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Portugal e as Convenções Internacionais sobre o Ambiente

Paulo Canelas de Castro *

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No termo do século XIX um grande jusinternacionalista alemão, H. Triepel, comparou o direito internacional a um marechal desejoso de ganhar uma guerra: como este, também aquele precisa de que os seus mandamentos sejam bem recebidos e aplicados pelos seus "generais" e "cabos de guerra", os Estados e os direitos nacionais. Sem a colaboração destes, o direito internacional ainda hoje dificilmente se aplica.

O bom exemplo

Ora, pelo menos no que diz respeito à questão fundamental da vinculação aos principais instrumentos jurídicos convencionais que estruturam o direito internacional do ambiente e à da sua recepção no ordenamento jurídico nacional, pode-se dizer que Portugal se tem comportado como um fiel seguidor do "marechal"-direito internacional do ambiente. Sustentam esta asserção alguns dados objectivos simples.

Assim, se se olhar o elenco dos mais de 25 instrumentos convencionais fundamentais arrolados por Birnie e Boyle em recente publicação (P. W. Birnie e A. Boyle, "Basic Documents on International Law and the Environement", Oxford University Press, 1995), que constitui já uma referência bibliográfica imprescindível no sector, constata-se que só dois dos tratados aplicáveis não motivaram uma posição normativa por parte de Portugal: a convenção sobre responsabilidade civil por danos resultantes de actividades perigosas para o ambiente, de 1993; e o Protocolo anexo à Convenção de 1979 sobre poluição atmosférica transfronteiriça a longa distância relativo à redução das emissões de enxofre, de 1994.

E se, por outro lado, se compulsar a importante listagem de mais de 110 "Convenções e acordos internacionais com interesse na área do ambiente" que o Ministério do Ambiente elabora e periodicamente actualiza (a edição que consultámos é de Março de 1996), retira-se que só em 19 casos Portugal não assinou ou ratificou tal instrumento, sendo que apenas um ou dois podem ser qualificados como fundamentais na arquitectura do sistema de protecção jurídico-internacional do ambiente.

Os números são eloquentes, falando bem de uma generosa abertura de Portugal ao direito internacional convencional do ambiente, sobretudo se comparados com os resultados que Portugal evidencia a propósito das convenções internacionais estruturantes de outros domínios do direito internacional; e também se se tiver em conta que as convenções em causa nestas duas listagens recobrem quer todas as expressões quer todos os temas fundamentais em que se analisa o direito internacional do ambiente: a sua codificação e desenvolvimento gerais, como a sua estruturação regional ou bilateral, por um lado, a responsabilidade por danos ambientais, a protecção do meio marinho, da atmosfera, dos cursos de água internacionais, da natureza e dos recursos vivos, da fauna e da flora, da cobertura dos riscos nucleares, do transporte e do comércio de resíduos, efluentes e substâncias perigosos, por outro, e mesmo a problemática institucional.

Esta imagem de abertura de Portugal perante o direito internacional do ambiente complementa-se pela amizade que o direito português revela ao prever, nos termos da cláusula geral do artigo 8° da Constituição, que os seus princípios e regras se integrarão no conjunto das regras que regem a comunidade portuguesa ou os residentes em Portugal sem exigências de maior e ao admitir mesmo, no entendimento da doutrina e da jurisprudência dominantes em Portugal, que a tais regras se atribua um valor prevalecente sobre todo o direito infraconstitucional. Daqui decorre que mesmo regras legais que colidam com as consagradas nas convenções às quais Portugal se vinculou sejam desaplicadas em benefício destas últimas.

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As excepções

Esta imagem globalmente positiva deve, no entanto, ser relativizada pelo facto de nem todas as tomadas de posição referidas equivalerem à vinculação por tais convenções. Na verdade, em relação a algumas verifica-se que, depois da sua assinatura, Portugal não deu sequência ao procedimento de conclusão da convenção praticando o acto da ratificação ou da adesão à mesma.

Os exemplos, apesar de pouco numerosos, são contudo relevantes, sobretudo se se tiver em conta que contendem com áreas com uma particular importância para Portugal. Assim, numa matéria tão sensível como é a dos cursos de água internacionais mal se percebem as hesitações de Portugal na ratificação da convenção de Espoo de 1991 sobre a avaliação do impacto ambiental num contexto transfronteiriço. E, por outro lado, num tempo em que tombaram ou perderam relevo muitas das objecções que no passado conduziram grande parte dos Estados do mundo ocidental a opor-se à ratificação da Convenção de Montego Bay sobre o Direito do Mar, também mal se compreende que Portugal tarde em fazê-lo, ainda que, aqui e ali, formule reservas ou faça as declarações interpretativas adequadas à defesa dos seus interesses específicos.

Acresce que se nota uma perniciosa tendência para que, uma vez ratificado um instrumento convencional fundamental sobre uma determinada matéria, se não proceda de idêntica forma relativamente àqueles que posteriormente lhe introduzem emendas. É o que acontece, exemplarmente, com as convenções pelas quais se emendou a Convenção internacional para a prevenção da poluição das águas por hidrocarbonetos.

Estas inconsequências, para além de permitirem que se gerem dúvidas sobre a seriedade da abertura de Portugal a tais regimes, tornam-se particularmente criticáveis numa época em que se assiste ao desenvolvimento de uma tendência normativa para, no plano internacional, se diferir no tempo — através da concepção de convenções de desenvolvimento de uma convenção quadro inicial ou da introdução de emendas ao texto originário — a regulação jurídica de matérias perante as quais o Homem se reconhece incapaz de imediatamente, por ausência de conhecimentos científicos ou por outras razões, fundar regimes perfeitos.

Por fim, não se pode olvidar que mesmo a melhor política convencional pode sair comprometida se esquecer o sentido profundo da "advertência" de Triepel: para além da vinculação ao direito internacional, o direito nacional tem que conceber os seus próprios planos normativos de aplicação das regras emanadas do primeiro. O Estado tem por isso que constituir ou adequar instrumentos legais ou regulamentares, instituir e prosseguir mecanismos administrativos ou judiciais que traduzam a proclamação de abertura e amizade perante o direito internacional em realidade vivida.

No contexto comunitário, este esforço tem ainda que ser acompanhado pela transposição das directivas que, aqui e ali, pretendem até assegurar um nível mais elevado de protecção e conservação do ambiente. Teme-se, porém, que a análise do cumprimento dos deveres de solidariedade do Estado português neste campo revele um comportamento que, paradoxalmente, não seja propriamente exemplar. Acresce que uma política convencional meritória se não faz apenas da capacidade de, com generosidade, abrir o ordenamento português ao direito internacional, mas também da capacidade de, a montante, activamente contribuir para a sua conformação.

A esperança parece contudo legítima se se atentar nuns quantos factos. E, desde logo, no de que alguns dos instrumentos convencionais pelos quais Portugal ainda não se obrigou serem de concepção recente. Por outro lado, há informações de que existe vontade de se proceder à vinculação por textos relevantes mais antigos, bem como de corrigir procedimentos que minoravam a eficácia da recepção de tais regras no direito português e ainda de, mais globalmente, aperfeiçoar o direito com que Portugal pretende contribuir para a protecção do ("seu") ambiente.

Dois factos concorrem no fortalecimento desta expectativa: a entrega recente de comentários portugueses ao projecto de Convenção-quadro das Nações Unidas sobre os usos diversos da navegação dos rios internacionais e a continuação das negociações entre Portugal e a Espanha com vista à celebração de um novo convénio sobre os cursos de água internacionais luso-espanhóis.

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* Paulo Canelas de Castro

Mestre em Ciências Jurídico-políticas pela Universidade de Coimbra. Mestre em Direito Internacional Público e Privado pela Universidade de Nice. Consultor Jurídico do Ministério do Ambiente. Docente na Universidade de Coimbra e na UAL.

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Dados adicionais
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