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ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS CLIQUE AQUI! A rede MNE e a diplomacia económica portuguesa Ainda por isso, o padrão de localização dos diversos níveis da rede diplomática obedecia a critérios quase estritamente políticos, que em nada tinham a ver com questões economicistas: não se criava uma representação diplomática portuguesa no país A porque interessava fomentar o investimento estrangeiro, o turismo ou as trocas comerciais com o nosso país; instituía-se essa embaixada porque o país em causa tinha uma posição central na teia político-institucional (ou na lógica dos conflitos).
Efeitos da globalização Por um lado, ao internacionalizar e massificar actividades tão diversas como o comércio e o investimento, o turismo e as tecnologias da comunicação, a globalização transmitiu às nações uma mensagem clara: ou estas conseguiam ser competitivas a nível internacional, ou sujeitavam-se a um processo de progressivo empobrecimento e perda de importância no contexto económico mundial. Acontece que a perda de competitividade, neste mundo globalizado, pode ocorrer, pelo menos, por dois motivos completamente distintos: porque a empresa não consegue produzir a preços equiparáveis aos dos seus principais concorrentes, mas também porque a empresa não consegue utilizar o marketing e a imagem que este projecta da “marca” como forma de captar mercados. Aliás, suspeitamos que, progressivamente, as questões da marca começaram a sobrepor-se à mera lógica do preço, não apenas ao nível do produto, mas também do próprio país (1). Tratando-se de uma questão de preço ou de marca, a verdade é que estes desenvolvimentos que a globalização nos trouxe exigiram também uma nova lógica para a actividade diplomática das nações. Hoje, a rede diplomática deve preocupar-se, em conjunto com os outros actores neste processo (designadamente as empresas e as organizações não governamentais), em promover os produtos e serviços nacionais, mas também em projectar do país uma imagem, tanto quanto possível real, de si próprio, das suas capacidade, da sua história e cultura, dos seus valores e dos seus produtos. A rede diplomática deve ainda interagir com outros canais neste processo de promoção da imagem do país, designadamente através de iniciativas de cariz mediático, nomeadamente os grandes acontecimentos desportivos e as exposições internacionais (veja-se o impacto da Expo-Sevilha e da Expo-Lisboa para os respectivos países), ou mesmo associando-se ao sucesso desportivo ou cultural de cidadãos nacionais (2). Em bom rigor, o problema de quase todas as nações é que ninguém sabe nem quer saber nada sobre elas...
Da lógica de criação do aparelho... Portugal tem actualmente setenta e sete embaixadas (3) espalhadas pelo mundo, com clara predominância para a Europa, onde dispomos de 36 embaixadas que cobrem a quase totalidade do continente (4). É de referir que existiam algumas excepções de relevo, designadamente de alguns dos novos países da União Europeia (nomeadamente os Estados do Báltico, isto é, a Estónia, Letónia e Lituânia) e da Bielorússia. Estas lacunas foram, já em 2005, parcialmente colmatadas, com a abertura de embaixadas nos referidos Estados do Báltico, em Chipre, Eslovénia e Eslováquia (esta última ainda em 2004). Trata-se, em primeiro lugar, de uma rede vasta à escala mundial, especialmente se tivermos em conta o papel algo periférico de Portugal na cena política mundial (nomeadamente nos grandes palcos de conflito/negociação actuais), a nossa reduzida dimensão económica e o leque limitado de países que potencialmente deveriam merecer maior atenção, designadamente do ponto de vista de uma estratégia de promoção do investimento estrangeiro no país ou das exportações portuguesas para o resto do mundo extra-União Europeia (U.E.). A título meramente exemplificativo, vejamos o caso da Espanha. O nosso vizinho ibérico tem actualmente cento e cinco embaixadas mas, se retirarmos as missões diplomáticas na América Latina (que existem por questões estratégicas que ultrapassam em muito a vertente económica), esse número diminui para oitenta e oito embaixadas. No noroeste europeu, encontramos a Irlanda, com somente quarenta e nove embaixadas espalhadas pelo mundo. A Bélgica, apesar de contar com oitenta e sete embaixadas, dispõe apenas de vinte e quatro consulados gerais e seis consulados, pelo que a sua rede diplomática é quantitativamente inferior à portuguesa. Convirá todavia referir, em abono do rigor de análise, que existem outros exemplos de redes diplomáticas aparentemente sobredimensionadas, mesmo a nível europeu, designadamente a Grécia que possui oitenta embaixadas no exterior. É aliás conveniente não esquecer que Portugal está incluído na UE e, como tal, ao abrigo dos desígnios da Política Externa e de Segurança Comum (a chamada PESC). Ora, nesse contexto e atentos os objectivos da PESC, seria de esperar uma progressiva coordenação de estratégias e esforços ao nível diplomático, que tornariam certamente redundantes algumas das missões diplomáticas espalhadas pelo mundo. A título meramente exemplificativo, imaginando que a actividade principal de uma embaixada portuguesa num longínquo país da América Latina é passar vistos de entrada em Portugal, será razoável considerar até que ponto essa missão diplomática não configura um absoluto desperdício de recursos para o país. Na verdade, admitimos que essa tarefa poderia facilmente ser desempenhada por qualquer outro país da União Europeia que tivesse uma permanência, e motivações, mais activas nesse país (numa primeira análise, a embaixada espanhola). Em segundo lugar, trata-se de uma rede que foi essencialmente constituída com base em critérios de incidência político/estratégica da segunda metade do século XX, só por mero acaso coincidentes com as novas realidades económicas e, até, sociopolíticas que o final da Guerra Fria propiciou. Comecemos pela rede de embaixadas na Europa. Sendo aceitável, num contexto em que o país tem vindo cada vez mais a aprofundar a sua vocação europeísta, que se pretenda, tanto quanto possível, ter representações diplomáticas na generalidade dos país europeus é, no entanto, de questionar até que ponto se justifica a permanência de missões diplomáticas nalguns Estados europeus. Por exemplo, justificar-se-á actualmente ter embaixadas na Bulgária e na Roménia, países que, ao menos do ponto de vista das relações comerciais, do investimento ou do turismo têm um peso absolutamente residual para Portugal (5)? Não seria, numa lógica de custo/benefício, mais prudente alargar a cobertura do mar Negro, reforçando a presença diplomática portuguesa em Ancara e Kiev? Estas reflexões tornam-se, todavia, mais prementes quando olhamos para as restantes zonas geográficas: na América do Sul, temos sete (7!) embaixadas, quando nos pareceria fundamental concentrar os recursos em dois mercados prioritários, isto é, o Brasil e a Argentina (6); em África temos uma vastíssima rede de missões diplomáticas, que abrange países como a Etiópia, o Quénia, o Zimbabué e o Senegal. Em contrapartida, na Ásia, região que se vem afirmando em crescendo do ponto de vista económico e financeiro, e que provavelmente irá ocupar um lugar central a nível político e social no mundo (basta olhar para os dados populacionais e imaginar, por exemplo, o que acontecerá aos tradicionais fluxos migratórios e turísticos quando a China e a Índia aumentarem em meia dúzia de dólares os respectivos rendimentos per capita), a nossa rede diplomática continua a ser relativamente escassa, não tanto em termos do número de embaixadas na região, mas mais em função dos recursos de que estas dispõem para desenvolver a sua actividade. Por último, a rede diplomática tem ainda como critério preferencial de localização os fluxos migratórios portugueses da segunda metade do século passado. Esta realidade torna-se particularmente evidente quando se observa a extensa lista de países em que Portugal tem consulados (cinquenta e oito no total), para além de um vasto número de cônsules honorários (cerca de cento e cinquenta). Assim se compreende que a França seja o país em que Portugal tem o maior número de consulados (treze!), a que se acrescentam quatro na Alemanha, seis nos EUA e nove no Brasil. Em Espanha, hoje em dia destacadamente o principal parceiro económico do país, tanto a nível do comércio externo como do investimento do exterior em Portugal e do país no exterior, temos, em contrapartida, apenas seis consulados (Barcelona, Bilbau, Madrid, Sevilha, Valência e Vigo). Daqui resulta a convicção de que a rede diplomática está, pelo menos no que diz respeito à sua repartição geográfica, algo desajustada. Acresce ainda que não parecem existir critérios objectivos na definição dos recursos afectos às nossas missões no exterior. Por exemplo, seria demasiado complexo estabelecer patamares orçamentais para cada embaixada, em função do interesse específico para Portugal do país em questão (onde a diplomacia económica teria certamente uma palavra a dizer)? Em complemento a esta ideia, será útil para o país, sobretudo atendendo à actual situação financeira, canalizar 20 ou 30 milhões de euros/ano para uma embaixada num país onde o nosso peso político é residual e, portanto, o embaixador português apenas tem acesso à base da pirâmide ministerial local e tão pouco consegue aceder às “forças vivas” da economia desse país?
... aos recursos humanos afectos São conhecidas, e compreensíveis, as dificuldades de adaptação do diplomata de carreira às questões económicas: trata-se normalmente de cidadãos com formação na área do direito ou das relações internacionais e que iniciaram a sua carreira numa época em que a ciência económica era absolutamente secundária no âmbito da diplomacia. O que já não é aceitável é que o diplomata de carreira, voluntária ou involuntariamente, se torne um obstáculo à boa prossecução dos objectivos de âmbito económico do país no exterior. Querendo aceitar que aqueles obstáculos são absolutamente involuntários e resultam da ausência de formação na área económico-financeira, então valeria a pena encarar a adopção de algumas medidas para os ultrapassar. Defendendo nós um modelo diplomático centralizado, em que à embaixada deverá será cometida a responsabilidade pela representação externa de Portugal, também na esfera económica, então parecem-nos restar apenas dois caminhos: dotar as embaixadas de elementos com formação nessa área (e com responsabilidades de decisão) e, por último, fomentar a formação económica dos próprios embaixadores. Como nos dizia alguém, caricaturando um pouco a situação, por que razão haverá o país de “sujeitar” os seus embaixadores, de tempos em tempos, a passar um período tormentoso (e de quase sabática...) em Lisboa, sofrendo com a poluição e a ausência de óperas de qualidade? Não seria mais proveitoso que nesse período, à semelhança do que se passa noutros países, os embaixadores pudessem optar por frequentar cursos de formação de qualidade na área económico-financeira ou, em alternativa, se direccionassem temporariamente para empresas ou associações empresariais? Seria uma partilha bastante proveitosa também para as empresas, designadamente pelo aproveitamento da experiência internacional dos diplomatas.
Licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). Mestre em Economia Internacional pelo ISEG. Docente na UAL e na Universidade do Algarve. Assessor do Banco de Portugal. Membro do Conselho Directivo do Observatório das Relações Exteriores da UAL. Quadros de pessoal das embaixadas portuguesas
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