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Direitos dos imigrantes em Portugal

José Leitão *

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É elevado o nível de reconhecimento de direitos aos imigrantes em Portugal. Este facto resulta desde logo do facto da CRP consagrar o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei (art. 13"), independentemente, nomeadamente, "da raça" e do princípio da equiparação de direitos entre nacionais e estrangeiros, com as excepções previstas na Constituição e na lei (art. 15"). Estas têm que ter um fundamento material válido, sob pena de serem inconstitucionais. É importante ter em conta os standards mínimos fixados pelo direito internacional incluindo as Convenções das Nações Unidas, do Conselho da Europa ou da Organização Internacional do Trabalho para a determinação da existência ou não desse fundamento. Os direitos previstos na Constituição não excluem quaisquer outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional e devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Aos estrangeiros em geral, incluindo os imigrantes não são reconhecidos apenas um vasto conjunto de direitos, mas o acesso ao direito e aos tribunais, que inclui o direito de informação e consulta jurídica e o direito ao patrocínio judiciário. Criam-se assim as condições que permitem a efectivação dos direitos reconhecidos.

 

Direitos, liberdades e garantias pessoais

Os imigrantes legalmente residentes em Portugal gozam da generalidade dos direitos, liberdades e garantias pessoais, tais como o direito à vida, o direito à integridade pessoal, o direito à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar, à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação, o direito à liberdade e à segurança, o direito à não retroactividade da lei criminal, o direito ao habeas corpus, à inviolabilidade do domicílio e da correspondência, a liberdade de consciência, de religião e de culto, a liberdade de expressão e de informação, a liberdade de reunião e de manifestação, a liberdade de associação. Os imigrantes gozam também do direito de constituir família e contrair casamento e o direito à manutenção e educação dos filhos e ao reagrupamento familiar, nos termos da lei. O direito de constituir família consagrado na CRP é reforçado pelo direito ao respeito da vida familiar decorrente da Convenção Europeia para a protecção dos direitos do homem e das liberdades fundamentais. Destes direitos retirou a jurisprudência dos tribunais portugueses a existência de categorias de estrangeiros inexpulsáveis por aplicação de penas acessórias de expulsão. A lei das associações de imigrantes veio reconhecer o direito de antena às associações representativas de âmbito nacional.

 

Direitos, liberdades e garantias de participação política

Tem-se verificado uma evolução no sentido de reconhecer alguns direitos de participação política a cidadãos estrangeiros, em função, nomeadamente da cidadania europeia e do que se espera venha a ser a cidadania lusófona. Na sequência da regulamentação do art. 15° n.º 4° da CRP, que prevê a possibilidade de a lei atribuir a estrangeiros residentes no território nacional, em condições de reciprocidade, capacidade eleitoral activa e passiva para a eleição dos titulares de autarquias locais, os cidadãos dos Estados-membros da União Europeia, do Brasil, de Cabo Verde, do Peru e do Uruguai podem votar e ser candidatos às autarquias locais, podendo os cidadãos da Argentina, de Israel e da Noruega apenas votar. Os cidadãos dos Estados membros da União Europeia gozam do direito de elegerem e serem eleitos Deputados ao Parlamento Europeu. Os cidadãos brasileiros com o estatuto especial de igualdade de direitos e deveres, gozam do direito de votar nas eleições para a Assembleia da República e nos referendos nacionais.

Os cidadãos estrangeiros gozam ainda do direito de se filiar em partidos políticos. Este direito está consagrado nos estatutos de, pelo menos, um dos principais partidos políticos, embora apenas para os cidadãos dos Estados-membros da União Europeia e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.

 

Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores

Os trabalhadores imigrantes gozam da garantia de segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos, bem como do direito à liberdade sindical.

Os trabalhadores imigrantes podem também inscrever-se, votar e ser eleitos para os órgãos das associações sindicais. Os trabalhadores imigrantes gozam também do direito de participarem na criação de comissões de trabalhadores, incluindo o direito de votarem e de serem eleitos para delas fazerem parte. Os trabalhadores imigrantes gozam do direito à greve como os trabalhadores nacionais.

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Direitos e deveres económicos, sociais e culturais

Os trabalhadores imigrantes têm direito ao trabalho. Até à actual lei de 1998, nas empresas com mais de cinco trabalhadores, noventa por cento tinham que ser trabalhadores portugueses. Actualmente não há qualquer limitação quantitativa à contratação de trabalhadores estrangeiros, não havendo profissões vedadas ou condicionadas em função da nacionalidade. Além disso é punível com uma sanção pecuniária, denominada coima, nomeadamente:

• a subordinação da oferta de emprego, da cessação de contrato de trabalho ou a recusa de contratação, a factores de natureza racial, étnica ou de nacionalidade;

• a produção ou difusão de anúncios de ofertas de emprego ou outra forma de publicidade ligada à pré-selecção ou ao recrutamento, que contenha, directa ou indirectamente qualquer especificação ou preferência baseada em factor de discriminação em função da raça, cor, nacionalidade ou origem étnica. A igualdade de tratamento dos trabalhadores tem consagração constitucional. Os trabalhadores têm direito sem distinção, nomeadamente, de nacionalidade, "raça", território de origem: à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade; à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, à prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde; ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas; à assistência material, quando involuntariamente se encontrem em situações de desemprego. Têm também direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte.

Têm direito à segurança social. A lei que institucionalizou o rendimento mínimo garantido, previu que esse direito seja reconhecido aos residentes legais, incluindo os imigrantes, o que é o reconhecimento da sua cidadania social. Apesar de a Constituição prever que todos têm direito à saúde, a Lei de Bases do SNS continua a prever, de forma constitucionalmente questionável, no caso dos estrangeiros que não sejam cidadãos da União Europeia, que o acesso ao SNS esteja sujeito à reciprocidade. Em matéria de habitação, os Planos Especiais de Realojamento não discriminam em função da nacionalidade.

Os direitos das famílias, o direito à protecção da paternidade e maternidade ou da infância por parte da sociedade e do Estado, abrange naturalmente os cidadãos imigrantes, bem como a protecção especial dos jovens e dos cidadãos portadores de deficiência ou da terceira idade. Os imigrantes têm direito à educação, à cultura e ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar. A CRP prevê que ao Estado incumbe assegurar aos filhos dos imigrantes apoio adequado para efectivação do direito ao ensino, sendo a única vez que a CRP utiliza a palavra "imigrantes". Os imigrantes têm direito à fruição e criação cultural e à cultura física e ao desporto em termos idênticos aos cidadãos portugueses.

 

Direitos e deveres

Não há direitos sem deveres. Os imigrantes estão sujeitos à generalidade dos deveres que incidem sobre os cidadãos portugueses, como, por exemplo o de pagar impostos ou de contribuir para a segurança social. Alguns direitos e deveres são, contudo, reservados em parte ou no todo aos cidadãos portugueses.

O recenseamento dos imigrantes que gozam de capacidade eleitoral activa e passiva para a eleição dos titulares das autarquias locais é voluntário, enquanto o dos portugueses é obrigatório. Têm também direito ao exercício de funções públicas que tenham carácter predominantemente técnico. Aos estrangeiros está vedada a titularidade dos órgãos de soberania, dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, o serviço nas forças armadas e a carreira diplomática.

 

Informação complementar

Os imigrantes em situação irregular têm direitos?

Todos os imigrantes têm direitos, mas os imigrantes em situação irregular gozam de menos direitos do que os que se encontram em situação regular. Desde logo não gozam do direito de permanecer no país, podendo ser expulsos.

Todos os imigrantes gozam dos direitos humanos fundamentais que são inerentes à própria dignidade da pessoa humana sobre a qual é fundada a República Portuguesa, como refere o art° 1.° da Constituição.

Entre esses direitos contam-se por exemplo, o direito à vida, o direito à integridade moral e física, o direito ao desenvolvimento da personalidade, à reserva da vida privada e familiar, o direito à não retroactividade da lei penal, o direito de acesso aos tribunais, o direito ao habeas corpus, o direito à liberdade de expressão e informação, à liberdade de consciência, de religião e de culto. No que se refere ao direito à liberdade e segurança, a Constituição prevê a possibilidade de prisão, detenção ou outra medida coactiva sujeita a controlo judicial, de pessoa que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional ou contra a qual esteja em curso processo de extradição ou expulsão.

Em matéria de direito ao trabalho, a lei prevê como requisito para o seu gozo, a residência ou permanência legal no país. Contudo, um imigrante em situação irregular, que apesar da proibição legal prestou o seu trabalho, deverá ser remunerado como os restantes trabalhadores, não podendo permitir-se que do seu recrutamento resulte um enriquecimento injustificado para o empregador. As recentes alterações à lei de entrada, permanência, saída e afastamento deram uma base legal indiscutível a este entendimento.

Os imigrantes em situação irregular gozam de capacidade civil para celebração de contratos, devendo os contratos com eles celebrados ser considerados como válidos. Em matéria de outros direitos, que se analisam em prestações asseguradas pelo Estado, a regra é deles não serem titulares os imigrantes em situação irregular.

Invocando razões de saúde pública, tem-se desde há vários anos permitido o acesso ao Serviço Nacional de Saúde dos imigrantes em situação irregular, mas de forma discreta através de circulares da Administração Regional de Saúde de Lisboa ou de um acordo, de âmbito regional, com uma associação ligada à saúde dos imigrantes.

Os imigrantes e demais estrangeiros em situação irregular podem beneficiar de prestações de Acção Social, "estando a sua atribuição condicionada, por um lado, pêlos resultados obtidos do estudo do caso em presença e, por outro lado, pelas disponibilidades de recursos de natureza financeira ou outra, dos serviços de Acção Social, a nível regional e local", não podendo por isso mesmo falar-se a este respeito do reconhecimento de um direito.

Não gozam, contudo, do direito ao rendimento mínimo garantido, por não serem residentes legais. Em matéria de direito à educação, todas as crianças, incluindo os filhos dos requerentes de asilo e dos imigrantes ilegais, têm direito a uma escolaridade básica, em conformidade com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e com a legislação internacional, especialmente, com o artigo 2.° da Convenção relativa aos Direitos da Criança na linha do estipulado pela Resolução do Conselho da União Europeia, de 23 de Outubro de 1995, sobre a resposta dos sistemas educativos aos problemas do racismo e da xenofobia.

Na linha do que defendemos em matéria de direitos dos imigrantes em situação irregular, pode verse, Luís Nunes de Almeida e José Leitão, "Les Droits et Libertes des Étrangers en Situation Irreguliére, Portugal", Annuaire International de Justice Constitutionnelle, Económica, Presses Universitaires d'Aix - Marseille, 1998, pp. 297-309.

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* José Leitão

Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Exerceu actividade profissional de advogado. Eleito deputado à Assembleia da República, exercendo actualmente as funções de Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas.

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