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- JANUS 2008 -



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Formação e qualificação profissional

António Gonçalves * e António Canhão **

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A abordagem das temáticas de formação e qualificação profissional revela-se difícil, hoje em dia, como comprovam as repetidas análises e diagnósticos realizados, nos mais diversos seminários, encontros e fóruns. A possibilidade de apresentar ideias repetidas e cenários repisados é elevada. Menos habitual é considerar estas áreas do ponto de vista das relações que se podem estabelecer na esfera laboral.

A última década revelou uma desejada aproximação entre os sistemas educativos e formativos, integrando perspectivas de desenvolvimento pessoal, com a preparação de futuros profissionais devidamente habilitados e competentes, para um mercado de trabalho em profundas alterações. O desenvolvimento acelerado das tecnologias de informação e comunicação e sua respectiva apropriação pelos vários sectores da actividade económica; o profundo desenvolvimento de conhecimento intensivo em múltiplas áreas das ciências e respectivas aplicações; a confirmação do aparecimento das chamadas economias emergentes, a partir de um grupo de países ganhadores de níveis elevados de desenvolvimento; a complexificação das sociedades com novas ameaças e oportunidades; a “compactação” do planeta, com a nossa crescente consciência das suas tremendas limitações e fragilidades, aliadas a processos de incapacidades de as atender, entre outros contextos bem marcantes da nossa contemporaneidade, leva-nos a uma repetida recentração da importância da educação/formação/qualificação, como provável grande solução para todas estas situações.

De forma predominantemente reactiva, as sociedades tentam construir modelos que se ajustem às dificuldades específicas que vão encontrando, criando plataformas de sustentação a “futuros” cenários onde pretendem sobreviver e mesmo singrar.

A reconfiguração, em curso ou procurada, das relações laborais ganhou muitos adeptos, surgindo diversas propostas conjugadas com visões e ideologias do que poderão ou deverão ser as próximas sociedades, a partir da realidade actual que observamos e registamos.

 

A qualificação no eixo da educação e formação

É certo que a discussão em torno da Educação e Formação e das suas interrelações não é recente; contudo é importante a clarificação destes conceitos, considerando as implicações que têm neste artigo.

Considera-se a educação como uma acção de sentido mais lato e contínuo em que se perspective um desenvolvimento continuado e geral do “conhecimento, de valores e da capacidade de compreensão requeridos para os caminhos da vida” (Walker, 1987: 19), hoje frequentemente associada à expressão “Educação ao Longo da Vida”. Assim, a Formação, vista como um processo associado ao desempenho de uma dada profissão, insere-se na definição mais lata de Educação. Com efeito, os conceitos mais recentemente utilizados pela Agência Nacional para a Qualificação (ANQ) integram essa perspectiva. Assim, no Catálogo Nacional de Qualificações (http://www.catalogo.anq.gov.pt/Top/Glossario/Paginas/default.aspx), as definições de formação inicial e contínua são referidas como actividades de “educação e formação”, diferenciando depois os dois conceitos, aplicando o conceito de formação inicial àquela que confere a qualificação para o exercício de uma profissão, enquanto a formação contínua, considerada a que ocorre “após a saída do sistema de ensino ou após o ingresso no mercado de trabalho”, possibilita o “aprofundamento de competências profissionais” e o “reforço da empregabilidade”. Nesta perspectiva, a Qualificação, sendo “o resultado formal de um processo de avaliação e validação comprovado por um órgão competente, reconhecendo que um indivíduo adquiriu competências, em conformidade com os referenciais estabelecidos” (ANQ, 2007), é adquirida por um processo de formação (educação) inicial. Este processo distingue-se da formação contínua que, como vimos, pretende melhorar as competências profissionais que conduziram a essa Qualificação.

Em Portugal, o problema situa-se precisamente nos baixos níveis de Qualificação dos activos, quer porque não passaram por percursos de formação inicial, quer porque muita da formação qualificante realizada nos últimos anos não se encontra reconhecida e certificada, conduzindo assim a uma subcertificação dos activos. Alguns passos têm sido dados nesse sentido, nomeadamente através da implementação de processos de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências Profissionais (RVCC-PRO) cujo alargamento estará para breve (ver texto complementar).

 

Os níveis de escolarização e qualificação em Portugal e na Europa

Tal como referido anteriormente, Portugal apresenta uma população com níveis de habilitação e qualificação bastante baixos, quer em termos absolutos, quer em relação aos seus parceiros europeus. Os dados apresentados no “Livro verde sobre as relações laborais” mostram que, apesar de se poder considerar uma alteração significativa, essencialmente ao nível da taxa de analfabetismo, tal não esconde o facto de o ponto de partida ser muito baixo e de o esforço de melhoria ter de ser, necessariamente, maior. Atendendo a uma faixa etária situada entre os vinte e os vinte e quatro anos, não chega a 50% desta população que tenha pelo menos o ensino secundário concluído, enquanto na União Europeia a 25 Estados a média se situa em cerca de 80%. Outro aspecto crítico para a nossa sociedade continua a ser o nível de abandono escolar precoce. Este abandono tem permanecido bastante estável nos últimos anos (quase sempre acima dos 40%) e não tem sido compensado pela participação em percursos de educação e formação. De facto, quer a taxa de abandono escolar, para a população dos 18 aos 24 anos, é das mais elevadas da UE a 25, com valores de cerca de 40%, enquanto a média comunitária se situa nos 17%, quer ainda a participação na educação e formação da população com idades entre os 25 e 64 anos é cerca de 5%, metade do registado para a média da UE a 25. Com efeito, esta saída escolar antecipada coloca-nos numa situação particularmente vulnerável face aos nossos parceiros europeus. Este cenário torna-se particularmente preocupante, dado que a competitividade da economia europeia, e a de Portugal no contexto europeu e mundial, só tem sentido se se apostar num mercado de trabalho altamente qualificado e que integre como sua a perspectiva de aprendizagem ao longo da vida. Só assim os activos terão a possibilidade de reciclar as suas competências, procurar formação contínua e adequar o seu desempenho profissional a um contexto de constante mudança. É evidente que um baixo nível de escolarização dificulta a apropriação destas linhas de desenvolvimento das relações laborais futuras e criará necessariamente um desfasamento entre o mercado de trabalho e as necessidades das empresas que, cada vez mais, necessitam de profissionais qualificados para serem competitivas. Num mercado a 25, há que considerar a possibilidade de as empresas recorrerem a trabalhadores de países parceiros onde os níveis de habilitações e qualificação são superiores. A formação, inicial e contínua, constitui-se, assim, como uma das formas mais importantes de ultrapassar o baixo nível de qualificação, sendo neste momento uma das fortes apostas do governo com a iniciativa Novas Oportunidades.

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A qualificação e o mercado de trabalho

Nas referências apresentadas anteriormente sobre a evolução das condições e exigências do actual mercado de trabalho, denota-se uma crescente relação e dependência das funções profissionais com níveis mais elevados de qualificação.

No enquadramento desta afirmação apresentam-se os seguintes vectores concorrenciais determinantes:

• A evolução da estrutura sectorial do emprego, com um aumento gradual e contínuo do terciário e uma diminuição do sector primário, associando-se esta realidade a uma maior necessidade de qualificações, quer habilitacionais, quer de formação profissional específica;

• A crescente utilização e dependência das tecnologias de informação e comunicação no desempenho diário das funções profissionais, com a consequente mudança dos respectivos perfis, mobilizadores de mais habilitações e formação;

• A disponibilização crescente de mais e, também, diversificadas fontes de informação, facilitando o aumento significativo de utilização de conhecimento intensivo em profissões de todos os sectores de actividade;

• O confronto da realidade de cada país com as condições de todos os outros e seus respectivos factores de concorrência, em que a produtividade está associada a níveis elevados de desempenho, com fortes suportes nas suas habilitações e qualificações;

• A indissociável necessidade de as organizações disporem de cidadãos esclarecidos, pró-activos e críticos, para além de uma formação instrumental e utilitária no campo profissional. A complexidade das sociedades e das organizações contemporâneas assim o recomenda e exige.

Ao aceitar-se como regra geral para qualquer mercado a existência de uma livre oferta e procura, a descrição anterior vem determinando que as ofertas de trabalho, como necessidades para as empresas, se centrarão em perfis profissionais altamente habilitados e qualificados. Neste ponto é importante averiguar a situação actual e possíveis tendências.

No que a Portugal diz respeito e no quadro do espaço económico e comunitário em que nos inserimos, possuímos fortes desvantagens quer de níveis de habilitações, quer de qualificações para as actuais exigências do trabalho. Como vimos, num sentido geral, temos uma situação negativa de partida, pela não qualificação inicial da população e seu agravamento ao longo da vida da população activa, com fraca participação em formações contínuas.

Nesta análise de diferenciação entre qualificação inicial e ao longo da vida, não se pretende criar qualquer dicotomia, antes pelo contrário: salienta-se a importância de garantir uma adequada e exigente qualificação inicial, como suporte a futuros incrementos qualificantes, funcionando aquela como conceito funcional composto de metabolismo basal e substrato, indispensável a processos qualificantes posteriores e consequentes desempenhos profissionais.

 

A reconfiguração das relações laborais sustentada na formação e qualificação

A consulta das opiniões manifestadas pelas organizações sindicais e pelas associações empresariais sobre a relevância da formação e qualificação do capital humano das organizações não dista grandemente, referindo-se de forma sistemática e enfatizada, como sendo factores imprescindíveis e determinantes para a modernização e sucesso das empresas.

No entanto, não se registam opiniões semelhantes sobre a forma de as promover e operacionalizar. Por um lado, advoga-se a prioridade da defesa do posto de trabalho e seu estatuto, visualizando-se o dever de as organizações criarem as condições para a necessária qualificação dos seus membros num processo de reciclagem e adaptação permanente perante os desafios colocados. Por outro lado, existe a defesa da prioridade de uma liberalização da contratação de activos, com processos agilizados de substituição de contratados, por aqueles que manifestem as qualificações mais úteis e competitivas, para a livre concorrência nos diversos mercados dos diferentes sectores económicos. Supõe-se que esta livre procura e selecção irá induzir a procura de formação e qualificações, por parte dos activos que ambicionem conquistar um posto de trabalho.

As comissões arbitrárias, no âmbito de processos de concertação social, têm tentado construir vias variadas de dosagem intermédia destes dois pontos de vista. A mais recente proposta intermédia foi lançada em torno do conceito de flexigurança, anunciando a flexibilidade de contratações e despedimentos, garantindo uma protecção social de reintegração em novos postos de trabalho, após o desenvolvimento de processos de formação qualificantes. Neste entendimento, resta uma questão-chave sobre quem suportará maioritariamente os esforços da qualificação e da reintegração no mercado de trabalho, os indivíduos, as organizações, ou a entidade abstracta chamada Estado. Na aceitação séria e convicta das posições assumidas pelas partes sobre a importância da qualificação/formação, deduz-se que todos darão um contributo equilibrado para esse esforço, sob pena de mais uma vez se cair em desresponsabilizações de cada um para um encargo de todos, ou seja, o Estado e suas consequentes contas desequilibradas.

Numa síntese ao assunto em título, torna-se notório que os perfis das qualificações e formações requeridas pelo mercado de trabalho têm uma relação directa com as novas exigências da evolução da economia, pelo que a primeira das qualificações reside no entendimento de todos sobre os desafios objectivos às organizações, na particularidade de cada sector e dimensão das empresas em cada país.

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Informação Complementar

Novas oportunidades

A iniciativa Novas Oportunidades foi criada com o objectivo de tornar o ensino secundário o patamar mínimo de referência para as qualificações dos portugueses, organizado em dois pilares fundamentais, ambos com a perspectiva de que a Aprendizagem ao Longo da Vida é um princípio que permitirá aos cidadãos adquirir e reter, ao longo da vida, novas competências necessárias numa sociedade altamente competitiva. Um dos pilares destina-se aos jovens, apostando em fazer do ensino profissionalizante de nível secundário uma oportunidade real de combater o abandono escolar precoce. O segundo pilar tem como objectivo elevar as qualificações dos activos e assenta na rede de Centros Novas Oportunidades, criada a partir dos Centros de Reconhecimento Validação e Certificação de Competências, em funcionamento desde 2001, que passou a funcionar como a porta de entrada na educação e formação dos adultos. Partindo do princípio de que o nível de qualificação real dos activos não se espelha nos dados estatísticos, em virtude de se ter realizado muita formação de carácter não formal e informal que não foi certificada, estes centros apostam no reconhecimento das competências adquiridas por essas vias, conduzindo à certificação desde o básico ao secundário. Por outro lado, os Centros Novas Oportunidades passam a funcionar como locais de diagnóstico e encaminhamento dos adultos para as respostas formativas mais adequadas. Mais recentemente, surgiu a possibilidade de se realizar o Reconhecimento Validação e Certificação de Competências Profissionais, dispositivo integrado que possibilita uma resposta simultânea às necessidades de dupla certificação. Até agora, este RVCC-Pro funciona em 41 centros do IEFP, para dezasseis profissões, sendo previsível que se alargue, em 2008, às cento e setenta e uma saídas profissionais do Catálogo Nacional de Profissões, funcionando numa rede de centros com cobertura nacional.

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* António Gonçalves

Licenciado em Biologia pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Mestre em Ciências da Educação – Área de Administração e Gestão Educacional. Professor do Ensino Secundário. Coordenador do Centro Novas Oportunidades Arrábida. Autor de publicações sobre desenvolvimento curricular.

 

** António Canhão

Licenciado em Biologia/Geologia pela Universidade de Évora. Mestre em Ciências da Educação – Área da Educação de Adultos. Professor do Ensino Secundário. Concebe Programas de Cursos Profissionais. Director do Centro de Formação de Professores Arrábida. Autor de publicações sobre desenvolvimento curricular e perfis profissionais.

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Referências bibliográficas

CRUZ, Jorge Valadas Preto (1998) – Formação profissional em Portugal. Do levantamento de necessidades à avaliação. Lisboa: Edições Sílabo.

Agência Nacional para a Qualificação (2007) – Catálogo Nacional de Qualificações. Disponível em: http://www.catalogo.anq.gov.pt

DORNELAS, António (coord.) (2006) – Livro verde sobre as relações laborais. Lisboa: Ministério do Trabalho e Solidariedade Social.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

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Link em nova janela Dimensão da flexigurança

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