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Onde estou: | Janus 2007> Índice de artigos > Conjuntura internacional > [ A globalização, os EUA e a Ásia ] | |||
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A globalização no sistema financeiro Os sistemas financeiros, à escala global, experimentaram ao longo das décadas de 80 e 90 do século XX um conjunto inter-relacionado de transformações que tornaram possível a globalização das poupanças: • Liberalização da circulação de capitais e de convertibilidade das moedas, e interconexão dos mercados financeiros à escala global; • Um papel crescente dos mercados financeiros no financiamento das economias, com destaque para as economias desenvolvidas mais inspiradas no modelo anglo-saxónico e para as economias emergentes; • Um papel crescente dos investidores institucionais, nas três categorias em que se dividem: fundos de pensão, companhias de seguro de vida e fundos mobiliários, abertos (do tipo mutual funds ) ou fechados (do tipo hedge funds ), sendo que a maioria dos activos destes investidores institucionais são detidos por instituições dos EUA (fundos de pensões, mutual funds e hedge funds ) e em segundo lugar, mas muito atrás, em volume, por entidades japonesas; • Uma transformação das funções e das competências centrais dos grandes bancos, tendo como resultado que o seu comportamento se revela determinante nas manifestações de instabilidade financeira e na propagação das crises ( vg . crise asiática); • O desenvolvimento de novos instrumentos de gestão do risco, num quadro de variações nas taxas de câmbio e nas taxas de juro à escala internacional, como são os instrumentos derivados – opções, futuros, swaps – fundamentais para a integração dos mercados financeiros à escala global; • O desenvolvimento de um importante segmento de capital de risco, nomeadamente nas economias desenvolvidas de modelo anglo-saxónico.
Actores da globalização A compreensão da dinâmica da globalização é facilitada se considerarmos como actores chave os que já são ou se estão a tornar dominantes no fornecimento de três tipos de funções: • A produção de conhecimento e a inovação tecnológica – EUA e Japão; • A competência na fabricação competitiva de massa – China; • O abastecimento de energia – Arábia Saudita.
Os EUA... Acumulam conhecimentos, inovam num espectro muito largo de sectores e actividades e valorizam essa acumulação e inovação no mercado de capitais. Durante a década de 90 reforçaram a sua liderança sobre a generalidade das tecnologias de informação, tendo criado por inteiro um conjunto de novas actividades em torno das redes de computadores e da internet ; • Pelos mecanismos do seu modelo de capitalismo, asseguram uma retribuição aos capitais superior ao que é comum no Japão e na Europa continental, graças à existência de actores institucionais exigindo a maximização dos resultados a curto prazo do seu investimento (por via da valorização das acções ou dos dividendos pagos) e à elevada mobilidade do capital, tornada possível pela flexibilidade do mercado de trabalho e pela existência de um mercado muito activo de títulos de propriedade das empresas; • Os EUA “produzem” o maior volume de activos financeiros atractivos em termos de rendimento e segurança à escala mundial, o que lhes dá uma ampla margem de liberdade para suportarem défices correntes e deste modo ajudarem amortecer as crises que têm ocorrido à escala global; • Têm níveis reduzidos de poupança discricionária das famílias, em grande parte porque aplicam as suas poupanças “livres” em activos que permitem aumentar rapidamente o seu património (activos imobiliários e acções de empresas); • Funcionam como o “consumidor de primeira instância” no sistema do Pacífico, absorvendo uma parte muito significativa das exportações de produtos industriais da Ásia/Pacífico; têm défices comerciais em larga escala com o Japão e a Coreia do Sul, as “economias chinesas” e as outras economias emergentes; • Pela via do investimento directo internacional das suas empresas multinacionais e pelo processo de diversificação geográfica das carteiras de activos dos grandes investidores institucionais – fundos de pensões, fundos mobiliários e companhias de seguros de vida – que são actores dominantes à escala dos mercados de capitais de todo o mundo, originam fluxos de saída de capitais a longo prazo para as Novas Economias Industrializadas e para as Economias Emergentes do sistema do Pacífico; • Colocam uma parte significativa da sua dívida pública a curto prazo junto dos bancos centrais do Japão e das economias emergentes (Ásia/Pacífico e México), em contrapartida ao aumento das reservas cambiais que as economias emergentes da Ásia/Pacífico – têm vindo a acumular como consequência dos resultados nas suas balanças básicas e da sua política macroeconómica de “ancoragem” ao dólar. O Japão... • Gera e acumula conhecimentos tecnológicos num conjunto relativamente focalizado de áreas-chave da mutação tecnológica em curso (microelectrónica, optoelectrónica, fotónica, terminais de computação e jogos, materiais funcionais para a micro e optoelectrónica, instrumentação e meios de diagnóstico, burótica, robótica, novas motorizações, etc.) e difunde nos EUA e em toda a Ásia /Pacífico as suas competências excepcionais na área da fabricação, com empresas líderes mundiais e fortemente internacionalizadas nas suas operações e no seu modo de financiamento; • O Japão tem a sua economia “partida” em duas vertentes principais: uma economia baseada no conhecimento, como a dos EUA, limitada aos sectores exportadores onde está focalizada a sua geração de conhecimentos tecnológicos e assente em empresas multinacionais que hoje já se financiam parcialmente a nível global; e uma economia baseada na terra, em que se incluem os sectores da construção e obras públicas, imobiliário, agricultura/agro-alimentar, distribuição e sectores industriais anexos, virados para o mercado interno e objecto de um financiamento privilegiado pelo sector público e pelos bancos; • Graças ao sector empresarial exportador e à protecção multiforme do seu mercado interno, acumula excedentes comerciais, com os principais actores do “mundo do Pacífico” – EUA e “Economias Chinesas” – e apresenta sistematicamente excedentes na balança de transacções correntes; • A poupança das famílias é elevada, devido ao elevado custo da terra e da habitação e ao baixo rendimento dos activos em que é colocada a poupança – depósitos e seguros; • O Japão funcionou como a economia que poupa em primeira instância no “mundo do Pacífico”, exportando capitais a curto prazo para os EUA (adquirindo títulos do Tesouro como contrapartida das suas reservas cambiais maioritariamente expressas em dólares ou emprestando em yens a operadores norte-americanos que transformam esses empréstimos em investimentos em activos de longo prazo, noutros locais do “mundo do Pacífico”) e para as economias emergentes, sob a forma de empréstimos bancários a curto prazo; e exportando capitais a longo prazo para os EUA e Reino Unido (em ambos os casos, sob a forma de investimento directo internacional, e no caso dos EUA também sob a forma de aquisição de títulos do Tesouro a longo prazo pelos investidores institucionais japoneses.
A China... • Especializa-se na produção em massa de bens de consumo. Inicialmente bens de consumo corrente; numa segunda fase bens de consumo duradouro de base electrónica e, mais recentemente, bens duradouros como o automóvel, sendo que nos bens electrónicos apenas realiza a fase final das cadeias de produção, importando componentes e subsistemas. Integrada na zona dólar, a China tem sido procurada como base de exportação por parte de outras “economias chinesas” igualmente integradas nessa zona pela Coreia do Sul e pelo Japão e em menor escala por empresas norte-americanas e europeias, igualmente interessadas em assegurar uma presença no mercado interno chinês; • A China acumula excedentes correntes com os EUA; recebe importantes fluxos e investimento da Ásia, mas também dos EUA e da Europa e “recicla” esses excedentes, acumulando reservas cambiais em dólares, financiando o défice corrente dos EUA, em conjunto com os outros países asiáticos que têm tido no mercado dos EUA um motor sólido para as suas exportações.
A Arábia Saudita... • Tem tido, até recentemente, os meios para regular o mercado petrolífero, graças à sua posição de maior exportador e de único com capacidade excedentária suficientemente significativa para poder interferir na formação dos preços, conforme mobilize ou mantenha suspensa essa mesma capacidade. A economia mundial, na fase actual de globalização, funciona pois assente numa estrutura dominada por um conjunto de relações assimétricas e de desequilíbrios permanentes entre os seus principais actores. Assim: • Os EUA são a economia mais multinacional e organizada em rede de todas as economias desenvolvidas. Ao mesmo tempo que empresas e consumidores americanos se abastecem de produtos “baratos” na Ásia e de energia no Golfo e nas Américas, a sua “economia territorial” gera défices comerciais sistemáticos, mas recebe os rendimentos dos capitais resultantes da actividade das filiais das suas empresas no estrangeiro e atrai capitais de todo o mundo devido à inovação, rendibilidade das empresas, diversidade e qualidade dos activos financeiros e dimensão, profundidade e liquidez dos seus mercados de capitais. É também a economia líder da zona dólar. • O Japão e a Europa continental têm crescimento potencial de longo prazo claramente inferior ao dos EUA, facto associado a perspectivas demográficas e a níveis de produtividade distintos; além disso asseguram níveis de rendibilidade inferiores aos dos EUA; pelo que são induzidos a colocar no exterior parte das suas poupanças, só não o fazendo em mais larga escala devido ao peso da sua dívida pública; a economia dos EUA e as economias asiáticas são o destino “normal” destes fluxos. • O Japão comporta-se ainda como uma economia exportadora; regista excedentes comerciais quer com os EUA, quer com a Ásia, incluídos ambos na zona dólar; tem tradicionalmente excedentes na sua balança corrente, funcionando como um financiador do conjunto, quer exportando capitais de curto prazo para os EUA e para as economias emergentes, sob a forma de empréstimos bancários a curto prazo; quer exportando capitais a longo prazo para os EUA e Reino Unido. • As “economias chinesas” são, com os EUA, as economias com maior potencial de crescimento e transformaram-se na principal base global para as actividades industriais – processo que acelera a desindustrialização das actuais macro-regiões mais desenvolvidas do mundo; os principais excedentes comerciais das “economias chinesas” eram até há pouco obtidos com os EUA, sendo actualmente (Setembro de 2000) a UE o principal parceiro económico; a dinâmica de exportações e de crescimento do mercado interno que está associado à dinâmica exportadora atrai uma parte crescente do pool de poupanças global. Excedentes comerciais e entradas líquidas de capitais são geridos de forma mercantilista, gerando acumulação de reservas cambiais, mais do que abertura de mercado e crescimento das importações. Enquanto se mantiverem na zona dólar estas economias contribuem para o financiamento do défice corrente dos EUA por via da acumulação de reservas cambiais detidas em activos de curto prazo em dólares.
Equilíbrio instável... As principais economias, EUA, Japão, “economias chinesas” e Europa continental, são importadoras líquidas de petróleo, sendo o Golfo Pérsico a principal base de abastecimento global. Variações violentas do preço do petróleo aprofundam os desequilíbrios externos dos principais actores e podem precipitar crises cambiais, desempenhando a Arábia Saudita o papel crucial de regulador do mercado do petróleo, graças à utilização da sua capacidade excedentária de produção. Esta estrutura base da globalização, assente em fluxos determinados por fortes assimetrias de activos, é instável, podendo gerar periodicamente crises financeiras e cambiais, mas que não significam o seu fim. * José Manuel Félix Ribeiro Os principais actores na globalização A estrutura que suporta a dinâmica de globalização
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