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Conflitos militares e o pós-11 de Setembro O ano de 2008 marcou a passagem de cinco anos desde a invasão do Iraque (operação «Liberdade Iraquiana») e sete anos desde a invasão do Afeganistão (operação «Liberdade Duradoura»). Ambas as operações foram levadas a cabo pela administração de George W. Bush, na sequência dos actos de terrorismo de 11 de Setembro de 2001, ao abrigo, presumidamente, de uma campanha de «Guerra Global ao Terror». Este conjunto de acontecimentos marcaria de uma forma indelével a paisagem da segurança internacional. A sua influência directa e indirecta irá, certamente, estender-se por bastante tempo. Ambos os conflitos começaram como guerras entre Estados e coincidiram com a interrupção de uma tendência de queda no número global de conflitos que se vinha desenhando desde o desmoronamento do Bloco de Leste (Harbom e Wallensten, 2007, p. 623). A abordagem militar posta em prática em ambos os casos tem, desde então, sido considerada invulgar dado que formas mais típicas de contra-terrorismo teriam sido mais aconselháveis (Rogers, 2008, p. 178). No entanto, as acções no terreno foram eficazes em relação aos objectivos a que se propunham no momento e resultaram rapidamente na dissolução das estruturas de poder nos dois países. Durante o ano que se seguiu às respectivas invasões ambos os teatros de operações pareciam ser sinónimo do triunfo do poderio bélico das forças estrangeiras. Contudo, e novamente nos dois casos, o ambiente de risco não desapareceu com o fim das operações militares convencionais. As dificuldades verificadas na estabilização das sociedades e na reconstrução de instituições vieram sublinhar o défice de compreensão do comportamento de agentes não-estatais cujos movimentos e redes de suporte não se restringem necessariamente às fronteiras formalmente estabelecidas (Bilgin, 2008, p. 95). As exigências ligadas à permanência de elevados contingentes militares levaram a necessidades financeiras crescentes forçando a administração norte-americana a pedir a aprovação junto do Congresso de várias dotações extraordinárias, e mesmo mais do que uma durante um dado ano como, em 2007 ( The New York Times , 23 de Outubro, 2007). É a história deste processo de instabilidade que importa detalhar, quantificar e compreender.
Iraque: Os primeiros cinco anos depois da invasão norte-americana O ano em que o Iraque foi invadido foi, paradoxalmente, o ano com menos conflitos em curso desde meados da década de 1970; o número de conflitos activos tem aumen-tado desde então (Harbom, et al. , 2008, p. 697). A tendência de aumento de violência seria sentida dentro do próprio Iraque. Os primeiros quatro anos de violência armada, isto é, o período entre Março de 2003 e Março de 2007, foram caracterizados por uma tendência crescente em termos de baixas militares norte-americanas. Esse crescimento foi modulado por flutuações cíclicas e por aumentos periódicos na violência ligados ao calendário do Ramadão. Mais notável foi a ocorrência de uma rotura no processo normal de violência em Janeiro de 2005, em consequência de uma confluência de circunstâncias: o Ramadão, as eleições presidenciais de Novembro nos Estados Unidos e a ofensiva norte-americana em Fallujah, coincidentes com as eleições para a Assembleia Nacional de Transição no Iraque (Mendonça e Nunes, 2008). Essa forte perturbação é por nós entendida como uma mutação do conflito essencial para compreender a sua evolução ao longo do tempo, uma transformação estrutural que separa o «antes» do «depois». Se até aí o processo de violência poderia ser descrito como de resistência ao invasor, a partir daí transformou-se num processo diferente que para muitos autores poderia ser apropriadamente descrito como guerra civil (Dobbins, 2007; Fearon, 2007). Para vários observadores, a situação no teatro de operações mostrava a ausência continuada de uma estratégia de «contra-insurgência», pelo menos até ao reforço de tropas de 2007 conhecido como «Surge» (e.g. Burns, 2008). Este aumento da presença militar está associado à tomada do comando pelo General David Petraeus, em 10 de Fevereiro de 2007 (Petraeus passaria essa liderança ao General R.T. Odierno, em 16 de Setembro de 2008, para assumir o Comando Central e a responsabilidade de supervisão pelo Médio Oriente, Africa Oriental e Ásia Central). Embora os contornos do «Surge» não estejam ainda completamente compreendidos, parece emergir que o reforço de tropas foi uma decisão controversa dentro da Casa Branca e que a nova abordagem estratégica terá empregue operações secretas de uma forma muito substancial. O jornalista Bob Woodward (2008), que teve acesso a vários protagonistas das deliberações, sugere mesmo que o reforço de tropas não foi a principal causa por detrás da redução da violência. A estes factores juntam-se outros como o fornecimento de armas e a injecção de dinheiro em favor de várias facções em jogo (sobretudo às milícias Sunitas) e de desenvolvimentos políticos no terreno como, por exemplo, a trégua declarada pelo exército Mahdi de Muqtada al-Sadre (Dobbins, 2007). Mais óbvios foram, apesar de tudo, os efeitos desta nova etapa do conflito. Por exemplo, a diminuição das más notícias, em particular das baixas entre os militares norte-americanos, removeu o Iraque do topo dos assuntos debatidos pelos candidatos presidenciais, em 2008. O declínio das mortes iraquianas e norte-americanas é a talvez a mais clara descontinuidade neste conflito iniciado em 2003 e o único ponto de viragem detectado depois de Janeiro de 2005, aquando da viragem para a guerra civil. Para usar as palavras do senador norte-americano Jack Reed, as operações ligadas ao reforço de tropas acabariam por funcionar como um «torniquete que estancou a hemorragia.» ( Washington Post , 19 de Março, 2008). Apesar do sucesso associado à reorientação estratégica, o Iraque continuava, no entanto, a ser o conflito mais mortífero do mundo, em 2007, logo seguido pelo Afeganistão (Harbom 2008, p. 698).
Afeganistão: uma «guerra boa» em mau estado A invasão do Afeganistão deu-se a 7 de Outubro de 2001. As operações começaram com a introdução de pequenas forças especiais cujo objectivo eram abrirem espaço para a missão de derrube dos talibã e arruinar a Al Qaeda começando pela eliminação dos seus dirigentes. No início de 2002, o Afeganistão era considerado libertado. Porém, essa impressão seria uma primeira instância de um padrão de avaliações erróneas que colocaria em risco a condução da «guerra boa», o nome como a guerra do Afeganistão viria ser conhecida entre os militares norte-americanos ( The New York Times , 12 de Agosto de 2007). A guerra do Iraque impediu o empenho extensivo das forças norte-americanos no Iraque e depauperou ainda mais os meios afectos à reconstrução das instituições Afegãs (Santos, 2008). Entretanto, os combatentes Talibã e a Al Qaeda reoganizavam-se a partir das regiões de fronteira com o Paquistão. Em Junho de 2005, o embaixador dos Estados Unidos no Afeganistão, Zalmay Khalilzad (nascido no Afeganistão), que tinha tido um papel na estabilização do Afeganistão, foi enviado para liderar a embaixada no Iraque (de onde sairia em Março de 2007 para substituir John Bolton como embaixador nas Nações Unidas). O aumento da insegurança nos territórios afegãos aparenta ter aumentado significativamente nessa Primavera de 2005, precisamente na altura em que a situação no Iraque saía fora de controlo.
Conclusão Este artigo pretendeu contribuir com uma nova perspectiva e nova evidência empírica sobre a estrutura e a dinâmica dos conflitos em curso no Iraque e no Afeganistão. O artigo procurou especificamente olhar com renovada atenção para o efeito da estratégia associada ao reforço de tropas no Iraque, no início de 2007, para o salto de violência no Afeganistão verificado na Primavera de 2005 e para os possíveis aspectos comuns dos dois conflitos.* Sandro Mendonça Docente no Departamento de Economia do ISCTE. É membro da Comissão Executiva do Obercom – Observatório da Comunicação e colabora no Dinâmia, ERC, UECE e CISEP. Doutorando do SPRU, Universidade de Sussex.
** Luís Catela Nunes Doutor em Economia pela University of Illinois at Urbana-Champaign. Professor Associado da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa. Referências bibliográficas BILGIN, P., 2008, – «Critical theory», in P. D. Williams (org.) – Security Studies: An Introduction, Routlege, pp. 89-102. BURNS, J. F., 2008, – «War torn – Five Years». The New York Times, 16 de Março. DOBBINS, J., 2007, – «Are the Sunnis Changing Sides?». International Herald Tribune, August 17. FEARON, J., 2007, – «Iraq's Civil War». Foreign Affairs, Vol. 86, n.º 2, pp. 1-13. HARBOM, L. e WALLENSTEN, P., 2007, – «Armed Conflict, 1989-2006». Journal of Peace Research, vol. 44, n.º 5, p. 623-634. HARBOM, L., MELANDER, E. e WALLENSTEEN , P., 2008, – «Dyadic Dimensions of Armed Conflict, 1946-2007». Journal of Peace Research, vol. 45, n.º 5, p. 697-710. MENDONÇA, S. e NUNES, L. C., 2008, – «Números Fatais: Violência no Iraque, 2003-2007». Janus, n.º 11, pp. 12-13. ROGERS, P., 2008, – «Terrorism», in P.D. Williams (org.) – Security Studies: An Introduction, Routlege, pp. 171-184. SANTOS, J. L., 2008, – «Um Balanço da Guerra do Afeganistão». Janus, n.º 11, pp. 14-15. WOODWARD, B., 2008, – The War Within: A Secret White House History (2006–2008), Simon & Schuster.Dados adicionais Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas (clique nos links disponíveis) Coincidência de fases de ciclos de violência: Iraque/Afeganistão (2003-2008) Iraque: cinco anos de evolução do conflito Afeganistão e mudança estrutural do processo de violência Iraque e Afeganistão: que relação (estatística)?
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