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- JANUS 2007 -



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Ayatollah Khomeini: o pai da República Islâmica

Ana Damásio *

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Conhecido pelo seu turbante negro e ar austero, o ayatollah Khomeini é umas das figuras mais importantes do século XX. As suas ideias representam um ponto de viragem para a comunidade muçulmana ( umma ), que assistiu à construção da primeira República Islâmica. Curiosamente, esta fez-se por via do xiismo, ramo minoritário do islão, com Khomeini como motor deste regime teocrático.

 

Dados biográficos

Ruhollah Musavi nasceu em 1902, em Khomein (Irão), numa família de clérigos de longa tradição. Dada a morte precoce dos pais, a sua educação ficou entregue ao irmão, que o iniciou nos estudos teológicos. Ao longo da sua carreira académica, Khomeini passou pelos dois principais centros do saber xiita: Qom no Irão e Najaf no Iraque.

Foi em Qom que os seus discursos inflamados contra o xá, em 1963, precipitaram uma série de motins e a detenção do próprio ayatollah . Este desafio ao xá obrigou-o ao exílio, primeiro na Turquia e depois em Najaf. Em Najaf, Khomeini publicou pela primeira vez as suas ideias sobre o vilayat-i faqih ou governo do jurisconsulto. O ayatollah acabou por ser deportado do Iraque para França em 1978, de onde partiu para abraçar a revolução em curso no Irão, em Fevereiro de 1979. Este regresso marcou o carácter “islâmico” da revolução, com o silenciamento dos elementos da oposição secular e marxista que participavam no movimento.

 

O vilayat-i faqih

A ideia de vilayat-i faqih é a imagem de marca do testamento teológico do ayatollah Khomeini. Este conceito determina a existência de um regime teocrático em que o líder religioso de maior relevo assume a posição de topo na hierarquia política (ver esquema). Khomeini, como religioso-jurisconsulto, controlava não só todo o aparelho político iraniano, mas virtualmente toda a República Islâmica, através da sua rede de conselheiros e da Guarda Revolucionária ( sipah-i pasdaran ). A Constituição que o ayatollah inspirou indicava que no caso de não surgir outro religioso-jurisconsulto depois da sua morte, a liderança caberia a um comité de religiosos séniores. Adivinhando o que sucederia, Khomeini mudou de discurso meses antes de morrer e abriu lugar à sua sucessão por Ali Khamenei, na altura um religioso de escalão intermédio.

Khomeini foi para a maioria dos iranianos mais do que um líder político-religioso.

A sua figura foi até à sua morte, em 1989, a de um pai da nação. Foi mesmo considerado “fonte de imitação” ( marja-i taqlid ), qualificação máxima para os religiosos xiitas.O povo chamava-o imã, por deferência e em analogia com os 12 guias do xiismo iraniano.

 

A exportação da revolução

A exportação da revolução islâmica foi desde o início um dos objectivos de Khomeini. O ayatollah incitava os mais desfavorecidos à luta contra a injustiça social e ao estabelecimento de governos islâmicos que contrapusessem a influência do Ocidente. Este pilar da política externa iraniana passou, no entanto, de uma meta clara nos primeiros anos, a desígnio do foro meramente cultural no mandato do moderado presidente Khatami. A própria guerra com o Iraque, e os recursos que esta exigiu e o papel dos pragmáticos do regime, como Rafsanjani e Khatami, foram factores que contribuíram para esta mudança.

Khomeini defendia a exportação da revolução por meios pacíficos; no entanto, as ligações do Irão a grupos extremistas e à oposição a vários regimes vizinhos contrariavam a tese oficial. Este apoio originou um historial de tensão entre o Irão e alguns dos mais importantes estados árabes, como o Egipto e a Arábia Saudita. A ligação da República Islâmica a grupos políticos xiitas no Líbano e nas Filipinas é também conhecida. O Irão procurou ainda influenciar os xiitas no Iraque, no Bahrein e no Koweit. Actualmente, essa influência é um elemento chave no novo Iraque, no Líbano e nos Territórios Ocupados, mas perdeu espectro nas pequenas monarquias do Golfo, onde a distribuição de riqueza tem contentado as populações.

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Informação Complementar

1979: o ano do Ayatollah

No dia 1 de Fevereiro de 1979 Ruhollah Khomeini regressou ao Irão depois do exílio em França. O ayatollah tomou conta da revolução em curso e tornou-se o Líder Supremo da República Islâmica. Ainda assim, não poderia supor o que o resto do ano significaria para o islamismo radical.

Alguns meses depois, na Arábia Saudita, um grupo de extremistas armados tomou de assalto a Grande Mesquita em Meca. No fim do ano, a União Soviética iniciou a colocação de tropas no Afeganistão. Estes eventos espelham a mudança que germinava na região: o islamismo emergia como rival do secularismo e das monarquias tradicionais. E apresentava uma saída para populações desencantadas com os fracassos nas guerras contra Israel e as desigualdades económicas que o nacionalismo secular árabe ou persa e o petróleo não conseguiram resolver.

No caso da revolução iraniana, o seu impacto foi tremendo e Khomeini procurou estender a sua influência a toda a região. O Irão tornou-se mentor de grupos islamitas por todo o mundo árabe e, nos primeiros anos da República Islâmica, apelava directamente aos povos muçulmanos para derrubarem os seus governos contrários à doutrina do islão. Esta campanha fez-se sentir no Iraque, na Arábia Saudita, no Egipto, no Líbano e nos pequenos Estados do Golfo, para além do envolvimento no conflito israelo-palestiniano através do apoio a grupos armados.

Breve cronologia

1902 – Nascimento em Khomein, Irão.
1903 – Morte do pai.
1918 – Morte da mãe e da tia, responsáveis pela sua educação.
1927 – Obtenção em Qom do título de ijtihad .
1963 – Discurso sobre dependência do xá dos poderes ocidentais. Detenção em Qom.
1964 – Detenção e exílio, primeiro na Turquia, depois no Iraque.
1970 – Desenvolvimento da teoria do vilayat-i faqih em Najaf.
1978 – Expulsão do Iraque. Fuga para França.
1979 – Regresso apoteótico ao Irão durante a revolução. Criação da República Islâmica.
1980 – Ataque iraquiano origina guerra Irão-Iraque.
1989Fatwa contra Salman Rushdie, autor dos “Versículos Satânicos”.
Morte em Junho do mesmo ano em Teerão.

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* Ana Damásio

Licenciada em Ciências da Comunicação, especialização jornalismo, na Universidade Nova de Lisboa. Mestre em Ciência Política/ Relações Internacionais pela American University, Cairo. Estagiária na Embaixada de Portugal no Cairo na área de Assuntos Económicos, informação no domínio da Importação e Exportação (2004/2005). Jornalista.

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