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Onde estou: | Janus 2006> Índice de artigos > A nova diplomacia > UE: a política externa e de segurança > [ A PESC nos Tratados: antecedentes e evolução ] | |||
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Foi uma longa e lenta evolução, feita de pequenos passos, que levou ao aparecimento do que é hoje designado de “Política Externa e de Segurança Comum”, mais conhecida pela sua sigla PESC, que tem a sua base jurídica inicial no Tratado da União Europeia, assinado em Maastricht em 7 de Fevereiro de 1992, constituindo o “segundo pilar” intergovernamental da União, e que foi reformulada e reforçada pelo Tratado de Amesterdão, assinado em 2 de Outubro de 1997 e pelo Tratado de Nice, assinado em 26 de Fevereiro de 2001.
A cooperação política europeia Datam dos anos 70 os primeiros esforços eficazes para impulsionar o aparecimento de uma política externa e de segurança comum. Depois de fracassadas duas tentativas de criar uma política europeia de defesa e de cooperação política – os Planos Pléven e Fouchet nos anos 50 e 60 que propunham, respectivamente, a criação de um exército europeu e a definição de políticas comuns nos domínios das Relações Externas e da Defesa – foi apresentado um relatório (o “relatório Davignon”) na Cimeira do Luxemburgo em 1970. Este relatório esteve na origem da criação da Cooperação Política Europeia (CPE), lançada de modo informal logo nesse ano, aperfeiçoada por relatórios subsequentes apresentados em Copenhaga em 1973, em Londres em 1981, e posteriormente institucionalizada pelo Acto Único Europeu, assinado no Luxemburgo em 17 de Fevereiro de 1986 e em Haia a 28 de Fevereiro de 1986, já por doze Estados-membros. A CPE, antecessora imediata da PESC, implicava principalmente a consulta entre os Estados-membros sobre questões de política externa, mas não a execução de acções comuns. Para possibilitar estas consultas, o relatório do Luxemburgo propôs, como bases fundamentais para uma CPE, que os ministros dos Negócios Estrangeiros dos Estados-membros se reunissem duas vezes por ano, em reuniões presididas pela Presidência. Para preparar essas reuniões periódicas, foi proposta a criação de um Comité Político que reunia pelo menos quatro vezes por ano. Foi também proposta a criação de correspondentes europeus de ligação entre as capitais e grupos de trabalho que efectua-vam análises geográficas ou temáticas para a CPE. A obrigação principal imposta aos Estados era a de se consultarem em todas as questões de política externa. Os relatórios de Copenhaga e Londres vieram, entre outras coisas: aumentar a periodicidade das reuniões ministeriais; reforçar o papel da Presidência – que passou a ter o papel de supervisionar a implementação das conclusões dessas reuniões e a representar a CPE perante a comunidade internacional –, da Troika e também das embaixadas e missões dos Estados-membros – que passaram a efectuar consultas e relatórios sobre questões da CPE nas capitais dos membros e também de países terceiros e em conferências e organizações internacionais; e instituir uma rede de comunicações cifradas entre os Estados-membros para a partilha de informação (COREU). O Acto Único Europeu dotou a CPE de uma base jurídica e institucionalizou esta prática dezassete anos após o seu lançamento, incluindo através da criação um secretariado próprio em Bruxelas sob a tutela directa da Presidência. Por outro lado, os objectivos da CPE foram alargados a todas as questões de política externa de interesse geral, passando a ser discutidos pelo Conselho Europeu (composto pelos chefes de Estado e de Governo e pelo Presidente da Comissão Europeia), que reúne pelo menos duas vezes por ano. A política externa e de segurança comum nos Tratados de Maastricht, Amesterdão e Nice Através do Tratado da União Europeia, os então doze membros das Comunidades Europeias (Comunidade Económica Europeia, Comunidade Europeia do Carvão e do Aço e Comunidade Europeia da Energia Atómica), decidiram em 1992 instituir entre si uma “União Europeia”, em que um dos objectivos principais passou a ser a “afirmação da sua identidade na cena internacional, nomeadamente através da execução de uma política externa e de segurança comum, que inclua a definição, a prazo, de uma política de defesa comum”. Os bem conhecidos eventos políticos internacionais e na Europa entre o final dos anos 80 e princípios dos anos 90, levaram os Estados-membros das Comunidades Europeias a sentirem necessidade de dar esse passo. Com a entrada em vigor do Tratado de Maastricht em 1 de Novembro de 1993, o Título V do Tratado da União Europeia substituiu, no edifício comunitário, a CPE por um pilar intergovernamental – o segundo pilar – com cinco objectivos principais: a salvaguarda dos valores comuns e dos interesses fundamentais da União; o reforço da segurança da União; a manutenção da paz e o reforço da segurança internacional; o fomento da cooperação internacional; e o reforço da democracia e do Estado de Direito, bem como o respeito dos Direitos do Homem. Este Título V constituiu um pilar distinto da União Europeia, ao lado dos pilares comunitário e justiça e assuntos internos, dado que os seus procedimentos, e sobretudo o processo de decisão por consenso, são de carácter intergovernamental e por isso se distinguem dos adoptados nos sectores comunitários tradicionais, como o mercado interno ou a política comercial. O Tratado de Amesterdão procurou aperfeiçoar o Título V do Tratado da União Europeia, reforçando o carácter operacional da PESC, dotando-a de instrumentos mais coerentes e de um processo de decisão mais eficaz. Designadamente, foi aceite a possibilidade de recorrer ao voto por maioria qualificada através da chamada “abstenção construtiva” e da possibilidade de submeter a decisão ao Conselho Europeu em caso de veto excepcional de um Estado-membro (denominado “travão de emergência” para assuntos de interesse nacional). Foi criado um Alto Representante para a Política Externa e de Segurança Comum e passou também a reconhecer-se à Comissão um papel de representação e execução da PESC. O Tratado de Nice, por seu turno, feito a quinze mas pensando já numa Europa a vinte e cinco, procurou agilizar ainda mais o processo de tomada de decisão em matéria de política externa e de segurança comum na União Europeia. Assim, nos casos de cooperação reforçada – em execução de uma acção ou posição comum em questões sem repercussões na área de defesa ou militares – e se nenhum Estado-membro se opuser ou se não for exigida uma decisão unânime do Conselho Europeu (o “travão de emergência”), passaram a poder tomar-se decisões no Conselho por maioria qualificada, como o apoio de, no mínimo, oito países.
Informação Complementar TÍTULO V DO TRATADO DA UNIÃO EUROPEIA - ALGUMAS DISPOSIÇÕES RELATIVAS À POLÍTICA EXTERNA E DE SEGURANÇA COMUM (VERSÃO DO TRATADO DE MAASTRICHT - 1992)* Artigo J É instituída uma política externa e de segurança comum, regida pelas disposições que se seguem. Artigo J.1 1. A União e os seus Estados-membros definirão e executarão uma política externa e de segurança comum, regida pelas disposições do presente Título e extensiva a todos os domínios da política externa e de segurança. 2. Os objectivos da política externa e de segurança comum são: - a salvaguarda dos valores comuns, dos interesses fundamentais e da independência da União; - o reforço da segurança da União e dos seus Estados-membros, sob todas as formas; - a manutenção da paz e o reforço da segurança internacional, de acordo com os princípios da Carta das Nações Unidas e da Acta Final de Helsínquia e com os objectivos da Carta de Paris; - o fomento da cooperação internacional; - o desenvolvimento e o reforço da democracia e do Estado de direito, bem como o respeito dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais. 3. A União prosseguirá estes objectivos, mediante: - a instituição de uma cooperação sistemática entre os Estados-membros na condução da sua política, nos termos do disposto no artigo J.2; - a realização gradual, nos termos do disposto no artigo J.3, de acções comuns nos domínios em que os Estados-membros têm interesses importantes em comum. 4. Os Estados-membros apoiarão activamente e sem reservas a política externa e de segurança da União, num espírito de lealdade e de solidariedade mútua. Abster-se-ão de empreender quaisquer acções contrárias aos interesses da União ou susceptíveis de prejudicar a sua eficácia como força coerente nas relações internacionais. O Conselho zelará pela observância destes princípios. Artigo J.2 1. Os Estados-membros informar-se-ão mutuamente e concertar-se-ão no âmbito do Conselho sobre todas as questões de política externa e de segurança que se revistam de interesse geral, de modo a garantir que a sua influência conjugada se exerça da forma mais eficaz, através da convergência das acções. 2. Sempre que o considere necessário, o Conselho definirá uma posição comum. Os Estados-membros zelarão pela coerência das suas políticas nacionais com as posições comuns. 3. Os Estados-membros coordenarão a sua acção no âmbito das organizações internacionais e em Conferências internacionais. Nessas instâncias defenderão as posições comuns. Nas organizações internacionais e em Conferências internacionais em que não tomem parte todos os Estados-membros, os que nelas participem defenderão as posições comuns. * Entrou em vigor em 1 de Novembro de 1993
TÍTULO V DO TRATADO DA UNIÃO EUROPEIA - DISPOSIÇÕES RELATIVAS À POLÍTICA EXTERNA E DE SEGURANÇA COMUM (VERSÃO DO TRATADO DE AMESTERDÃO - 1997)* Artigo 12.º A União prosseguirá os objectivos enunciados no artigo 11.º: - definindo os princípios e as orientações gerais da política externa e de segurança comum, - decidindo sobre as estratégias comuns, - adoptando acções comuns, - adoptando posições comuns, - reforçando a cooperação sistemática entre os Estados-membros na condução da política. Artigo 23.º 1. As decisões ao abrigo do presente Título serão adoptadas pelo Conselho, deliberando por unanimidade. As abstenções dos membros presentes ou representados não impedem a adopção dessas decisões. Qualquer membro do Conselho que se abstenha numa votação pode fazer acompanhar a sua abstenção de uma declaração formal nos termos do presente parágrafo. Nesse caso, não é obrigado a aplicar a decisão, mas deve reconhecer que ela vincula a União. Num espírito de solidariedade mútua, esse Estado-membro deve abster-se de qualquer actuação susceptível de colidir com a acção da União baseada na referida decisão ou de a dificultar; os demais Estados-membros respeitarão a posição daquele. Se os membros do Conselho que façam acompanhar a sua abstenção da citada declaração representarem mais de um terço dos votos, ponderados nos termos do n.º 2 do artigo 205.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia, a decisão não será adoptada. 2. Em derrogação do disposto no n.º 1, o Conselho delibera por maioria qualificada: - Sempre que adopte acções comuns ou posições comuns ou tome qualquer outra decisão com base numa estratégia comum, - Sempre que adopte qualquer decisão que dê execução a uma acção comum ou a uma posição comum. Se um membro do Conselho declarar que, por importantes e expressas razões de política nacional, tenciona opor-se à adopção de uma decisão a tomar por maioria qualificada, não se procederá à votação. O Conselho, deliberando por maioria qualificada, pode solicitar que a questão seja submetida ao Conselho Europeu, a fim de ser tomada uma decisão por unanimidade. Os votos dos membros do Conselho serão ponderados nos termos do n.º 2 do artigo 205.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia. As deliberações serão tomadas se obtiverem, pelo menos, sessenta e dois votos que exprimam a votação favorável de, no mínimo, dez membros. O disposto no presente número não é aplicável às decisões que tenham implicações no domínio militar ou da defesa. 3. Em questões de natureza processual, o Conselho delibera por maioria dos seus membros. * Entrou em vigor em 1 de Maio de 1999
TRATADO DE NICE * São inseridos os seguintes artigos: “Artigo 27.ºA 1. As cooperações reforçadas num dos domínios referidos no presente Título destinam-se a salvaguardar os valores e servir os interesses da União no seu conjunto, afirmando a sua identidade como força coerente na cena internacional. Devem respeitar: - os princípios, os objectivos, as orientações gerais e a coerência da política externa e de segurança comum, bem como as decisões tomadas no quadro dessa política; - as competências da Comunidade Europeia; - a coerência entre o conjunto das políticas da União e a sua acção externa. 2. Salvo disposição em contrário contida no artigo 27.ºC e nos artigos 43.º a 45.º, às cooperações reforçadas previstas no presente artigo aplica-se o disposto nos artigos 11.º a 27.º e nos artigos 27.ºB a 28.º. Artigo 27.ºB As cooperações reforçadas ao abrigo do presente Título incidem na execução de uma acção comum ou de uma posição comum. Não podem incidir em questões que tenham implicações militares ou do domínio da defesa. Artigo 27.ºE Qualquer Estado-membro que deseje participar numa cooperação reforçada instituída nos termos do artigo 27.ºC notificará a sua intenção ao Conselho e informará a Comissão. A Comissão apresentará um parecer ao Conselho, no prazo de três meses a contar da data de recepção da notificação. No prazo de quatro meses a contar da data de recepção da notificação, o Conselho tomará uma decisão sobre a questão, bem como sobre eventuais disposições específicas que julgue necessárias. A decisão considera-se tomada, excepto se o Conselho, deliberando por maioria qualificada dentro desse prazo, decidir suspendê-la; neste caso, indicará os motivos da sua decisão e fixará um prazo para voltar a avaliá-la. Para efeitos do presente artigo, o Conselho delibera por maioria qualificada. Esta é definida como sendo constituída pela mesma proporção dos votos ponderados e do número dos membros do Conselho em causa do que a fixada no n.º 2, terceiro parágrafo, do artigo 23.º.” * Entrou em vigor em 1 de Fevereiro de 2003* Patrícia Galvão Teles Licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Doutorada em Direito Internacional Público pelo Institut Universitaire dês Hautes Études Internacionales da Universidade de Genebra (Suiça). Docente na UAL. Consultora do Departamento de Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Membro do Conselho Directivo do Observatório de Relações Exteriores da UAL.
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