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- JANUS 2009 -



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China-Japão: a corrida pela liderança mundial

Carlos Roberto *

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Quem avalie as relações sino-japonesas não pode ignorar um conjunto de atitudes levadas a cabo por ambas as partes, nos últimos anos, que demonstram as desconfianças mútuas existentes, fruto de um passado pautado por confrontações sangrentas.

Essas atitudes, que provocaram violentas reacções nas ruas, em 2005, e que fizeram reacender ódios, têm por detrás uma acesa luta pela hegemonia política e económica da Ásia Oriental e do Sudeste Asiático, o acesso a fontes de abastecimento energético e a outras commodities e a emergência da China como superpotência.

Mas se estes aspectos são centrais e reflectem a vontade da China em ganhar uma crescente predominância regional que a possa projectar à escala continental e mundial, a substituição do Primeiro-Ministro Koizumi, muito criticado pelas autoridades chinesas pela suas sucessivas visitas ao templo Yasukuni – símbolo da belicista herança imperial japonesa que conduziu a milhões de mortos em todo o continente asiático e em especial na China –, por Shinzo Abe´s foi um passo fundamental no restabelecimento de pontes de diálogo entre os dois países.

Este «quebrar do gelo», iniciado em Outubro de dois mil e seis, teve sequência com a nomeação, o ano passado, de Yasuo Fukuda para Primeiro-Ministro, que elegeu a China, em detrimento dos Estados Unidos, como o país de destino para a sua primeira deslocação ao exterior, rompendo desta forma com a anterior tradição de primeiras viagens a Washington para sinalizar a aliança Japão-EUA.

A contrapartida deste esforço de reaproximação entre os dois países teve sequência na recente visita ao Japão do Presidente Hu Jintao, em Maio passado, e do Ministro da Defesa Chinês General Cao Ganchung, em Junho.

Procura-se, desta forma, esbater tensões havendo a sensação que, por detrás de iniciativas positivas e de compromissos de índole geral, ambas as partes tentam ganhar tempo para reajustar as suas estratégias de actuação.

 

As grandes dicotomias no plano do desenvolvimento e do bem-estar

É ainda enorme o fosso entre os dois países, expresso, nomeadamente, nos indicadores de desenvolvimento humano, na quantidade de riqueza criada, no rendimento per capita , na qualidade do ensino, mas o ritmo a que se está a produzir o crescimento da economia chinesa permite antever que a China alcance o Japão em 2020, em termos de produto interno bruto.

Com efeito, e por via da globalização e da modernização da China, tem-se vindo a assistir, nos últimos anos, a um aumento do seu peso no comércio mundial em detrimento, entre outros, do detido pelo Japão, cuja economia passou por períodos de estagnação ou de crescimento moderado nos últimos anos. As comunidades de origem chinesa espalhadas pelo mundo são um factor relevante para a penetração dos seus produtos, de captação de investimentos e fluxos financeiros dos emigrantes.

De acordo com a UNCTAD (1), as remessas dos emigrantes chineses têm vindo a crescer cifrando-se em 22,492 milhões de dólares, em 2006, e correspondendo a 0,8% do PIB chinês. No caso da ASEAN (2), a China já se superiorizou ao Japão no que às trocas comerciais diz respeito. Se em 2004 o Japão ainda liderava com 112.858 milhões de euros face aos 82.784 milhões de euros da China, já em 2006 a situação inverteu-se com a China a liderar com 127.680 milhões de euros contra 124.310 milhões de euros do Japão. Se estes dados, entre outros, são significativos para se perceber quanto a China tem avançado nos últimos anos e quão impressionante é o ritmo desse mesmo avanço, não se pode deixar de considerar que a diferença de bem-estar entre os dois povos é abissal e muito dificilmente será esbatido na primeira metade do século XXI.

A entrada da China na economia global a par da Índia e mais recentemente dos países da Europa de Leste fez, por um lado, aumentar de forma acentuada os custos unitário do trabalho nesses países, mas, por outro, tem contribuído para a redução dos mesmos nos países desenvolvidos.

No caso do Japão, assiste-se, desde 1998, a uma evolução anual negativa da taxa de crescimento dos custos unitários do trabalho.

Esta tendência para a desaceleração do custo unitário do trabalho nas economias mais desenvolvidas vai continuar a sentir-se ao longo deste século, caso não sejam introduzidos acentuados mecanismos proteccionistas, pois é quase ilimitada a oferta de mão-de-obra por parte da China e da Índia.

O processo de desenvolvimento económico destes países efectuar-se-á também através da crescente incorporação de know-how e tecnologia o que implicará uma transferência para eles de actividades económicas hoje asseguradas pelas economias mais desenvolvidas. A criação de um desenvolvimento sustentável em detrimento do crescimento puro e duro exigirá importantes mudanças no paradigma produtivo. Neste particular, o Japão poderá desempenhar um importante papel dado ser um dos países com melhores indicadores de sustentabilidade.

A eficiência energética só pode ser obtida com sofisticação tecnológica e racionalização de processos produtivos e nesse campo o Japão tem um grande know-how que pode ser aproveitado pela China a todos os níveis da sua actividade económica.

No médio e longo prazos as áreas de intervenção da economia japonesa na China serão centradas em todos os domínios que tenham a ver com a sustentabilidade mais do que em empresas de consumo de massas.

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A crescente interdependência económica: quem está mais dependente?

A interdependência entre as duas economias é muito acentuada ao nível das trocas comerciais e do investimento e tem contribuído para o relançamento da economia japonesa.

Em 2006, a China era o segundo parceiro comercial (18,2% do total) do Japão, sendo a primeira nas importações (21,2%) e a terceira nas exportações (15,4%), enquanto que na balança comercial chinesa o Japão é o terceiro parceiro (12,6% do total), sendo o primeiro nas importações (16,4%) e o quarto nas exportações (9,7%).

Fazendo uma comparação destes dados com os observados em 2004 verifica-se, em termos percentuais, uma maior dependência do Japão face à China já que esta continua a diversificar as relações comerciais relativizando as mantidas com a economia japonesa.

No que diz respeito ao investimento estrangeiro, o Japão, é segundo maior investidor.

Actualmente, vinte mil empresas japonesas operam na China e começa a crescer o número de empresas chinesas que tentam operar no Japão, quer através da abertura de filiais, quer por compra de empresas japonesas.

Havendo um gap de know-how e de tecnologia entre os dois países, com vantagem para o Japão, tem sido interessante observar o processo de expansão entre as duas economias. Enquanto as empresas japonesas alicerçam a sua presença na China deslocalizando actividades produtivas – com transferência de I&D – e abrindo redes de retalho, as empresas chinesas investem no Japão adquirindo empresas locais detentoras de I&D em dificuldades económicas para, numa fase posterior, transferirem esse I&D para a China.

Tais políticas de expansão resultam das aludidas desconfianças mútuas que impedem uma mais rápida integração das duas economias.

Contudo, a economia chinesa está mais exposta à queda/abrandamento da economia mundial do que a japonesa, daí se perceber as crescentes preocupações das autoridades daquele país pela revisão em baixa do crescimento do PIB de 11,8% para 9,8%, em 2008.

Com efeito, de acordo com os dados do Banco Mundial de 2006, as exportações de bens e serviços da China representam 40% do PIB enquanto que no Japão apenas 14% (dados de 2005).

Sendo certo que se possa verificar a referida queda/abrandamento das exportações, por via da desaceleração da economia mundial, o elevado grau de competitividade das mesmas não fará com que a China perca quota de mercado.

O estádio de desenvolvimento da China permite uma maior margem de manobra nas políticas económicas do que no Japão, sendo possível reorientar a «locomotiva do crescimento» para a economia doméstica.

 

Necessidades energéticas – o «calcanhar de Aquiles» dos dois países

Nos últimos anos, tem-se vindo a assistir a uma vigorosa disputa à escala mundial entre estes países no acesso às fontes de abastecimento, com a China a levar a melhor ao Japão em várias áreas do globo (Equador, Venezuela, Brasil, Peru, Síria, Sudão, Nigéria, Angola, Argélia, Chade, Kazaquistão, Azerbeijão, Irão, Arábia Saudita, Rússia). O Médio Oriente satisfaz 45% (13,6% do total do abastecimento é proveniente do Irão) e a África 29% das necessidades da China em petróleo.

Para a China, é vital manter o acesso às matérias-primas e ao mesmo tempo criar condições para garantir a segurança dos meios de transporte até aos portos chineses, principalmente quando 4/5 do petróleo importado passa pelo Estreito de Malaca, onde se verificam casos de pirataria marítima e onde poderão vir a ocorrer ataques terroristas.

Com este objectivo, tem a China vindo a desenvolver uma estratégia, designada de «colar de pérolas», que consiste em criar relações estratégicas com vários países ao longo das linhas marítimas, desde o Médio Oriente até ao Mar da China do Sul.

Com a recente abertura do pipeline com o Kazaquistão, a China, pela primeira vez, assegurou uma fonte de abastecimento de energia não vulnerável às forças americanas aéreo-transportadas, o que não acontece no caso dos abastecimentos no Golfo Pérsico e no Sudão.

Quer a China, quer o Japão têm muito a perder com um possível conflito em torno da intenção iraniana, de produção de energia e tecnologias nucleares, já que efectuaram vultuosos investimentos nos campos de Everadan e de Azadegan, sendo de prever que tentarão encontrar em conjunto com os iranianos soluções que minimizem a observância de factores de instabilidade na economia mundial.

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1 - UNCTAD: United Nations Conference on Trade and Development.

2 - ASEAN: Burnéo, Camboja, Indonésia, Laos, Malásia, Myanmar, Filipinas, Singapura, Tailândia e Vietname.

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* Carlos Roberto

Economista. Consultor na Unidade Internacional dos CTT SA. Assistente convidado no Instituto Superior e Economia e Gestão (ISEG) da Universidade Técnica de Lisboa (1991/1997). Técnico Assessor no Governo de Macau (1997-1999). Colabora com a Escola de Gestão & Negócios da Universidade Autónoma de Lisboa.

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Referências bibliográficas

UNCTAD – Development and Globalization: Facts and Figures 2008, United Nations, Geneva, Abril 2008.

Banco Mundial, Estatísticas.

China Quarterly Update, World Bank Office, Pequim, Junho 2008.

EUROSTAT – Estatísticas 2004 e 2006, DG TRADE 7, Agosto 2007.

FOUSE, David – Ásia-Pacif Security Studies – «Japan's FY 20005 National Defense Program Outline: New Concepts, Old Compromises» . Março 2005.

CRANE, Keith; CLIFT , Roger; MEDEIROS , Evan; MULVENON , James; OVERHALT, Willian – Modernising China's Military – Opportunities and Constraints. Rand Project Air Force, EUA, 2005.

EMMOTT, Bill; LANE, Allen – Rivals, How the Power Struggle Between China, India and Japan will Shape our Next Decade. Londres, 2008.

Direcção de GNESOTTO, Nicole e GREVI, Giovanni – O Mundo em 2025. Editorial Bizâncio, Lisboa 2008.

Jim O'NEILL, SUN Bae Kim and Mike BUCHANAN – «Globalization and Disinflation – Can Anyone Else “Do a China?». Goldman Sachs Economic Research, Global Economics Paper, n.º 147, 5 de Outubro 2007.

MISAKI, Hisane – «China, Japan, trug-of-war over Indochne». Asian Times, Outubro 2005.

BAJPAEE, Chietigj – «The Price of Asian Conflit». Asian Times, Março 2005.

LAFRASIABI , Kaveh – «China's Energy Insecurity and Iran's Crisis». Asian Times, Fevereiro 2006.

The State Council Information Office of China, China's Peaceful Development Road, Dezembro 2005.

YUAN , Jing-dong – «China and Japan tiptoe into a “warm spring”» . Asian Times, Maio 2008.

A New Chaper in Japan-China Relations – Towards Co-Existence and Co-Development That Overcomes History, Institute for international Policy Studies, 23 de Abril 2008.

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