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Janus 2001



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O PCP e o movimento comunista internacional

João Madeira*

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A intervenção de Jules Humbert-Droz no 1º Congresso do PCP (1923) selou como que o estabelecimento de relações com o Komintern, mas o Partido Comunista continuará, por muitos anos, longe de constituir um partido de tipo leninista, apesar dos esforços de Bento Gonçalves após a reorganização de 1929.

Já em 1922, é enviada uma delegação ao IV Congresso da Internacional Comunista; vários quadros frequentam nos anos 20 e 30 a Escola Leninista de Moscovo; em 1935, Bento Gonçalves encabeça a participação no VII Congresso da IC; entre 1934 e 1936 faz deslocar um representante permanente – Francisco Paula de Oliveira – para o Secção Latina do Komintern. Fustigado pela repressão salazarista, afectado por uma profunda instabilidade do seu corpo dirigente, mas também minado por rivalidades que facilmente tomavam a forma de suspeições de infiltração policial, o PCP é expulso da Internacional Comunista, em 1938, num gesto tão aos tons da época.

Só em 1948 é que as relações com a família comunista são restabelecidas por acção directa de Álvaro Cunhal, depois de ter, juntamente com um escasso núcleo dirigente, reorganizado e estalinizado nos primeiros anos de quarenta um partido praticamente desestruturado.

Até aí, as relações externas com a constelação comunista haviam sido esparsas e com um carácter predominantemente inorgânico – contactos e apoio logístico ao partido espanhol, correspondência com o brasileiro, ligações indirectas com os jugoslavos através da Legação diplomática em Lisboa, mas sobretudo a Rádio Moscovo, onde bebia o pulsar da evolução da guerra e as consignas soviéticas numa conjuntura de derrota iminente do nazismo por uma Frente Antifascista Mundial.

Álvaro Cunhal é preso pouco depois de regressar ao país, mas no PCP já se, começara a instalar um clima de acirrada sectarização e intolerância político-ideológica, em sintonia com o clima internacional de guerra fria, ambiente que domina o partido nos primeiros anos da década de 50. Os antigos aliados das correntes oposicionistas não comunistas, passam a capitulacionistas, traidores e agentes ao serviço do imperialismo americano. A vertigem persecutória instala-se no interior do próprio partido, sendo expulsos muitas dezenas de militantes e alguns encontrados mortos em circunstâncias que continuam por esclarecer, de que o caso mais conhecido é o de Manuel Domingues, em 1952.

A ascensão de Júlio Fogaça ao Secretariado do Comité Central, depois de obrigado a várias autocríticas sob a acusação de desvio de direita, abre caminho a uma linha política mais moderada na segunda metade dos anos 50, de solução pacífica da questão nacional, em proximidade e sob a influência do PC Espanhol, animado ainda pela inflexão verificada no XX Congresso do PC soviético. A fuga de um importante grupo de 10 dirigentes comunistas, entre os quais Álvaro Cunhal, do forte de Peniche em Janeiro de 1960, leva, sob impulso deste dirigente, à correcção do designado "desvio de direita".

O corpo doutrinário que faz então vingar no seio do partido, consagrada no VI Congresso (Kiev, 1965), baseava-se no pressuposto de que Portugal era um país de burguesia fraca, dependente do imperialismo americano, mas ao mesmo tempo monopolista e colonizadora, o que conduzia como que a uma sobreposição de objectivos entre a etapa democrática e nacional, preconizada e a etapa socialista da revolução.

Por outro lado, a linha do levantamento nacional, introduzia, mesmo que matizadas, componentes de violência no processo de derrube do salazarismo. Estas teses não eram propriamente consentâneas com as posições dominantes no movimento comunista internacional, mas vão em larga medida escorar-se nas modificações introduzidas sob a égide de Brejnev.

A saída do país de Álvaro Cunhal, entretanto eleito secretário-geral, em Setembro de 1961, radicando-se entre Paris, Praga e Moscovo, onde se vai manter até Abril de 1974, permite que o PCP afirme a sua linha política e se prestigie num contexto marcado pelo dissídio sino-soviético.

A partir de então, alinhando inequivocamente ao lado do PCUS, mas agitando a ideia da igualdade entre pequenos e grandes partidos, o PCP desempenha um papel precioso no sentido de estancar a cisão chinesa, combater as posições moderadas de espanhóis e italianos e trazer ao bloco soviético todo um conjunto de partidos instáveis no seu alinhamento.

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É um dos primeiros partidos a apoiar a intervenção soviética na Checoslováquia, ao mesmo tempo que se pronuncia na importante Conferência internacional de Partidos Comunistas, reunida em 1969, em Moscovo, contra a teoria do status quo, segundo a qual o equilíbrio entre as superpotências deveria ser mantido, o que significava rebaixar o papel de cada partido na luta pelo poder no seu próprio país. Neste contexto, o Partido Comunista Português beneficia de poderosos apoios junto da Secção Internacional do CC do PCUS, designadamente de Boris Ponomariov e Mikhail Suslov, homens fortes deste novo centro do sistema comunista mundial.

Esta linha vai revelar-se fundamental na intervenção no período pós-25 de Abril, quer no que se refere tanto ao processo de descolonização como às circunstâncias concretas do processo revolucionário. No período de 1974-75, o PCP desempenha, com o seu exemplo, um papel fulcral nos debates que se vinham travando, principalmente sob impacto do fracasso da experiência chilena, sobre as modalidades e as formas de transição para o socialismo. A originalidade e a especificidade do processo português, radicando na tese da dupla componente – aliança do movimento popular, cuja vanguarda era o PCP, com o MFA, não deixava de se fundar nas experiências internacionais do campo socialista desde a revolução bolchevique.

A política de détente, laboriosamente acordada entre americanos e soviéticos, basculava, nas condições explosivas do Portugal de então, com o ímpeto e a vertigem revolucionária. Em Novembro de 1975, na iminência de um confronto militar, a tender potencialmente para um clima de guerra civil, o Partido Comunista recuou, prevalecendo as posições dos que, como Álvaro Cunhal, percebiam que os avanços só se podiam fazer e consolidar com base num bloco político e social alargado, que se fragmentara irremediavelmente pelo menos desde a Primavera de 1975. Conseguiria ainda não ser excluído do regime, beneficiando da prestimosa ajuda que a esquerda militar moderada lhe proporcionou, ajustando-se numa hábil e astuta postura política ao quadro democrático-constitucional em institucionalização. A Constituição que combatera no Verão de 1975 passava a constituir uma sugestiva plataforma política para relançar as pontes com o Partido Socialista, ao mesmo tempo que mantinha intacta a sua identidade ideológica e persistia na duplicidade que o caracterizaria – um pé nas instituições democráticas e outro no movimento operário, sindical e de massas.

Como que simbolicamente, o secretário-geral do PCP, que em 1973 recebera na URSS a prestigiosa Ordem honorífica da Revolução de Outubro, receberia, em pleno VIII Congresso do seu partido (Novembro de 1976) a bandeira soviética das mãos de Boris Ponomariov, enviado do CC do PCUS. Na realidade, ao mesmo tempo que fustigava as posições eurocomunistas dos partidos italiano e espanhol, solidarizava-se intransigentemente com a invasão do Afeganistão pela União Soviética e com as medidas repressivas do governo polaco sobre o sindicato "Solidariedade". Desta forma, o PCP mantinha e reforçava a sua influente e proeminente posição no seio do movimento comunista internacional. É a partir de 1987, com a Perestroika, que esta situação se altera. Apoiando formal, mas tardia e superficialmente, as alterações gorbatchovianas, percebia bem que era um mundo que começava a desabar, pelas brechas abertas com a admissibilidade da imperfeição da ordem socialista soviética e dos crimes de Staline, de efeitos tão perturbadores.

Como um castelo de cartas, em 1989, os sinais de desagregação do bloco soviético aprofundam-se, com as tentativas de sobrevivência e metamorfose dos partidos húngaro e polaco; depois com o enorme abalo sísmico que foi a queda do muro de Berlim. Finalmente, em 1991, a  implosão soviética.

Todavia, o PC Português mantém-se fiel aos princípios ideológicos que o enformaram. Os próprios reflexos internos de toda esta situação, com o Grupo dos Seis, por exemplo, se abalaram a estrutura partidária, foram rapidamente ultrapassados, numa extraordinária capacidade de adaptação.

Para o PCP, a União Soviética deixara de ser o "Sol na Terra", deixando cair a ideia de modelo único, matricial. Apenas uma primeira experiência; não obstante, prenhe de ensinamentos. Coloca-se então na gigantesca tarefa de reconstruir a identidade comunista, alicerçado na valorização do seu património histórico e da estabilidade e coesão interna.

O processo de substituição de lideranças, face ao acentuado envelhecimento dos seus dirigentes históricos, faz-se de modo lento, gradual e controlado. Mesmo que num quadro de declínio interno, os 8,6% obtidos em 1995 continuam a ser notáveis num quadro internacional não só de refluxo, como de pulverização da constelação internacional em que se continua a integrar. A sua influência política e social são contudo superiores, para o que continuam a contribuir designadamente as frentes de intervenção sindical e autárquica. Este esforço de reconstruir a identidade comunista faz-se a partir da difícil convergência de uma pluralidade de agrupamentos políticos que vão desde os que, como o PCP, se mantêm inflexíveis, até aos que se constituem em resultado de processos de cisão quer nos países ex-comunistas quer ao nível do resto do mundo.

Revestem a forma de contactos bilaterais, de esforços reorganizadores e de iniciativas que, de algum modo, ainda aproveitam causas, efemérides ou organizações que sobreviveram à derrocada do sistema, como as campanhas de solidariedade com Cuba Por outro lado, o PCP integra quer a Confederação das Esquerdas Unitárias Europeias, em 1994, no âmbito do Parlamento Europeu, como a Plataforma Anti-Maastricht, com encontros multilaterais e iniciativas públicas de dimensão internacional, como foi o Comício de Paris, em 1996, que apontam no sentido de uma prudente articulação internacional, aparentemente ainda num nível regional e longe de um estádio orgânico de amplitude mundial.

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* João Madeira

Mestre em História do Século XX pela FCSH da Universidade Nova de Lisboa.

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