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Janus 2001



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Dimensão internacional dos fenómenos religiosos

Policarpo Lopes e Elisa Santos *

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Num contexto de cristandade e de expansão missionária, o campo religioso alimentou um intenso fluxo de relações externas no seio de um movimento eurocêntrico. O contexto de mundialização e de circulação integral não só intensificou o movimento internacional em torno do fenómeno religioso como o complexificou tornando-o multipolar. Com efeito, a mundialização associada ao policentrísmo, ao cosmopolitismo e ao politeísmo de valores, num regime de mobilidade generalizada, real e virtual, supõe que áreas cultural e religiosamente conotadas negoceiem o seu modo de coexistência e induzam múltiplas transacções.

Apesar da revolução do "crer" provocada, por um lado, pela hominização da esfera política e pela passagem irreversível da heteronomia de um mundo submisso à incarnação do soberano a uma fé laicizada ao extremo, regulada por uma lógica de secularização e/ou de laicização e, por outro lado, pelo processo de autonomização e individualização das escolhas religiosas, o campo religioso continua a alimentar um relacionamento internacional entre instâncias e agentes de produção e mediação de bens sócio-simbólicos.

No eurocentrismo formalizava-se em torno das religiões históricas, no contexto de mundialização circula em movimentos cruzados, de forma difusa e fluida, não só a partir do interior, dos interstícios e do exterior do religioso instituído mas também a partir do religioso flutuante, designadamente através da sociedade informacional.

Actualmente, em Portugal, as relações exteriores a partir do campo religioso privilegiam os dispositivos do regime eurocêntrico, ou seja, as religiões instituídas e os novos movimentos religiosos, cujas redes têm dimensão planetária. Observemos o relacionamento externo a partir deste duplo ângulo de visão.

 

As religiões instituídas

Todas as grandes religiões, tanto monoteístas como de matriz oriental, têm visibilidade em Portugal. Assim, estimam-se em 30.000 os membros da comunidade islâmica, 9.000 os da comunidade hindu e 1.500 os da judaica. Estas comunidades, assim como as confissões religiosas matriz cristã não católicas, apesar da sua posição minoritária alimentam naturais transacções com os países e comunidades de origem, através das suas instituições e respectivos agentes.

A posição hegemónica do catolicismo leva-nos a privilegiar este eixo de observação e análise. A universalidade da religião católica produziu ao longo dos tempos um conjunto de mecanismos e dispositivos por onde circulam regularmente pessoas e permutas bilaterais à escala internacional.

Este relacionamento externo circula no sentido centro-periferia-centro: pelas relações formais e informais entre instituições, organizações e movimentos eclesiais; pela mobilidade dos seus membros em funções de gestão, formação, missão e representação; pela circulação de pessoas, bens e produtos socioculturais, designadamente nos movimentos de turismo religioso. Na bilateralidade de relações permanentes entre a Igreja local e a Igreja universal, temos, de um lado, a Conferência Episcopal com as suas 12 Comissões, as 20 Dioceses, os 140 Institutos religiosos de vida consagrada e outros serviços nacionais criados pela Conferência Episcopal e/ou ligados à Santa Sé, pelas 61 associações e pelos diferentes movimentos e obras laicas. Do outro lado, estão os diferentes Dicastérios da Cúria Romana, as instituições e organismos ligados à Santa Sé além das Congregações e Institutos Religiosos com dimensão internacional e com sede em Roma.

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Neste circuito desempenha papel central a mediação da Nunciatura Apostólica em Lisboa assim como a Embaixada do Governo Português junto da Santa Sé. Registamos ainda a presença permanente de 3 arcebispos, dois sacerdotes portugueses nos serviços da Cúria romana e cerca de duas dezenas de sacerdotes das várias Dioceses de Portugal, a residir no Pontifício Colégio Português e a frequentar as universidades em Roma.

Neste mesmo canal de contacto, mas de forma ocasional, salientamos as visitas "ad Limina" dos Bispos das Dioceses e Superiores Maiores, a participação e representação da Igreja portuguesa em reuniões de organismos, Capítulos gerais ou provinciais das Ordens e Institutos religiosos, Congressos, fóruns internacionais, de âmbito eclesial a nível universal ou regional, e ainda, contactos pontuais entre as diferentes conferências episcopais, a nível regional e/ou universal, designadamente dos países lusófonos, de Espanha e da Europa.

Uma segunda malha da internacionalização da Igreja portuguesa passa pela constituição e funcionamento das diferentes Congregações e Institutos religiosos.

Das 140 Congregações e Institutos religiosos presentes em Portugal, à excepção de 2 masculinos e 19 femininos, todos têm as suas origens em países estrangeiros. O que pressupõe relações e interacções regulares dos membros dirigentes e uma mobilidade-circulação frequente da generalidade dos outros membros entre as diferentes casas e províncias no estrangeiro, quer por razões de formação quer por motivos de trabalho.

Nas últimas décadas, a diminuição de vocações reforçou a internacionalização dos Institutos religiosos. O que explica a existência de casas de formação, sobretudo dos Institutos "ad gentes" em países lusófonos e a presença de membros desses países em Portugal. Uma das malhas mais importantes da rede de relações exteriores a partir da Igreja Católica passa pelos seus agentes ao serviço nas diversas comunidades de imigrantes e pelos missionários "ad gentes", cuja distribuição figura no quadro em anexo.

Dos 838 missionário(a)s "ad gentes", 46,5% são homens e 53,5% mulheres. Neles encontramos todos os estratos da hierarquia eclesial: 3 Bispos, 289 sacerdotes, 98 irmãos missionários e outros, 448 religiosas. Dos 390 missionários, 67% trabalham em África e 22,3% na América Latina e das 448 religiosas, 72,7% em África e 22,7% na América Latina. Regista-se, porém, uma forte concentração (72% de missionários e 83% de religiosas em países lusófonos, nomeadamente em Moçambique, Angola e Brasil. O que significa que o exercício da missão "ad gentes" continua intimamente associado à situação colonial e pós-colonial.

 

Os novos movimentos religiosos

Nos últimos 30 anos, os grupos minoritários com pretensão religiosa pulularam um pouco por toda a parte à escala planetária. Normalmente, são designados pelo vocábulo de seitas, cuja origem semântica está nos verbos "secare", "seccedere" e "sequi", com um duplo eixo semântico, cessação ou dissidência de uma grande instituição religiosa ou vontade unitária de doutrina e de "praxis".

Os novos movimentos religiosos constituem uma nebulosa místico-esotérica duma grande diversidade de origens, de natureza e de modalidades de funcionamento, mas todos com uma dimensão internacional. Muitos constituem autênticos impérios e verdadeiras multinacionais religiosas. Estimam-se em 2.000 os grupos espiritualistas de origem cristã nos E.U.A. No Japão, 1.500 movimentos religiosos incorporam elementos do Shintoismo e do Budismo. Em África, existem entre 15.000 e 30.000 igrejas independentes. A América Latina é terreno fértil para o desenvolvimento de grupos evangélicos e pentecostistas de carácter sincretista e messiânico. Em 1990, havia na América Latina 30.000.000 de protestantes quando no início do século não passavam de 6.480. Na Europa, o Parlamento Europeu reconhece que as seitas operam em redes transfronteiriças. Só em França, o Relatório Guyard identifica 172 organizações-mães e 800 satélites com 160.000 adeptos e 100.000 simpatizantes.

Em Portugal, não dispomos de informação que nos permita descrever a ordem de grandeza do fenómeno. Há a convicção de que a maior parte destes grupos actuam no nosso País. A título indicativo, o Anuário das Testemunhas de Jeová afirma que, em 1997, havia 46.746 Testemunhas a difundir a fé. Até 08.07.1998, inscreveram-se no Ministério da Justiça 471 associações religiosas não católicas, das quais estão actualmente activas 449. Da sua matriz semântica ressalta que a grande maioria têm origem ou inspiração protestante.

Face a estas minorias religiosas identificamos uma dupla lógica social, a diabolização, que procura atitudes e comportamentos criminosos como ameaça à ordem pública, e o conhecimento objectivo da sua morfologia e desenvolvimento em paralelo ao desinvestimento nas Igrejas instituídas.

Estes movimentos, tendo a sua origem em países estrangeiros com redes internacionais de contacto, induzem um intenso movimento de relacionamento externo, através dos seus líderes e das permutas de bens e serviços sócio-simbólicos dificilmente quantificáveis, devido a modalidades de funcionamento hermético.

O nosso país, além de ser terreno aberto à fascinação destes novos movimentos de natureza integradora e emotiva, funciona como placa giratória para a sua difusão e implantação nos países lusófonos e nas comunidades portuguesas.

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* Policarpo Lopes

Doutorado em Sociologia pela Universidade Católica de Lovaina, Bélgica. Docente e Director do Curso de Sociologia da UAL.

* Elisa Santos

Licenciada em Sociologia pela UAL. Docente na UAL.

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