou: | Janus 2006> Índice de artigos > A nova diplomacia > Diplomacia económica > [ Portugal e a Organização Mundial do Comércio ] | |||
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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! Portugal e a Organização Mundial do Comércio Visando a liberalização crescente das trocas comerciais, com base no princípio da não discriminação e na reciprocidade de vantagens entre as partes, em reacção às medidas proteccionistas e ao unilateralismo vividos durante os dois conflitos mundiais e o período de recessão económica entre guerras, os princípios e regras do GATT, formulados no contexto neoliberal que se seguiu à 2.ª Guerra Mundial, regeram durante quase 50 anos o comércio internacional. Nesta sequência, o GATT constituiu um quadro para a realização periódica de negociações comerciais multilaterais entre as Partes Contratantes: entre 1947 e 1993 tiveram lugar oito ciclos negociais, progressivamente mais abrangentes e com um maior número de Partes Contratantes. Durante o último ciclo realizado sob a égide do GATT, o ciclo do Uruguai, decorrido entre 1986 e 1993, foi acordada a criação da Organização Mundial do Comércio (adiante OMC), a primeira organização internacional económica especificamente dedicada ao comércio internacional, entendido numa acepção muito mais ampla do que a subjacente ao GATT (comércio de mercadorias) e, portanto, dotada de um âmbito muito mais amplo, e de vocação universal. 128 países assinaram os Acordos de Marraquexe, em 15 de Abril de 1994, subscrevendo os compromissos resultantes das negociações do ciclo do Uruguai e tornando-se membros fundadores da OMC. A OMC prossegue a cooperação económica entre os seus Membros no domínio das relações comerciais, abrangendo três grandes áreas – comércio de mercadorias, comércio de serviços, aspectos comerciais da propriedade intelectual –, para além de regras de carácter horizontal que se estendem àquelas matérias, relativas à resolução de litígios (Memorando de Entendimento sobre a Resolução de Litígios) e ao exame das políticas comerciais dos membros (Mecanismo de Exame das Políticas Comerciais). Desde 1994, o sistema multilateral de comércio acolhe regras aplicáveis a sectores anteriormente não regulados – os serviços e os aspectos comerciais da propriedade intelectual (1), por um lado, e, por outro, os produtos agrícolas e os têxteis e vestuário, até aí excluídos das normas multilaterais –, tendo aperfeiçoado e actualizado outras normas ao contexto das relações económicas internacionais do final do século XX. A criação de um Sistema de Resolução de Litígios, garante da estabilidade e previsibilidade das regras multilaterais, bem como os Acordos sobre as Medidas Sanitárias e Fitossanitárias, sobre as Medidas de Salvaguarda e sobre as Medidas de Investimento relacionadas com o Comércio constituem exemplos significativos do reforço das regras e da sua modernização.
Integração económica regional A coexistência do sistema multilateral com a integração económica regional já decorria do GATT, que reconhecia as zonas de comércio livre e as uniões aduaneiras como excepção à Cláusula da Nação Mais Favorecida (2), desde que não houvesse desvio de comércio e fossem cumpridos certos requisitos, verificados pelos órgãos competentes após a sua notificação pelos membros (artigo XXIV.º, n.ºs 3, 5 a 8 e 10) (3). As Comunidades Europeias, mais concretamente a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) e a Comunidade Económica Europeia, hoje Comunidade Europeia (CE), foram examinadas neste domínio para se aferir da sua compatibilidade com as regras do GATT. Se a OMC reafirmou o multilateralismo, especialmente importante numa época marcada pela globalização económica e, como tal, pela estreita interdependência entre os Estados no plano internacional, os membros da OMC não deixaram de explorar a integração regional, já que o número de acordos comerciais preferenciais aumentou exponencialmente (4). Mas se a liberalização comercial e o processo negocial no seio da OMC podem beneficiar do agrupamento dos 148 membros em blocos regionais, muitos membros menos avançados haverá que não estão integrados dessa forma, e não podendo as negociações deixar de ser inclusivas. Além disso, nem todas as zonas de comércio livre e uniões aduaneiras têm subjacente um conjunto uniforme de interesses face à diversidade das matérias abrangidas pelos Acordos da OMC: com efeito, a formulação de uma posição negocial comum por uma zona de integração regional requer ela própria uma negociação interna, poucas vezes linear, como é o caso da Comunidade Europeia.
A Política Comercial Comum No âmbito da Comunidade Europeia, por força da instituição de uma União Aduaneira sobre a qual seria erguido o Mercado Comum, foi necessário definir uma política comum em matéria de comércio internacional, a Política Comercial Comum, talvez a primeira verdadeira política comum, resultando da transferência de competências dos Estados-Membros naquela matéria, que renunciaram implicitamente a negociar e a concluir, de forma unilateral, acordos comerciais. A Política Comercial Comum, no centro da acção externa da União Europeia, é da competência exclusiva da CE, sendo definida através de um procedimento que envolve a Comissão Europeia e o Conselho, ao qual cabe aprovar as directrizes negociais propostas pela Comissão (o mandato para as negociações multilaterais e bilaterais) e, no final, os resultados das negociações desenvolvidas, deliberando por maioria qualificada (artigo 133.º, n.º s 2 a 4). A Comissão é, pois, a negociadora externa da CE em matéria de Política Comercial, consultando um Comité de peritos nacionais (altos funcionários públicos) designado pelo Conselho – o Comité 133 (artigo 133º, n.º 3, segundo parágrafo) – no processo de elaboração da proposta de directrizes negociais e no decurso das negociações. A participação da CE na OMC A Comunidade Europeia nunca foi Parte Contratante do GATT, ao contrário dos então Estados-Membros, mas a existência de uma Pauta Aduaneira Comum e a Política Comercial Comum levaram a que a Comissão interviesse nos diferentes ciclos negociais realizados desde o início da década de 60, substituindo os Estados-Membros. No ciclo do Uruguai foi acordada a criação da OMC e a ampliação do sistema multilateral de comércio – incluindo o comércio de serviços e os aspectos comerciais da propriedade intelectual, recorde-se – suscitou dúvidas quanto à competência da CE para concluir os Acordos de Marraquexe, sendo certo que as próprias Comunidades Europeias eram membros fundadores da OMC. O Tribunal de Justiça veio esclarecer esta questão (5), estabelecendo que o sistema comercial multilateral abrangia, por um lado, matérias objecto de competência exclusiva da CE – o comércio de mercadorias, a prestação de serviços transfronteiriços e o regime de interdição de circulação de bens contrafeitos (6) – e, por outro, matérias de competência partilhada entre a CE e os Estados-Membros (as restantes vertentes do comércio de serviços e dos aspectos comerciais da propriedade intelectual), nas quais teriam de acordar a posição a tomar. Entretanto, o Tratado de Nice alargou a Política Comercial Comum, comunitarizando o comércio de serviços e os aspectos comerciais da propriedade intelectual, não obstante ter derrogado cinco categorias de serviços deste domínio – culturais e audio-visuais, de educação, sociais e de saúde humana – e ter estabelecido procedimentos especiais para certas áreas (princípio do paralelismo das regras de votação; acordos horizontais; aspectos não comerciais da propriedade intelectual – artigo 133.º, n.º s 5 a 7). Neste quadro, foi necessário definir um procedimento para assegurar a intervenção da CE e dos Estados-Membros em bloco no quadro da OMC: as reuniões multilaterais são previamente coordenadas entre a CE e os Estados-Membros, assumindo a Comissão a defesa da sua posição conjunta perante os restantes parceiros comerciais. Resulta deste regime que a defesa dos interesses nacionais é efectuada formalmente apenas no contexto da própria CE, no contributo para a definição do mandato negocial a apresentar pela Comissão ao Conselho e nas reuniões do Conselho, chamado a aprovar as directrizes de negociação e os resultados das negociações realizadas.
Portugal face à OMC Portugal fora Parte Contratante do GATT desde 1962, mas em virtude da adesão às Comunidades Europeias em 1986, passou a participar num grande Mercado Comum, beneficiando da capacidade negocial e do peso da CE nas negociações multilaterais, mas ficando impedido de negociar e de conceder preferências comerciais a países terceiros e de actuar sozinho nas instâncias multilaterais. Nesta sequência, será fácil perceber que os interesses comerciais de Portugal só podem ser afirmados e defendidos no quadro da CE, devendo ser exploradas alianças com os parceiros comunitários próximos, de forma a garantir que as suas prioridades ofensivas e defensivas sejam contempladas, de forma adequada, nas posições adoptadas pela CE a exprimir na OMC. Acresce que a combinação de áreas exclusivamente cometidas à CE (o comércio de mercadorias), com temas há pouco comunitarizados (o comércio de serviços e os aspectos comerciais da propriedade intelectual), e outros domínios partilhados entre a CE e os Estados-Membros (ambiente, desenvolvimento, investimento), exige o diálogo e negociação constantes neste processo decisório, visando-se construir uma posição única e tão consensual quanto possível da CE, para a reforçar perante os outros parceiros. Porém, a prática de consenso do Conselho não obsta a que, segundo as regras aplicáveis à Política Comercial Comum, as deliberações sejam tomadas por maioria qualificada, nos termos da ponderação dos votos dos Estados-Membros introduzida pelo Tratado de Nice e após o último alargamento da União Europeia: tal pode conduzir a que nem todas as preocupações de alguns Estados-Membros sejam aí consideradas. Por outro lado, a OMC abarca actualmente, para além dos temas clássicos de comércio internacional, como o acesso ao mercado em sede de mercadorias e de serviços, uma importante dimensão regulamentar – regras sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias, sobre Obstáculos Técnicos ao Comércio, sobre as Medidas de Investimento relacionadas com o Comércio, sobre o Comércio de Serviços, sobre os Aspectos Comerciais da Propriedade Intelectual –, estando ainda incluídas na sua agenda matérias relacionadas com o comércio, como o ambiente, o investimento, a concorrência, a facilitação do comércio, os mercados públicos, o comércio electrónico, a transferência de tecnologia. Por isso, é no quadro multilateral da OMC que se irão desenrolar quaisquer futuros desenvolvimentos relevantes na perspectiva das relações económicas internacionais. Considerando o mandato negocial assumido pela CE para o primeiro ciclo negocial sob a égide da OMC, em curso, e o seu programa de trabalhos – a “Agenda de Desenvolvimento de Doha” (7) – conclui-se que os interesses de Portugal foram acolhidos no que respeita ao acesso aos mercados, tanto para produtos industriais como para serviços, matéria em que Portugal assume uma atitude claramente ofensiva, no que toca ao reforço das regras multilaterais e à adopção de novas regras nos chamados temas de Singapura (investimento, concorrência, facilitação do comércio, transparência dos mercados públicos) (8) e ainda quanto à protecção acrescida das indicações geográficas dentro do Acordo TRIPS (Acordo sobre os Direitos da Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio). A Portugal e aos outros Estados-Membros resta complementar o plano multilateral com a via da cooperação económica bilateral, seleccionando sectores da actividade económica ou temas específicos – indústria, turismo, investigação e desenvolvimento, qualidade, propriedade industrial –, criando um ambiente propício aos investimentos internacionais mediante acordos de promoção e protecção recíproca e evitando a dupla tributação, ainda regulada pelos Estados. Mas será inserido na União Europeia, o principal bloco comercial (9) mundial, que Portugal melhor pode encontrar aliados para a defesa dos seus interesses estratégicos no plano externo, contribuir para a construção de posições comuns, assim reforçadas, e fazê-las vingar no plano multilateral.
Informação Complementar CICLOS NEGOCIAIS REALIZADOS AO ABRIGO DO GATT - OBJECTO Genebra - 1947: Tarifas; 23 Partes Contratantes Fonte: OMC
MEMBROS DA OMC EM 16 DE FEVEREIRO DE 2005 (PAÍSES E TERRITÓRIOS ADUANEIROS AUTÓNOMOS) 148 – dos quais 32 são Países Menos Avançados (2.º classificação da ONU) e a maior parte Países em Desenvolvimento (não existe uma definição de país desenvolvido ou em desenvolvimento, autodesignando-se os membros) Países Menos Avançados Membros da OMC: Fonte: OMC
Dados adicionais Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas (clique nos links disponíveis) Notificações de acordos comerciais regionais
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