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- JANUS 2008 -



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A política de coesão territorial europeia

José Reis *

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A política europeia de coesão, hoje tão central nas discussões que atravessam o espaço e as instituições comunitárias, é, no entanto, uma construção relativamente recente. Não nasceu com a Comunidade Económica Europeia (CEE) inicial, como bem se compreende, dado que esta era um grupo de países semelhantes e próximos, quer em termos geográficos, quer em termos económicos e sociais: verdadeiramente, era um clube de ricos. Não que o entendimento daqueles “seis” para criarem um projecto comum e a sua aposta num futuro conjunto não fossem, em si mesmos, já um facto marcante. Estávamos então na segunda metade da década de 50, isto é, bem próximo da lenta extinção dos fogos da Segunda Guerra e entre os fundadores contavam-se inimigos de há pouco. Mas é claro que foi a evolução da comunidade a partir deste núcleo originário – dando lugar a um dos mais notáveis processos de integração social e económica contemporâneos – que tornou a agenda da coesão, entendida como coesão entre territórios, uma das matérias constitutivas da natureza que a União Europeia (UE) veio a assumir.

 

A política de coesão como política dos alargamentos

Embora existissem algumas assimetrias de desenvolvimento entre os países fundadores, como era especialmente exemplificado pela situação do Mezzogiorno italiano, pode pois assumir-se que a política de coesão é uma consequência dos alargamentos, sobretudo depois da adesão da Grécia e de Portugal e Espanha.

Aliás, a própria opção de organizar os recursos da comunidade através da elaboração das chamadas perspectivas financeiras, que estabelecem o quadro orçamental que a governa numa lógica plurianual, está directamente associada aos grandes compromissos políticos que permitiram lançar a política de coesão numa base sistemática, programada e articulada, dando-lhe uma visão de médio prazo. E entre esses compromissos estão, evidentemente, os alargamentos. Foi assim, então de forma assaz inovadora e original, no período 1988-1992, quando, com a sagacidade de Delors, se abriram as portas ao chamado Pacote Delors I. Foi assim no período seguinte, 1993-1999, com o Pacote Delors II. E assim continuou com a Agenda 2000, para 2000-2006, até às decisões actuais para o ciclo 2007-2013. Tratou-se, pois, de substituir intervenções estruturais relativamente marginais e desarticuladas por políticas orientadas para a convergência de regiões com níveis de desenvolvimento claramente inferiores aos da Comunidade no seu conjunto ou com outros problemas de desenvolvimento. Quer dizer, a capacidade de a União desenvolver um quadro estrutural para as suas opções e para as suas margens de actuação financeira, através de transferências individualizadas para Estados, tem de ser creditada, ou pelo menos associada, à consolidação de uma política de coesão.

Estes compromissos e esta agenda política só são compreensíveis à luz da formação de um espaço político, social e económico profunda e crescentemente heterogéneo. A persistência de padrões de vida e de contextos económicos muito contrastantes não seria apenas uma “contradição nos termos” de um processo de integração; seria, obviamente, uma situação insustentável. Mas nem por isso o espaço ocupado pela política de coesão deixou de ter de ser aberto a pulso, confrontando-se com dois adversários poderosos: os limites do orçamento comunitário, hoje ainda contidos em 1,24% do PIB da União (e sem nunca se lá chegar, porque tanto este tecto como a “margem” de não utilização são zelosamente guardados por alguns países) e a mais persistente das políticas comunitárias, aquela que os “seis” iniciais acordaram – a política agrícola – e que, continuando a ser uma política predominantemente para países ricos e agricultores ricos, ainda hoje capta uma das maiores fatias dos recursos.

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As orientações da política de coesão e o contexto actual da discussão sobre intervenções estruturais

O ambiente europeu – balizado, em matéria de recursos, por um orçamento persistentemente na casa do 1% do PIB global e por um debate surdo sobre as implicações dos custos dos alargamentos, para já não falar no problema maior da natureza política e constitucional da União – recriou um novo contexto para a evolução da política de coesão, que é o que marca os dias de hoje. Já não é a questão dos caminhos e das modalidades da convergência das regiões mais desfavorecidas que encima o debate – é o tema das relações entre coesão e competitividade que predomina. Isso ficou muito claro no processo que levou à formulação das orientações para a política de coesão no período 2007-2013 e às respectivas perspectivas financeiras.

As prioridades da União em matéria de competitividade internacional – designadamente com os Estados Unidos – e a Agenda de Lisboa revista passaram a dar lugar de destaque às questões da inovação, do espírito empresarial e do crescimento da economia, com referência obrigatória ao conhecimento e às capacidades de investigação, incluindo as novas tecnologias da informação e da comunicação. Por isso, as orientações estratégicas estabelecidas por decisão do Conselho em Outubro de 2006 foram (1) tornar a Europa e as suas regiões espaços mais atractivos para investir e para trabalhar, (2) melhorar os conhecimentos e a inovação em prol do crescimento e (3) criar mais e melhores empregos.

Estabeleceu-se, assim, que a política de coesão é, ela própria, um instrumento da competitividade e da concretização da Agenda de Lisboa, na medida em que assegura o contributo dos Estados membros e das regiões menos desenvolvidos para as finalidades do emprego, da inovação e do crescimento. Para além da formulação deste princípio em si mesmo (que até pode não sofrer contestação, visto que a política de coesão não tem de ser “assistencialista”), a verdade é que ele produziu uma forte “rotação” no entendimento da função redistributiva dentro da União, sujeitando--a às restrições da macroeconomia e da competitividade. Quer dizer, os espaços em atraso (a sua transformação) são menos um objectivo da União, encarando-se antes como participantes numa lógica que está para além deles e à qual têm de se ligar. Afirma-se, assim, “a importância da política de coesão para atingir outros objectivos políticos comunitários em sintonia com a Agenda de Lisboa renovada”. O “não-Estado” europeu aproxima-se muito mais do que se convencionou chamar um Estado “schumpeteriano” do que de um Estado-Providência, agora tido como fora de moda, mas cuja natureza formou decisivamente a problemática inicial da coesão. A Agenda de Lisboa é o grande elemento impulsionador desta viragem e os princípios da coesão são, de certo modo, os barómetros da mudança em curso.

 

Os novos objectivos da política de coesão e os recursos mobilizados

Em todo o caso, a grande parte (mais de 80%) dos recursos da política de coesão continua a concentrar-se no primeiro dos três objectivos estabelecidos para o período 2007-2013, o “Objectivo da Convergência”, que se destina a acelerar a convergência dos Estados membros e das regiões menos desenvolvidos. Ao “Objectivo da Competitividade Regional e do Emprego”, que se destina a reforçar a competitividade e a capacidade de atracção das regiões que não são definidas como das menos desenvolvidas, cabem cerca de 16% , restando um pouco mais de 2% para o “Objectivo da Cooperação Territorial Europeia”, que se destina, em geral, a reforçar a cooperação inter-regional e o intercâmbio de experiências de nível territorial. O que acontece, evidentemente, é que a execução da política de coesão nas regiões desfavorecidas tenderá a privilegiar uma lógica de contributo para a competitividade.

Contudo, a estrutura do orçamento comunitário, no seu conjunto, onde os recursos acabados de analisar representam um peso de cerca de 36% do total, não acompanha esta opção por uma prioridade tão forte a favor da política de coesão (no entendimento actual ou nos que o antecederam). De facto, é a política agrícola, com uma natureza apenas marginalmente modificada, por comparação com a política de preços e mercados, que favorece uma pequena parte dos agricultores europeus, que se inclui na rubrica mais “pesada” (43%), valor que constitui, no entanto, uma redução apreciável face aos tempos em que era muito mais de metade do orçamento.

 

O contributo da coesão para a reinvenção permanente da ideia de Europa

Parece, pois, que se pode dizer que a natureza e o entendimento da política europeia de coesão continuam a ser parte importante de muitos debates que há que fazer sobre o futuro da União Europeia.
A questão central, nesta União que chegou a pontos ainda há pouco impensáveis do continente, talvez seja a de saber se, num espaço político, social e económico constituído a partir dessa riqueza enorme que é a diversidade, a mobilização das diferenças continua a ser um pilar dos mais fortes. A Europa comporta, de facto, modos de governação territorial muito diversos. Não foi só o aumento do seu tamanho que lhe criou heterogeneidade. Ela é estrutural e basilar. Para além dos grandes espaços macro-reguladores (liderados pelas maiores metrópoles), as dinâmicas europeias assentam em sistemas territoriais de diferentes naturezas: sistemas metropolitanos e sistemas urbanos activos, assim como regiões de urbanização e de economia mais difusas ou de menor densidade. Todos eles, na sua variedade, resultam de ancoragens territoriais poderosas. Os territórios são, portanto, fontes de inovação, qualificação e crescimento potenciais. Assim como são os espaços onde, através de relações de proximidade, se geram as primeiras formas de inclusão e de acesso dos cidadãos a padrões de bem-estar e sociabilidade. Mas esse acesso proporciona níveis de bem-estar muito diversos, como resulta das disparidades de riqueza existentes. Por isso, as componentes infra-europeias da União tanto podem ser razão de dinamismo e de criação de valor para o bem-estar de todos como causa de assimetrias, desconstrução, segmentação.

A equação coesão/competitividade passa, pois, em simultâneo pelos modos de aproveitar o espaço europeu e os seus territórios para gerar dinamismos (contributo da coesão para a competitividade) e pelos modos de ligar, articular, tornar coesos esses dinamismos, não desaproveitando essa grande marcha europeia iniciada em 1957, geradora de uma capacidade de invenção social e política certamente não prevista por muitos.

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Informação Complementar

A política europeia de coesão em Portugal: o QREN (2007-2013)

Os fundos estruturais de coesão, que constituem as transferências comunitárias que co-financiam a execução, em bases nacionais, de projectos de desenvolvimento, traduzem-se em Quadros de Referência Estratégicos Nacionais. O QREN português para o período 2007-20013 assenta em três “agendas” principais que se supõem em consonância com as orientações e as prioridades formuladas a nível europeu. Trata-se das Agendas Operacionais para o Potencial Humano, para os Factores de Competitividade e para a Valorização do Território.

Elas concretizam-se através de três Programas Operacionais Temáticos com aquelas designações e de Programas Operacionais Regionais do Continente – Norte, Centro, Lisboa, Alentejo e Algarve – e das Regiões Autónomas. O co-financiamento é assegurado pelo Fundo Social Europeu (FSE), pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) e, conjuntamente, pelo FEDER e Fundo de Coesão.

Esta estrutura operacional (a que corresponde a distribuição de recursos que se mostra na figura) contém uma novidade relevante, por comparação com os QCA anteriores: uma redução significativa dos programas operacionais não-regionais, agora limitados a três, o que significa uma maior concentração de objectivos, prioridades e recursos. Isso está em consonância com o propósito de dotar as intervenções estruturais de maior selectividade, tendo em vista a viabilidade económica e a sustentabilidade financeira dos projectos e a necessidade de alcançar resultados mais duradouros em matéria de coesão e valorização territoriais.

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* José Reis

Prof. Catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Investigador do Centro de Estudos Sociais.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Distribuição dos fundos estruturais por objectivos

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