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Janus 2006



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Responsabilidades do Estado na cultura

José Amaral Lopes *

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Tendo consciência de que a cultura se alicerça em valores e conhecimento, só mulheres e homens cultos, capazes de compreensão e conhecimento crítico da realidade e do mundo que os rodeia, são capazes de exercer, de forma exigente e responsável, os seus direitos e exercer plenamente a sua cidadania.

Por isso, qualquer agente político empenhado na construção de uma sociedade mais desenvolvida, justa e harmoniosa, deve ter sempre presente que a cultura é uma componente fundamental da identidade nacional e que o crescimento económico e o verdadeiro desenvolvimento das sociedades só serão alcançados, de forma integral e duradoura, se forem acompanhados por um efectivo desenvolvimento cultural.

A política cultural deve ter, por conseguinte, um papel central e transversal no conjunto de todas as políticas sectoriais e, por ser assim, o propósito de promover o acesso do maior número possível de cidadãos aos bens e actividades culturais, deve ser permanente e consistente em toda actividade política.

 

Partilhar o domínio

Porque a cultura contribui para a diminuição da exclusão social e para o reforço da auto-estima das pessoas e das comunidades locais, o conjunto de responsabilidades no domínio cultural não deve ser atribuído, exclusivamente, ao Governo; deve, outrossim, ser assumido, de forma clara e consistente, pelas autarquias locais e partilhado com os agentes e criadores culturais, universidades, escolas, associações, fundações, empresas e outras instituições e com os cidadãos em geral.

Só conhecendo a diversidade e pluralidade das expressões com que a cultura se revela, se reforça o valor da tolerância, da aceitação da diferença e se cria a consciência de que a diversidade cultural é uma riqueza que constitui um património civilizacional que a todos compete defender e valorizar.

Importa ter presente que nos nossos dias é maior a consciência de que o artista tem a capacidade de traduzir a mesma realidade em muitas realidades divergentes, estimulando, através das “leituras” da sua criação, a reflexão, a discussão, a valorização da diversidade e análise crítica do mundo que nos rodeia.

Nunca é demais, por conseguinte, insistir nas vantagens da construção do conhecimento a partir do acesso e fruição dos bens culturais – a partir da arte – pois, o homem e o mundo são melhor percepcionados a partir da criação artística e da categoria do belo. Adquire-se maior capacidade de utilizar as linguagens e os conceitos que permitem dar nome às coisas e renovar a sensibilidade estética de forma mais plena porque alcançada nos domínios das emoções emanadas das criações artísticas que acrescentam beleza e promovem a mudança essencial ao desenvolvimento do homem.

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Formar públicos

Sendo produto e responsabilidade de toda a comunidade, a cultura tem de ser fruída, sentida, enfim, vivida por todas as pessoas, pois só assim se poderão combater os atrasos estruturais e criar os alicerces sólidos de desenvolvimento humano e social.

Sendo Portugal um país que ainda se pode caracterizar como desequilibrado, do ponto de vista do acesso dos cidadãos às actividades culturais, revela-se indispensável adoptar medidas políticas que favoreçam a criação e o fortalecimento de pólos culturais capazes de instituir dinâmicas locais de formação de públicos.

Devemos, pois, ter consciência de que os desafios que a sociedade contemporânea nos coloca e os objectivos que todos devemos prosseguir serão melhor alcançados através de medidas políticas de promoção do acesso efectivo dos cidadãos à cultura.

A política cultural que defendemos deve ir ao encontro das populações residentes, no sentido de mudar e melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, bem como desenvolver o espirito crítico e a cidadania. Para tanto, defendemos que se deve promover uma oferta cultural de qualidade e com uma vertente educativa que não se compadece com a demagogia do efémero e do deslumbramento, nem com a captação de massas que em muito pouco aproveita ao futuro dos cidadãos.

Instituir hábitos e gostos, bem como mudar comportamentos e mentalidades, em particular das crianças e dos jovens em idade escolar, só é possível através de um esforço de continuidade e da garantia de sustentabilidade, significando isto a construção de parcerias e a promoção de sinergias, através das quais se implicam as pessoas que são o primeiro e fundamental objectivo de qualquer actividade política.

As medidas de política cultural são essenciais à imagem de qualidade e à imagem da auto-estima de um povo que passa para além-fronteiras e que faz com que as iniciativas culturais de uma cidade e de um país possam ser elementos geradores de riqueza.

 

Mudar de turismo

Não podemos esquecer que promover públicos também significa captar públicos de fora e, nessa medida, também significa turismo e, consequentemente, valorização e enriquecimento da cidade e dos seus habitantes.

Se é verdade que Portugal concorreu significativamente para o processo de globalização, que resultou na valorização de povos e nações de todo o mundo, contribuindo, assim, para o desenvolvimento da humanidade, é também certo que a cultura portuguesa adquiriu uma identidade aberta às importações estrangeiras, no passado e no presente. Surge uma identidade que resulta das interinfluências com outras comunidades no mundo, sem o que não há enriquecimento mútuo das culturas e dos povos. Mas esta identidade não pode confundir-se com o desenraizamento porventura decorrente da globalização da economia, da informação e das tecnologias.

Por isso, no sentido da consciencialização do valor que é o património cultural, deve defender-se a perspectiva moderna de um património vivo, aberto e integrado num conjunto urbano ou na paisagem natural, sem o que se perde a sua qualidade enquanto património e deixa de haver contributo para melhorar a qualidade de vida do homem, em particular das crianças e dos jovens.

 

Reinventar a paisagem

A qualidade de uma cidade – que implica necessariamente a qualidade da actividade cultural que nela se desenvolve – deve ser integrada nas novas perspectivas de conceber o território, através da reinvenção da paisagem e do condicionamento ambiental, ou seja, de um novo planeamento territorial.

Por isso, também não nos podemos esquecer que o actual modelo de turismo de massas se encontra em vias de esgotamento, revelando-se urgente a requalificação da oferta e das estratégias alternativas. Por outras palavras, urge caracterizar uma nova identidade dos lugares a promover, a sua

fruição pelas populações locais e para a captação de turismo. Qualquer estratégia nesse sentido deve privilegiar a qualidade de vida dos residentes, na medida em que só assim se constrói o poder de atracção das vivências urbanas para os que nos querem visitar e nos valorizam com a sua presença e com a imagem que difundem de nós.

Só com medidas de política cultural que assumam, de forma inequívoca, estes objectivos, é que as gerações mais jovens compreenderão a importância da defesa e promoção do património cultural que lhes foi transmitido e para a criação que permitirá valorizar e construir o património do futuro.

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Informação Complementar

UMA POLÍTICA EM REVISÃO: O INVESTIMENTO NO CINEMA

Em Portugal, a produção dos filmes de longa-metragem depende, quase em exclusivo, do financiamento do Estado, através do ICAM. O financiamento do ICAM é atribuído através de concursos desenvolvidos no âmbito de três tipos de procedimentos. Existem, por conseguinte, três sistemas de financiamento público. O mais importante – pois é através dele que se atribui a maioria do financiamento à produção cinematográfica nacional – é o designado Apoio Selectivo. No âmbito deste procedimento, os projectos são analisados por um júri, de acordo com critérios estabelecidos nos regulamentos aplicáveis, onde a qualidade artística é um dos factores mais relevantes. Para além do sistema designado Apoio Selectivo, existe o designado sistema de Apoio Automático, no âmbito do qual são analisados os projectos de produtores que tenham alcançado um número mínimo de espectadores em obras apoiadas anteriormente.

É nesta modalidade de apoio que a capacidade de o produtor interessar o público é relevante. Existe, ainda, um sistema de atribuição de apoios que é designado por Apoio Directo, no âmbito do qual os apoios são atribuídos a projectos que já conseguiram obter outras fontes de financiamento, sendo o financiamento do ICAM um financiamento complementar que não pode ultrapassar 50% do custo-valor global do projecto.

Comercial, cultural...

Em Espanha e em França o sistema, no âmbito do qual é atribuída a maior parte do financiamento do Estado à produção cinematográfica, é o sistema de Apoio Automático. Desde logo se pode constatar que nesses países a capacidade que os produtores demonstraram nas suas produções anteriores de interessar os espectadores nacionais é relevante para a atribuição do financiamento público. Ao contrário do que acontece na generalidade dos Estados-membros da UE, em Portugal ainda há ainda quem defenda que o interesse dos cidadãos/espectadores não deve ser critério relevante, porque as obras de arte nem sempre são, na sua contemporaneidade, compreendidas por todos e a promoção da vanguarda deve ser assumida pelo Estado. Estamos de acordo com a ideia de que o Estado deve apoiar a criatividade, a inovação e a liberdade artística, mas não no sentido maniqueísta de considerar que a obra de qualidade artística é, por natureza, inatingível, incompreendida e incapaz de suscitar o interesse dos cidadãos. Porque entendo que não devemos aceitar o maniqueísmo, também não defendo que a produção de cinema deva ficar entregue às forças do mercado. Uma posição não é contraditória com a outra. Entendo que o Estado tem a obrigação de adoptar medidas que permitam garantir aos filmes nacionais boas condições de produção, de circulação e de acesso ao público. Os três objectivos são complementares e não necessariamente contraditórios. Como consta da Declaração Comum das Agências Nacionais de Cinema Europeias, “os fundamentos para o apoio financeiro ao cinema não podem limitar-se unicamente a razões de ordem cultural”. A distinção nítida, categórica, entre uma obra “comercial” e uma obra “cultural” é artificial, visto que cada filme é simultaneamente um empreendimento comercial e a expressão de uma cultura. Do mesmo modo, não é possível definir o que é um filme “difícil”... A existência de um tecido industrial forte é uma condição necessária à criatividade.

Na verdade, o interesse que algumas obras que marcaram a cinematografia europeia conseguiram despertar junto dos públicos europeus já tornou evidente que a qualidade artística não é incompatível com o acesso do público à fruição dessas obras. E é inquestionável que desta forma contribuímos decisivamente para o enriquecimento cultural dos cidadãos e, ao mesmo tempo, para a valorização dos autores e da cinematografia europeia. Será por este tipo de razões que os produtores nacionais fazem um esforço para estar presentes nos principais festivais internacionais e, nesses eventos, procuram promover e dar a conhecer ao maior número possível de potenciais interessados as obras cinematográficas nacionais.

Diversificar as fontes

No entanto, para prosseguir este tipo de objectivos é preciso ter consciência de que o investimento na produção nacional (para não falar na promoção) é reduzido, quando comparado com os restantes países europeus, revelando-se necessário aumentar os níveis de investimento no sector em Portugal. Para tanto, uma vez que o recurso ao financiamento exclusivamente público é escasso e limitado, revela-se necessário diversificar as fontes de financiamento e, por essa via, aumentar o volume dos investimentos em todos os segmentos do sector do cinema e do audiovisual em Portugal, desde a fase de desenvolvimento, passando pela produção, distribuição e exibição. Nesse sentido, o envolvimento e a participação de todos os agentes do sector revela-se necessário. Os mecanismos destinados às decisões de investimento também devem ser diversificados, sob pena de não se alcançar o desejado aumento da participação financeira das entidades privadas.

Neste contexto, a regulamentação da Lei das Artes Cinematográficas deverá prever a participação efectiva dos principais agentes do sector, promovendo, de forma eficiente, o aumento de investimentos e uma maior co-responsabilização nas estratégias de promoção e internacionalização das obras cinematográficas portuguesas. A criação de oportunidades para novos criadores nestes domínios deve ser também um objectivo persistente e uma atenção às novas linguagens e formas de criação e produção não pode ser desvalorizada. O apoio concreto às novas tecnologias poderá criar condições para o aparecimento de novos criadores, sem que o esforço necessário de investimento inviabilize a concretização deste objectivo.

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* José Amaral Lopes

Licenciado em Direito na Universidade Lusíada e Pós Graduado em Estudos Europeus pela Universidade Católica Portuguesa. Desempenhou diversas funções entre as quais Secretário de Estado dos Bens Culturais e Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Cultura.

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Dados adicionais
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