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Janus 2006



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Padrões referenciais da Universidade no Reino Unido

Fernando Amorim *

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A existência de um sistema de ensino superior estruturado e coerente, e já não um mero conjunto de instituições autónomas com frágeis vínculos entre si, bem como a duplicação do número de alunos no ensino superior, de cerca um para dois milhões nos últimos quinze anos, tornou estratégica a questão dos padrões referenciais de qualidade (standards) que balizam um ensino superior homogéneo e de ponta, por forma a assegurar o melhor desempenho dos alunos, dos cursos e das instituições, e que passaram pela criação de um sistema ou “Estrutura Nacional das Titulações Académicas” (National Qualification Framework); a definição de “Padrões de Referência de Qualidade de Área” (Subject Benchmarking Standards) ao nível de disciplina ou curso; e pelas “Especificações do Programa” (Programme Specifications) ao nível das instituições ou programas, instrumentos cruciais para a agência britânica de avaliação do ensino superior (Quality Assurance Agency - QAA) poder levar a cabo a “Avaliação Institucional” (Institutional Review) e a “Avaliação dos Cursos” (Subject Review).

 

Uniformização das titulações académicas

A Estrutura Nacional de Titulações Académicas visa a adopção a nível nacional de uma estrutura de titulações académicas, desde os cursos pós-secundários (sub-degree diplomas) até aos níveis mais elevados da pós-graduação, por forma a assegurar que os diplomas com o mesmo título sejam do mesmo nível e natureza, eliminando assim algumas especificidades e idiossincrasias do sistema. Apesar de a maioria dos cursos de graduação terem uma duração de três anos e os mestrados um ano, registava-se uma variedade de títulos académicos concedidos por colleges e universidades, e algumas “peculiaridades”, como a concessão do título de mestre em alguns cursos de graduação ou, no caso de Oxford e Cambridge, a possibilidade de obtê-lo alguns anos após a graduação mediante pagamento de uma taxa, mas sem a exigência de ulteriores estudos. Esta diversidade nas titulações (observável não apenas em relação ao resto da Europa, mas também dentro da própria Ilha, entre o sistema inglês e o sistema escocês) era particularmente visível ao nível da pós-graduação, pois é sobretudo nesse nível de ensino que se observa uma proliferação de tipos de cursos e de títulos académicos, sem nenhuma garantia de equivalência quanto a nível, exigências e duração. Seguindo as recomendações do Dearing Report (1997), a agência QAA elaborou uma tipologia de titulações assente na definição dos conceitos-chave de “Nível”, “Créditos” e “Carácter”dos cursos. O “nível” consiste num indicador da complexidade, profundidade dos estudos e autonomia do estudante. O segundo conceito chave é o de “crédito”, que fornece uma medida dos resultados da aprendizagem quantificada pelas supostas horas de estudo exigidas para obter tais resultados, sendo que a possibilidade de acumular créditos impede a vinculação do nível de estudos ao número de anos académicos cursados. O terceiro conceito é o de mais difícil definição, passando por identificar claramente a finalidade da titulação, a natureza do estudo exigido e o método de avaliação utilizado, de forma a fornecer as informações necessárias a alunos, empregadores e financiadores.

 

Padrões de referência de qualidade de área

A necessidade de tornar explícitas as características académicas gerais dos cursos universitários no Reino Unido e os standards dos seus graus académicos conduziu à criação (1999-2002) de padrões de referência de qualidade por área científica (Subject Benchmarking Standards) inspirados no conceito de “benchmarking”, apontado pela UNESCO (1995) como conceito relevante para as suas actuais políticas do ensino superior. Segundo Allan Schofield (1998,
p. 8) o “Benchmarking é um instrumento de automelhoramento das organizações que permite que elas se comparem com outras, identifiquem os seus pontos fortes e fracos e aprendam o que deve ser melhorado. É uma maneira de identificar e adoptar as melhores práticas”. Originário da iniciativa privada, este conceito surgiu como instrumento estratégico de resposta a uma competição internacional cada vez mais agressiva e no contexto do crescente interesse por métodos de garantia e melhoria da qualidade e de um rápido progresso da tecnologia da informação. Contudo, há o risco de que esses standards , em pleno funcionamento a partir de 2002, se tornem uma espécie de currículo nacional ou, no extremo oposto, resultem em preceitos tão gerais e vagos que não tenham algum efeito prático, ou ainda, que, ao se estabelecer um limite mínimo aceitável, se favoreça o nivelamento por baixo dos padrões de qualidade (QAAHE, 1998).

 

Especificações do programa

No centro deste outro conceito está a ideia de ajudar as instituições universitárias britânicas a definir com clareza os produtos pretendidos pelos seus programas de curso, tendo em vista não apenas fornecer, de uma forma simples e directa, informações a futuros alunos e empregadores sobre os produtos resultantes do programa de estudo, mas também, de ajudar as equipas docentes a definir esses produtos em termos de aprendizagem dos alunos, métodos de ensino/aprendizagem que a eles conduzem, processos de avaliação que demonstrem que os resultados foram atingidos, e relação que o programa e seus elementos mantêm com a estrutura de titulações académicas (Qualification Framework). As informações contidas na “Especificação” são divulgadas nos folhetos de cursos, nos catálogos e nas web pages das respectivas instituições, devendo indicar os documentos ou ligações complementares onde são veiculadas outras informações relativas a directrizes, políticas, planeamento, manuais de cursos, currículos e conteúdos programáticos disciplinas.

 

A avaliação institucional

A Avaliação Institucional ( Institutional Review ) é a herdeira da Auditoria da Qualidade Académica ( Academic Quality Audit ), que começou em 1990, promovida pelo Conselho dos Reitores (CVCP). Com a unificação do sistema, em 1992, o CVCP criou o Higher Education Quality Council (HEQC) que estendeu essa avaliação também às novas universidades (ex-Politécnicos) mas que viria a ser extinto em 1997, sendo as suas funções transferidas para a nova agência de avaliação do ensino superior com sede em Gloucester, a Quality Assurance Agency (QAA). Este instrumento ganhou popularidade na Europa continental, sobretudo após a sua adopção pelo Conselho de Reitores das Universidades Europeias (CRE) no seu programa de avaliação institucional, cujo objectivo primeiro era melhorar os processos de gestão de qualidade das instituições universitárias (Vught, van F. e Westerheijden, D., 1996). Também nos EUA o academic audit foi saudado com entusiasmo como inovação importante por vários académicos (Dill, Massy, Williams e Cook, 1996; Trow, 1998, pp. 47-57; Trombley, 1999), que reconhecem o seu potencial e a apontam como o caminho mais promissor para revigorar ou redesenhar o tradicional sistema americano de acreditação.

O resultado dessa avaliação é apresentado num relatório público (The Institutional Report) que apresenta um quadro geral de como a universidade ou college mantém sua qualidade e standards, destacando os pontos fortes e fracos, vinculando as instituições a informar, no prazo de ano após a sua publicação, sobre as medidas tomadas para superar os pontos fracos identificados, ajudando assim as instituições a garantir o seu futuro.

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A avaliação de cursos

A Avaliação de Cursos, antiga Avaliação da Qualidade do Ensino (Teaching Quality Assessment), e que foi conduzida pelo HEFCE, por meio de sua Quality Assessment Division, de 1993 até Outubro de 1997, é da competência da QAA que coordena essa avaliação, em nome do HEFCE, e articula as visitas a universidades e colleges para avaliar a qualidade do ensino nas diferentes áreas. Seguindo os procedimentos estabelecidos num manual próprio, o Subject Review Handbook, concentra a sua acção na análise de seis aspectos predefinidos da oferta, como, a estrutura curricular, conteúdo e organização; o ensino, aprendizagem e avaliação; a progressão dos alunos e desempenho; o apoio e orientação aos alunos; os recursos para a aprendizagem; e os processos de gestão da qualidade e de aperfeiçoamento. Em torno destes seis aspectos é organizada a visita e, posteriormente, elaborado o relatório público, sendo cada um dos seis aspectos da oferta avaliado numa escala de quatro pontos, o que resulta numa pontuação máxima final de 24 pontos. A atribuição a um curso de dois ou mais pontos em cada um dos seis itens confere-lhe a distinção de “qualidade aprovada”, enquanto que a atribuição de um ponto em qualquer dos tópicos obrigará a nova avaliação no prazo de um ano, pelo que, a persistir a deficiência, resultará a classificação de “qualidade insatisfatória” e a suspensão, em parte ou no seu todo, do financiamento do curso. No final do ciclo de avaliação de cada área, a QAA publica um relatório geral de área disponível também no website da agência (http://www.qaa.ac.uk) e que constitui uma valiosa fonte de informação para os potenciais candidatos a esses cursos.

 

A avaliação da pesquisa

Das grandes avaliações externas que compõem o sistema universitário britânico, a mais antiga, realizada pela primeira vez em 1986, é a Avaliação da Pesquisa (Research Assessment Exercise - RAE), que, mesmo depois da criação da QAA, continua sob a responsabilidade das agências de financiamento (HEFCs). Esta avaliação é um processo conjunto das agências de financiamento do Ensino Superior do Reino Unido, mas a avaliação é coordenada por uma equipa do escritório central da HEFCE, sediado em Bristol. O RAE avalia a qualidade da pesquisa nas instituições, de acordo com um modelo padrão e um conjunto de formulários que devem ser preenchidos e que respeitam ao staff (desde os “investigadores activos” até outras categorias de investigadores e docentes, research fellows , assistentes de pesquisa com pós-doutoramento ou doutoramento, assistentes, técnicos e auxiliares de pesquisa), a produção técnica e científica, o corpo discente e financiamento externo obtido em bolsas ou contratos, – isto sem influenciar ou distorcer o que está medindo, não encorajando ou desencorajando qualquer tipo particular de actividade; apenas estimulando, de forma geral e em transparência, a melhoria da qualidade da pesquisa, de uma forma absoluta, independentemente do tipo, forma e localização da universidade que produz essa pesquisa.

 

Avaliação, internacionalização e “Processo de Bolonha”

Como resultado de todo este processo, o Reino Unido assumiu uma posição de vanguarda na articulação e resposta do sistema de ensino superior à internacionalização e globalização, detendo uma posição de liderança no desenvolvimento de uma agenda para a exportação e comércio dos seus modelos de ensino e avaliação, reforçando a sua já longa tradição de centralidade internacional como destino de estudantes universitários de vários continentes e reconfigurando a sua histórica influência cultural em diversas áreas do globo. O Reino Unido é hoje o segundo maior “exportador” de ensino superior e o quarto maior “importador” (Uvalic-Trumbic & Varoglu, 2003). Nas últimas duas décadas, o número de estudantes estrangeiros no país (incluindo naturais da UE) aumentou 90% (154% entre 1990-94), tornando-se a principal fonte de financiamento das universidades através do pagamento das suas propinas, minimizando desta forma as consequências da redução do financiamento e da eliminação dos subsídios públicos à formação de estudantes estrangeiros. O próprio governo de Tony Blair estimulou este processo ( Prime Minister's Initiative ) de mobilidade estudantil, com o afrouxamento das restrições de concessão de visto a estudantes estrangeiros. Esta política de incentivo, associada a outros factores como a tradição académica de independência, os condicionamentos económicos, mas, sobretudo, a língua inglesa como instrumento veicular de comunicação internacional, torna o ensino superior britânico um destino preferencial. Uma projecção do British Council aponta para que, em 2025, a população estudantil estrangeira tenha duplicado, constituindo um quarto do total de todos os estudantes do Reino Unido. Os quadros anexos fornecem uma perspectiva actual das estatísticas relativas aos estudantes estrangeiros no país.

Da sua análise constata-se que o mercado asiático é importante para o Reino Unido, que concorre com a Austrália e os EUA nesta lucrativa fonte de rendimento. Previsões recentes acerca do mercado internacional de estudantes apontam para que, em 2025, exista um mercado potencial de sete milhões de estudantes em mobilidade, dos quais dois terços serão provenientes da Ásia. O facto é que as instituições líderes no ensino superior britânico dependem largamente, para a sua viabilidade económica, da população de estudantes estrangeiros.

O Reino Unido é um dos signatários da Declaração de Bolonha. Contudo, comparativamente a outros países europeus signatários, o “processo de Bolonha” não produziu um impacto significativo nas políticas para o ensino superior no país, porquanto, na maioria dos aspectos acordados naquela declaração, o sistema britânico de ensino superior foi pioneiro, contempla-os e constituiu o modelo inspirador do processo. Contudo, identificam-se algumas anomalias: a unidade básica de graduação corresponde a um curso de três anos (bachelor), seguido de um ano de curso de mestrado (master) (3+1); além de que o país possui o seu próprio sistema nacional de créditos. Pelo que a convergência europeia no sentido de uma unidade básica assente no 4+2 conduzirá à necessidade de novas reformulações do sistema britânico que o tornarão ainda mais competitivo como instrumento económico estratégico e de reconfiguração e recomposição das antigas áreas culturais de influência.

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* Fernando Amorim

Mestre em História Moderna pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Docente e Investigador do Observatório de Relações Exteriores da UAL. Editor do Janus.

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Bibliografia

DILL, D MASSY, W. WILLIAMS, P & COOK, C. – “Accreditation & Academic Quality Assurance. Can We Get There From Here?” Change , September/October, 1996. Pp.17-24.

QAAHE. – “Quality Assurance: a new approach”. Higher Quality , No 4, 1998.

SCHOFIELD, Allan. – “Benchmarking: An Overview of Approaches and Issues in Implementation”. In Commonwealth Higher Education Management Service. Benchmarking in Higher Education: an International Review . London, 1998.

SPAGNOLO, Fernando. – “Avaliação do Ensino Superior: Dez Lições da Inglaterra”. INFOCAPES: Boletim Informativo Vol. 8, Nº 1 Janeiro/Março 2000. Brasília-DF: MEC- Ministério da Educação, 2000.

UNESCO. – Change and Development in Higher Education. Policy Paper , UNESCO (1995).

TROMBLEY, William. – “Academic Audits. American Educators Examine European Practices”. National Crosstalk . The National Centre for Public Policy and Higher Education. Vol. 7, N o .3 1999, p.4.

TROW, Martin – “On the Accountability of Higher Education in the United States”. In BOWEN W & SHAPIRO H. Universities and Their Leadership . Princeton, Princeton University Press, 1998.

UVALIC-TRUMBIC, S.; VAROGLU, Z. – Survey of the 2002 breaking news and the UNESCO Global Forum on quality assurance, accreditation and the recognition of qualifications . London: The Observatory on Borderless Higher Education, 2003.

VUGHT, Van FA & WESTERHEIJDEN, D. – “Institutional Evaluation and Management for Quality. The CRE Programme: Background, Goals and Procedures”. CRE-action , N o . 107, pp. 9-40, 1996.

WILLIAMS, G.; COATE, K. (2004) – “United Kingdom”. In: J. Huisman & M. van der Wende (Eds.) – On Cooperation and Competition: National and European Policies for the Internationalisation of Higher Education , pp. 113-137.

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