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Onde estou: | Janus 2007> Índice de artigos > Religiões e política mundial > Influência política das religiões > [ O Paquistão e o islão combatente: a Jihad ] | |||
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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! Ao lançarem-se na luta contra Nova Delhi, os caxemirenses denunciam a incúria e as manipulações da política indiana que, desde 1953, vem corroendo a autonomia maximalista inicialmente concedida a Caxemira, designadamente não organizando o referendo prometido por Nehru em 1948. O núcleo duro do movimento nada tem de islamita, pelo contrário: a Frente de Libertação do Jammu e de Caxemira é mais independentista do que pró-paquistanesa (apesar de o Paquistão a apoiar); e é laica, invocando o espírito da kashmiriyat , que transcendia a diferença entre muçulmanos e hindus. Mas a Frente também é um protagonista da história recente, entendida como a de um despertar do islão: em 1962, vitória da FLN argelina sobre a potência colonial; em 1979, tomada do poder pelo islão iraniano vitória da revolução khomeinista; em 1989, derrota soviética contra os mujaedines afegãos; em 1991, implosão da URSS e nascimento das repúblicas muçulmanas da Ásia Central; e, em sucessivos momentos destas décadas, o recomeço do combate palestiniano...
A reconquista da Índia Mas Caxemira não é o Afeganistão, nem a Índia é a URSS. Os indianos aguentam a situação em Caxemira, e Islamabad terá rapidamente de mudar de estratégia, como mudou no Afeganistão mal empalideceu a estrela do seu protegido Gulbuddin Hekmatyar, incapaz de “segurar” o país. No Afeganistão ocidental como no leste de Caxemira, o exército paquistanês, chamando a si os respectivos dossiers, mesmo quando o poder está a ser exercido por civis, vai instrumentalizar o islão num jogo perigoso, como se perceberá imediatamente a seguir ao 11 de Setembro de 2001. Em 1994, os ISI lançam os talibans, formados em madrassas dos arredores de Peshawar, à conquista do Afeganistão. Quase em simultâneo, e enquanto a Índia marca pontos contra os insurrectos caxemirenses, cujos jovens líderes não-islamitas (Yasin Malik, Shabir Shah) trocam a luta armada pelo combate político, Islamabad reforça a sua intervenção local, fazendo juntarem-se aos combatentes caxemirenses do Hizb ul Mujahideen esquadrões paquistaneses e de antigos combatentes do Afeganistão, formados na Caxemira paquistanesa, no Paquistão ou no Afeganistão, e cujo programa é abertamente islamita: o Harkat ul Ansar (Companheiros do Profeta), os Laskhar e Taiba (Combatentes da Pureza), e depois, em 2000, o Jaish e Mohammed (Exército de Maomé). Os Laskhar e Taiba , por exemplo, são o braço armado do Markaz ad Dawa wal Irsahd (Centro de convite à escuta da palavra divina), que tem sede pública no Paquistão e que propaga uma ideologia radical, salafista, pregando um retorno puritano (e reinventado) ao Islão do Profeta e dos seus sucessores imediatos. Caxemira é um teatro de operações, mas a ambição é mais vasta: este islão combatente, transportado pelo espírito da jihad , tem em vista toda a Índia, e mais além dela. Na Internet, os textos do Markaz e dos Laskhar anunciam a reconquista da Índia, rebaptizada Mogolstão ( Mogholstan ).
Internacionalismo islamita Mais elaborada é a organização de um internacionalismo islamita, que tenta dar aos diversos combates dos muçulmanos no mundo um mesmo significado: Bósnia, Tchetchénia, Palestina, Caxemira, Filipinas... A sombra da Al Qaida plana sobre esse fervilhar ideológico, embora a fatwa de Osama bin Laden (Fevereiro de 1998), assinada pelo secretário-geral de um partido islamita paquistanês, não mencione Caxemira. Islamabad entende conduzir, assim, contra a presença indiana em Caxemira, uma guerra de baixa intensidade, feita por formações armadas sob o seu controlo mas não-militares, baptizadas de “combatentes da liberdade”. Nova Delhi descreve a estratégia do seu adversário em duas fórmulas: trata-se de uma “guerra por substituição”, porque o exército paquistanês não opera directamente no terreno da Caxemira indiana, e que recorre ao “terrorismo transfronteiras”. Tal estratégia não é, porém, isenta de riscos para a sociedade paquistanesa em primeiro lugar, e depois para as opções geopolíticas do país. O islão paquistanês pouco difere do islão indiano – ambos são dominados pelo sufismo, uma tendência sunita popular, adepta do culto dos santos, e que era odiada pelos rigoristas reformadores nascidos na Índia do séc. XIX e que depois se implantaram no Paquistão, em torno de forças políticas específicas, em especial os déobandis rigoristas, próximos dos wahabismo encorajado pelos petro-dólares sauditas. Este sunismo doutrinário não está apenas em guerra contra o islão pervertido e “hinduizado” da tradição subasiática. Entre os seus inimigos contam- Hinduísmo e Islão pós-11 de Setembro Abordar o pós-11 de Setembro valorizando as religiões em vez das nações responde decerto à problemática em questão mas envolve riscos, o primeiro dos quais é o de dar crédito à tese do choque de civilizações. Se é fácil demonstrar que esta tese é tão perigosa como simplista e que favorece a amálgama, convém no entanto apurar o peso das percepções que, de uma forma ou outra, a credibilizam. E também é conveniente identificar o que, nos contextos nacionais, releva dos debates em curso : não existe uma Índia hindu que se reconheça nas teses extremistas do Sangh Parivar , como também não existe um islão paquistanês uniformemente radical. A 12 de Setembro de 2001, Índia e Paquistão mostram-se ao lado dos EUA na guerra contra o terrorismo que se anuncia. O general Musharraf vai depressa abandonar os talibans, visto que estes não se dispõem a entregar bin Laden. A Índia declara o seu mal-estar, e espanta-se, através de diversas vozes governamentais, com a possibilidade de “o Paquistão, parte do problema terrorista, poder ser parte da sua solução”. Nova Delhi não conseguirá que o Paquistão seja classificado como Estado terrorista nos termos das resoluções 1368 e 1373 da ONU. Mas as pressões americanas, sobretudo depois do atentado contra o parlamento indiano de 12 de Dezembro do mesmo ano, que incitam a Índia a enviar tropas para a fronteira com o Paquistão, levarão Musharraf a condenar a jihad e a proibir, em Janeiro de 2002, os grupos agora definidos como terroristas por Washington e já não, apenas, por Nova Delhi: a começar pelos Laskhar e Taiba e Mohammad . O 11 de Setembro e o seu seguimento exacerbaram as contradições da linha paquistanesa seguida por muitos militares por razões mais geoestratégicas do que ideológicas, mesmo se alguns responsáveis, antigos chefes dos serviços secretos ou antigos chefes de estados-maiores, exibem um discurso que promove o islão ou o islamismo. Musharraf, por seu lado, tinha-se distanciado, imediatamente após a sua posse, daqueles a quem chamava “beatões”, embora tenha sido, logo a seguir, obrigado a apagar as referências a Kemal Ataturk.
Paquistão contraditório Duas contradições maiores pesam sobre o Paquistão de hoje: a primeira exprime-se no carácter vaporoso das referências ao Islão. As fracas manifestações pró-talibans e anti-bombardeamentos americanos, em Outubro 2001, mostraram que o peso local dos partidos islamitas tinha sido sobreavaliado. Mas a referência ao islão mantém-se incontornável, porque ela é a razão fundadora da partição de 1947 e exprime a própria legitimidade do país. Sai-se desta contradição invocando um islão moderado, aberto ao Ocidente (recordam- Informação Complementar Os mal-amados de "segunda zona" Hoje, a frustração cresce no Paquistão. A ideia de que o islão é uma religião mal amada, e de que os muçulmanos são cidadãos do mundo de segunda zona, fez o seu caminho bem para além dos círculos de extremistas islamitas. Os acordos militares entre EUA e Índia, Índia e Israel, são entendidos, mesmo entre intelectuais liberais, como sinais que confirmariam as teses de Huntington. Desde há anos, os islamitas denunciavam a aproximação indo-israelita, que visaria apertar, com o beneplácito ocidental, a tenaz que prende o mundo muçulmano. Nas revistas semigovernamentais paquistanesas, lêem-se artigos denunciando a “aliança bramânico-talmudista”, e que levam às relações internacionais a crítica, banal entre islamitas mas não só, do bramanismo, pintado como instrumento ideológico da hegemonia das castas dominantes do hinduísmo sobre o conjunto da população indiana (muçulmanos, mas também castas baixas e intocáveis) : é a visão de uma Índia sob o jugo das castas altas, até ao dia em que a revolta dos oprimidos a subverta – variante da conhecida imagem de uma Índia mais frágil do que parece, ou artificialmente unificada. Inversamente, a imagem da Índia como potência crescente alimenta os fantasmas sobre a fraqueza do islão. A vitalidade económica indiana, o interesse (ainda limitado) do investimento estrangeiro por este mercado de mil milhões de homens e mulheres, são evocados para explicar a complacência do Ocidente para com um país acusado de desrespeitar as resoluções da ONU em Caxemira. Não apenas nos círculos islamitas, instala-se a imagem de um Paquistão e de uma Caxemira perdendo em todas as frentes porque são muçulmanos. Eis, segundo esta leitura, a lista dos povos muçulmanos oprimidos pelos poderosos: palestinianos, tchetchenos, caxemirenses, e depois iraquianos, em nome de um eixo Ocidente-Israel-Rússia; o amigo chinês ainda não é criticado pela sua política face aos uigures muçulmanos do Sinkiang e comenta-se a duplicidade dos discursos, ou das práticas, tendo como pano de fundo a discriminação muçulmana. Porque é que Timor-Leste, ao contrário de Caxemira e da Tchetchénia, foi tão depressa objecto de um referendo sobre a independência? Porque é cristão, e a sua independência foi obtida contra a Indonésia muçulmana... Porque é que Washington se comoveu tão pouco com o massacre de 1500 muçulmanos no Gujarat indiano, mas se perturba diante do assassínio de dez cristãos paquistaneses?
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