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Janus 1997



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Rendimentos e Transferências

Francisco Mendes *

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A balança de rendimentos apresentou, em 1995, um défice de 132,5 milhões de contos (m.c.), superior ao dobro do saldo negativo apurado no ano anterior e a contrastar com o excedente de 13,2 m.c. ainda averbado em 1993.

Para este resultado concorreram os défices verificados ao nível dos rendimentos de capitais (-91 m.c.) e de outros rendimentos (-52,1 m.c.), só muito fracamente compensados pelo excedente pouco significativo (10,7 m.c.) dos rendimentos do trabalho. O marcado agravamento da balança de rendimentos ocorrido entre 1994 e 1995 (que sucede à obtenção de saldos positivos no triénio de 1991-93) foi especialmente motivado pela acentuada deterioração do défice dos rendimentos de capital (- 56,7 m.c.), a que se aliou o aumento de 68,5 % dos pagamentos de direitos de patentes, marcas, «royalties» e «copyright» (+ 20,6 m.c.).

Por sua vez, a referida expansão das saídas líquidas de rendimentos de capitais em 1995 — cujos fluxos continuam a assumir posição dominante na balança de rendimentos – resultou, em particular, do forte aumento dos pagamentos de rendimentos associados ao investimento directo do exterior em Portugal (+ 14,8 m.c.), a que se aliou a acentuada redução (em termos líquidos) dos rendimentos de investimento de carteira (- 23,3 m.c.). De notar, em 1995, um impressivo aumento do dinamismo dos rendimentos pagos e recebidos por investimento de carteira, revelando-se o ritmo de crescimento dos fluxos de saída (+ 120,4 %) muito superior ao das receitas (+ 36,4 %).

Situação semelhante ocorreu com os rendimentos associados a operações de depósito, que têm também vindo a aumentar de importância com a liberalização dos movimentos de capitais. Com efeito, o forte incremento do pagamento de rendimentos a não residentes decorrente de depósitos (+ 147,5 m.c.) excedeu a expansão das receitas resultantes de depósitos de residentes efectuados no exterior (+ 134 m.c.), ocasionando a redução do excedente desta categoria de rendimentos entre 1994 e 1995 (-13,5 m.c.). Além do efeito da tendência para a constituição de depósitos no exterior, o comportamento das receitas reflecte, em grande parte, a evolução dos rendimentos gerados pela aplicação das reservas oficiais.

Nos primeiros quatro meses de 1996, verificou-se nova deterioração da balança de rendimentos em relação ao período homólogo do ano anterior. Com efeito, o défice de 85,1 m.c., apurado no período de Janeiro a Abril de 1996, foi quase duplo do registado em igual período de 1995. Esta evolução desfavorável teve origem, principalmente, no avolumar das saídas de rendimentos resultantes de aplicações de não residentes em títulos nacionais.

As transferências unilaterais apresentaram, em 1995, uma entrada líquida de fundos de cerca de 1 071 milhões de contos, o que representa um acréscimo de 20,7 % relativamente ao fluxo apurado no ano anterior. Deve, todavia, assinalar-se que as transferências privadas e públicas revelaram um comportamento nitidamente diferenciado. Com efeito, as remessas de emigrantes (que representam a quase totalidade das transferências privadas) originaram a entrada líquida de 498,5 m.c., resultado muito inferior ao obtido no ano de 1994 (548,7 m.c.). Ao invés, as transferências públicas líquidas, dominadas pelas transferências oriundas da União Europeia (U.E.), registaram, relativamente ao ano anterior, o impressivo aumento de 76 %, atingindo 566,9 m.c. em 1995, ultrapassando, pela primeira vez, as transferências privadas.

A evolução negativa das remessas de emigrantes insere-se na tendência de longo prazo de diminuição do valor das poupanças do trabalho recebidas do exterior. De facto, estes fluxos líquidos não só têm vindo a diminuir em termos absolutos desde 1992, como têm também vindo a perder peso relativo no PIB desde meados dos anos 80. Na origem da quebra das remessas de emigrantes, em 1995, estiveram, em grande parte, as diminuições no envio de poupanças da Alemanha, dos EUA, do Canadá e do Reino Unido, só parcialmente compensadas pelos aumentos dos fluxos provenientes da França e da Suíça.

As transferências líquidas com a U.E. praticamente duplicaram em 1995 (+258,5 m.c.), não só em resultado do aumento dos recebimentos (+ 40,8 %) mas, também, de uma redução de cerca de 20,7 % dos pagamentos. De notar que os valores anormalmente elevados dos pagamentos em 1994 foram afectados por regularizações associadas à reavaliação do PIB português.

A contrastar com o ocorrido em 1994 — em que se verificara uma diminuição dos recebimentos da UE originada por alguns atrasos na implementação do Segundo Quadro Comunitário de Apoio — o aumento de 207,2 m.c. em 1995 decorreu, maioritariamente, dos recebimentos associados ao FEDER (+ 78,3 m.c.), ao FSE (+ 55 m.c.) e ao Fundo de Coesão (+ 48,8 m.c.). As entradas líquidas das transferências unilaterais no período de Janeiro a Abril de 1996 situaram-se virtualmente ao mesmo nível atingido no período homólogo do ano anterior (cerca de 300 m.c.), notando-se ligeiro acréscimo das remessas de emigrantes a compensar a quebra correspondente nas transferências públicas oriundas da UE.

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Informação Complementar

A mudança dos anos 90

Embora as alterações metodológicas introduzidas na elaboração da balança de pagamentos a partir de 1993 prejudiquem a comparabilidade dos valores da balança de rendimentos para os anos anteriores (admitindo-se, nomeadamente, subavaliação dos débitos por omissões de rendimentos associados ao reinvestimento directo estrangeiro ou erradamente classificados como amortizações de capital), mesmo assim é possível distinguir dois períodos distintos na evolução desta balança.

Na década de 80, a balança de rendimentos apresentou sistematicamente défices relativamente avultados, com largo predomínio dos valores a débito, sendo os créditos de fraco significado. Este comportamento reflectia um elevado «stock» de endividamento externo a originar pesados pagamentos de juros da dívida externa portuguesa.

A partir de 1990, notou-se gradual melhoria da balança de rendimentos, acompanhada do avolumar dos fluxos de pagamentos e recebimentos de rendimentos de capitais e, em especial, nítido aumento dos valores a crédito, tendo-se verificado a formação de excedentes no triénio de 1991-93. Este comportamento é explicado pela progressiva internacionalização da economia portuguesa, com total liberalização dos movimentos de capitais, e melhoria da posição externa líquida do País a possibilitar a aplicação no exterior de montantes progressivamente crescentes das reservas cambiais.

Por outro lado, a amortização da dívida externa permitiu aligeirar o pagamento dos respectivos encargos, concorrendo, assim, para atenuar os valores a débito. De notar, neste contexto, o aumento da importância relativa dos rendimentos de investimento de carteira (ligados às crescentes aplicações de residentes em títulos estrangeiros e às aplicações financeiras em títulos nacionais) e os resultantes de operações de depósito. As remessas de emigrantes (contrapartidas financeiras da perda de um potencial de riqueza e de envelhecimento da população residente) têm ocupado um lugar relevante na estrutura da balança de transacções correntes, sendo um factor fundamental de financiamento dos tradicionais e elevados défices da balança comercial.

E, no entanto, visível uma tendência de longo prazo de abrandamento das remessas de emigrantes. Com efeito, esses recebimentos têm vindo a perder importância desde meados dos anos 80, quer em valor quer em peso relativo no PIB — desceram de 7,7% do PIB, em 1987, para cerca de 3 %, em 1995. Na origem desta evolução está a fraca expressão da corrente emigratória nas duas últimas décadas, associada à crise económica europeia e às restrições levantadas à entrada de trabalhadores estrangeiros. De facto, em 1974 termina o grande ciclo emigratório português para a Europa Ocidental.

Outros factores, de natureza conjuntural, têm também concorrido para a referida evolução: diferencial das taxas de remuneração da poupança entre Portugal e o exterior, expectativas de flutuação cambial do escudo face às outras divisas e variação do rendimento nominal nos países de origem das remessas. A perda de importância relativa das remessas de emigrantes levou a que essas remessas apenas tenham financiado cerca de 33 % do défice comercial em 1995, quando, em 1987, ainda cobriam 91 % desse défice.

Em sentido contrário, as transferências públicas líquidas (a outra componente das transferências unilaterais), que até 1986 tinham fraco significado, têm vindo a aumentar de importância. Este comportamento reflecte basicamente a expansão das transferências financeiras líquidas provenientes da UE — no triénio de 1993-95 totalizaram 1 236 milhões de contos), permitindo, assim, compensar a evolução desfavorável das remessas de emigrantes.

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* Francisco Mendes

Licenciado em Organização e Gestão de Empresas pelo ISCTE. Docente na UAL.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
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