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- JANUS 2008 -



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A convergência em Ciência e Tecnologia

Manuel Mira Godinho *

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Desde 2000 Portugal entrou em “divergência” com a média da União Europeia. Isto depois de importantes avanços em termos de redução da distância económica face à UE em anos anteriores. O desempenho nas décadas precedentes foi de tal forma positivo que, conjuntamente com os “tigres asiáticos” e a Irlanda, Portugal foi com frequência referido como um dos casos emblemáticos de catching up com as economias mais avançadas no final do século XX. Porém, nos anos mais recentes, fruto de uma recessão prolongada e de uma arranque lento, a economia portuguesa tem-se vindo a afastar das mais desenvolvidas. Neste contexto, a questão que se coloca quanto a esta matéria da convergência/divergência é: será Portugal capaz de retornar à trajectória de aproximação das décadas anteriores? E, em caso positivo, as questões que naturalmente se seguem são: quando se verificará essa aproximação; e com que intensidade se irá ela verificar?

 

O contexto

A “convergência económica” tem sido extensivamente tratada por inúmeros estudos ao longo das últimas duas décadas. A discussão sobre esta temática tem-se baseado em medidas associadas ao rendimento per capita , contemplando, em geral, amostras com um grande número de países e cobrindo períodos temporais de mais de uma década.

Também em relação a Portugal, a temática da convergência económica face à média da UE tem sido bastante abordada. O caminho percorrido desde a adesão é bem conhecido – de início houve uma aproximação às médias do bloco europeu, tendência esta que se inverteu durante a presente década, com uma progressiva divergência.

Neste artigo o foco não é, porém, na convergência ou divergência do rendimento per capita , mas na análise de dimensões que condicionam as perspectivas dessa mesma convergência económica. Clarificando: o rendimento per capita (ou outras medidas análogas) é uma variável “resultado”; em contraste, o presente artigo focaliza-se em variáveis “causais” que afectam a evolução desse mesmo “resultado”.

Nesta perspectiva, o que de seguida se apresenta é uma análise da convergência em termos de ciência e tecnologia (C&T), duas dimensões “causais” com enorme impacto nos desempenhos económicos de longo prazo. Em particular, parte-se do pressuposto de que, mais que no passado, estas variáveis são ingredientes críticos do modelo de desenvolvimento económico.

Antes de passar à análise dos dados relativos aos desempenhos em C&T, convém porém qualificar tal pressuposto, visto ele não ser pacífico e unanimemente partilhado pelos vários quadrantes da sociedade portuguesa.

A este respeito, há já alguns anos que diversos protagonistas do debate de desenvolvimento contrastam dois cenários “alternativos”. Um corresponderia ao designado ‘modelo da Flórida' (sol, praias, serviços de tempos livres e de apoio à terceira idade...), enquanto o outro consistiria num modelo mais ‘californiano' (universidades, investigação, empresas high-tech ...). Em anos recentes, inclusive, houve quem advogasse uma versão adaptada do primeiro modelo: a aposta sucessiva na organização do Euro 2004, a tentativa de atracção da America's Cup para Lisboa (cuja escolha final recaiu, como se sabe, na cidade de Valência), sucessivos projectos de abertura de novos casinos, etc., pareciam apontar para um modelo de desenvolvimento mais próximo do de Las Vegas, Nevada que do seguido pela Florida.

Sendo evidente que, tendo as abordagens tipo Florida ou Las Vegas apresentado – nos respectivos contextos em que foram empreendidas – resultados positivos, em termos de crescimento, etc., o desviar de uma aposta sistemática no investimento em educação e conhecimento torna, noutros pontos do mundo, mais inseguras as possibilidades de desenvolvimento no longo prazo. De outro modo, a aposta em modelos dessa natureza deixa a progressão futura muito mais dependente do acaso e da sorte.

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Onde estamos (contexto nacional)?

Para ilustrar as dinâmicas de convergência em ciência e tecnologia recorre-se de seguida a dois indicadores: as publicações científicas (para a ciência) e as patentes (para a tecnologia). A literatura associada aos estudos de C&T refere de forma extensiva os méritos e limitações destes indicadores. Embora reconhecendo que uma análise exaustiva do desempenho em C&T exigiria a consideração de outros indicadores, assume-se suficiente a referência a apenas estes dois, visto as mensagens por eles transmitidas coincidirem, no essencial, com as de estudos mais sistemáticos.

As contagens de publicações científicas decorrem de informação constante de bases de dados originalmente desenvolvidas pelo Institute for Scientific Information. Estas bases de dados registam, para as diferentes áreas disciplinares, todos os artigos publicados nas principais revistas científicas de referência a nível internacional. Em relação às patentes, vai-se analisar as patentes nacionais (portuguesas) e as patentes pedidas nos Estados Unidos. É vulgar tomar-se como referência nas comparações internacionais as patentes americanas, pois este país dispõe do maior mercado tecnológico do mundo. Para as patentes nacionais a fonte é o Instituto Nacional de Propriedade Industrial, enquanto para as americanas é o U.S. Patent and Trademark Office.

Em termos das publicações científicas, Portugal tem tido uma evolução significativa: entre 1981 e 2005 o número de publicações aumentou cerca de 20 vezes. Esta expansão explica-se em parte por o ponto de partida ser bastante baixo. Porém, o ritmo do aumento anual de publicações científicas é elevado e exibe uma taxa de crescimento sustentada em torno dos 12-13% ao ano desde o início dos anos 80.

Em contraste, no respeitante às patentes, os números apontam para uma situação bem diferente. Num estudo realizado pelo CISEP/ ISEG em 2003, verificava-se que os pedidos de patentes nacionais por parte de entidades residentes durante as duas décadas precedentes se tinha mantido relativamente estável, perto dos 100 pedidos por ano. Esta situação sofreu todavia uma alteração nos anos mais recentes (ver Figura 2), com os pedidos de patentes por residentes a alcançarem um valor superior a 180 em 2006.

 

Onde estamos (contexto internacional)?

A figura 3 confirma a análise anterior – o número de publicações nacionais está a crescer rapidamente. Essa figura permite ainda perceber que, embora ainda a alguma distância das economias de referência, a manutenção do ritmo de crescimento português poderá permitir alcançar valores similares aos dessas economias num horizonte de médio prazo.

No que concerne às patentes, a observação da figura 4 transmite uma mensagem diversa. Os dados desta figura correspondem a pedidos junto do United States and Trademark Office (USPTO). Mesmo estando os valores representados numa escala logarítmica, é bem perceptível o enorme fosso com que Portugal se depara. Em 2005, o número de patentes pedidas no USPTO, medido em termos relativos por milhão de habitantes no país de origem desses pedidos, era de 701 para os EUA, 564 para o Japão, 132 para a União Europeia e apenas de 3 para Portugal!

Em alternativa às patentes pedidas nos EUA, poder-se-ia ter feito esta análise contabilizando a posição portuguesa no respeitante à utilização das patentes solicitadas junto do Instituto Europeu de Patentes, por se admitir ser mais natural entidades portuguesas procurarem proteger as suas invenções no mercado europeu que no mercado norte-americano. Porém, a conclusão que se extrai quando se analisam as patentes europeias é que a enorme desvantagem relativa de Portugal não se desvanece de forma minimamente substancial.

 

Para onde vamos?

Verificou-se, através dos dados analisados, que Portugal tem vindo a aumentar os valores dos dois indicadores básicos de ciência e tecnologia. Todavia, ficou igualmente claro existirem situações bem distintas nessas duas áreas. O gap que separa Portugal das economias de referência é muitíssimo maior em termos tecnológicos e o ritmo de progressão nesta área não aponta para um prazo de catching up minimamente razoável.

Embora a leitura dos dados das patentes deva tomar em consideração factores que afectam o desempenho neste domínio, a verdade é que mesmo quando o desempenho é controlado por aspectos como a estrutura produtiva ou a atractividade de patentes para empresas e negócios do tipo dos existentes em Portugal, a desvantagem continua a ser enorme.

O que tem sido evidenciado por várias análises mais sistemáticas sobre estas matérias, é a existência de um efectivo dualismo em matéria de C&T. Por um lado, verifica-se uma aproximação sustentada a níveis de maior excelência internacional na área científica. Por outro, ao nível da inovação competitiva, regista-se uma fragilidade substancial e incapacidade de aproximação à fronteira tecnológica.

O fraco domínio da utilização estratégica da propriedade intelectual, e no caso vertente das patentes, revela-se como um ónus que inibe a convergência económica a longo prazo. Acresce que a incapacidade de materializar os avanços na área da ciência académica em melhoria do posicionamento tecnológico constitui uma barreira à retoma dos ritmos de convergência económica verificados na segunda metade do século XX.

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Informação Complementar

Quantos anos para alcançar os países que lideram em termos científicos e tecnológicos

O quadro anexo, com informação sobre publicações e patentes, foi construído a partir dos dados empregues nas figuras inseridas no texto principal. Ele foi elaborado com o objectivo de permitir extrapolar o período de tempo que decorrerá até que Portugal alcance os níveis de referência internacionais. Tal extrapolação baseia-se na média de publicações e de patentes nos anos mais recentes e nas velocidades relativas de avanço de Portugal e dos restantes países das economias triáticas (UE, Japão e Estados Unidos).

A conclusão que se extrai, com base numa extrapolação de tendências (ver dados constantes na última coluna do quadro anexo), é que enquanto no caso das publicações, a manutenção das velocidades relativas permitirá uma convergência num prazo de cerca de uma década, no caso das patentes a situação é bem mais complicada – na verdade, aos ritmos actuais irá demorar entre um século e meio a dois séculos para que se alcancem os níveis de patenteamento das economias triádicas!

Admitimos que o prognóstico acabado de apresentar possa estar penalizado, para o bom e para o mau, pelo facto de estarmos a trabalhar meramente com extrapolações simples de tendências. É natural que no caso das publicações científicas, à medida que o seu número total vá aumentando, seja cada vez mais difícil manter o ritmo de progressão verificado no passado, o que alongará o período de recuperação ( catching up ) acima enunciado. Em contrapartida, no caso das patentes, o facto de se partir de uma base muito baixa poderá permitir que em poucos anos possa vir a haver um aumento súbito (designado, por vezes, nas análise de convergência, por ‘ take-off ') dos pedidos de patentes, reduzindo o período de aproximação acima referido. De qualquer modo, os números do parágrafo anterior são uma expressão clara do enorme dualismo que caracteriza actualmente a C&T em Portugal.

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* Manuel Mira Godinho

Doutor em Science and Technology Policy pelo Science Policy Research Unit, Universidade de Sussex, Reino Unido. Professor Associado do ISEG/UTL. Fez Agregação com a lição “Análise Económica das patentes”. Coordena o programa de Doutoramento em Economia e do Mestrado em Economia e Gestão de C&T e Inovação.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Evolução das publicações científicas referenciadas internacionalmente com origem em Portugal, 1981-2004

Link em nova janela Pedidos de patentes nacionais por residentes, 1980-2006

Link em nova janela Publicações em ciências naturais e engenharia e pedidos de patentes nos Estados Unidos

Link em nova janela Evolução dos artigos nas áreas das ciências naturais e engenharias por milhão de habitantes, 1991-2003

Link em nova janela Evolução dos pedidos de patentes por milhão de habitantes no país de origem apresentados ao USPTO, 1991-2005

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